Discurso no Senado Federal

USO DA MAQUINA DO ESTADO EM FAVOR DA REELEIÇÃO DO GOVERNADOR DO PIAUI. (COMO LIDER)

Autor
Hugo Napoleão (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Hugo Napoleão do Rego Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • USO DA MAQUINA DO ESTADO EM FAVOR DA REELEIÇÃO DO GOVERNADOR DO PIAUI. (COMO LIDER)
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares, Djalma Bessa, Edison Lobão, Elói Portela, Emília Fernandes, José Eduardo Dutra, Lucídio Portella, Marina Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 13/08/1998 - Página 12907
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • CRITICA, ABUSO, GOVERNADOR, ESTADO DO PIAUI (PI), UTILIZAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, FAVORECIMENTO, CANDIDATURA, REELEIÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, COMPROVAÇÃO, DENUNCIA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), IRREGULARIDADE, DISTRIBUIÇÃO, MERCADORIA APREENDIDA, SECRETARIA DE FAZENDA, POPULAÇÃO CARENTE, MUNICIPIOS, INTERIOR, PERIODO, CAMPANHA ELEITORAL.
  • CRITICA, GOVERNO, ESTADO DO PIAUI (PI), EXCESSO, UTILIZAÇÃO, VERBA, PROPAGANDA ELEITORAL, PROVOCAÇÃO, PREJUIZO, ATENDIMENTO, VITIMA, SECA, REGIÃO.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu não poderia deixar de assomar à tribuna na tarde hoje. Não na condição de candidato a Governador do Piauí; não na condição de candidato da coligação “Avança Piauí”, formada pelo PFL, pelo PPB e por mais cinco partidos que dão sustentação à plataforma que estou empreendendo em praças públicas, por meio de reuniões de auditório ou por onde eu ande. Também não estou aqui como porta-voz de absolutamente ninguém. Falo rigorosamente em meu nome, na condição de Senador pelo Estado do Piauí.

Quero caracterizar essa situação, a fim de demonstrar que não me move outro ânimo senão o de efetivamente chamar a atenção para fatos que estão ocorrendo no meu Estado. Talvez nem precisasse fazê-lo, porque já são do conhecimento público, já vêm sendo reproduzidos pela imprensa de todo o País. Os jornais do Rio de Janeiro, de São Paulo, do Pará, revistas, enfim, vêm dando conta do verdadeiro descalabro que tem ocorrido no meu Estado, e a cujo povo pesa uma condenação diuturnamente imposta pelo Governador do Estado.

Como se já não bastasse uma administração rigorosamente desastrada, nefasta e ruim para o povo do meu Estado, eis que se não quando, deparamo-nos com situações incríveis. Por exemplo, o jornal O Globo do último domingo ocupa toda a sua página terceira para deter-se em situações absolutamente inexplicáveis. Sendo irmão do Governador do Estado, o Secretário de Fazenda promove a apreensão de mercadorias contrabandeadas, originárias muitas delas do Paraguai. Em vez de entregá-las à Secretaria da Receita Federal, a fim de que esta, com a competência que lhe é atribuída pela legislação em vigor, promova o necessário leilão na forma da lei e canalize os recursos para o Programa do Comunidade Solidária e para objetivos consagrados nas leis do País, ao contrário, determina que a mercadoria seja colocada sobre carrocerias dos caminhões do Governo do Estado, mais especificamente até do serviço social do Estado. Esses caminhões vão pelos Municípios afora e, para deleite do Governador e de sua comitiva, S. Exª e a família distribuem o produto apreendido para a população, uma população extremamente carente, cheia de problemas estruturais e de injustiça social com que ainda convive o nosso País. Digo isso lamentando. Essa população se vê, de repente, rodeada de caixas contendo centenas de relógios, relógios de parede, rádios, aparelhos eletrodomésticos importados através de contrabando e que entram no País sem o pagamento dos respectivos impostos. Assim, a vida é bonita e tudo é muito fácil! O Governador do Piauí pode dar-se a esse luxo de fazer com que a irregularidade e a ilegalidade campeiem no meu Estado.

