Discurso no Senado Federal

DENUNCIA DE IRREGULARIDADES PRATICADAS PELO GOVERNO DO ESTADO DO MARANHÃO.

Autor
Epitácio Cafeteira (PPB - Partido Progressista Brasileiro/MA)
Nome completo: Epitácio Cafeteira Afonso Pereira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO MARANHÃO (MA), GOVERNO ESTADUAL.:
  • DENUNCIA DE IRREGULARIDADES PRATICADAS PELO GOVERNO DO ESTADO DO MARANHÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 18/06/1998 - Página 10477
Assunto
Outros > ESTADO DO MARANHÃO (MA), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • DENUNCIA, CRIME, RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA, DESVIO, VERBA, ROSEANA SARNEY, GOVERNADOR, ESTADO DO MARANHÃO (MA), CONSTRUÇÃO, PAVIMENTAÇÃO, RODOVIA.
  • DENUNCIA, IRREGULARIDADE, ATUAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, PROPRIEDADE, FAMILIA, JOSE SARNEY, SENADOR, IMPEDIMENTO, TRANSMISSÃO, PROGRAMA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO PROGRESSISTA BRASILEIRO (PPB), INTERIOR, ESTADO DO MARANHÃO (MA).
  • LEITURA, TRECHO, REPRESENTAÇÃO JUDICIAL, APRESENTAÇÃO, ADERSON LAGO, DEPUTADO ESTADUAL, ESTADO DO MARANHÃO (MA), PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, DESVIO, VERBA, CONSTRUÇÃO, OBRA PUBLICA, PAVIMENTAÇÃO, RODOVIA, RESPONSABILIDADE, ROSEANA SARNEY, GOVERNADOR.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA (PPB-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, desde 1963 tenho exercido mandatos no Poder Legislativo. Ou seja, há 35 anos, descontados os mandatos de Prefeito de São Luís e Governador do Maranhão, estou no Parlamento representando o meu povo e o meu Estado.

Esta tribuna deve ser ocupada para a discussão dos grandes temas desta Nação. Assim penso e assim tenho procurado agir em toda a minha vida parlamentar.

Hoje, porém, numa rara exceção, explanarei, até certo ponto constrangido, sobre um problema referente ao meu Estado. Asseguro, no entanto, não se tratar de questiúncula ou intriga provinciana. O assunto é sério, gravíssimo mesmo e, infelizmente, denigre a política maranhense.

Trata-se de uma denúncia de crime praticado pela Governadora do Maranhão, Roseana Sarney, subtraindo de um povo tão pobre e sofrido, recursos valiosos - no montante de R$33 milhões - aplicados em uma estrada que não existe e que poderiam ser investidos em saúde, educação, moradia e tantos outros.

Na tentativa de uma melhor compreensão dos fatos e objetivando um ordenamento para o raciocínio, adotarei uma metodologia baseada em ordem cronológica.

No dia 11 de maio deste ano, a TV Mirante, de propriedade da família Sarney, desobedecendo à Justiça Eleitoral, deixou de transmitir para o interior do Estado do Maranhão o programa político do meu Partido, o PPB. Mesmo em São Luís, a audiência da emissora foi restrita, pois, estranhamente, faltou energia elétrica exatamente no horário do programa em vários bairros considerados redutos eleitorais da Oposição.

Não bastasse isso, os torcedores dos dois maiores clubes maranhenses não ficaram em casa para ver o programa pois foram atraídos pelo sorteio de carros, televisores e eletrodomésticos que o concurso Nota na Mão, do Governo do Estado, promovia durante o maior clássico do nosso futebol, propositalmente transferido do domingo à tarde para segunda-feira à noite, Sr. Presidente.

Qual a razão de tantas artimanhas e peripécias governamentais? O que temia a Governadora Roseana Sarney?

É que o Deputado Aderson Lago, Líder da Bancada na Assembléia Legislativa e Presidente do PPB no Maranhão, verificou e arregimentou provas cabais de que o Governo do meu Estado pagou mais de R$33 milhões por uma estrada que não existe. Os documentos exibidos provavam o desvio de verbas públicas para o patrimônio de terceiros por meio de uma obra que nunca foi executada.

Diante da afronta à lei por parte da TV Mirante, nosso Partido foi ao TSE, que, por unanimidade, determinou a formação de nova cadeia para a transmissão do programa para o interior no dia 2 de junho deste ano.

