Discurso no Senado Federal

ANALISE DO PROGRAMA DE AJUSTE FISCAL, A SER IMPLEMENTADO PELO GOVERNO LOGO APOS O 2 TURNO DAS ELEIÇÕES.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • ANALISE DO PROGRAMA DE AJUSTE FISCAL, A SER IMPLEMENTADO PELO GOVERNO LOGO APOS O 2 TURNO DAS ELEIÇÕES.
Aparteantes
Carlos Bezerra, José Eduardo Dutra, Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DSF de 16/10/1998 - Página 14070
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • APREENSÃO, DIFICULDADE, GOVERNADOR, PREFEITO, CANDIDATO ELEITO, ESTADOS, MUNICIPIOS, MOTIVO, AJUSTE FISCAL, ANUNCIO, GOVERNO, COMBATE, CRISE, ESPECIFICAÇÃO, PAGAMENTO, DIVIDA PUBLICA.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, POLITICA, REDUÇÃO, AUTONOMIA, RECURSOS, ESTADOS, MUNICIPIOS, ESPECIFICAÇÃO, AMPLIAÇÃO, FUNDO DE ESTABILIZAÇÃO FISCAL.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senadora Marina Silva, a nossa sorte é que o nosso País é privilegiado, pois tem riquezas incomensuráveis e permite, apesar de todas as dificuldades, que seu povo sobreviva.  

Digo isso, porque V. Exª faz um relatório da vitória do Governador do Acre, pelo Partido dos Trabalhadores. Mas quero ressaltar, de imediato, as enormes dificuldades que os Governadores e Prefeitos do nosso País terão a partir do próximo dia 30 de outubro.  

O Governo Fernando Henrique Cardoso pretende apresentar o seu ajuste fiscal, que visa resolver os problemas que o próprio Governo criou, relativos ao pagamento dos serviços das dívidas externa e interna brasileiras. Esse ajuste fiscal caminha no sentido contrário daquilo que, durante toda a vida, defendemos como políticos neste Congresso Nacional: esse ajuste evidentemente prejudica, de maneira extremamente forte, os Estados e os Municípios do nosso País.  

Tenho pena das pessoas que vão governar os Estados brasileiros e dos nossos Prefeitos municipais, porque uma das idéias do Governo Fernando Henrique Cardoso que são noticiadas pela imprensa, mas que não são ditas por Sua Excelência ou por seus Líderes nesta Casa é o aumento do percentual do Fundo de Estabilização Fiscal. Hoje, o Governo Fernando Henrique Cardoso manipula 20% de todos os recursos constitucionais que estão no orçamento. Ele retirou 20% dos repasses do Fundo dos Estados; 20% do Fundo dos Municípios; e 20% dos recursos de desenvolvimento das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste do nosso País.  

Agora, a imprensa noticia que o Presidente Fernando Henrique Cardoso apresentará o seu pacote fiscal no dia 20 de outubro. Não acredito que Sua Excelência tenha coragem para isso. Na verdade, o Presidente vai deixar passar o segundo turno das eleições, disputado por vários candidatos do PSDB. Só depois de concretizado o resultado das eleições, o Presidente apresentará o seu plano de ajuste fiscal. Na verdade, Sua Excelência não fará isso agora. Eu até o desafio a fazer isso antes das eleições, mas, com certeza, Sua Excelência não o fará.  

Caminha o Presidente numa direção inversa daquela pela qual, a vida inteira, lutamos neste Congresso Nacional. Senador Ronaldo Cunha Lima, eu, que já fui do PMDB, e todos os Parlamentares que, há muitos anos, estão nesta Casa sempre defendemos o fortalecimento dos Municípios e dos Estados brasileiros, para que tivessem recursos, e, aplicando-os melhor, poderiam inclusive alcançar independência política.  

É muito mais fácil um prefeito definir o que deve ser construído na sua cidade, contratar empreiteiras locais e pagar essa despesa do que esperar que o Governo Federal ou que o Governo do Estado vá ao Município para fazer as obras necessárias.  

