Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS A CARTA RECEBIDA DO JORNALISTA ARLINDO PORTO EM QUE ALERTA SOBRE O PROCESSO DE POLUIÇÃO POR METAIS PESADOS, ESPECIALMENTE O MERCURIO, NOS RIOS DA REGIÃO AMAZONICA, CAUSANDO DANOS AS POPULAÇÕES RIBEIRINHAS.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • COMENTARIOS A CARTA RECEBIDA DO JORNALISTA ARLINDO PORTO EM QUE ALERTA SOBRE O PROCESSO DE POLUIÇÃO POR METAIS PESADOS, ESPECIALMENTE O MERCURIO, NOS RIOS DA REGIÃO AMAZONICA, CAUSANDO DANOS AS POPULAÇÕES RIBEIRINHAS.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 08/10/1998 - Página 13444
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • ANALISE, CARTA, RECEBIMENTO, ORADOR, AUTORIA, ARLINDO PORTO, JORNALISTA, CONSELHEIRO, TRIBUNAL DE CONTAS, ESTADO DO AMAZONAS (AM), FUNDADOR, SINDICATO, ADVERTENCIA, RISCOS, POPULAÇÃO, Amazônia Legal, REPRESENTAÇÃO, PROCESSO, CONTAMINAÇÃO, MEIO AMBIENTE, POLUIÇÃO, METAL PESADO, MERCURIO, RIO, REGIÃO AMAZONICA, RESULTADO, ATIVIDADE EXTRATIVA, MINERAÇÃO, GARIMPAGEM, EXTRAÇÃO, OURO, REGIÃO.
  • CRITICA, INSUFICIENCIA, FISCALIZAÇÃO, GARANTIA, CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, PROTEÇÃO, SAUDE, CIDADÃO, BRASIL.
  • DEFESA, URGENCIA, ADOÇÃO, POLITICA, COMBATE, POLUIÇÃO, METAL PESADO, MERCURIO, AGUAS FLUVIAIS, REGIÃO AMAZONICA.
  • ANALISE, AUSENCIA, TRABALHO, LEVANTAMENTO, AVALIAÇÃO, PROCESSO, EVOLUÇÃO, EXPANSÃO, POLUIÇÃO, MEIO AMBIENTE, METAL PESADO, MERCURIO, AREA, BACIA AMAZONICA, PROVOCAÇÃO, RISCOS, SAUDE, POPULAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA.
  • ANALISE, HISTORIA, OCORRENCIA, POLUIÇÃO, MEIO AMBIENTE, PAIS ESTRANGEIRO, CONTINENTE, EUROPA, ASIA, RESULTADO, EXCESSO, BUSCA, LUCRO, INDUSTRIA QUIMICA, ADIAMENTO, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, COMBATE, CONTAMINAÇÃO, PRODUTO QUIMICO, PROVOCAÇÃO, PREJUIZO, SAUDE, POPULAÇÃO, REDUÇÃO, ATIVIDADE INDUSTRIAL, LONGO PRAZO.
  • NECESSIDADE, EDUCAÇÃO, POPULAÇÃO, RESPONSAVEL, ATIVIDADE, MINERAÇÃO, CONSCIENTIZAÇÃO, RISCOS, SAUDE, CONTINUAÇÃO, UTILIZAÇÃO, GARIMPAGEM, PRODUTO POLUENTE, MERCURIO, AGUAS FLUVIAIS, REGIÃO AMAZONICA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, CORREÇÃO, ERRO, RESULTADO, GARIMPAGEM, REGIÃO AMAZONICA, EXTINÇÃO, AREA, POLUIÇÃO, Amazônia Legal, IMPEDIMENTO, CONSUMO, ANIMAL, PEIXE, PROCEDENCIA, LOCAL, MERCURIO, SIMULTANEIDADE, DESENVOLVIMENTO, PROCESSO, COMBATE, DESPOLUIÇÃO, ADAPTAÇÃO, ECOSSISTEMA, EXTENSÃO, TERRITORIO, FLORESTA AMAZONICA, PARCERIA, COOPERAÇÃO, UNIVERSIDADE, REGIÃO.
  • CONCLAMAÇÃO, DIRIGENTE, INTELECTUAL, PAIS, EMPENHO, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, POLUIÇÃO, METAL PESADO, MERCURIO, RIO, REGIÃO AMAZONICA.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, recebi recentemente uma carta do Dr. Arlindo Porto, ilustre jornalista, fundador do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do meu Estado e atual Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, na qual ele, de modo apaixonado, lança um alerta vermelho sobre o processo de poluição por metais pesados, em especial o mercúrio, dos rios e populações ribeirinhas da Amazônia. É para essa questão que peço, neste momento, a máxima atenção de meus nobres Pares.

