Pronunciamento de Lauro Campos em 05/10/1998
Discurso no Senado Federal
SOLIDARIEDADE AO PRONUNCIAMENTO DO SENADOR JOSAPHAT MARINHO. ANALISE DA ATUAL CRISE ECONOMICA MUNDIAL.
- Autor
- Lauro Campos (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
- Nome completo: Lauro Álvares da Silva Campos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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REFORMA CONSTITUCIONAL.
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
- SOLIDARIEDADE AO PRONUNCIAMENTO DO SENADOR JOSAPHAT MARINHO. ANALISE DA ATUAL CRISE ECONOMICA MUNDIAL.
- Publicação
- Publicação no DSF de 06/10/1998 - Página 13203
- Assunto
- Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
- Indexação
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- SOLIDARIEDADE, PRONUNCIAMENTO, JOSAPHAT MARINHO, SENADOR, REFERENCIA, NECESSIDADE, PRESERVAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, GARANTIA, BEM ESTAR SOCIAL, MAIORIA, POPULAÇÃO, BRASIL.
- CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO, AREA, ECONOMIA, SUJEIÇÃO, DIRETRIZ, ESTABELECIMENTO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), PROVOCAÇÃO, ALTERAÇÃO, REFORMULAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ATENDIMENTO, INTERESSE, PAIS INDUSTRIALIZADO, PRIMEIRO MUNDO, ESPECIFICAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), PREJUIZO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, BRASIL, AMERICA LATINA.
O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PT-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não era meu propósito fazer uso da palavra nesta data, mas, ouvindo a oração do eminente colega Josaphat Marinho - para orgulho e engrandecimento meu -, não pude resistir ao impulso de solidarizar-me com S. Exª por suas palavras e de, mais uma vez, prestar-lhe uma homenagem por sua coragem, por seu desassombro, por seu compromisso intransigente com as necessidades, fraquezas e anseios do povo brasileiro e por sua vontade de transformar o mundo para melhor.
Sendo assim, quero apenas dizer que concordo inteiramente com o que foi mais uma vez colocado por este desassombrado companheiro, Senador Josaphat Marinho.
Poderia acrescer muitos dados, mas seriam perfunctórios diante do quadro que S. Exª traçou. Poderia referir-me a absurdos como o processo de globalização, dominado pelo FMI e por seu patrão, o próprio Governo dos Estados Unidos, e pela necessidade desse mesmo FMI de livrar-se de suas contradições e problemas, exportando-os. Para reduzir a dívida pública dos Estados Unidos, que atingiu U$ 5,3 trilhões, era preciso que o Governo reduzisse seus gastos, como nos mandam fazer aqui. Naquele país, o Governo reduz gastos, enquanto que, aqui, passamos a comprar de fornecedores, de produtores norte-americanos. Passamos a importar, gerando um déficit comercial aqui, na Argentina, em todos os países dominados, para que a economia norte-americana permaneça em seu pleno emprego, sem perturbar-se com a crise mundial. O Governo norte-americano reduz seus gastos, equilibra o orçamento; desequilibramos nossas importações, nosso orçamento, nosso nível de emprego, nossa vida social.
A primeira vez que ouvi a palavra desconstitucionalização - essa palavra fantástica - foi de um economista que, tenho certeza, nunca leu a Constituição brasileira ou qualquer outra. E foi exatamente ele quem veio ao Brasil pregar a desconstitucionalização. Sabia ele ser necessário retirar da Constituição certas garantias e passá-las para uma legislação menor, mais facilmente manipulável pela vontade de Sua Excelência, o Presidente da República, que, há muito tempo, passou a ser uma vontade sombra, uma vontade delegada, uma vontade ajoelhada diante dos desígnios do FMI. Um FMI falido ao tentar prestar socorros que viriam tapar os buracos por ele provocados na sua tentativa de resolver os problemas da matriz sobre as agruras dos países e das sociedades satélites e pobres.
Uma das decisões tomadas na Argentina, por exemplo, foi inserir a taxa de câmbio na Constituição - que tem que ser flexível. Para que uma autoridade financeira altere a taxa de câmbio é preciso uma emenda constitucional. Mas, nesse ínterim, nesse processo de mudança da Constituição, permite-se uma série de manipulações e de especulações em torno dessa medida, que deveria ser tomada de forma quase oculta e rapidamente.
O Governo brasileiro não quis ver que estava sendo enleado. O problema não era, como o eminente Senador Josaphat Marinho acaba de dizer muito bem, de desconstitucionalizar, não era de retirar da Constituição algumas garantias que haviam sido conquistadas duramente e a longas penas pelo povo brasileiro, pela sociedade brasileira. Na realidade, o Governo não estava apenas retirando da Constituição esses direitos. Mais do que isso: visava à redução do custo Brasil por meio da diminuição da contribuição à Previdência, do décimo-terceiro salário, do aviso prévio, da legislação trabalhista e das despesas sociais. O custo Brasil que paga aos seus trabalhadores o salário de R$130,00 por mês. Como se vai reduzir o custo Alemanha, por exemplo?
Na Alemanha, o que já se provou é que, se houver uma redução de 28 vezes o salário médio do trabalhador alemão, aquele país não conseguirá concorrer com Bangladesh e com a China, porque nesses países os custos já estão de tal forma aviltados que as mercadorias lá produzidas conseguem penetrar no mercado mundial com um preço tão reduzido que é impossível concorrer com as mesmas.
A globalização é um engodo nesse sentido, quando coloca umas diante das outras mercadorias produzidas em situações econômicas, sociais e políticas totalmente diferentes.
Então, a catástrofe que deveria vir nesse processo só poderia resultar nesse fato a que estamos assistindo: uma crise que encontrou perplexo o Governo brasileiro, preocupado com reformas da Constituição, mas sem preocupar-se com as reformas que poderiam gerar garantias, salvaguardas à soberania nacional, à capacidade de produção e de trabalho da sociedade brasileira, à tranqüilidade e estabilidade reais que essa sociedade pretende e exige.
De modo que, então, entre outras mudanças, a mais hedionda de todas, a que veio matar de vez a nossa democracia incipiente: a reeleição. Uma instituição, até então, inédita na história brasileira, e cujos efeitos nefastos já Tocqueville havia demonstrado sobre a democracia norte-americana, em meados do século passado, quando lá esteve. Tocqueville dizia que, em virtude da reeleição nos Estados Unidos, o Presidente da República deixava de se preocupar com o governo, com a administração pública, para se preocupar, única e exclusivamente, com sua própria campanha reeleitoral.
O que vemos no Brasil é isto: uma desmoralização total da democracia num processo de reeleição sem desincompatibilização. A democracia teria sido muito menos atingida se, em vez de uma reeleição nestas circunstâncias, distorcidas, desfavorecidas, desbalanceadas, como esta a que assistimos, houvesse havido uma recondução pura e simples do Senhor Presidente da República, a fim de que pudesse melhor satisfazer seus anseios, seus desejos, suas pulsões de poder.
Diante de tudo isso, aqui estou tentando agradecer ao eminente Senador Josaphat Marinho, professor de todos nós no Senado, o fato de, com suas palavras, ter me estimulado, ter me incitado de tal forma que não pude deixar de trazer esta minha modestíssima contribuição que só visa a secundar as suas palavras, agradecendo-lhe o fato de as ter pronunciado.
Muito obrigado.