Foi com esse objetivo que trabalhamos duro na Constituição de 1988. Obtivemos vitórias espetaculares, tais como a garantia de 47% dos recursos do Imposto de Renda e do Imposto Sobre Produtos Industrializados para serem distribuídos desta maneira: 21,5% para os Estados brasileiros - é o fundo do Estado; 22,5% para os Municípios - antes da Constituição de 1988 tínhamos 17%; e os 3% restantes para o Fundo Constitucional do Norte, que criamos para acelerar o desenvolvimento do Nordeste, do Norte e do Centro-Oeste. No entanto, há algum tempo o Presidente Fernando Henrique criou o Fundo de Estabilização Fiscal. Tomou 20% de todo esse recurso para gastar como bem entender. Sabemos que a maior parte desse dinheiro foi utilizada para pagar serviço da dívida interna e da dívida externa brasileira. E vou antecipar: quando vier o ajuste fiscal - alerto todos os Governadores e Prefeitos do Brasil - o Presidente Fernando Henrique vai aumentar o Fundo de Estabilização Fiscal para 40%. O Presidente manipulou em 1998 R$34 bilhões, segundo levantamento da revista Veja. Ora, aumentando para 40% vai manipular R$68 bilhões, o que significa um prejuízo inaceitável para os Estados e Municípios brasileiros.  

O pior de tudo, Sr. Presidente, é que se o Presidente Fernando Henrique utilizasse esses recursos devidamente, fazendo as coisas de maneira igualitária, poderíamos até concordar. Mas grande parte desse dinheiro, como disse, destina-se ao pagamento dos serviços da dívida; outra parte é para fazer a sua política pessoal, a política da dependência. Sr. Presidente, Senador Ronaldo Cunha Lima, quando o PMDB quis lançar um candidato à Presidência da República do Brasil, todos os Governadores, sem exceção, levantaram-se contra essa tese. Por quê? Os Governadores, hoje, já estão de pires na mão, não sobrevivem sem ajuda política do Governo do Estado. Nos Municípios acontece o mesmo. O repasse do ICMS era de 20%. Mediante a Constituição de 1988, aumentamos para 25%, para que os Municípios tivessem mais força. Agora vem o Presidente querendo diminuir, querendo reduzir essa possibilidade.  

Portanto, Senadora Marina Silva, pertencendo o Governador do Acre ao Partido dos Trabalhadores, tenho dó em pensar o que lhe vai acontecer. Até em relação a emendas, nós, da Oposição, temos problemas. Sabe-se que temos direito a apresentar emendas ao Orçamento da União no valor de R$1,5 milhão e sabe-se também que essas emendas só saem por troca de votos. As emendas dos Senadores e dos Deputados de Oposição não são atendidas. Nesses quase quatro anos que estou no Senado da República, não consegui liberar mais do que 20% das emendas que propus ao Orçamento da União. E é uma perseguição nítida e clara aos que são da Oposição. Às vezes, nós, que temos o mesmo direito que tem um Senador da base do Governo, para conseguirmos liberar uma verba, precisamos fazer um apelo, um pedido a um líder do Governo, utilizando a amizade, utilizando o entendimento.  

Portanto, entre os muitos defeitos do ajuste fiscal, quero de imediato fazer esse alerta aos Governadores e Prefeitos do nosso Brasil.  

O Sr. Carlos Bezerra (PMDB-MT) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O Sr. Roberto Requião (PMDB-PR) - Senador, permite-me um aparte?  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Concedo o aparte ao Senador Carlos Bezerra, que havia pedido antes, e depois a V. Exª, Senador Roberto Requião.  