Sr. Presidente, não é mais possível que o Estado Brasileiro, em suas diferentes instâncias, continue ausente de uma de suas mais fundamentais responsabilidades: garantir o respeito às leis e assegurar proteção aos cidadãos deste País. Onde estão os fiscais para coibir essa atividade predatória e altamente lesiva à saúde da população amazônica e a todo o meio ambiente deste imenso território?

A descarga de mercúrio, oriunda das atividades informais de mineração de ouro na Região Amazônica, tem sua origem, em grande parte, na falta de preocupação dos garimpeiros com o meio ambiente, bem como em seu pequeno ou quase nulo conhecimento sobre os métodos mais eficientes e limpos de extração do ouro. Pessoas em contato com esses garimpeiros, tais como físicos, padres, pastores, higienistas, assistentes sociais, enfermeiros, inspetores de mineração, funcionários dos órgãos públicos e outros, também carecem de formação e informação, isto é, de dados sobre as transformações do mercúrio no meio ambiente, todas altamente nocivas.

Hoje em dia já se percebe existir, em certos círculos envolvidos com a proteção da Amazônia e de sua população, preocupação com os efeitos nocivos da dispersão do mercúrio nas águas e no ar da região, contaminando animais e seres humanos. Todavia, falta ainda um trabalho sistematizado e aprofundado de monitoração da poluição existente e de seus processos de evolução e difusão na Bacia Amazônica, assim como de sua exportação, sobretudo pela via dos peixes e outros animais contaminados. Procedimentos de correção e de interrupção dessa cadeia poluente ainda não foram adotados até agora. Prova evidente e candente é a carta que recebi do Dr. Arlindo Porto sobre o assunto.

Diz o Dr. Arlindo Porto em certo trecho de sua missiva:

Não posso e não devo ficar calado, no instante em que constato que todos nós (você, eu, nossos pais, irmãos, cunhados, cunhadas, filhos, netos, amigos, todo mundo nesta terra, todos, todos) estamos sendo assassinados por um veneno mortal, sem antídoto, que está nos tirando a vida paulatinamente, sem apelações, pouco a pouco, sem volta.

...Estamos sendo mortos, dia após dia, e não fazemos nada, absolutamente nada... Não sou eu quem afirma isso. Está no jornal “A Crítica” de hoje, dia 16 de agosto de 1998: a presença do mercúrio nos rios Madeira, Negro e Tapajós é dez vezes superior aos índices aceitáveis, segundo a Organização Mundial de Saúde - OMS, órgão da ONU. Foi detectada uma média de 17 a 20 miligramas de mercúrio por quilo de cabelo nas populações ribeirinhas daqueles cursos d’água, quando o nível normal varia de 2 a 3 miligramas. Já nos peixes consumidos por essas populações (dentre as quais se inclui a de Manaus), tais como o tucunaré, filhote, dourado e piranha, o índice detectado foi de 700 microgramas por quilo, quando o aceitável é de 500 microgramas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estudos recentes mostram que a contaminação das populações que ingerem alimentos contendo mercúrio é mais séria até que a que ocorre diretamente com os garimpeiros. Ou seja, inocentes, que não têm nada a ver com as atividades dos garimpos, é que sofrem as mais danosas conseqüências.

Será possível que esse ciclo de morte continue a se espalhar por nosso território e que nada realmente efetivo seja feito para quebrá-lo?

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico realiza estudos para a elaboração do Programa Nacional de Monitoração de Mercúrio. Existem técnicos que vêm estudando a intoxicação de pessoas e animais por metais pesados há vários anos. Todavia, nada surgiu, ainda, em matéria de política de combate ao mal. Nossos organismos de Estado são muito lentos, burocratizados e despreparados para lidar com questões endêmicas e urgentes como essas. E, o que é pior, esse problema ataca uma região onde a população é extremamente carente e indefesa perante agressões sub-reptícias como essa.