Pois bem, isso foi dito em letras garrafais pelo jornal O Globo. Aliás, é novamente esse jornal do Rio de Janeiro que reproduz palavras do Secretário da Receita Federal, Dr. Everardo Maciel, a respeito do assunto, considerando o fato extremamente grave, como não poderia deixar de ser. Trata-se, indiscutível e indubitavelmente, de um ilícito penal. Afinal, não é justo que, numa campanha eleitoral em que há cinco candidatos a Governador do Estado, venha o Governador a usar a máquina, como vem fazendo, em função de suas vontades, de seus ditames, do seu querer.

Como se isso tudo não fosse suficiente, o meu Estado foi assolado pelo El Niño, mais uma vez, como aconteceu em 1983 - um fenômeno de aquecimento de até 5° das águas do Pacífico Equatorial e do Atlântico, o que provoca a formação de uma massa densa que evita o despencar das águas da chuva. Com isso, os flagelados estão a necessitar de recursos para terem o mínimo com o que se sustentar, porque a fome campeia, param-se a lavoura e a produção, não se tem o que comer, nem leite que beber.

O Governo Federal instalou as frentes de serviço, coordenadas pelo superintendente da Sudene, que estão funcionando a contento - ao que eu saiba - nos Estados da Federação. Pode haver, aqui ou acolá, um erro ou um desvio, mas todos os Estados do Nordeste compreendidos na área da seca estão contribuindo rigorosamente com sua parcela de R$15,00 do total de R$80,00 correspondentes ao pagamento dessa frente.

O Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso vem acudindo a população à razão de R$65,00 por frentista e, repito, ao que eu saiba, o Piauí é o único Estado da Federação atingido pela seca cujo Governador não aplica os R$15,00 que deveria para a composição da cesta, dizendo que não tem recursos - isto está na imprensa piauiense. Não obstante essas circunstâncias, baixa o Decreto nº 9.938, de 8 de julho de 1998, publicado no Diário Oficial do Estado do Piauí, em que destina uma aplicação de R$3 milhões para a Secretaria de Comunicação Social - aliás, o decreto maneja verbas do excesso de arrecadação em até quase R$5 milhões; há outros itens atendidos, mas R$3 milhões são para a Secretaria de Comunicação Social.

Ora, Sr. Presidente, o Governador não tem dinheiro para os frentistas, que representam menos da metade desse valor, mas tem para atender, a seu deleite e prazer, as matérias de publicidade e propaganda que bem quiser ou desejar mandar publicar Deus sabe lá onde. Incoerência e má orientação administrativa.

Não importam os frentistas para o Governador do Estado do Piauí; importam, sim, os ditames da sua vontade. Aquilo que S. Exª quer é o que deve ser feito. O mais grave de tudo isso é que, agora, o próprio Secretário da Defesa Civil foi ao Município de São João do Piauí a fim de distribuir alimentos para aqueles que não são frentistas, para distribuir cestas para pessoas não cadastradas, e dentro de cada uma delas, sub-reptícia e inocentemente, coloca-se a propaganda do Governador, candidato à reeleição.

Assim, digo eu repetindo, é muito fácil. Só que ninguém fica impune dessa maneira: foi aberto inquérito, o cidadão foi indiciado, está correndo risco de prisão preventiva e a Procuradoria da República no meu Estado e os partidos políticos concorrentes estão atentos a esses fatos. É incrivelmente absurdo que o Governador venha a incentivar assuntos dessa natureza.

