Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE PROMOVER UMA REFORMA TRIBUTARIA QUE ESTABELEÇA UM PADRÃO JUSTO E DESCENTRALIZADO NA DISTRIBUIÇÃO DA RENDA NACIONAL E DEFINA UMA ESTRUTURA ORÇAMENTARIA QUE GARANTA UM TRATAMENTO MENOS ISONOMO PARA OS DIVERSOS PORTES DAS CIDADES BRASILEIRAS.

Autor
Odacir Soares (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • NECESSIDADE DE PROMOVER UMA REFORMA TRIBUTARIA QUE ESTABELEÇA UM PADRÃO JUSTO E DESCENTRALIZADO NA DISTRIBUIÇÃO DA RENDA NACIONAL E DEFINA UMA ESTRUTURA ORÇAMENTARIA QUE GARANTA UM TRATAMENTO MENOS ISONOMO PARA OS DIVERSOS PORTES DAS CIDADES BRASILEIRAS.
Publicação
Publicação no DSF de 12/08/1998 - Página 12803
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • DEFESA, DESCENTRALIZAÇÃO, POLITICA ORÇAMENTARIA, FINANÇAS, BRASIL, REGISTRO, AUMENTO, PROPORCIONALIDADE, RECURSOS, DESTINAÇÃO, MUNICIPIOS.
  • OCORRENCIA, INJUSTIÇA, DISTRIBUIÇÃO, RECURSOS, RELAÇÃO, DIMENSÃO, CIDADE, PREJUIZO, MUNICIPIO, INFERIORIDADE, NUMERO, HABITANTE, PRIVILEGIO, MUNICIPIOS, FAIXA, POPULAÇÃO.
  • EXPECTATIVA, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PROMOÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA.

           O SR. ODACIR SOARES (PTB-RO. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é de hoje que venho, com veemência, clamar por uma ordem financeira mais justa, cuja estrutura contemple melhor distribuição de recursos para os Municípios brasileiros. Tampouco tenho sido voz isolada nesta Casa na reivindicação de uma política orçamentária mais descentralizada na condução das finanças do País. Sem dúvida, a própria Constituição de 88 estabeleceu normas e princípios nitidamente descentralizadores no que diz respeito à administração das finanças públicas de nosso País.

           E, verdade seja dita, desde a promulgação de nossa Carta Magna, os Municípios brasileiros têm sido contemplados com fatias gradualmente mais espessas da renda nacional. Como prova disso, as três modalidades que compõem as receitas municipais receita tributária, receita de transferência e “outras receitas” assinalaram crescimento expressivo nos últimos anos. As estatísticas indicam que tanto a receita total dos Municípios quanto a rubrica “receita de transferência” mais que dobraram seus valores desde a promulgação da Carta Magna até o ano de 1995. Mais do que isso, segundo levantamento feito pelo IBAM (Núcleo de Articulação Político-Institucional do Banco de Dados Municipais), a receita tributária municipal acusou extraordinária taxa de crescimento, cravando elevação da ordem de 321,37% de 89 a 95, o que acabou por eqüivaler ao dobro da receita total registrada em igual período.

           A euforia proporcionada pelos números absolutos é legítima e deve ser destacada, porém a leitura minuciosa e qualitativamente avaliada dos mesmos números merece melhor apreciação. Assim, se procedermos a uma interpretação menos superficial dos dados fornecidos pelas estatísticas, descobriremos que os Municípios não apresentam um suposto e desejável perfil uniforme que as percentagens médias levam a crer. De fato, no que concerne à real apropriação dos recursos conforme o porte das cidades, verificaremos que existem diferenças bem acentuadas entre as diversas e discrepantes dimensões demográficas espalhadas pelo Brasil afora.

           Senhor Presidente, para ser mais preciso, estudos recentes do mesmo IBAM demonstram que as cidades de pequeno porte ou seja, aquelas com registro de população abaixo de 20 mil habitantes compõem o grupo das que, proporcionalmente, menos se apropriaram do aumento da receita total, ostentando taxa de crescimento abaixo da média do conjunto. Com um quadro muito parecido, os Municípios situados na faixa populacional entre 100 e 200 mil habitantes também apontaram uma expansão das receitas num patamar aquém da média verificada. Do mesmo modo, o desempenho da receita total das cidades com mais de 5 milhões também se situou abaixo da média geral.

           Em compensação, despontando como grande beneficiário do aumento da receita total do País, o conjunto das cidades brasileiras com conglomerados populacionais entre 1 milhão e 5 milhões de pessoas demonstrou, comparativamente, melhor capacidade administrativa para captar tal modalidade de recursos. Curiosamente, quando investigamos os dados referentes à receita tributária, uma nova evolução distributiva se afigura como tendência irreversível, pois as maiores taxas de crescimento se voltam agora para os Municípios com menos de 500 mil habitantes. Mais ainda, os dados indicam que quanto mais densa a população, menor o poder de o Município expandir o recolhimento de tributos.