Nesse ínterim, o Deputado Aderson Lago apresentou requerimento à Assembléia Legislativa, aprovado em 19/05/98, solicitando a formação de uma comissão para “verificar in loco as condições das estradas entre Paulo Ramos/Arame e Morros/Humberto de Campos, cujas obras foram objeto das denúncias veiculadas pela televisão, no horário político do PPB...”

A Governadora, sabendo de sua aprovação, irritou-se e chamou a seu gabinete os Deputados que compõem sua Bancada e que são maioria, exigindo deles uma retratação. Assim, numa atitude inusitada, a Bancada da Governadora fez uma comunicação ao Presidente da Assembléia Legislativa, solicitando a não constituição da comissão proposta pelo Deputado Aderson Lago embora aprovada anteriormente pelos próprios.

Os Deputados encarregados de fiscalizar, chamados para olhar o local da estrada, diziam naquele documento, colocando as mãos nos olhos: “não queremos ver, não queremos constatar que não existe estrada”. Essa é a realidade. É constrangedora, mas é a realidade.

Tal atitude causa perplexidade, visto que demonstra quão frágil e submisso está o Poder Legislativo Estadual, que, obediente, agacha-se diante de qualquer ordem da Governadora.

O Secretário de Comunicação do Governo editou nota oficial com data de 28.05.98, ou seja, 17 dias após a denúncia. Levaram 17 dias para fazer uma nota oficial que, além de não esclarecer por que a obra não tinha sido feita, ainda atribuía a governos anteriores o débito da estrada que faltava. Alegava que os R$33 milhões haviam sido pagos na rubrica de “restos a pagar” e que estava quitando inclusive despesas da Companhia de Águas e Esgotos do Maranhão - Caema -, decorrentes da gestão do Deputado Aderson Lago como Presidente da empresa, na época do meu Governo, levantando assim suspeitas.

Como resposta imediata, Aderson Lago entrou com um pedido de CPI. Pedia à Assembléia Legislativa que apurasse sua própria administração frente à Caema, numa demonstração insofismável de que pretendia defender o seu nome. Esse requerimento foi rejeitado.

Roseana Sarney, caso tivesse o mesmo cuidado de defender seu nome, deveria ser a primeira a pedir a apuração dos fatos, até porque, como Governadora, é de sua obrigação defender o erário público. Se ela não estivesse comprometida, tentaria reaver os R$33 milhões que pertencem ao povo do Maranhão.

O Deputado Aderson Lago apresentou, no mesmo dia, mais um requerimento, desta vez pedindo a instalação de uma CPI para “apurar denúncias de irregularidades no pagamento feito pelo Governo do Estado do Maranhão, no valor de mais de R$ 33 milhões, pela construção da MA-008, trecho Arame-Paulo Ramos, sem que a referida obra tivesse sido realizada...” Obviamente, Sr. Presidente, o requerimento também foi rejeitado.

Como presidente do PPB no Maranhão, o Deputado Aderson Lago deu entrada a um pedido de impeachment da Governadora, que, de antemão, no Maranhão de hoje, sabemos, jamais será examinado. Entrou ainda com representação junto ao Tribunal de Contas do Maranhão e também iniciou uma ação popular para que o dinheiro seja devolvido ao Estado. Junto ao Ministério Público do Maranhão apresentou, também, uma ação na tentativa de demonstrar as improbidades administrativas do Governo do Estado.

Sabendo que atualmente no Maranhão o clima é de coação, submissão e impunidade, o PPB, representado pelo Deputado Aderson Lago - ele está aqui na tribuna de honra -, acompanhado de correligionários, veio a Brasília para apresentar na data de hoje - e apresentou - ao Exmº Sr. Procurador-Geral da República representação contra a Governadora do Estado do Maranhão.

Sr. Presidente, vou ler, para que faça parte do meu pronunciamento, trecho da representação apresentada, que considero ser uma acusação jurídica e não política - tanto é assim, que o Partido ingressou com a ação junto à Procuradoria Geral da República. Portanto, quem quiser defender a Governadora, não vai fazê-lo do ponto de vista político; terá de mostrar claramente ou que a Governadora não pagou ou que a Governadora pagou e a estrada existe. Não há meio-termo, não há outra explicação para defender a Governadora: ou ela não pagou ou ela pagou e a estrada existe. Repito, portanto, que não se trata de denúncia política.