A Região Amazônica é, na verdade, Sr. Presidente Geraldo Melo, um imenso laboratório a desafiar a criatividade dos brasileiros para que façam dela uma das mais poderosas centrais de desenvolvimento sustentado e sustentável que o planeta jamais conheceu.

Infelizmente a humanidade tem memória curta e só aprende à custa da experiência própria. Pouco adiantam as lições da história para as gerações de hoje. Não fosse assim, muitas das mazelas que hoje ainda vivemos já teriam sido evitadas, pela não repetição de erros do passado. Pouco, muito pouco, ou quase nada adiantaram as milhares de guerras e destruições pelas quais a humanidade já passou. Ainda hoje, fanatismos de toda espécie, oportunismos de toda sorte, imprevidências de todo jaez jogam povos inteiros, quando não a humanidade toda, em conflitos, armados ou não, que só trazem sofrimento a muitos, para benefício e sádico prazer de uns poucos.

Assim se passa com a fome na África, enquanto a Europa e a América do Norte esbanjam fartura. Assim se passa com a corrida às armas nucleares na Ásia, enquanto os países já nuclearizados fingem não ver o problema. Assim se passa com o desmatamento selvagem do Extremo Oriente, enquanto os mercados ricos compram sua madeira sem qualquer escrúpulo. Assim se pode arrolar uma extensa lista de pequenas ou grandes catástrofes que assolam diariamente nosso planeta, sem que haja uma só medida coordenada para que se ponha fim a tais descalabros.

Fale-se em escala mundial, continental, nacional, estadual, municipal ou meramente local, o homem é, infelizmente, um ser imprevidente por natureza. Só quando a desgraça bate a sua porta é que ele procura, se ainda tiver tempo, barrar-lhe a passagem.

Será que teremos que assistir, no Brasil, a uma catástrofe como a ocorrida no Japão, em 1932, na baía de Minamata, quando indústrias descarregaram toneladas de mercúrio, contaminando peixes e frutos do mar? O Japão levou quase 40 anos para reconhecer que o mercúrio era o responsável pelo envenenamento da população ribeirinha e pelas graves seqüelas que adultos, crianças e bebês nascidos desde então vêm sofrendo, com gravíssimas degenerações genéticas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não estamos lidando, no caso da poluição ambiental por metais pesados, sobretudo de reservatórios e cursos d’água, com uma situação meramente transitória e autocorrigível pela ação do tempo. Trata-se de poluição ativa e de difícil eliminação sem a ação decisiva do homem no seu combate. Para se ter uma idéia de sua gravidade, registrem -se os seguintes fatos:

1 - para cada quilo de ouro extraído, necessita-se da mesma quantidade de mercúrio;

2 - de 40 a 45% do mercúrio utilizado é despejado nos rios e o restante é lançado no ar por processos de queima;

3 - na Região Amazônica - dados de 1995 - a exploração do ouro despeja 120 toneladas anuais de mercúrio no meio ambiente, acrescidas de 600 toneladas enviadas para a atmosfera por reações químicas detonadas pelas queimadas;

4 - muitos dos efeitos da poluição se estendem no tempo, seja pela absorção do mercúrio pelos peixes, consumidos, a seguir, pelo homem, seja pela contaminação dos leitos dos rios e lagos, pela criação de depósitos.

Como se pode ver, Srªs e Srs. Senadores, não estamos lidando com um pequeno problema mas com algo em escala nacional, já que afeta diretamente mais da metade do território nacional. O caso só não tem repercussão maior na imprensa e nos meios de divulgação porque, infelizmente, a população amazônica é pequena em relação à do resto do País e não tem a força política que os centros mais populosos e desenvolvidos têm junto à mídia e aos altos escalões governamentais.

Veja V. Exª, Sr. Presidente, que nem o fato - gravíssimo - de termos uma Senadora que sofre das seqüelas dessa poluição insidiosa foi capaz de mobilizar eficazmente Governo, opinião pública, centros de pesquisa e entidades da sociedade em socorro dessa gente.

Será que teremos que esperar por catástrofes como a japonesa ou como a de Chernobil para que o Brasil acorde para o combate a seus mecanismos de lenta autodestruição?