O Sr. Carlos Bezerra (PMDB-MT) - Nobre Senador, V. Exª trata de um dos assuntos mais sérios deste País, que é a centralização de recursos do Governo Federal. Esse não é um problema novo, é secular; nasceu com a formação do Brasil, nasceu com as capitanias hereditárias, com o Rei, e essa cultura é mantida até hoje infelizmente. Acredito que este é o maior problema deste País: a centralização de recursos. Hoje, com todos esses avanços que V. Exª mencionou no seu discurso, a União ainda fica com cerca de 60% dos recursos arrecadados no País. Fiquei feliz ao ouvir ontem uma declaração do Presidente da Câmara, Deputado Michel Temer. S. Exª pretende apressar a votação da reforma tributária, começando ainda esse ano. Isso, a meu ver, é de transcendental importância para o País. Penso que é o momento, nobre Senador, aproveitando a votação da reforma tributária, de melhorarmos a situação dos Municípios e dos Estados. Verdadeiramente, o que V. Exª afirmou tem inteira veracidade. A União, como sempre, quer trazer os Estados e Municípios dependentes de si, para manter o controle político. Os militares aprofundaram esse aspecto violentamente, a partir da ditadura militar de 1964. Saímos da ditadura, demos alguns passos no sentido de dar maior autonomia aos Estados, aos Municípios, mas estamos patinando na areia. Não vamos a lugar nenhum. Os avanços são muito fracos, muito tênues, e o poder do Governo central hoje é tão grande ou maior do que aquele da época da ditadura militar - creio até que é maior; talvez hoje o Governo tenha muito mais poder do que na época dos militares. Então, nobre Senador, está na hora de os Municípios, os Estados, as Bancadas formarem uma grande frente municipalista, uma grande frente pela autonomia dos Estados, e aproveitarem o ensejo da iminente votação da reforma tributária para fazer justiça aos nossos Estados e aos nossos Municípios. Países do mundo inteiro, bem menores que o Brasil - Itália, Suíça, França, Alemanha - são altamente municipalistas. Todas as decisões passam pelos Municípios. No entanto, nós, que somos um gigante, uma país enorme, continental, centralizamos tudo em Brasília. Um Prefeito para construir um posto de saúde ou uma escola, para comprar uma ambulância tem que vir a Brasília, de pires na mão, e levar o Deputado e o Senador a tiracolo para conseguir um parco recurso para aplicar em seu Município. Isso é catastrófico em um País subdesenvolvido e grande como o nosso, que precisa desenvolver-se urgentemente e gerar empregos para milhões de jovens que todo ano passam a integrar a massa trabalhadora. Parabenizo V. Exª pela sua fala e concito os nobres Pares para lutarmos por uma reforma tributária que realmente venha fazer justiça aos Estados e Municípios brasileiros. Muito obrigado.  

O SR. ADEMIR ANDRADE - (Bloco/PSB-PA) - Agradeço a V. Exª pelo aparte. A reforma tributária pretendida pelo Governo objetiva consolidar o poder central, colocando mais recursos na mão do Governo Federal. E pior: atualmente...  

O Sr. Carlos Bezerra (PMDB-MT) - Quem vai votar somos nós, Senador. Não é possível que todo o Congresso fique subjugado a isso.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Exatamente. É bom fiquemos alerta a isso.  

Devemos chamar a atenção também para o fato de o Governo ter municipalizado todos os serviços, mas não ter repassado aos Municípios os recursos devidos para essa finalidade. Foram liquidadas instituições federais, como a Fundação Nacional de Saúde, a SUCAM. Todo esses serviços, então, estão sendo prestados pelo município. Entretanto, os recursos que são repassados pelo Sistema Único de Saúde não atendem às dificuldades de cada um. Assim acontece nos setores da saúde e educação: passa-se a responsabilidade ao Município, mas os recursos não são repassados. É impossível aceitar isso. É impossível aceitar também o aumento do percentual do Fundo de Estabilização Fiscal de 20% para 40%.

 

Ouço V. Exª, Senador Roberto Requião.  