Destaco, Sr. Presidente, o seguinte trecho da representação apresentada ao Procurador-Geral da República:

A representada praticou crime de responsabilidade definido na Carta Magna do Estado do Maranhão os ilícitos comuns definidos na legislação federal, em especial, o crime de peculato, ao autorizar e efetuar, sob sua responsabilidade, o pagamento, a título de encargos de exercícios anteriores, para as empresas EIT - Empresa Industrial e Técnica S/A e PLANOR Empreendimentos Imobliliários Ltda, num total de R$16.769.892,05 (dezesseis milhões setecentos e sessenta e nove mil oitocentos e noventa e dois reais e cinco centavos), no ano de 1995, e R$16.352.518,11 (dezesseis milhões trezentos e cinqüenta e dois mil quinhentos e dezoito reais e onze centavos), no ano de 1996. Pagamentos estes por uma obra que, simplesmente, não existe. Ao agir desta forma, a Governadora do Estado do Maranhão concorreu para que fosse subtraído dinheiro público para proveito alheio, valendo-se de facilidades que lhe proporciona a qualidade de Governadora.

Os pagamentos “frios” foram feitos por conta das obras de terraplenagem e pavimentação da rodovia MA-008, no trecho compreendido entre os municípios de Paulo Ramos e Arame, num total de 127 quilômetros, e constam das prestações de contas do Governo do Estado relativas aos anos de 1995 e 1996, submetidas ao Tribunal de Contas do Estado, nos autos dos Processos n°3.983/96 e n°1.118/97.

Conforme podemos conferir a partir das provas acostadas aos autos da representação, a rodovia MA-008, ligando Paulo Ramos a Arame, simplesmente não existe. Está asfaltada, mas não existe. Diria que ela não foi asfaltada, Sr. Presidente, ela foi assaltada, porque ela não existe. Comprova tal assertiva fita de vídeo, fotografias e cópia da nota oficial do Governo do Estado, além de cópia do aviso de licitação do tipo tomada de preço, publicada pelo Governo no dia 4 de maio. Ou seja, somente após o pagamento de mais de R$33 milhões por uma estrada, é que o Governo mandou licitar o projeto de engenharia para essa mesma estrada.

Não pode haver confissão mais clara de que a estrada não existe: somente agora, no dia 4 de maio, foi licitado o projeto de engenharia para a estrada. A responsabilidade da qual a Governadora do Estado não poderá se eximir é decorrente dos decretos nºs 14.396 e 14.391, de 02 de janeiro de 1995. O primeiro decreto, em seu art. 4º, diz que a Secretaria de Estado da Fazenda somente acatará despesas de exercícios anteriores para pagamento de dotações alocadas a Encargos Gerais do Estado mediante autorização da Governadora. Só ela podia autorizar.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, nesse caso - não há como deixar de reconhecer - há responsabilidade da Governadora. Ao exame do decreto mencionado, vemos que os pagamentos a título de encargos de exercícios anteriores somente foram possíveis graças à autorização da primeira mandatária. S. Exª fez o decreto proibindo que qualquer secretário pagasse: só ela poderia mandar pagar.

Ademais, todos os atos administrativos foram revogados. Então, se foram autorizados - e foram, Sr. Presidente -, os pagamentos foram passados para obras inexistentes, sob o crivo da Governadora, tornando-se ela, portanto, a responsável direta pelo pagamento.

Sr. Presidente, a responsabilidade da Governadora ficou clarificada quando chamou a si atribuição pertinente ao exercício da função de Secretária de Estado, qual seja, a liquidação de despesa. Só S. Exª poderia autorizar o pagamento, já que era a encarregada de verificar o direito adquirido pelo credor - no presente caso, as empresas EIT e PLANOR.

A Governadora Roseana Sarney, Sr. Presidente, ao autorizar esse pagamento sabia o que estava fazendo. Ela ordenou os pagamentos pela obra inexistente ciente de sua responsabilidade e concorreu, como funcionária pública, para que o dinheiro do Estado fosse subtraído.

Finalmente, não venha a representada argumentar que não tinha conhecimento ou que não sabia que as faturas eram frias e que as medições eram inexistentes. Isso não é verdade! Tudo o que foi pago teve a análise e a autorização da Governadora, que chamou a si a responsabilidade para ordenação e liquidação da despesa, mesmo porque o pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação.

Não satisfeita com o pagamento de uma obra inexistente e com fraude ao Decreto nº 14.891, a representada, em nota oficial, afronta o bom senso público ao tentar ocultar a fraude com a mentira.

Diz a nota oficial:

“Com base em critério de moralidade, a Governadora editou o decreto estabelecendo normas para tramitação de exercícios anteriores pendentes de pagamento, no sentido de sanear as contas públicas, ouvindo a Auditoria-Geral e a Procuradoria-Geral do Estado.”