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT-DF) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Permito-me a honra de ouvir V. Exª, Senador e eminente mestre Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT-DF) - Senador Bernardo Cabral, não poderia perder a oportunidade que a inteligência de V. Exª abre para mim, ficando silencioso diante de um pronunciamento do nível, da profundidade e da importância desse que V. Exª faz neste plenário. Realmente, como sempre, V. Exª se preocupa com os problemas fundamentais da nossa sociedade, de nosso tempo, de nossa cultura. E, desta vez, V. Exª atinge um problema que só aqueles que têm a felicidade de penetrar abaixo da superfície, de penetrar no âmago das questões podem trazer à tona, com a felicidade e a profundidade com que faz V. Exª. De modo que, então, eu apenas gostaria de acrescentar as minhas modestas palavras ao seu discurso e dizer que esse discurso que V. Exª faz, mostrando a sua preocupação com a defesa da vida, com a defesa do meio ambiente, com a defesa da reprodução da vida humana na terra, cala fundo dentro do meu espírito. Será que estamos fadados a continuar um processo de produção destruidora, de produção que, obviamente, não permitirá, se continuar nesta marcha (344 guerras em 200 anos) e com esse poder destruidor letal, a sobrevivência humana? V. Exª flagra, com a sua inteligência, na Amazônia, esse desrespeito à vida, esse desrespeito ao próximo, esse desrespeito à natureza, essa cegueira que impede que o homem veja que ele é parte daquilo que ele destrói, que ele é parte da natureza. O pronunciamento de V. Exª mostra que, em diversos pontos da atividade humana, a prioridade é o lucro, a maximização do lucro, ao invés da maximização da vida humana. É este estímulo, este incentivo que a cultura capitalista coloca na frente de sua ação: a maximização do lucro a qualquer preço, o desrespeito à vida, ao invés de colocar a defesa da vida - como V. Exª faz tão bem - como a prioridade das prioridades. O humanismo de V. Exª se manifesta mais uma vez nessas suas preocupações. Quero apenas, com as minhas palavras, parabenizar V. Exª pela escolha do tema e pela maneira como o tratou.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Senador Lauro Campos, um dos motivos pelos quais admiro a atuação de V. Exª está além do ângulo político. É que V. Exª é um professor. Direi melhor: um professor e um educador e, como tal, tem a visão panorâmica do que é necessário, do que é preciso, do que se torna indispensável para que apreciemos no conjunto o significado da vida.

Sei que não podemos seguir aquela filosofia do cidadão que em nada acreditava e dizia que para ele “a vida é um bem que me deram sem me consultar e que eu restituirei com a mesma indiferença”. Não podemos seguir esse passo. A vida é algo sublime, como bem ressaltou V. Exª, que deve pautar a conduta de todos nós.

E hoje vejo, nesta pálida contribuição que posso dar, que V. Exª, com a sua chega, traz um colorido, traz uma tinta forte, para que ambos possamos desfraldar uma bandeira. Agradeço-lhe, portanto a intervenção e a registro, incorporando-a ao meu discurso.

E vou mais além, Sr. Presidente. Quero reconhecer que é verdade que mesmo a Europa tardou a combater a poluição de seus rios. Foi preciso que o Reno se tornasse uma massa pastosa de dejetos das indústrias químicas suíças, francesas e alemãs, para que os países europeus se dessem conta de que estavam condenando ao aniquilamento não só as população ribeirinhas, mas também a própria atividade econômica geradora do problema. Custou, mas, lá, eles se deram conta de que não se pode mais consentir que o progresso econômico se faça à revelia da proteção do meio ambiente. O preço a pagar, a médio e longo prazos, é muitas vezes maior que o lucro de curto prazo - este lucro que ainda há pouco o eminente Senador Lauro Campos sublinhava na sua intervenção.

Assim como foi feito com o Reno, a Inglaterra fez com o Tâmisa, e o Brasil tem projetos, pelo menos no papel, de fazer com a baía de Guanabara e o rio Tietê. Por que, então, esperar que a Amazônia chegue aos níveis de poluição e degradação ambiental dos rios europeus ou do Sudeste brasileiro para se tomar alguma providência? Não me parece lógico, economicamente razoável, socialmente justo e humanamente defensável, qualquer que seja o prisma pelo qual se analise a questão.

