Discurso no Senado Federal

PAPEL HISTORICO DESEMPENHADO PELA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL NA RESTAURAÇÃO DO ESTADO DE DIREITO.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • PAPEL HISTORICO DESEMPENHADO PELA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL NA RESTAURAÇÃO DO ESTADO DE DIREITO.
Aparteantes
Edison Lobão, Francisco Benjamim.
Publicação
Publicação no DSF de 01/07/1998 - Página 11472
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), HISTORIA, BRASIL, DEFESA, ESTADO DE DIREITO.
  • REGISTRO, COLABORAÇÃO, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), ALTERAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), REGULAMENTAÇÃO, CONSELHO, PROFISSÃO, MELHORIA, LEGISLAÇÃO, PAIS.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, OFICIO, PRESIDENTE, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB).

       O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, geralmente o tempo consegue esmaecer algumas atuações que marcaram época na vida deste País. Refiro-me à atuação da Ordem dos Advogados do Brasil.

       Quando a repressão em nosso País é aguda, quando os governos ditatoriais se instalam, a OAB cresce. Ela tem a capacidade de demonstrar ao País, com independência e altivez, um caminho que nenhuma outra entidade civil consegue percorrer, geralmente, quando esta luta é em função do retorno ao Estado de Direito.

       Lembro-me, jovem ainda, Conselheiro, primeiro na minha terra, da Ordem dos Advogados do Brasil, depois, Conselheiro Federal, já no plano nacional, do que Sobral Pinto relatava para nós, dizendo que, com a queda da ditadura de 45, chamado a assumir o poder o Ministro do Supremo Tribunal Federal pelo seu Presidente, Ministro José Linhares, portanto, retornando ao Estado de Direito, somente uma instituição fora convidada para a posse: a Ordem dos Advogados do Brasil. E Sobral Pinto fazia um relato para todos nós, mais jovens, do que tinha sido a luta em plena ditadura, sobretudo quando Luiz Carlos Prestes havia sido preso e nenhum advogado quis patrocinar a sua defesa - advogado no sentido comercial. Quando a Ordem dos Advogados, pela sua Presidência, indicou um defensor, esse defensor foi exatamente o maior anticomunista do País, Heráclito Fontoura Sobral Pinto, que defendeu Luiz Carlos Prestes e com ele fez amizade até o final dos seus dias.

       Mais tarde, Sr. Presidente, quando os atos institucionais começaram a ser implantados neste País, foi a Ordem dos Advogados do Brasil que primeiro começou a fazer a campanha pela volta do habeas corpus, pela caminhada novamente, mais esta vez, no sentido de sepultar todos os entulhos autoritários que havia até então. Aqui cabe relembrar a caminhada do então Ministro Petrônio Portella, procurando a Ordem dos Advogados do Brasil para o retorno ao Estado de Direito, a volta do habeas corpus, o respeito às autoridades judiciárias. E ali se deu a primeira caminhada para a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte.

       Quem passou pela Presidência da Ordem, Sr. Presidente - e não conheço cargo que mais possa dignificar um advogado do que ser Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - sabe o que tem sido essa luta, esse trabalho. Todos os que passaram pela Presidência da Ordem dos Advogados do Brasil, pelo seu estatuto, se transformam em membros honorários vitalícios. E, nessa qualidade, acabo de receber expediente do seu atual Presidente, o advogado militante Dr. Reginaldo Oscar de Castro, que, na sua Presidência, tem conseguido ser altivo, sem ser arrogante; que tem caminhado com os seus colegas dentro de uma linha de atuação que só engrandece a OAB, sobretudo quando estamos no Estado de Direito, desprezado aquilo que eu dizia da repressão aguda e essa entidade não aparece.

       Quando a democracia funciona plenamente, a Ordem se recolhe aos seus quadros para lutar em função dos seus membros, sem se descurar daquilo que eu chamava, ainda há pouco, de plenitude do Estado de Direito.

       Todos sabemos, Sr. Presidente, que recentemente houve uma medida provisória que sucedeu duas outras anteriores. Refiro-me à Medida Provisória nº 1.651-43, que sucedeu às Medidas Provisórias nºs 1.549 e 1.642. Do que cuidavam essas medidas? Cuidavam dos Conselhos de Fiscalização de Profissões Regulamentadas, transformando-os de autarquias em entidades com personalidade jurídica de direito privado.