O Sr. Roberto Requião (PMDB-PR) - Senador Ademir Andrade, em primeiro lugar queria cumprimentá-lo pelo prestígio que V. Exª goza junto ao Governo Federal. V. Exª conseguiu liberar 20% de suas emendas. Quero dizer a V. Exª que a minha situação não é igual a sua, pois não consegui liberar nenhuma emenda. Por outro lado, eu gostaria de reiterar a sua crítica ao ajuste fiscal, que, na verdade, é uma fantasia que se está realizando no momento. São propostas criativas e absolutamente ineficazes. O Governo Federal resolveu cortar algumas passagens aéreas. Falta que sugira ao Congresso Nacional que dê passagem de ônibus aos Parlamentares para virem de seus Estados a Brasília. D. Maria, de Taguatinga, diarista em minha casa, hoje pela manhã, me sugeria: "Senador, que tal se o Presidente arrendasse o Palácio da Alvorada a um buffet e fosse morar no Hotel Nacional? Seria um extraordinário corte de despesas". Mas isso só cabe na cabeça de D. Maria, de Taguatinga. Outra medida extremamente criativa foi a do futuro Ministro Mendonça de Barros, que resolveu fazer cortes nas despesas de viagens internacionais, debitando a sua conta para uma empresa espanhola de telefonia.... Por aí vai esse festival de besteiras que assola o País. A última peça desse festival é o ajuste fiscal. O Presidente não morará mais no Palácio da Alvorada, os Parlamentares virão a Brasília de nibus e o ajuste fiscal é uma brincadeira monumental diante de um País que possui juros de 40% ao ano. Não há ajuste fiscal que resolva nem sequer uma parcela da conta de juros da dívida mobiliária interna e da dívida externa do Brasil. Estamos voltando exatamente à proposta inicial de Fernando Henrique, defendida com clareza nos seus livros antigos. É a tese de que a dependência, ao contrário do que os "dependentistas" imaginavam, não traz ao País o retrocesso, mas liquida a burguesia nacional que o Presidente considerava atrasada - isso está escrito textualmente, ipsis literis , nos seus livros - e a substitui por uma burguesia internacional avançada. Na verdade, o Presidente é o exterminador da burguesia brasileira. Exterminou primeiro a burguesia rural, que surgiu para equilibrar contas quando do estímulo do Governo à agricultura no momento do processo de importações da década passada, e agora liquida a burguesia industrial. Fala-se em necessidade de novos investimentos no País, mas ontem, eu e o Senador Josaphat Marinho, tivemos a oportunidade de conversar com alguns economistas, e Décio Munhoz nos chamava a atenção para o fato de que 25% da capacidade industrial brasileira é ociosa. Recuperar essa capacidade industrial se realiza simplesmente com a diminuição dos impostos internos. E, para que o Senador tenha idéia do que significa 25% da capacidade industrial, digo que significa um valor ao redor de R$250 bilhões em investimento. É um investimento já feito, que bastaria ser viabilizado com a queda dos juros e uma política industrial razoável que o País não conheceu até hoje. Então, estamos diante de uma farsa! Não existe nenhuma possibilidade de o ajuste fiscal e os cortes no salário dos funcionários resolverem este problema. E ainda condenamos o Presidente do STJ, que, a meu ver, nada mais fez do que interpretar literalmente o dispositivo constitucional que estabelece o teto salarial. O Presidente do STJ, embora inoportuno do ponto de vista do aumento de despesas, interpretou a Constituição literalmente. Não há possibilidade de outra interpretação quanto à vinculação dos salários, e ela é auto-aplicável. É evidente que, para modificar o salário mais alto, precisamos da participação dos três poderes, do Legislativo, do Executivo e do Judiciário, mas, enquanto não se modifica, o número é o aquele estabelecido pela política salarial do próprio Judiciário. É o valor de R$10.700, que é o salário dos Ministros e que deve também orientar a composição dos salários dos juizes. Então, estamos vivendo um período de notícias, de factóides, que espero que não termine com o vaticínio da Dona Maria, de Taguatinga, com a mudança do Presidente da República, num gesto de rara austeridade, para o Hotel Nacional e o aluguel do Palácio da Alvorada a um buffet de Brasília.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Agradeço a V. Exª.  

Eu fazia referência, Senador Roberto Requião, apenas a um dos pontos pretendidos no ajuste fiscal pelo Governo Fernando Henrique, que é a questão da ampliação dos recursos do Fundo de Estabilização Fiscal, medida que vai prejudicar enormemente os municípios, os Estados e o Fundo de Desenvolvimento das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste do nosso País. É evidente que condeno, porque o Fundo está baseado em duas situações: uma é a redução de despesas - e aí o Senador Roberto Requião fez alguns comentários -, mas há outras muito mais graves na área da saúde e da educação.  

