Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE INSTALAÇÃO DO CONSELHO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, PREVISTO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E CRIADO PELA LEI 8.389/91, COMO FORMA DE RESPONDER AOS ANSEIOS DA SOCIEDADE QUE REIVINDICA ALGUM CONTROLE SOBRE A QUALIDADE DA PROGRAMAÇÃO DAS EMISSORAS DE TELEVISÃO.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO.:
  • NECESSIDADE DE INSTALAÇÃO DO CONSELHO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, PREVISTO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E CRIADO PELA LEI 8.389/91, COMO FORMA DE RESPONDER AOS ANSEIOS DA SOCIEDADE QUE REIVINDICA ALGUM CONTROLE SOBRE A QUALIDADE DA PROGRAMAÇÃO DAS EMISSORAS DE TELEVISÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 02/07/1998 - Página 11902
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • IMPORTANCIA, TELEVISÃO, INFLUENCIA, POPULAÇÃO, CRITICA, INFERIORIDADE, QUALIDADE, CULTURA, MORAL, PROGRAMAÇÃO.
  • NECESSIDADE, CONTROLE, PROGRAMA, TELEVISÃO, AMBITO, LEGISLAÇÃO, DEBATE, OPOSIÇÃO, CENSURA, INEFICACIA, CODIGO DE ETICA, ASSOCIAÇÃO NACIONAL, EMISSORA.
  • DEFESA, FUNCIONAMENTO, CONSELHO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, NECESSIDADE, AGILIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, ELEIÇÃO, MEMBROS.

           O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, todos reconhecemos a importância da televisão na sociedade contemporânea. Sua influência se manifesta não só como agente formadora de opinião, mas também como modeladora de costumes e comportamento. Sua relevância se destaca particularmente no Brasil, cuja população se compõe, em parte considerável, de analfabetos e semi-analfabetos, com possibilidade restrita de ter acesso a outros meios de informação e transmissão de conhecimentos. Acresce a isso o fato de não dispormos de um sistema público de ensino eficiente, além de estarmos diante de um ritmo acelerado de exclusão social. Para se ter uma idéia, pesquisa recentemente divulgada pela imprensa revelou que mais de 60% dos brasileiros encontram na televisão a única fonte habitual de informação.

           Nesse contexto, cabe-nos indagar: Estarão os programas contribuindo para o crescimento humano e elevação cultural da sociedade? Infelizmente, Sr. Presidente, a resposta é negativa. Existem programas de nítido teor edificante, mas é cada vez mais freqüente a exibição de cenas degradantes de violência, de casos de anomalias físicas, de comportamento sexual anômalo e de humorismo de baixo nível. E o que é Pior: essas imagens são exibidas em horários impróprios para crianças e adolescentes, submetendo telespectadores indefesos à degradação moral e levando, por conseguinte, ao rebaixamento da dignidade humana e ao enfraquecimento dos valores éticos.

           Diante dessa realidade, não é de estranhar a insatisfação que vem se instalando na sociedade brasileira com a programação de nossas emissoras. Chegam ao Ministério da Justiça mais de 100 cartas por semana de cidadãos insatisfeitos com a televisão. Em entrevista encomendada pelo Ministério da Justiça e patrocinada pela Unesco, 75% dos brasileiros manifestaram o desejo de que houvesse algum tipo de controle sobre o que vai ao ar. Entre esses, 64% defenderam a classificação por faixa etária e horário, e mais de um terço, 32%, pediu a volta de alguma forma de censura. Deve-se notar que a pesquisa foi feita entre maio e julho do ano passado e de lá para cá a situação em nada melhorou; ao contrário, só vem piorando.

           No final do mês passado, o Governo divulgou a intenção de incluir na Lei Geral de Comunicação Eletrônica, que vai regular os setores de rádio e televisão, artigos que estabeleçam parâmetros para garantir a qualidade da programação e a classificação etária para exibição de programas, inclusive prevendo sanções para as emissoras que não obedecerem às novas normas.

           O anúncio dessa iniciativa já começou a provocar polêmica. Muitos profissionais de televisão estão entendendo que qualquer tipo de controle pode descambar para a reinstalação da censura prévia, que tantos estragos nos causou com seus preconceitos e arbítrios. Além do mais, a Constituição Federal é clara em seu artigo 5o, inciso IX, ao estabelecer que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.