Srªs. e Srs. Senadores, as lideranças brasileiras, sejam elas políticas, sociais, econômicas ou religiosas, devem entender urgentemente que o desenvolvimento do Brasil não pode implicar depredações ambientais, cujos custos de reparação devam ser pagos pelas gerações futuras. Assim, não haverá gerações futuras para pagar, pois o desenvolvimento não se sustentará e a pouca riqueza que se produzir mal dará para a sobrevivência dos que conseguirem viver numa terra devastada.

Estou usando uma linguagem propositadamente apocalíptica, na tentativa de despertar as consciências para o problema que temos de resolver. Pesquisas feitas no Canadá, na Suécia, na Inglaterra, na França e até mesmo no Brasil já apontam soluções para iniciar um processo de despoluição da Amazônia, junto com um processo educativo daqueles que trabalham em atividades potencialmente poluidoras. Resta-nos “pegar os freios nos dentes”, como se diz na linguagem popular, e partirmos para um programa de ação eficaz a curto, médio e longo prazos.

Como primeiro passo inquestionável, surge a questão da educação da população mineradora para o trabalho não poluente. Duas vertentes devem ser atacadas: a da absorção de tecnologias limpas e a das conseqüências desastrosas da continuação das atuais práticas de garimpagem. Há aí um grande esforço a ser feito pelas comunidades locais, com o apoio das lideranças técnicas nacionais mais competentes.

Um segundo passo é o da correção dos erros cometidos. Trata-se de buscar a eliminação dos bolsões de poluição espalhados por toda a Amazônia Legal. Em paralelo, enquanto os níveis de poluição não baixam para índices aceitáveis para a vida humana e animal, medidas de proteção temporária devem ser adotadas. A criação de peixes em viveiros suspensos nos rios e lagos, sem que eles tenham contato com os sedimentos contaminados, e sistemas permanentes de monitoração de poluentes nas águas que chegam aos viveiros são algumas da opções possíveis.

É evidente que uma solução paliativa é a de evitar a ingestão de animais já contaminados. Isso, no entanto, é muito difícil, pois afeta a dieta básica dos amazônidas, que é o peixe. Como controlar tais hábitos em populações ermas no interior das selvas? É mais fácil, racional e correto controlar a fonte de poluição.

A correção dos erros cometidos passa, também, pelo desenvolvimento de processos despoluidores adaptados ao ecossistema amazônico e à escala territorial em que se está trabalhando. A Amazônia sozinha é maior do que a Europa Ocidental inteira, o que coloca um fator de escala que influencia fortemente as técnicas a serem empregadas num e noutro caso. No caso brasileiro, mesmo aproveitando as experiências já acumuladas em outros locais semelhantes, necessitamos do desenvolvimento de tecnologia nacional, em parceria com centros mais adiantados, se for o caso. Necessitamos, de qualquer modo, de algo genuinamente brasileiro. Universidades da Região Amazônica, em cooperação com outras, melhor equipadas, como a Universidade de Brasília ou a Universidade Federal do Rio de Janeiro, entre outras, podem formar uma força-tarefa extremamente eficiente em prol da sociedade brasileira. Projetos desse tipo dão às nossas universidades públicas uma razão de ser que muitos lhes negam.

Enfim, Sr. Presidente, depois de ter feito, à vol d´oiseau, um diagnóstico em termos panorâmicos, mas sugerindo a terapêutica, estou a concluir para dizer que não estamos mais no momento de ações meramente retóricas ou de discussões puramente acadêmicas. Temos um problema social e tecnológico grave a nos demandar solução urgente, criativa e duradoura.

Espero que a elite dirigente do País lhe conceda a devida atenção, assim como espero que a elite intelectual lhe dê o competente encaminhamento de solução. Não são apenas uns poucos peixinhos doentes que necessitam da ajuda de incômodos ecologistas de plantão. São milhares ou milhões de pessoas e um patrimônio ambiental que clamam por salvação imediata.

E é esse clamor, Sr. Presidente, que eu não poderia deixar de levantar aqui; e, ao fazê-lo, quero, mais uma vez, ao final desta manifestação, agradecer as mãos dadas, para juntos caminharmos nesta senda que se abre - e refiro-me ao professor e Senador Lauro Campos e a mim próprio como defensores da nossa chamada “vida”.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/10/1998 - Página 13444