O Sr. Roberto Requião (PMDB-PR) - Não só graves, Senador, mas absolutamente ineficazes diante da conta de juros.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Talvez o Presidente queira estar apresentando à sociedade uma idéia falsa da nossa realidade, isto é, querendo dizer que vai conter, que está certo em conter. Tanto é verdade, que ganhou a eleição porque passou uma imagem falsa. Na verdade, o povo não conhece profundamente o que está acontecendo. O povo acredita porque a moeda está estabilizada e não se dá conta do que está por detrás de tudo isso. Mas nós, do Congresso Nacional, vamos ter a responsabilidade de aprovar ou não essas medidas, embora sabemos que o Presidente Fernando Henrique tem condições de tomar muitas medidas sem passar pelo Congresso. Segundo levantamento feito pela Revista Veja, o Presidente pode reduzir o gasto público a R$10,2 bilhões sem que haja nenhuma manifestação nossa ou necessidade de nos consultar. Mas ele vai terá que fazê-lo, por exemplo, para passar às suas mãos, para seu controle pessoal, mais R$34 bilhões do Fundo de Estabilização Fiscal; terá que fazê-lo também para aumentar os impostos que pretende, que é outro ponto do ajuste fiscal. Estão aí incluídos uma série de impostos: imposto de renda da pessoa física, imposto sobre o cheque - a CPMF, que quer passar de 0,2 para 0,3% -, o aumento da contribuição previdenciária do servidor público, já massacrado por quatro anos seguidos sem aumento, e o imposto sobre as grandes fortunas - espero que venha desta vez, já que sempre defendemos nesta Casa.  

Espero que o Governo, Senador Antonio Carlos Magalhães, não mande a mensagem de ajuste fiscal, deixando a cobrança de imposto sobre grandes fortunas para a Oposição ter como ponto de negociação, porque isso não vai fazer com que aprovemos pontos com os quais concordamos. Há, portanto, uma série de responsabilidades, há coisas gravíssimas que vão ser expostas a partir do dia 25 - o Governo Fernando Henrique lamentavelmente não tem coragem de apresentar esse ajuste fiscal antes do segundo turno das eleições. Está dito, está programado que será dia 20, mas desafio que seja, ele não tem coragem para isso, vai deixar passar a eleição.  

Vamos ter a grande responsabilidade de analisar tudo isso. O Governo está tirando dinheiro dos Estados, dos Municípios, dos fundos constitucionais, está reduzindo gastos do orçamento. Por quê? Para pagar os serviços da dívida? Para pagar os juros que se elevaram para 50% ao ano, quando em qualquer país europeu, qualquer país da Ásia, nos Estados Unidos, os juros daqueles que poupam dinheiro é 4% ao ano? É para isso que estamos sacrificando o povo brasileiro? A nossa sorte é que o Brasil é um país muito rico e muito farto e o povo sempre encontra uma forma de sobreviver, de dar um jeito na vida.  

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Ademir Andrade?  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Ouço V. Exª com muito prazer.  