A Folha de S.Paulo de hoje, na página 5-A, mostra que, no Piauí, a Comissão de Defesa Civil não está dando as cestas, como deveria, às pessoas credenciadas, mas às não credenciadas, ou as está dividindo entre os dois grupos, ou seja, entre aqueles que já estão aptos, pelas normas do combate à seca, e aqueles que não o estão, tornando quase que insubsistente um valor de R$30,00 a R$40,00 para cada um. No caso do meu Estado, que não aplica os seus R$15,00 devidos, são R$ 65,00 divididos por duas pessoas, ou duas famílias.

Tudo, no Piauí, tem acontecido de maneira inteira e extremamente rudimentar e ilegal, flagrantemente contrária à legislação do País.

O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUGO NAPOLEÂO (PFL-PI) - Ouço, com prazer, o Líder em exercício do meu Partido, Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - Senador Hugo Napoleão, não sendo eu do Piauí, não posso ingressar mais profundamente no exame dessa matéria. Lembra-me o nosso Colega Francelino Pereira que não sou do Piauí, mas que S. Exª o é.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Para nosso deleite.

O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - V. Exª faz um relato que não diz respeito apenas ao Piauí, mas a um sistema político eleitoral do País inteiro. Ora, votamos, e V. Exª também, uma emenda constitucional consagrando o princípio da reeleição. Mas estávamos todos nós no pressuposto de que os Governadores de Estado, permanecendo no exercício de seus mandatos, o Presidente da República e, no futuro, os Prefeitos, teriam que agir com lisura, com lealdade na competição. Mas o que V. Exª demonstra é que, no seu Estado, não está acontecendo isso. O Governador atual, inclusive, serve-se de uma fiscalização que deve ficar, neste caso, a cargo da Receita Federal para beneficiar-se daquilo que a sua Receita Estadual apreende, no sentido de uma distribuição que acaba por favorecer o próprio Governador. Ora, diante disso, nenhum de nós, creio, pode ficar alheio a essa denúncia que V. Exª faz, não em relação ao Piauí, mas no que diz respeito até aos procedimentos nacionais. Não posso deixar de manifestar, portanto, minha total solidariedade a V. Exª, porque isto não é coisa que se faça numa competição que há de ser leal, sobretudo depois do princípio da reeleição. Temos que admitir que o Governador que continua no cargo já leva uma grande vantagem na competição em relação a seus adversários e ainda usa a máquina administrativa para procedimentos dessa natureza. É uma coisa descabida. A Governadora do meu Estado tomou a iniciativa de se licenciar até as eleições, exatamente para não ter nenhuma ingerência no poder. Ela quer competir de igual para igual.

O HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Isso é que é um exemplo!

O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - Sim, mas no Piauí percebo que o processo se dá de maneira diferente. Minha solidariedade, portanto, a V. Exª.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Conforta-me sobremaneira, Senador e Líder Edison Lobão, o que diz V. Exª. É bem verdade que isso provoca lamentavelmente uma má imagem do meu Estado perante a comunidade nacional, e eu deploro esse fato profundamente.

O Sr. Elói Portela (PPB-PI) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Ouço V. Exª com prazer, Senador Elói Portela.

O Sr. Elói Portela (PPB-PI) - Senador Hugo Napoleão, gostaria de, neste momento, solidarizar-me com V. Exª. e acrescentar que o nosso Estado, sofrido como é, sente-se humilhado com todos os atos que esse Governador vem praticando. Percebe-se isso ao auscultar o povo. Ainda hoje no almoço, discutimos a reeleição do Presidente Fernando Henrique Cardoso e falamos sobre a lisura com que se porta dentro do processo eleitoral.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - É verdade.