       Ora, todos sabíamos que ali havia um grave erro de inconstitucionalidade e tínhamos a certeza de que a Ordem dos Advogados do Brasil não ficaria silente, nem eqüidistante, nem indiferente. Tanto assim, Sr. Presidente, que, neste expediente a mim dirigido, o seu Presidente diz, com absoluta propriedade, falando em nome da sua diretoria e do seu pessoal, que havia a criação de uma imunidade tributária para as mencionadas entidades -aqueles Conselhos de Fiscalização -, submetendo-as à jurisdição da Justiça Federal apenas - e aqui está toda a chamada controvérsia - na apreciação das controvérsias que tenham por objeto o exercício dos serviços a ela delegados. Pretendia-se remeter para a Justiça Comum a jurisdição do Conselho Federal da OAB, sem saber do grande equívoco que estavam cometendo.

       O expediente mostra, Sr. Presidente, que, apesar de a diretoria de todo o Conselho Federal não entender que aquela instituição pudesse ser atingida, ainda assim, o trabalho foi feito em silêncio, sem alarde, e hoje, neste ofício, diz o Dr. Reginaldo Oscar de Castro:

       “Visando extinguir qualquer ameaça à altivez e firmeza das nossas ações cívicas, o Conselho Federal atuou junto ao Congresso Nacional para excluir a OAB da regulamentação aplicável aos demais conselhos, o que se tornou possível com o acréscimo, pelo relator, do § 9º ao art. 58 da MP com o seguinte texto:

       ‘§ 9º. O disposto neste artigo não se aplica à entidade de que trata a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994.’”

       Essa entidade é exatamente, Sr. Presidente, a Ordem dos Advogados do Brasil.

       Continua o expediente:

       “Desnecessário dizer o quanto a Diretoria do Conselho Federal teve de se empenhar, através de incontáveis tratativas, para que se atingisse o resultado colimado, esforço afinal recompensado com a publicação, no Diário Oficial de hoje, da Lei nº 9.649, de 27 de maio de 1998, em que foi convertida a Medida Provisória nº 1651-43, em face da sanção presidencial.

       Ao dar ciência do assunto a V. Exª, quero deixar registrado que tal vitória da Ordem dos Advogados do Brasil se alicerça na credibilidade da Instituição, conquistada, ao longo do tempo, pela incansável luta desenvolvida por todos que, como V. Exª, contribuíram e ainda contribuem para o fortalecimento de nossos ideais.”

       O que me leva a fazer esse registro, além daquela preluzão histórica sobre a qual, ainda há pouco, dava conhecimento ao Plenário, é o intuito de mostrar como é possível uma entidade, trabalhando com o Congresso Nacional e trazendo para esta Casa seus pontos de vista, fazer com que não haja nem vitoriosos, nem perdedores. Nesse caso, o Governo não sofreu nenhuma sanção, e a lei não foi arranhada. A OAB presta mais um serviço à coletividade e desenvolve, por meio dessas tratativas, aquilo que deveria sempre ser observado por quem cuida de assuntos desta natureza: o diálogo. Sr. Presidente, por falta do diálogo, ao se editar o Ato Institucional nº 05, cometeu-se um estupro no campo do Direito Constitucional, ao se dizer que nenhuma apreciação judiciária seria levada a efeito, desde que os atos tivessem sido tomados com base naqueles atos de exceção.

       Veja V. Exª que se retirava do Poder Judiciário, que é o cumpridor da legislação, um poder inerente a qualquer ordem constitucional: o de reparar ou apreciar qualquer lesão que seja submetida ao seu conhecimento.

       O Sr. Francisco Benjamin (PFL-BA) - Permite-me V. Exª um aparte?

       O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Com muito prazer, concedo o aparte a V. Exª.