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Senador Ademir Andrade, gostaria de parabenizar V. Exª por trazer essa questão em debate, já que estamos percebendo que a intenção do Governo e da sua própria base parlamentar é jogar uma cortina de fumaça sobre o que está preparando após as eleições, pois sabem que os candidatos que apoiam poderão ser prejudicados se anunciarem esse pacote antes das eleições do segundo turno. Também estamos percebendo que o Governo vai optar, mais uma vez, pelo caminho que considera mais fácil. O Governo e amplos setores da sociedade vêm falando da necessidade de se fazer uma reforma tributária. No entanto, durante três anos e meio não se teve notícia de qual era o projeto de reforma tributária do Governo, até porque a reforma tributária que interessava ao Governo foi feita, qual seja, a aprovação do Fundo de Estabilização Fiscal, que centralizava ainda mais recursos nas mãos da União em prejuízo principalmente daqueles Estados menos desenvolvidos e que dependem mais das transferências constitucionais do Fundo de Participação dos Estados e dos Municípios. O Governo também aprovou a chamada Lei Kandir, que acabava com a cobrança do ICMS em produtos primários e semi-elaborados. Acho interessante lembrar que os Ministros da área econômica vêm ao Senado, ao Congresso Nacional, fazem promessas mirabolantes e fica por isso mesmo. Se buscarmos as palavras do Ministro Kandir nas notas taquigráficas, quando fez a exposição na Comissão de Assuntos Econômicos, antes da votação da lei que acabou levando o seu nome, vamos verificar que ele dizia textualmente que com a aprovação daquela lei o Brasil se transformaria em uma máquina de exportações e que o sinal da balança comercial iria ser revertido. Naquela ocasião a balança apresentava um déficit de R$1,2 bilhões, mas poderia transformar-se em superávit. Aprovou-se a lei e o déficit passou para R$6 bilhões. No entanto, o Ministro Kandir continuou Ministro, apenas se afastando para para eleger-se Deputado e, possivelmente, voltar a ser Ministro. O Governo também anuncia o aumento da CPMF, a cobrança da contribuição previdenciária para os inativos, assunto que já foi rejeitado categoricamente por três vezes na Câmara dos Deputados, mas o Governo não acena com nenhuma cobrança sobre aqueles que pode pagar impostos neste País e não pagam. Quando os Ministros Antonio Kandir e Pedro Malan vieram a esta Casa, neste mesmo plenário, em uma manhã de sábado, em novembro do ano passado, insisti em uma pergunta que já havia sido feita pelo Deputado Haroldo Lima, qual seja, dentre as 51 medidas daquele pacote quais estavam voltadas para taxar o sistema financeiro, mas eles não responderam. O fato é que este Governo reduziu a contribuição sobre o lucro líquido dos bancos - que no Governo Itamar Franco era de 25% - para 13%. Também fez um imenso

marketing com a mudança na lei do ITR, tendo contado inclusive com o voto da Oposição, já que dizia que poderia arrecadar R$1 bilhão. Vivemos em um país que tem a maior concentração de terra do mundo, mas que arrecada de ITR o equivalente ao que a Prefeitura do Rio de Janeiro arrecada de IPTU no bairro de Copacabana. Sendo assim, como pode falar em aumentar ainda mais a cobrança de impostos daqueles setores que já pagam e não têm mais como pagar e deixa que aqueles que realmente poderiam contribuir para o desenvolvimento do País não paguem. Já que estão falando tanto em apertar cintos, por que o setor financeiro continua tendo alíquotas de pai para filho, assim como também os grandes proprietários rurais? O Governo, mais uma vez, vem com o discurso de que a sociedade deve contribuir para solucionar a crise, mas temos que considerar o que já foi levantado pelo Senador Roberto Requião e também por V. Exª, ou seja, que não adianta aumentar imposto de quem quer que seja porque da forma como estão os juros todo o dinheiro vai pelo ralo dos juros da dívida interna. Este Governo conseguiu ser inserido no livro Guiness dos recordes, pois o Brasil, em 494 anos de existência, acumulou uma dívida interna de R$65 bilhões - valor da dívida interna quando o Presidente Fernando Henrique Cardoso assumiu a Presidência -, mas em quatro anos foi elevada para R$300 bilhões. Pelo menos essa façanha o nosso Presidente já conseguiu: vai ter o seu nome gravado no livro dos recordes por ter aumentado para tal índice a nossa dívida interna. Insistimos para que o Governo venha às claras e apresente suas propostas antes das eleições. Não adianta nos cobrar apoio em medidas amargas para alguns setores, particularmente a classe média, enquanto outros setores que não pagam imposto no Brasil continuem a não pagar. Também não adianta levantar a questão do Imposto sobre Grandes Fortunas como moeda de barganha; até porque se trata de um projeto do então Senador Fernando Henrique Cardoso. Se esse imposto for colocado em votação, nós, da Oposição, vamos votar a favor, sem cobrar nada, sem estabelecer nenhuma barganha, sem qualquer restrição, apesar de ser um projeto de Fernando Henrique Cardoso. Vamos votar a favor, mas também vamos taxar os ricos deste País. Muito obrigado.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Agradeço a V. EXª, Senador José Eduardo Dutra, e quero dizer que a Lei Kandir causou um enorme prejuízo à Nação brasileira. Essa lei representa um desestímulo à industrialização do nosso País, porque quando nós, na Constituição de 1988, estabelecemos que os produtos primários e os semi-elaborados deveriam pagar ICMS aos Estados, queríamos com isso estimular o processo de industrialização dentro do nosso território. O Brasil talvez seja o país que mais exporta produto primário e semi-elaborado no mundo. A nossa pauta de exportação atinge 52% do seu valor econômico em produto semi-elaborado e produto primário. Quer dizer, produtos que deveriam estar sendo elaborados em nosso território estão gerando emprego e renda para outros.  