O Sr. Elói Portela (PPB-PI) - A lisura na eleição estava presente no espírito da emenda constitucional votada aqui no Senado. Entretanto, o Governador do Piauí, com suas exorbitâncias, tomando conta do noticiário nacional, deixa o Piauí humilhado. Eu hipoteco solidariedade a V. Exª.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Agradeço a V. Exª, Senador Elói Portela, que tem, de resto, vivido, convivido comigo, sentido e, igualmente, sofrido esse problema.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI)- Ouço com prazer V. Exª.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - Senador Hugo Napoleão, V. Exª está fazendo um relatório sobre o que vem ocorrendo no Estado do Piauí no período que antecede as eleições: o Governador do Estado, candidato à reeleição, utiliza, de forma escancarada, a máquina do governo, o poderio da caneta de que dispõe, para assegurar a sua reeleição. Sabemos que o princípio da reeleição foi aprovado, muito embora, no Senado, a Oposição tenha se posicionado contra. Respeitamos o desejo da maioria, mas o instituto que o Senado aprovou está sendo utilizado em benefício de determinadas candidaturas - como V. Exª acaba de acentuar. Logicamente, o espírito da lei é garantir igualdade entre os candidatos na disputa eleitoral, não só para Presidente da República, mas também para Governador e futuros prefeitos. Todavia, a prática tem evidenciado que esse princípio tem sido colocado de lado, tanto no Estado do Piauí como em praticamente todos os Estados onde os Governadores estão disputando a reeleição. Creio que o Governador do Estado de Sergipe até supera o Governador do Estado do Piauí - não o conheço de perto.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Felizmente.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - O Estado de Sergipe tem como candidato à reeleição o Governador Albano Franco que vem se utilizando, de forma escandalosa e escancarada, do poder de que dispõe como governador para garantir a continuidade de seu grupo político. Posso afirmar a V. Exª que a oposição em Sergipe já entrou com várias representações no Tribunal Regional Eleitoral e aguarda o resultado da apreciação dessas medidas. Não é possível que a legislação aprovada por nós permita a impunidade e assegure a existência de costumes e hábitos que já haviam sido enterrados no passado. Como exemplo podemos apontar a utilização do dinheiro da venda da companhia energética em que mais de R$400 milhões estão sendo “torrados” sem que haja um projeto de infra-estrutura para salvar a economia do Estado. Quero assegurar a V. Exª que, se no Piauí é assim, no Estado de Sergipe, e em praticamente todos os Estados brasileiros, ocorre a mesma coisa. Votei contra a reeleição, mas V. Exª votou favoravelmente e - tenho certeza - o fez de boa-fé, não acreditando que tal fato pudesse ocorrer com V. Exª; quer dizer: o feitiço virou-se contra o feiticeiro. V. Exª não votou para prejudicar a sua candidatura; votou pensando no Brasil. É triste, mas esse fato vem ocorrendo em muitos Estados do Brasil.

           O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Aliás, Senador Antonio Carlos Valadares, é função do Senado fiscalizar, acompanhar essas aberrações e trazê-las ao conhecimento da opinião pública. V. Exª diz que não conhece o Governador do meu Estado, e digo que V. Exª não perde nada por isso.

           Vou dar uma idéia da dimensão desse problema. Numa manchete de domingo do jornal O Globo, de página inteira - para ver V. Exª o deboche que o caracteriza -, diz o Governador, porque está atrasando os salários: “Salário é como menstruação, tem mês que vem no dia certo, mas tem outros em que atrasa.”

           Essas brincadeiras de mau gosto, essas situações hilariantes de um Governador que vai a um programa como o do Jô Soares e é ridicularizado nacionalmente, coloca mal o nosso Estado. Já fui Governador e sempre primei por trazer o Piauí com elevação, com grandeza, com respeitabilidade. Há outras frases terríveis como essa. É uma matéria deplorável. Até me envergonho de estar falando a respeito desse assunto. Avaliem a população do Piauí como não se sente também ofendida!

           Deparei-me, hoje, com o jornal O Liberal, de Belém do Pará, de ontem, terça-feira, em que há uma página também dedicada ao Governador do meu Estado: Polícia Federal comprova fraude no Piauí. Mais embaixo há uma outra manchete: Crime Eleitoral, e cita o seu nome. E ele sorri e acha graça dessas coisas, desde que esteja por cima.

