Discurso no Senado Federal

REGISTRO DA VISITA DO SECRETARIO DA ONU, SR. KOFFI ANNAN, AO BRASIL. REGOZIJO PELOS ATOS CONCRETOS DE MAIOR APROXIMAÇÃO DA ONU COM A AMERICA LATINA.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • REGISTRO DA VISITA DO SECRETARIO DA ONU, SR. KOFFI ANNAN, AO BRASIL. REGOZIJO PELOS ATOS CONCRETOS DE MAIOR APROXIMAÇÃO DA ONU COM A AMERICA LATINA.
Publicação
Publicação no DSF de 12/08/1998 - Página 12806
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • REGISTRO, VISITA, SECRETARIO GERAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), PAIS, ANALISE, ORADOR, POSIÇÃO, BRASIL, AMERICA LATINA, AMBITO, POLITICA INTERNACIONAL.
  • IMPORTANCIA, ASSINATURA, BRASIL, TRATADO, OPOSIÇÃO, CONSTRUÇÃO, ARMAMENTO NUCLEAR.
  • SAUDAÇÃO, INAUGURAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), SEÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), PROVOCAÇÃO, AMPLIAÇÃO, ATUAÇÃO, ORGANISMO INTERNACIONAL, PAIS.

           O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por ocasião da recente visita que nos fez o Secretário-Geral da ONU, o ganês Koffi Annan, tivemos oportunidade de testemunhar a celebração de alguns atos que, além do efeito simbólico que costuma caracterizar os protocolos internacionais, emitem sinais de uma nova postura do Brasil e, por extensão, da América Latina, no concerto das Nações.

           O primeiro desses atos ocorreu em 13 de julho, com a assinatura, pelo Presidente Fernando Henrique, do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, o TNP. Produzido em 1968, o TNP abre o País à fiscalização internacional de suas instalações nucleares e proíbe o uso da energia nuclear para fins bélicos. Na prática, a assinatura tem pouco efeito, pois o Brasil já recebe fiscais internacionais. Mas o gesto tem enorme significado, pois enterra, definitivamente, a era em que o Brasil quis virar uma potência nuclear bélica.

           A aventura da bomba começou com o acordo nuclear firmado entre Brasil e Alemanha, em 1975, pelo então Presidente Ernesto Geisel. Por esse acordo, os dois países desenvolveriam a tecnologia para produzir o combustível nuclear - que inclui o enriquecimento do urânio - e construir no País oito novas usinas nucleares. As usinas gerariam energia elétrica, mas todos nós sabemos que, secretamente, cultivava-se a idéia de dominar o processo de enriquecimento do urânio, passo indispensável para fazer a bomba. O acordo fracassou. Das oito usinas programadas, a primeira delas, a Angra II, será inaugurada no final deste ano, duas décadas depois do previsto. Quanto à usina de enriquecimento do urânio, nunca saiu do papel. Desde o fracasso do acordo, os envolvidos no projeto bomba foram para a clandestinidade.

           Envolto nas sombras, o programa nuclear começou a ruir no Governo Sarney, com a assinatura de um acordo de paz com a Argentina. Só no Governo Collor se soube que até buracos haviam sido feitos, na Serra do Cachimbo, para testes nucleares. Agora, o Governo sepulta o dispendioso e paranóico sonho da bomba brasileira. Enfim, o delírio acabou.

           O segundo ato teve lugar no dia seguinte à assinatura do Acordo. Em 14 de julho, Koffi Annan inaugurou, em São Paulo, a seção brasileira da Associação das Nações Unidas. Além de sua atuação tradiconal, a entidade oferecerá programas de desenvolvimento tecnológico e de exportações para as pequenas e médias empresas. No mundo todo, existem 82 associações das Nações Unidas e a meta é dobrar para 164 até o fim do século. Na África do sul, seu representante é o próprio Presidente Nelson Mandela. No Reino Unido, o ex-Secretário-Geral da Eco-92, Maurice Strong. A seção brasileira será dirigida pelo empresário Mário Garnero, Presidente do grupo Brasilinvest e do Fórum das Américas, uma entidade não-governamental.

           Como se vê, Srªs e Srs. Senadores, a agenda de Annan no Brasil difere em muito da de seu antecessor, o egípcio Boutros Ghali, que veio cobrar uma dívida do Governo com a ONU. Agora, cobra-se uma maior aproximação da ONU com a América Latina, e critica-se o distanciamento da entidade. Num momento de seca do Nordeste, a FAO - a organização que atua na área de agricultura - seria extremamente importante, mas seus representantes ficam lotados em Roma. Com a inauguração da seção brasileira, espera-se, portanto, um maior envolvimento da ONU com a realidade latino-americana.

           Em aula magna proferida no Ministério das Relações Exteriores, o Secretário Koffi Annan acentuou alguns pontos que podem fornecer pistas a respeito da atual política da ONU para a América Latina e, particularmente, para o Brasil.

           Iniciando seu pronunciamento com palavras do urbanista Lúcio Costa a respeito de Brasília, Koffi Annan destacou as dimensões continentais do território brasileiro, enalteceu nossa vocação histórica para a solução pacífica e a negociação e apontou a necessidade de reverter o quadro de desigualdades sociais que compromete os destinos do País.

           Considerou que o exemplo brasileiro assume significado renovado, numa época em que acontecimentos no sul da Ásia fazem ressurgir a perspectiva de uma nova corrida armamentista nuclear. O Brasil, ao se abster de concorrer a uma vaga no clube nuclear serve “como uma luz na escuridão”, segundo suas palavras.

           Depreende-se da exposição, Senhoras e Senhores Senadores, uma preocupação em adequar o papel da Organização das Nações Unidas à nova conjuntura internacional. Com o fim da Guerra-Fria, a paz global dependerá não apenas do gerenciamento de conflitos armados, mas da obtenção do progresso econômico e social dos povos do mundo.

           Vivemos em um mundo em que a mudança precisa ser vista como condição essencial da vida e no qual a globalização traz novas realidades todos os dias. Destruição ambiental; tráfico de drogas movimentando recursos duas vezes maior que os da indústria de veículos automotores; proliferação de armas nucleares; epidemia de AIDS que expôs os trágicos hiatos entre os ricos e os pobres - esses são apenas alguns dos problemas que o mundo enfrenta no alvorecer do novo século.

           A Organização das Nações Unidas que entra no Século XXI deverá estar equipada para essa nova conjuntura internacional. E, nesse novo contexto, não será possível relegar a plano secundário um país emergente e com as potencialidades do Brasil. Da mesma forma que não se poderá desmerecer as possibilidades do continente americano como bloco econômico e cultural.

           Assim, Srªs e Srs. Senadores, a visita de Koffi Annan, a par de representar a busca imemorial da ONU para a obtenção de melhores padrões de vida e de maior liberdade, representa, sobretudo, a procura de novas parcerias para libertar a humanidade da ameaça de armas de destruição em massa, das drogas, da pobreza ou de pandemias.

           É nesse aspecto que acredito no poder criativo de nossa imensa e diversificada Nação. Nossa cultura de paz, nosso dom para a solução pacífica de disputas, nosso compromisso com o multilateralismo serão um bem inestimável na tarefa de construir uma Organização das Nações Unidas para o Século XXI.

           Muito obrigado pela atenção!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/08/1998 - Página 12806