Sr. Presidente, há falha de memória da Governadora na nota oficial, pois diz que se tratava de pagamentos à conta de encargos de exercícios anteriores, esquecendo-se que os aditivos para essa estrada foram assinados durante o atual período de governo - e foram assinados pelo seu Vice-Governador e Secretário de Planejamento, Dr. José Reinaldo! Então, não se trata de exercícios anteriores, mas de exercício do Governo da Drª Roseana Sarney.

Igualmente é falacioso dizer que os pagamentos obedeceram à orientação da Procuradoria do Estado, mesmo porque a Procuradoria não examina liqüidação de despesas.

Sr. Presidente, o que havia de encargos de exercícios anteriores era um pouco mais de R$10 milhões em termos de verba, mas a Governadora desejava fazer tais pagamentos, e como os recursos existentes eram insuficientes, anulou créditos outros - está documentado -, para poder pagar as notas frias. E entre esses encargos anulados, Sr. Presidente, Srs. Senadores - é de estarrecer -, S. Exª tirou dinheiro do Programa de Proteção da Criança e do Adolescente, num total de R$1,150 milhão. Até o dinheiro de proteção à criança e ao adolescente foi entregue para o pagamento de uma estrada que nunca existiu!

Podemos verificar, pela simples leitura dos decretos mencionados, que, de fato, as faturas foram fabricadas posteriormente. E segue a representação! Não há que se falar no orçamento do DER, pois, apesar do decreto, havia o desejo malicioso de fazer-se o referido pagamento irregularmente na rubrica da Sefaz, Secretaria de Fazenda do Maranhão. Aliás, a Governadora retirou a verba que seria aplicada em uma despesa não prevista no Orçamento para pagar criminosamente o que já havia premeditado: obra pela qual se pagou a extraordinária quantia de R$33.122.410,16 milhões (trinta e três milhões, cento e vinte e dois mil, quatrocentos e dez reais e dezesseis centavos), fora o que já havia pago nos governos anteriores. A estrada simplesmente não existe. A obra não existe.

O Sr. Bello Parga (PFL-MA) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA (PPB-MA) - Nobre Senador, falta apenas um minuto para eu concluir. V. Exª naturalmente, como um dos Senadores da Governadora, deve ocupar possivelmente esta tribuna. Espero, no entanto, que ao fazê-lo V. Exª traga documentos, porque os documentos que tenho em mãos foram levados à Procuradoria-Geral da República.

O Sr. Bello Parga (PFL-MA) - Senador Cafeteira, peço licença para lhe fazer um reparo.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA (PPB-MA) - Sr. Presidente, para concluir...

O Sr. Bello Parga (PFL-MA) - Não sou Senador da Governadora, sou Senador do Estado do Maranhão e mereço respeito de V. Exª.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA (PPB-MA) - A prova de ato de improbidade administrativa do crime de responsabilidade de desvio da perda de patrimônio e da dilapidação dos bens públicos é o fato da obra paga não existir. Repito: não existe a Rodovia MA-008, ligando o Município Paulo Ramos ao Município de Arame.

É verdade também que a Governadora mandou licitar o projeto de engenharia, o que comprova a inexistência da referida obra. No entanto, Sr. Presidente, a Governadora fez a licitação para o projeto de engenharia da estrada somente em 04 de maio deste ano, depois de efetuar irregularmente o pagamento de mais de 33 milhões de uma estrada que simplesmente não existe.

Dessa forma, a representada concorreu para que fosse subtraído o dinheiro do Estado do Maranhão.

Sr. Presidente, quero dizer a V. Exª e aos Srs. Senadores que é contristador para mim, depois de 35 anos de exercício de mandato representando o Maranhão, sem jamais ter trazido qualquer nota contra qualquer Governador, chegar aqui e dizer: Sr. Presidente, Srs. Senadores, o Maranhão está enfermo. Está enfermo de democracia.

O Sr. Belo Parga (PFL-MA) - O Maranhão não está enfermo de democracia, V. Exª é que está enfermo de pesquisa eleitoral.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA (PPB-MA) - Então, está enfermo porque é à base do quero, posso e mando.

Sr. Presidente, só a certeza de impunidade, repito, faria um Governo fazer um pagamento de mais de R$33 milhões por uma obra que não existe. E é por isso que os Deputados do Maranhão, com o intuito de apresentarem denúncia de tudo o que foi feito à Procuradoria-Geral da União, vieram aqui hoje. Mas nós também esperamos que a grande imprensa, a imprensa do Brasil, discuta, examine e socorra o Estado do Maranhão, porque da maneira como estamos é muito difícil se falar em democracia.

Peço que esse documento conste dos Anais do Senado, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/06/1998 - Página 10477