Discurso no Senado Federal

DEFESA DOS INCENTIVOS FISCAIS PARA A ZONA FRANCA DE MANAUS.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • DEFESA DOS INCENTIVOS FISCAIS PARA A ZONA FRANCA DE MANAUS.
Aparteantes
Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DSF de 14/10/1998 - Página 13539
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • DEFESA, ZONA FRANCA, MUNICIPIO, MANAUS (AM), ESTADO DO AMAZONAS (AM), ACUSAÇÃO, EXCESSO, BENEFICIO FISCAL, PREJUIZO, COMBATE, CRISE, ECONOMIA, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS.
  • JUSTIFICAÇÃO, VANTAGENS, ZONA FRANCA, ESTADO DO AMAZONAS (AM), REDUÇÃO, IMPORTAÇÃO, REGISTRO, PROGRAMA, AUMENTO, EXPORTAÇÃO.
  • ANALISE, GARANTIA, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PERMANENCIA, BENEFICIO FISCAL, ZONA FRANCA, ESTADO DO AMAZONAS (AM).

            O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto a esta tribuna com a disposição que tenho e venho mantendo, ao longo dos anos, na defesa da Zona Franca de Manaus, por notar que se desenvolve, a olhos vistos, novos ataques contra a sua manutenção.

            É que, agora, não é ela mais um “bem mundial” ou uma instituição “que preservou a natureza, garantiu o meio ambiente”, etc. etc., como registravam até há pouco tempo.

            Não... Os seus detratores passam a assinalar que está ela na contramão da história, eis que, segundo eles, atrapalham as providências que o Presidente da República pretende tomar para, “cortando gastos e reduzindo incentivos, fazer as economias orçamentárias e poder vencer a batalha do déficit público”...

E mais: que “na Zona Franca de Manaus e áreas de livre comércio na Amazônia Ocidental, 520 indústrias e 2 mil empresas consumirão R$3 bilhões em incentivos fiscais - redução do Imposto sobre Importação (II), do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do IPI vinculado à importação.”

E aqui, Sr. Presidente, abro um subtítulo:

Desconhecimento

Eis aí uma prova contundente de quem não conhece a Zona Franca de Manaus e prefere generalizar - formando, aliás, uma corrente poderosa - dizendo que só cortando os seus incentivos é que o déficit pode ser combatido. Ledo engano: ao se cortar incentivos, elevam-se alíquotas de impostos. E, no caso da Zona Franca de Manaus, é que, sem ela, o País teria de comprar US$10 bilhões de produtos finais.

Chamo bem a atenção da Casa, porque essa é uma afirmativa irrespondível. Sem a Zona Franca de Manaus o País terá de comprar US$10 bilhões de produtos finais. O que acarretaria isso? Exatamente o aumento do déficit na balança comercial, porque a Zona Franca de Manaus compra US$3 bilhões de insumos e os transforma em bens finais que abastecem o mercado nacional. Ora, se a Zona Franca de Manaus deixar de produzir esses bens finais, a conclusão é só uma: inflação. Isso porque haverá falta de oferta de produtos no mercado e os preços, fatalmente, subirão.

Numa das reuniões que participei com o Governador Amazonino Mendes, o então Secretário de Fazenda, Dr. Samuel Hanan, e com a equipe do Governo Federal, o Chefe do Executivo amazonense provou que a Zona Franca de Manaus não beneficia só a Zona Franca e que dela precisa o País para ter resultados positivos até na balança interna.

Salientou Amazonino: “nos acusam de responsabilidade por US$4 bilhões do déficit global de US$7 bilhões na balança comercial, mas esquecem que 68% do déficit são resultantes da importação de bens finais. Ora - continuava ele - se economizarmos US$7 bilhões na manufatura desses bens para o mercado interno e a renúncia fiscal é de pouco mais de US$1 bilhão, mais o valor da importação de insumos de US$3 bilhões, ainda damos um lucro considerável à Nação.”

