Discurso no Senado Federal

JUSTIFICATIVA A APRESENTAÇÃO DO PROJETO DE LEI DO SENADO, DE SUA AUTORIA, QUE DISPÕE SOBRE A INSTALAÇÃO DE TELEFONES ESPECIAIS PARA SURDOS E DA OUTRAS PROVIDENCIAS, A SER LIDO NA PRESENTE SESSÃO.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO.:
  • JUSTIFICATIVA A APRESENTAÇÃO DO PROJETO DE LEI DO SENADO, DE SUA AUTORIA, QUE DISPÕE SOBRE A INSTALAÇÃO DE TELEFONES ESPECIAIS PARA SURDOS E DA OUTRAS PROVIDENCIAS, A SER LIDO NA PRESENTE SESSÃO.
Aparteantes
Leonel Paiva.
Publicação
Publicação no DSF de 13/08/1998 - Página 12878
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • LEITURA, JUSTIFICAÇÃO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, INSTALAÇÃO, SISTEMA, TELEFONIA, DESTINAÇÃO, USUARIO, SURDO, BRASIL.

A SRª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta tarde, venho à tribuna para comentar a respeito de um projeto de lei ao qual dou entrada hoje no Senado Federal e que dispõe sobre a instalação de telefones especiais para surdos. Em seu art. 2º, é dito:

Art. 2º - Deverá ser garantido, por parte do Ministério das Comunicações e empresas concessionárias de serviços públicos em geral, a instalação de telefones especiais para surdos, como meio de comunicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil, facilitando a comunicação das pessoas portadoras de deficiência auditiva.

           Tenho acompanhado todo o nosso processo de privatização. Tenho feito comentários no sentido de que a privatização não tem sido um instrumento que traga um retorno imediato, à altura das necessidades sociais. Mas, independente da minha vontade, em que pese o meu esforço, as privatizações estão sendo feitas.

           É preciso que haja também um olhar social nesse contexto, pois o fato de estarem privatizados alguns setores não significa que não temos que fiscalizar. Se o Governo justifica as privatizações no sentido de trazer melhorias sociais para o povo, é preciso que se fiscalize, para que se cumpra realmente o que determina e o que justifica as privatizações, segundo o Governo Federal.

           Estou atenta à questão da privatização nas telecomunicações. Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho a esta tribuna com uma única preocupação: a de que, no momento em que privatizamos esse grande setor - sabemos que há uma implementação dessa política, inclusive nos países que fizeram parte dessa privatização -, é importante também que o façamos funcionar no nosso País. Não somos contrários à instalação de nenhuma empresa estrangeira no País, mas, na relação com os trabalhadores, essas empresas nunca implementam as mesmas políticas de proteção que são implementadas nos seus países de origem.

Com essa preocupação, estou apresentando este projeto de lei, para que haja a instalação de telefones especiais para surdos. Faço questão de fazer a leitura da justificativa deste projeto, para contar com a compreensão dos meus Pares nesta Casa.

JUSTIFICATIVA

A imagem mais comum das pessoas portadoras de deficiência é a de pessoas incapacitadas (por exemplo: um paraplégico sentado numa cadeira de rodas), o que leva grande parte das pessoas a não perceberem o quanto a comunicação é difícil para muitos deles, embora de forma diferente para cada tipo de deficiência, e como essa dificuldade gera mal-entendidos sobre a real capacidade física e principalmente mental dos portadores de deficiência, com o conseqüente reforço do preconceito a respeito dos mesmos.

Um bom exemplo disso tudo são as pessoas surdas.

Por falta de uma legislação, os surdos do Brasil estão privados de um serviço tão corriqueiro como é a telefonia. A telefonia para surdos, utilizando os aparelhos telefônicos especiais, equipados com um teclado de escrever, como numa máquina de escrever, um visor onde se lê a mensagem e um alarme luminoso no lugar da campainha, existe em outros países há muitos anos, e, até hoje, nada se fez nesta área no Brasil.