           Por outro lado, não podemos ficar passivos diante de uma situação contra a qual a sociedade já manifestou seu desagrado e insatisfação. As emissoras estão agindo como se liberdade de expressão fosse dizer e exibir tudo. Trazer o esdrúxulo e o bizarro para as telas virou uma competição sórdida para ganhar pontos no IBOPE e garantir o sucesso comercial dos produtos anunciados.

           Ora, caros Senadores, a nossa televisão, em plena tarde de domingo, está realmente virando um circo dos horrores, numa época em que os próprios circos progrediram e não exibem mais atrações grotescas. Não me venham dizer que o ibope aumenta porque o brasileiro gosta de ver tais cenas.

           Há uma explicação científica para a atração humana pelo bizarro. Assim a define o neurocirurgião Roth Vargas, professor da Universidade de Campinas:

           “Todas as imagens comuns estão registradas pela memória. Quando a pessoa vê algo incomum, um anão, por exemplo, a informação é recebida pelo tálamo, uma espécie de porta de entrada do cérebro que registra que a informação é diferente do habitual, e isso faz com que a pessoa continue olhando. É o mecanismo da curiosidade.”

           O que é mais preocupante, Sr. Presidente, é a exposição de tais cenas a nossas crianças e adolescentes. Pesquisa divulgada no início da década pela USP revela que a criança brasileira assiste, em média, a cinco horas e meia de tevê por dia. São centenas de minutos passados diante de mensagens as mais desconexas, num frenesi inesgotável de estímulos os mais diversos. Para complicar a situação, o IBOPE revelou que a maior concentração de audiência infantil ocorre durante o horário nobre, entre 20 e 22 horas, quando 94% das crianças dos centros urbanos estão postadas diante da tela. Pior ainda: 13% delas ultrapassam a faixa do horário nobre e entram pela noite adentro assistindo a programas destinados a adultos.

           A situação toda é muito complexa, bem o sabemos. Mas é extremamente louvável que as discussões sobre os limites entre a liberdade de expressão e o respeito aos direitos e valores do público receptor tenham se avivado, num momento em que a programação das emissoras está tendendo para abusos e excessos e atingindo maciçamente a população mais jovem.

           É louvável, também, a iniciativa do Governo de criar parâmetros para o controle de qualidade da programação e instituir sanções para quem desrespeitá-las. A propósito, devemos ressaltar que o código de ética da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, ABERT, que foi criado pelas próprias emissoras para coibir os abusos, não tem funcionado como deveria. Ninguém fiscaliza e ninguém é punido. Quando três em cada quatro brasileiros reivindicam algum tipo de controle na televisão, é porque o sinal de alerta se acendeu.

           Sintonizado com os anseios da sociedade, o Congresso Nacional não pode ficar à margem das discussões e presenciar a polêmica como mero espectador externo. Aliás, nesse particular, a Constituição Federal foi previdente: estabeleceu, no artigo 224, que o Congresso Nacional deveria instituir, como órgão auxiliar para tratar das questões dispostas no Capítulo V, Título VIII, o Conselho de Comunicação Social. Pois bem, Sr. Presidente, tal Conselho já foi instituído, pela Lei número 8.389, de 30 de dezembro de 1991. Em suas atribuições, consta a realização de estudos, pareceres, recomendações sobre liberdade de expressão e informação, produção e programação das emissoras de rádio e televisão, bem como defesa da pessoa e da família contra programas de rádio e televisão que contrariem o disposto na Constituição.

           Portanto, eminentes Colegas, o necessário fórum de discussão e de atuação já está criado. Temo-lo ao alcance de nossa mão. O que é preciso é pô-lo em funcionamento. Há até determinação expressa na Lei 8.389 de que os membros do Conselho deveriam ser eleitos em sessão conjunta do Congresso Nacional em até sessenta dias após publicada a referida Lei. Passaram-se não apenas os sessenta dias, mas mais de 6 anos, sem que o Conselho tenha sido instalado.

           O Congresso Nacional, sempre tão sensível às demandas da sociedade brasileira, deve dar, sem demora, a esperada resposta a mais esse anseio de nossa população, que também é o nosso anseio. Nossas emissoras de televisão, que já alcançaram um admirável nível técnico e organizacional, devem se voltar urgentemente para a qualidade de suas programações, para que possam cumprir, enquanto concessionárias de um serviço público, a determinação constitucional de dar preferência em seus programas a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas.

           Era o que eu tinha a dizer.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/07/1998 - Página 11902