           Em outras palavras, a menor expansão comparativa dentro dessa categoria de receita recaiu sobre as cidades brasileiras que abrigam progressivamente populações com mais de 1 milhão de habitantes. Isso se justifica na medida em que, para as cidades densamente ocupadas, torna-se mais difícil multiplicar sua arrecadação diante de uma máquina arrecadadora mais complexa e eficiente.

           Pois bem, no que tange às receitas de transferências, cumpre registrar que os Municípios mais afetados com a “inibida” expansão dos recursos se concentram na faixa dos menos de 500 mil habitantes. Isso se deve, naturalmente, às distorções a que se tem sujeitado o famigerado Fundo de Participação dos Municípios (FPM), de cuja movimentação as cidades de menor porte dramaticamente dependem para fins de sobrevivência. Na mesma linha, o quadro das grandes metrópoles brasileiras, como são os casos de São Paulo e Rio de Janeiro, não se distingue muito se comparado com as de menor porte. No entanto, em contraste com os pequenos Municípios, Rio e São Paulo adicionam ao problema da insuficiência dos recursos oriundos do FPM a questão do repasse do ICMS, cuja lógica draconiana de distribuição dentro dos Estados tem implicado achatamento nos valores destinados às grandes cidades.

           Por outro lado, da rubrica “outras receitas”, observaremos que são justamente as megalópoles que demonstram maior capacidade de extrair vultosos recursos. Graças sobretudo às rentáveis operações de crédito, as cidades com mais de 5 milhões de habitantes ostentam índices bem acima da média nacional. Já ao contrário dessas, as cidades de porte médio e pequeno experimentaram no geral certa retração no recolhimento de “outras receitas”. De fato, como havia antes afirmado, entre todas as receitas, essa rubrica foi classificada como a de menor desempenho evolutivo desde a promulgação da Constituição vigente.

           Ora, algumas explicações devem ser agregadas agora, de modo a esclarecer comportamentos tão variáveis e irregulares na curva de crescimento das receitas municipais. Em primeiro lugar, em certa medida já se esperava significativo avanço da participação da receita tributária municipal no cômputo da receita total, uma vez que as arrecadações do IPTU, ISS, ITBI, Taxas e Contribuição de Melhoria reuniram maior poder de intervenção e aplicação no âmbito da própria comunidade. Enquanto que, em 1989, a soma desses recursos representavam apenas 16% do montante com que contavam os Municípios brasileiros, em 1995, as mesmas fontes acusaram participação de cerca de 26% do montante geral.

           Apesar disso, vale a pena anotar que o impacto numérico das receitas tributárias sobre as finanças das pequenas cidades ainda permanece inexpressivo quando comparado com a participação dos tributos nas contas públicas das grandes cidades. Só para termos uma idéia mais concreta, traduzindo os valores em moeda dolarizada, as cidades situadas na faixa de 200 a 500 mil habitantes registraram em 1995 o total de 800 mil dólares na receita tributária, bem como o total de 5 milhões de dólares nas receitas transferidas. No mesmo ano, cidades como Rio e São Paulo contabilizaram em média a soma de 1 bilhão e meio de dólares na rubrica receita tributária, bem como a soma de 1,3 bilhão de dólares na rubrica transferências.

           Por esses dados, torna-se evidente a disparidade relacional entre as duas modalidades de receita para dois perfis demográficos tão antagônicos. Portanto, ainda que as cidades pequenas e médias tenham acentuadamente expandido o volume de recursos tributários, a participação dos mesmos no universo dos recursos disponíveis se afigura ainda muito modesto. No entanto, em contraste com esse panorama patrocinado pelas receitas tributárias, a participação relativa das transferências federais e estaduais no total dos recursos disponíveis em 95 ficou praticamente estagnada no mesmo patamar de 89, ou seja, na faixa de 55%.

           De certo, para que as receitas provindas de transferências experimentassem tal estagnação na curva geral evolutiva nos anos 90, contribuíram em muito as perversões administrativas e legais envolvendo a distribuição, por exemplo, do FPM e do ICMS. Segundo os estudos do IBAM, a redução da participação relativa das transferências nas contas públicas cariocas e paulistanas afetou consideravelmente em termos negativos a curva da média nacional.

           Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em suma, guardadas as devidas proporções, os dados investigados para o período 89-95 podem perfeitamente ser projetados para os dias de hoje, já que a legislação tributária e orçamentária pouco, ou nada, mudaram em substância. Não se pode, entretanto, julgar que, a partir desse breve exercício analítico, o quadro das receitas municipais no Brasil seja o ideal, ou mesmo o mais adequado. Pelo contrário, por mais positiva que tenha sido a perspectiva da leitura dos números, há muito o que fazer na área para corrigir desvios e distorções. O Congresso Brasileiro tem muita consciência disso e se prepara, em curto prazo, para promover os trabalhos de uma reforma tributária que não só estabeleça uma padrão mais justo e descentralizado na distribuição da renda nacional, como também defina um estrutura orçamentária que garanta um tratamento menos isonômico para os diversos portes das cidades brasileiras.

           Era o que tinha a dizer.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/08/1998 - Página 12803