           O povo do Piauí é que vai dizer quem deve ser eleito.

           O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Senador Hugo Napoleão, V. Exª me concede um aparte?

           O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Concedo com prazer o aparte ao Senador José Eduardo Dutra.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE) - Senador Hugo Napoleão, V. Exª é o Líder do maior partido nesta Casa, o maior partido também na Câmara dos Deputados, e sobe à tribuna para fazer esse pronunciamento a respeito do uso da máquina. Nós, da Oposição, quando da discussão da emenda da reeleição, posicionamo-nos contra e alertamos sobre uma série de problemas que poderiam vir a ocorrer. Infelizmente, a impressão que fica é que os partidos da base governista aprovaram a reeleição pensando apenas na reeleição do Presidente da República na qual, embora possa haver uso da máquina, pelo menos há a imprensa e a sociedade civil acompanhando o processo. Já alertávamos para esse problema naquele momento: no caso do Presidente da República, embora a máquina venha a ser utilizada, existem instrumentos mais eficazes de controle; em alguns Estados, particularmente no Nordeste, surgiriam problemas que agora estão se confirmando. Penso que o pronunciamento de V. Exª é importante - e até pedagógico - para que o Congresso Nacional, a partir do ano que vem, venha a se debruçar sobre esse problema. Daqui a dois anos, teremos eleições para prefeito em milhares de Municípios do nosso País, muitos deles em situação de falta de pressão da sociedade, mais grave até do que uma situação como a do Estado do Piauí. Na minha opinião, se não nos debruçarmos sobre a questão da reeleição, particularmente em relação à reeleição nos Municípios corremos o risco - e vou aqui evocar palavras do Senador Esperidião Amin quando da discussão da emenda da reeleição - de uma feudalização da política de nosso País. Tomo o pronunciamento de V. Exª como um alerta para o Congresso Nacional. Se for mantido o instituto da reeleição sem desincompatibilização, como é hoje, teremos de encontrar mecanismos mais eficazes de evitar que ocorram fatos como esse que V. Exª vem relatando. Semana passada fiz um pronunciamento sobre a situação de Sergipe, mas creio que fatos semelhantes estão acontecendo em vários Estados. Muito obrigado.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Agradeço V. Exª. Foi extremamente didática e oportuna a intervenção que acaba de fazer.

Trata-se de um caso sobre o qual, realmente, precisamos pensar. Votamos a reeleição imbuídos da boa-fé dos homens públicos deste País; todavia, nos vemos hoje a braços com algumas situações extremamente delicadas, como a que estou narrando.

O Sr. Djalma Bessa (PFL-BA) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Concederei, com muito prazer, o aparte ao Senador Djalma Bessa, não sem antes ler - deplorando que o faça - a seguinte frase do Governador transcrita no jornal O Globo desta data. Ele criou um SPA Santo:

     “As gordinhas vão lá, ficam dez dias e voltam bonitinhas. Elas foram me ver esses dias, felizes da vida. Me adoram! Só rico pode fazer regime? Vou mandar o médico lá no Jô Soares. O Spa Santo vai fazer sucesso - prevê Mão Santa.”

            É algo lamentável. Fico profundamente entristecido por ter de comentar, da tribuna desta Casa, uma afirmação como essa.

Concedo o aparte ao Senador Djalma Bessa.

O Sr. Djalma Bessa (PFL-BA) - V. Exª, meu Líder, está relatando fatos publicados na imprensa nacional, independente de interesses partidários, com o objetivo de transmitir à Nação o desacerto que está havendo no seu Estado. Tem-se inicialmente a impressão de que o Governador do Piauí sente-se como se fosse o proprietário do Estado - e um mau proprietário -, uma espécie de Luís XIV tupiniquim. V. Exª tranqüilize-se; o País não haverá de ficar chocado com o Estado do Piauí, está chocado com o Governador do Estado do Piauí, que passa, que há de passar. Não é possível que diante de tantos desmantelos, tantos desacertos, tanto deboche, o eleitorado não se corrija e procure votar em um governador à altura da cultura do Estado.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Oxalá!