As pessoas surdas têm as mesmas necessidades de se comunicar à distância como as pessoas ouvintes: ligar para a escola do filho, marcar um horário no médico, chamar a polícia, comprar um remédio, encomendar uma pizza ou, simplesmente, conversar com alguém que se encontra distante. Nós, os ouvintes, dificilmente, imaginaríamos a nossa vida sem o telefone.

Os surdos que possuem o aparelho telefônico com o teclado de escrever podem ligar apenas um para o outro. Demais compromissos têm que ser resolvidos pessoalmente (a mesma atitude é adotada pelos surdos que não possuem nenhum tipo de telefone especial), o que acarreta perda de tempo, despesa com a condução e outros aborrecimentos (a pessoa com a qual se precisava falar pode não estar em casa). Fica muito difícil para um surdo solicitar ajuda de um ouvinte para telefonar, principalmente quando o ajudante é um desconhecido, como, por exemplo, no orelhão da rua.

A instalação de serviço de telefonia para surdos proporcionará a independência na comunicação à distância. É necessário encarar os surdos como pessoas diferentes, cujas diferenças precisam ser respeitadas, e não como pessoas deficientes, cujo defeito precisa ser corrigido.

Para que as pessoas surdas pudessem efetivamente fazer uso do telefone, seria necessário que existissem os seguintes serviços:

1. O telefone especial não consegue comunicar-se diretamente com o telefone comum. Para tanto, faz-se necessária a existência de uma central de intermediação das ligações, com pessoal devidamente treinado, para possibilitar as ligações entre o telefone de escrever e outro convencional, e vice-versa. Essa central de intermediação torna possível aos surdos o acesso a todos os telefones do sistema. Todos os usuários dos telefones, especiais ou não, poderiam efetuar as chamadas entre si.

2. Para reconhecer, no catálogo telefônico, que o aparelho é especial, este precisa ser identificado com uma sigla. A sigla utilizada em outros países é “TTY” ou “TDD” (do termo inglês Telecomunications Device for the Deaf, que significa, em português, Serviço de Telecomunicações para Surdos). Assim, os usuários ouvintes do sistema de telefonia saberiam identificar o aparelho especial e saberiam quando se faz necessário solicitar a ajuda da central de intermediação das ligações.

3 - Os telefones especiais para surdos necessitam ser instalados em locais públicos, como, por exemplo, em shopping centers, rodoviárias, hospitais, escolas para surdos, postos telefônicos etc., para que os surdos pudessem fazer uso deles quando estivessem fora de sua residência.

4 - A cobrança de tarifas pelas ligações feitas destes aparelhos precisa ser diferenciada, mais barata, porque digitar uma mensagem leva muito mais tempo do que falar, principalmente quando a pessoa não é muito hábil em datilografia. A cobrança pelo uso do telefone é feita, usualmente, de acordo com o tempo despendido. Na Inglaterra, por exemplo, a cobrança pelas ligações dos aparelhos telefônicos equipados com o teclado de escrever é mais baixa até uma determinada quantidade de ligações.

5 - Eu gostaria aqui de ressaltar que precisa surgir a oferta de aparelhos telefônicos especiais para surdos no mercado e a garantia de assistência técnica aos mesmos, com preços acessíveis. Atualmente, não existe nenhum ponto de venda de aparelhos telefônicos para surdos no Brasil. Os aparelhos existentes são trazidos de viagens particulares para o exterior, onde existe uma grande oferta dos mais variados modelos, mas não têm assistência técnica e correm o risco de não serem compatíveis com o sistema de telefonia brasileiro ou entre si.

Estamos certos que esta proposição encontrará o merecido respaldo dos nobres Pares. Faço isso com o sentimento de quem tem hoje uma certa dificuldade visual e uma certa dificuldade auditiva, em conseqüência dos meus trabalhos, exercidos há alguns anos. É pequena essa minha dificuldade pois posso perfeitamente ouvir as pessoas, posso ver, mas se me faltasse o telefone, mesmo agora, eu não teria como ter uma comunicação, já não digo nem para uso pessoal, exclusivo, para a função que exerço no momento.