Programa especial de exportação

Não é de agora que se faz um esforço muito grande para se transformar a Zona Franca em exportadora, a fim de minimizar as barreiras que impedem o empresariado daquela área de procurar outros mercados para os seus produtos.

Pois bem, no início deste mês, o superintendente da Zona Franca de Manaus, Mauro Ricardo Costa, assinou portaria que regulamenta o Programa Especial de Exportação da Amazônia Ocidental (Pexpam) e que outro objetivo não tem senão o de “alavancar as exportações através da concessão às empresas instaladas no Distrito Industrial de três modalidades de incentivos: suspensão, isenção e restituição de impostos”, a fim de atingir a meta de US$1 bilhão no próximo ano. E o que é mais significativo: de todos os incentivos, o mais importante é o que permitirá ao exportador colocar os seus produtos nos mercados externos e desses trazer matérias-primas pagando o mesmo preço por container cobrado no porto de Santos.

E, neste ponto, Sr. Presidente, chamo a atenção de V. Exª, que é um homem que navega nas águas da dificuldade de frete pelo Brasil afora, para a seguinte questão. Hoje, enquanto um container de 40 pés paga de frete US$3,480 entre Manaus e Buenos Aires, no futuro, com o crédito-prêmio funcionando como equalizador do diferencial entre os custos, o preço sairá por US$875, que é o cobrado no porto de Santos para containers dessa dimensão com destino à capital Argentina. Vale ressaltar que a diferença, US$2,605, poderá ser utilizada em outras exportações.

No entanto, pasmem os Srs. Senadores, apesar de a corrente que se insurge contra a Zona Franca reconhecer que o objetivo do programa é louvável e se enquadra no objetivo governamental de aumentar as exportações, não deixa de proclamar que os meios para atingir esse objetivo são discutíveis.

Sr. Presidente, passo a tratar do subtítulo A Zona Franca e a redução de seus benefícios tributários, e o faço porque é insistente, além do que seria imaginável, a todo instante, quando se fala em reduzir o déficit, quando se fala em economizar, tocar nessa questão. Resolvi, Sr. Presidente, colocar por escrito o que penso sobre esse assunto e assim o faço.

Há alguns tecno-bucrocratas que, vez por outra, entendem ser possível, através de emenda constitucional ou projeto de lei, rever toda a estrutura de benefícios tributários para a Zona Franca de Manaus e, assim, mutilar o art. 40 e seu parágrafo único do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

É preciso que a Nação seja alertada de que não há, nessa voracidade burocrática, nenhuma consistência tanto do ponto de vista da doutrina, quanto da práxis constitucional.

Do ângulo doutrinário, o argumento não pode sequer ser desenvolvido, eis que o estabelecido no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias representa decisão do titular do poder constituinte originário, insusceptível, por isso mesmo, de modificação por detentores de poder constituinte meramente derivado.

Do ponto de vista da práxis constitucional, igualmente é falacioso o argumento, pois naquele art. 40 foi estabelecida uma regra especial, qual seja, a manutenção da Zona Franca de Manaus pelo prazo de 25 anos, a contar de 5 de outubro de 1988.

Por outro lado, tentam esses inimigos da Zona Franca de Manaus sinalizar para o fato de que o Amazonas não pode conceder incentivos fiscais, à vista do que disciplina a Constituição no seu texto permanente, sobretudo no que diz respeito às disposições dos artigos 151, inciso III, e 155, parágrafo 2º, inciso XII.

Ora, essas são regras gerais que disciplinam a instituição de isenção da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, regulando igualmente a forma de concessão de isenção, incentivos e benefícios fiscais, por parte dos Estados e do Distrito Federal.

Já o disposto no artigo 40 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias é regra especial que mantém o instituto da Zona Franca de Manaus “com suas características de área de livre comércio, de exportação e importação e de incentivos fiscais, pelo prazo de vinte e cinco anos, a partir da promulgação da Constituição”.