O Sr. Djalma Bessa (PFL-BA) - V. Exª situou muito bem a questão. Aí estão cometidos três ilícitos flagrantes. O ilícito fiscal do aparecimento dessa mercadoria contrabandeada sem qualquer nota, fato que seria até menor diante de coisas mais graves; depois, a apropriação dessas mercadorias. Veja bem V. Exª: em uma situação civil, teríamos apropriação indébita, havendo um receptador que paga um preço - pequeno, irrisório, é verdade, mas paga. No caso, isso não ocorre, é de graça. Tudo está ilegal. Pois bem, além desse ilícito, há o eleitoral. A Justiça Eleitoral existe para julgar casos como esse. Não é possível que, em se tratando de um problema tão grave e público, a Justiça Eleitoral não adote a providência. Isso sem falar ainda na Justiça comum, pois trata-se de um ilícito penal. E esses crimes são de ação pública, ou seja, não é preciso que alguém o denuncie, porque é dever da autoridade determinar que se proceda à apuração dos fatos para a interposição da ação. Ademais, não é propriamente a reeleição que está provocando isso. É verdade que não temos uma cultura eleitoral, e é certo que devem ser aproveitadas essas dificuldades para a elaboração de uma legislação melhor, que evite essas dificuldades, como bem sugeriu o Senador Dutra. Penso que isso é essencial. Mas uma coisa não está associada a outra. Não é apenas o princípio da reeleição que proporciona isso. Sem ela, às vezes, há problemas de toda sorte praticados por governantes e dirigentes. V. Exª está citando fatos graves, e nós havemos de acreditar em nossa Justiça para que esta os apure em benefício da lei, da ordem e da ética. V. Exª há de ser julgado - e bem julgado - pelo seu povo não só pelo seu trabalho no Senado, mas também pelas atividades que desenvolveu na Câmara dos Deputados e no Governo do seu Estado. V. Exª tem a nossa solidariedade por defender uma causa justa. Nesta sua denúncia, está ainda uma preocupação de colocar bem o seu Estado.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Muito obrigado a V. Exª, Senador Djalma Bessa, que, como bom advogado e permanente estudioso do Direito, bem sabe e bem conhece as motivações que levam a caracterizar essas situações como efetivamente de crimes contra a Fazenda, contra o Erário e crimes da Justiça Comum.

A Srª Emilia Fernandes (Bloco/PDT-RS) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Ouço com prazer a Senadora Emilia Fernandes.