       O Sr. Francisco Benjamin (PFL-BA) - Eminente Senador Bernardo Cabral, quero associar-me à manifestação de V. Exª sobre o papel da Ordem dos Advogados do Brasil. Relembro que, logo que V. Exª assumiu a Presidência da Ordem, a primeira atitude que tomou foi visitar a Câmara dos Deputados, juntamente com o eminente brasileiro Sobral Pinto. Lembro-me bem da nossa reunião de trabalho, em que V. Exª começou a abrir esse diálogo a que acaba de se referir. A Ordem vem sendo estimulada permanentemente pela sociedade brasileira. V. Exª é, sem favor algum, um dos maiores expoentes da Ordem dos Advogados do Brasil; não digo que V. Exª é o maior expoente, porque Sobral Pinto realmente é, para todos nós, o grande advogado do País. Quero congratular-me com V. Exª, pois sei que o seu perfil é o de construir sempre, amena e suavemente, as grandes causas do Parlamento brasileiro.

       O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Senador Francisco Benjamin, sei que as palavras de V. Exª são ditadas pelo coração, pelo nosso convívio e por nossa amizade de longo tempo. V. Exª é um brilhante advogado e ex-Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados. Foi meu Colega na Assembléia Nacional Constituinte. Não seria outro senão o penhor da minha gratidão às palavras ditadas pelo coração.

       Sr. Presidente, até parece que Agrippino Grieco tinha razão. Infelizes dos homens que não exercitam a maçonaria dos elogios cruzados! Ainda bem que o Senador Francisco Benjamin e eu pudemos traçar e trocar, nesse campo da amizade, um e outro depoimento ao invés de insultos, que nada constroem.

       Sr. Presidente, volto ao tema, primeiramente para fazer um requerimento a V. Exª. Sei que V. Exª, na forma regimental, deferirá a transcrição, por inteiro, do Ofício nº 020/98, de 28 de maio, do eminente Presidente Reginaldo Oscar de Castro, a mim dirigido.

       Em segundo lugar, peço que V. Exª dê conhecimento à Presidência da Ordem dos Advogados do Brasil deste meu modesto pronunciamento, quanto mais não seja para que ele possa servir de estímulo a advogados novos, que estão construindo um novo Brasil e que talvez, amanhã, sintam que essa é a mais bela das profissões. Não quero dizer que a Engenharia, a Medicina e a Odontologia não tenham recursos de beleza, mas só a Advocacia permite penetrar no sacrário inexplorado da alma humana. Tantas vezes o cliente faz confissões, sobretudo na área de Direito de Família, que não faz nem ao sacerdote, nem ao seu mais íntimo amigo, mas as faz ao advogado.

       Por isso, Sr. Presidente, fazendo este registro, com os agradecimentos pela interferência sempre oportuna e amiga do Senador Francisco Benjamin, concluo o meu pronunciamento, expressando, mais uma vez, a minha esperança de que, no Brasil, possa haver advogados que defendam os seus interesses e patrocinem os seus direitos, como sempre realizou o eminente Professor Heráclito Fontoura Sobral Pinto.

       O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - V. Exª me permite um aparte?

       O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Concedo o aparte a V. Exª, com muito prazer.

       O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - A exemplo do Senador Francisco Benjamin, também quero associar-me à sua manifestação, dizendo que os advogados deste País e o Direito têm tido em V. Exª um defensor permanente, um vigilante. V. Exª é uma espécie de ganso do Capitólio, que aqui está sempre a cantar suas excelências, que, de fato, existem, e a defender o Poder Judiciário. Ai do mundo não fosse o Poder Judiciário e não fossem os advogados! Meus cumprimentos a V. Exª.

       O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Agradeço a V. Exª.

       O eminente Senador Edison Lobão me faz lembrar a história de Napoleão, que, quando os advogados estavam a defender seus clientes contra a virulência napoleônica, dizia que, se pudesse, arrancaria a língua de todos os advogados. Ele mal poderia imaginar que, não fosse o seu Código Civil, não teria entrado para a História da forma como entrou, ao invés daquele degredo, daquela solidão ao final da sua vida.

       Por tudo isso, Sr. Presidente, ao pedir a V. Exª, de forma reiterada, que dê conhecimento do meu pronunciamento, encerro-o consciente de que, sem o advogado, a vida fica muito mais difícil, porque, dessa forma, não há quem defenda o direito à vida. Se há algo que dignifique a vida, esse algo é a liberdade, e esta só o advogado consegue dar ao seu cliente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/07/1998 - Página 11472