E, por fim, Srªs e Srs. Senadores, deve ser colocada em relevo a lição dos constitucionalistas em Direito Público: a regra especial derroga a regra geral ou sobre ela prevalece, no que se refere à matéria, seu objeto.

Via de conseqüência, a Zona Franca de Manaus, queiram ou não os seus detratores, permanecerá pela garantia constitucional e não pela benesse, pelo favor ou pela concessão de um tecno-burocrata. E, para tanto, mais uma vez, ainda que não seja a última, será provocado o Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição.

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Neste ponto, Sr. Presidente, paro para ouvir o eminente Senador Jefferson Péres.

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Senador Bernardo Cabral, apenas para comunicar a V. Exª que deixo de dar um aparte demorado, como mereceria o seu discurso, porque, logo mais, farei um pronunciamento para expor minha posição a respeito do assunto que V. Exª, com tanto brilho, aborda da tribuna. Portanto, solidarizo-me integralmente com V. Exª. Esteja certo de que o Amazonas acompanha, com muita atenção, nossa atuação nesta Casa. Quero parabenizá-lo também - estava em Manaus e senti a reação - pelo projeto de lei que V. Exª apresentou há poucos dias, estabelecendo um calendário obrigatório para as reuniões do Conselho Administrativo da Suframa. Sem tal projeto, continuaremos com nosso desenvolvimento estrangulado, devido a uma simples decisão - não é nem portaria - do Ministro do Planejamento, por exemplo, como já aconteceu no passado. Receba, portanto, minha dupla congratulação, por seu discurso e pelo projeto.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Senador Jefferson Péres, em primeiro lugar, quero agradecer a generosidade de V. Exª quando se solidariza - e não é surpresa para mim - com assunto dessa importância. Tanto em relação ao seu discurso, o qual terei prazer em permanecer neste plenário para ouvi-lo, quanto ao projeto que está na Comissão de Assuntos Econômicos, uma vez que V. Exª dela é integrante, tenho certeza de que o Senador Pedro Piva, com sua costumeira e devida atenção, encontrará uma forma de o projeto tramitar com agilidade.

Um ponto do aparte de V. Exª precisa ser destacado: quando o chamado “segundo escalão” ou até o “primeiro” se insurge contra a Zona Franca de Manaus, parecendo digladiar-se com o Presidente da República. O Presidente Fernando Henrique Cardoso, no seu caminhar pela reeleição, esteve em Manaus e, em discurso em praça pública, fez questão de registrar, ainda esta vez, que a Zona Franca de Manaus era intocável.

Não sei, no fundo, quem é que comanda o País: se é Sua Excelência, na palavra de honra que assumiu perante os amazonenses, não só os que lá nasceram, mas também os que para lá foram e fizeram dali seu segundo torrão natal, ou se são aqueles outros, que são subordinados e que, portanto, podem ser exonerados a qualquer instante, que ficam tecendo declarações nitidamente desrespeitosas ao Presidente da República.

Queria, Sr. Presidente, colocar essa matéria no plano jurídico-constitucional e já o fiz, para que, amanhã, não venham aqueles que pensam que a Constituição tem de ser transformada num canteiro de obras para mutilá-la a todo e qualquer instante. Desta tribuna, tenho a certeza de que, com a companhia do eminente Senador Jefferson Péres, formaremos uma barreira. Nem S. Exª, nem eu temos interesse imediato na Zona Franca de Manaus, porque não somos advogados de nenhuma empresa, não somos sócios-cotistas, portanto estamos à vontade para defendê-la, sem que alguém possa levantar dúvidas. E o fazemos simplesmente porque hoje 97% da receita daquele Estado está na Zona Franca de Manaus e seria simplesmente colocar uma placa: “Fechado para balanço”.

De modo, Sr. Presidente, que voltarei a esta tribuna. E, na seqüência, das voltas, tantas sejam elas, eu, que dou suporte político ao Presidente em determinadas questões, serei um opositor ferrenho se tentarem mexer nos incentivos fiscais da Zona Franca de Manaus.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/10/1998 - Página 13539