A Srª Emilia Fernandes (Bloco/PDT-RS) - Peço um aparte diante do pronunciamento de V. Exª e das demais considerações que foram feitas por outros colegas Senadores, para, em primeiro lugar, lamentar profundamente que o Partido de V. Exª, com o potencial que tem, com número expressivo de Parlamentares que possui nesta Casa e na Câmara, à época da votação da reeleição, não tenha conseguido captar os nossos sentimentos, a nossa preocupação quando alertávamos que o processo da reeleição, dentro do período de mandato, traria conseqüências gravíssimas como a que V. Exª está denunciando, ao mesmo tempo em que alerta o povo brasileiro - não apenas o do seu Estado, mas o de todo o País. Deveríamos ter aprofundado a discussão e analisado que a urgência urgentíssima, como foi encaminhada a questão da reeleição, traria conseqüências dessa natureza. Quero alertar para duas questões que são fundamentais - entendo - diante de tudo o que V. Exª disse e do que já foi aqui amplamente complementado. Em primeiro lugar, chamávamos atenção para a importância da desincompatibilização. Quero dizer, Senador Hugo Napoleão, que, diante do que foi exposto, teremos de rever talvez, após as eleições, essa lei. Tenho experiência no Estado do Rio Grande do Sul, onde o atual Governador se licenciou e, portanto, lá a situação estaria talvez diferente da de outros Estados; diferente, inclusive, do Estado V. Exª. Não chegamos a tanto como V. Ex.ª expôs - é o que os meios de comunicação estão dizendo. No entanto, observamos o uso da máquina pública, o uso do poder econômico em torno de um candidato que continua sendo Governador, que está licenciado, mas que preparou previamente apenas a máquina administrativa, deixando alguém administrando em seu lugar, inclusive impedindo uma possível candidatura do atual Vice-Governador, hoje exercendo o cargo de Governador. Portanto, a pura e simples desincompatibilização - esse é o testemunho que quero dar a V. Exª - não é suficiente. Temos de trabalhar com algo mais. Se alguém pretende ser candidato à reeleição, que passe o mandato a outrem, porque os problemas são muito semelhantes. Quero manifestar o meu repúdio à forma agressiva - vamos discutir esta questão oportunamente - discriminatória e desrespeitosa relativa ao processo eleitoral, como está sendo veiculada pelos meios de comunicação. Acredito que há também outros termos que a mídia não tem mostrado, porque esse Governador, por incompetência, não consegue sequer pagar em dia os salários. E o mínimo que se espera é a manutenção da dignidade do salário para o professor, para o funcionário público. Quanto ao fato de S. Exª comparar os atrasos do pagamento dos salários com a menstruação, ofende e agride as mulheres do País e tenho certeza que seu Estado lhe dará a resposta que merece. Falar em “gordinhas” também é desrespeitoso. Independentemente de posição ideológica, queremos dizer que não é dessa forma que se afirma a democracia. Cumprimento-o porque, muito embora esteja manifestando oposição ao Governo de seu Estado, V. Exª está contribuindo com o processo eleitoral do País inteiro ao fazer esse alerta. Em todo o País estão ocorrendo coisas terríveis, como por exemplo o cerceamento de espaços de setores da Imprensa que favorecem determinados nomes. Eu queria tecer essa consideração, e em nome das mulheres do Brasil pedir ao Governador do Piauí que retire as expressões relativas às mulheres, pois são extremamente ofensivas. Tenho certeza de que, por isso, ele perderá muitos votos na próxima eleição. Eram as considerações que eu gostaria de fazer.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Recolho o oportuno aparte de V. Exª, Senadora Emilia Fernandes. E devo dizer que tem efetivamente meu apoio com relação às restrições que faz. Tenho dito no meu Estado, com relação aos impropérios lançados pelo Governador, que as expressões usadas contra a mulher não correspondem àqueles objetivos de cidadania que todos nós perseguimos. Finalmente, gostaria de dizer que - quanto às observações feitas ao meu Partido - demos uma prova de confiança aos homens públicos do Brasil quando votamos pela reeleição. A propósito, na minha Bancada - com desprendimento - três oposicionistas - à época tanto o Ministro Freitas Neto, então Senador da República, quanto o Senador Lucídio Portella quanto eu mesmo - confiamos no espírito dos homens públicos brasileiros. Assim, consubstanciamos esse pensamento em nosso voto. Contudo, se for necessário, vamos reverificar a legislação.

O Sr. Lucídio Portella (PPB/PI) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL/PI) - Ouço o aparte do nobre Senador Lucídio Portela.

O Sr. Lucídio Portella (PPB/PI) - Nobre Senador Hugo Napoleão, a bem da verdade, eu fui contra o projeto, exatamente prevendo todos os fatos que agora ocorrem nos Estados brasileiros onde os Governadores são candidatos à reeleição.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL/PI) - V. Exª está certo. Mas, referia-me, de maneira global, aos empréstimos que nós todos votamos, de boa vontade, até mesmo para o Estado do Piauí, fazendo com que houvesse um gesto elevado, com relação ao Governador que, lamentavelmente, não o merecia.