Tenho sempre a preocupação para que haja, de nossa parte, do Congresso Nacional brasileiro, do Senado Federal, prioridades nessas questões que dizem respeito às pessoas. Temos que ser uma sociedade muito humana e como tal preocupada ainda que com segmentos minoritários, pois só quem passa por essas dificuldades pode sentir a falta que faz não ter condições e instrumentos à sua disposição para uma comunicação, até mesmo para um serviço, como já me referi, de atendimento médico de urgência, ou para pedir algo com uma certa urgência. Tudo isso não é dado ao surdo no que diz respeito à comunicação da telefonia.

Portanto, penso que essa minha iniciativa busca equipar todas essas pessoas portadoras de deficiências, no caso, os surdos-mudos, para que possam ter acesso natural e compatível com a sua deficiência para uma comunicação plena.

O Sr. Leonel Paiva (PFL-DF) - Permite V. Exª um aparte?

A SRª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ) - Concedo o aparte a V. Exª, Senador Leonel Paiva.

O Sr. Leonel Paiva (PFL-DF) - Vejo, Senadora Benedita da Silva, que V. Exª pensou muito mais com a razão do que com a emoção ao abraçar essa causa. Confesso a minha adesão total a essa idéia, tanto que estou disposto a trabalhar por isso incessantemente, porque é uma forma de corrigir uma distorção social muito grave no País. O surdo-mudo no País não é uma minoria tão pequena; é uma minoria laboriosa, inclusive. A deficiência de não ouvir, do surdo-mudo, não o impede de desenvolver tarefas e funções do mais alto gabarito e da mais alta importância. É necessária sim a proteção. Não a proteção do coitadinho, mas a proteção da deficiência que ele carrega. Essa é a mensagem que ouvi de V. Exª e que transmito a todos para que o surdo-mudo tenha o reconhecimento da sua deficiência e que o Estado brasileiro, que a Nação brasileira, que o povo brasileiro dê ao surdo a oportunidade de ter uma qualidade de vida melhor. A tarifa diferenciada no telefone é um passo. É tão-somente um passo. V. Exª lembrou os locais públicos onde se deveria ter o telefone de teclado. Acredito que o surdo precisa ter um telefone de teclado à disposição dele também nas emergências, nos Procons, nos Bombeiros, na Polícia Militar, na Polícia Civil, nos hospitais e, mais ainda, defendo também uma tarifa diferenciada e uma disponibilidade no mercado não só do aparelho de teclado como também de um parelho de fax, que é uma alternativa hoje ao alcance de quase todos, menos do surdo-mudo. O Estado brasileiro, a nação brasileira e a sociedade brasileira poderiam todos cuidar desse aspecto. Parabéns pela lembrança de V. Exª.

A SRª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ) - Agradeço e incorporo a este meu pronunciamento as palavras de V. Exª compreendendo que certamente eu encontrarei eco, além de V. Exª, nesta Casa, até para que este projeto tramite com uma certa urgência, possa ser aceito e possa ser votado, para que possamos não só colaborar com esses portadores de deficiência auditiva como também complementar tantas outras iniciativas minhas nesta Casa e de outros Srs. Senadores na questão dos portadores de deficiência. Dedico-me a isso porque sou profissionalmente uma assistente social e tenho trabalhado nessa área, com a qual tenho convivido constantemente e vejo a dificuldade, principalmente se essas pessoas são pobres.

Agradeço, especialmente, a colaboração, na elaboração desta proposição, da Federação Nacional das Associações de Pais e Amigos de Surdos FENAPAS, representada pela sua Presidente Daniela Richter Teixeira, que é uma sociedade civil sem fins lucrativos e constituída de associações de pais no Brasil inteiro, com o objetivo de buscar soluções adequadas para as necessidades dos deficientes auditivos.

Obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/08/1998 - Página 12878