A Srª Marina Silva (Bloco/PT-AC) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PLFL-PI) - Ouço o aparte da nobre Senadora Marina Silva.

A Srª Marina Silva (Bloco/PT-AC) - Nobre Senador, quando começamos a discutir o expediente da reeleição, confesso a V. Exª que cheguei a ser simpatizante da idéia. Eu entendia que não poderíamos privar um homem público de, no desempenho de suas funções, reapresentar seu nome para avaliação da sociedade. Eu considerava ser um expediente justo, porque a sociedade optaria pela continuidade ou não daquele trabalho. Ao estudar o assunto mais a fundo, com o auxílio do Senador Eduardo Suplicy, li que Alexis de Tocquiville dizia que o homem público, quando instituído o expediente da reeleição, na maioria dos casos, não fazia prevalecer o limite de sua ética e o de sua postura; prevalecia, sobretudo, o interesse em viabilizar seu projeto.

De acordo com o autor, portanto, deixa de ser um projeto da sociedade para ser um projeto particular. É claro que, ao estabelecermos a ética como limite, nós próprios e tantos outros não lançaríamos mão dos mesmos expedientes para viabilizar um projeto, fosse ele o mais justo. No entanto, convenci-me de que a reeleição atrapalha a democracia e a faz empobrecer.

Se este é o cenário para a disputa de Presidente e de Governadores, quando se espera sofisticação ou, pelo menos, um padrão mais elevado, V. Exª pode imaginar o que farão os prefeitos que estarão disputando cargos? Lançarão mão de todos os instrumentos, até os inimagináveis, para viabilizar seus projetos e os do grupo ao qual pertencem. Por entendimento de princípio, fui contrária à reeleição. Acredito que o Congresso Nacional precisa, à luz de todas as denúncias feitas, inclusive por pessoas que - conforme disse V. Exª - deram um crédito ao expediente da reeleição, reavaliar o que aprovamos aqui.

O SR. HUGO NAPOLEÃO (PFL-PI) - Com respeito à opinião de V. Exª, devo dizer que o Partido de V. Exª, o PT, no meu Estado, está se insurgindo e entrou com medida judicial para o efeito e objetivo de coibir o Governador dos abusos de transferir verbas de combate à seca, por meio de decretos, para a Secretaria de Comunicação Social e para sua propaganda.

Não tive conhecimento de nenhum caso semelhante na campanha para Governador, e muito menos para Presidente, que fosse às páginas dos jornais como o publicado no sábado, dia 8 de agosto, na Folha de S. Paulo, página 7, com a manchete “Justiça veta verba para propaganda no Piauí”. Diz a matéria:

“O Juiz da 2ª Vara dos Feitos de Fazenda Pública, José Alves de Paula, concedeu anteontem liminar suspendendo a transferência de R$4milhões de duas Secretarias Estaduais para gastos com propaganda.

A decisão judicial torna sem efeito dois decretos do Governador Francisco de Assis Moraes Souza, o Mão Santa (PMDB), que transferiam recursos de duas Secretarias que desenvolvem ações de combate à seca à Secom (Secretaria de Comunicação).”

É lamentáve!

Sr. Presidente, vou encerrar dizendo dos cercos com que a Polícia do meu Estado - por quem tenho muito apreço e que gosta muito de mim -, por ordens superiores, tem tentado impedir a minha passagem nas praças públicas, prendendo os motoristas do caminhão-palanque, afastando o carrro e fazendo cordões de isolamento para que eu não passe. Mas, Sr. Presidente, eu já declarei que, se quiserem, podem me prender, mas ninguém, no meu Estado, vai poder dizer que eu não terei o direito de me manifestar. O Governador ou o Secretário podem mandar a Polícia, mas saibam que eu continuarei na minha jornada, na minha caminhada, levantando a minha voz todas as vezes em que isso se fizer necessário, pelo bem da democracia no nosso Estado e no nosso País.

Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/08/1998 - Página 12907