Há um projeto de minha autoria tramitando neste Senado da República, revogando a Lei Kandir, mas que, lamentavelmente, continua parado na Comissão de Assuntos Econômicos nesta Casa.  

Concluo, agradecendo a atenção dos Srs. Senadores, dizendo que todos nós devemos refletir profundamente sobre as medidas do ajuste fiscal, quais as razões desse ajuste fiscal, a que se destina o dinheiro que o Presidente Fernando Henrique pretende com o aumento dos impostos e com a redução das despesas, tendo mais controle sobre os recursos da União, que pertencem a Estados e Municípios e que passarão para a mão de Sua Excelência, a fim de que tenhamos a responsabilidade de votar, pensando nos prefeitos e governadores do Brasil.  

Quero dizer também que ainda não falei sobre o processo eleitoral do meu Estado, onde fui candidato a Governador, porque estou esperando o término do segundo turno. Como não estou apoiando nenhum dos dois candidatos, prefiro deixar para fazer uma análise daquele processo eleitoral e do resultado daquelas eleições após a realização do segundo turno.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

R K oÀ Xà PW Xà eitoral, todavia, coerente com minha permanente defesa do progresso político-social do povo acreano, renovo o mais sincero desejo de que o Dr. Jorge Viana faça uma boa administração à frente do Governo do Estado do Acre e que o Dr. Tião Viana tenha, no Senado Federal, uma atuação compatível com a confiança nele depositada por expressiva parcela da sociedade acreana. A SRª. MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Agradeço o aparte de V. Exª. Sei que V. Exª está torcendo para que as metas e as propostas do programa do Governador eleito, Jorge Viana, sejam realizadas e que também contribuirá, como Senador da República, para que isso ocorra. Tenho convivido com V. Exª durante esses quatro anos e já havia tido a oportunidade de tê-lo como Governador do Estado na época em que eu era dirigente sindical, ligada à Central Única dos Trabalhadores. Sei que V. Exª tem um legado à história política do Acre e, como sempre, continuará contribuindo, ainda que com um governo que, conforme acaba de dizer, não é aquele para o qual V. Exª estava fazendo campanha. Com certeza, o Governador Jorge Viana conta com o apoio de V. Exª. Para concluir essa parte em que me refiro à vitória das candidaturas de Jorge Viana, de Tião e de Lula, na capital do Estado do Acre, talvez para passar a V. Exªs o quanto me sinto agradecida a Deus por tudo isso, gostaria de parodiar a bela canção de Zeca Baleiro, dizendo o seguinte: "essa vitória me faz ficar tão à flor da pele, que qualquer lampejo de estrelas me faz chorar, e o meu desejo se confunde com o desejo de fazer". É tão grande a responsabilidade que temos, que essa vitória me parece ter o fogo do Juízo Final. O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senadora Marina Silva? A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Ouço V. Exª, nobre Senador José Eduardo Dutra. O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Senadora Marina Silva, gostaria de me congratular com V. Exª pelo resultado das eleições no Acre. Ele confirma que a vinda de V. Exª para o Senado Federal, há quatro anos, não foi obra de um mero acaso, mas a comprovação de um trabalho político sério, competente e conseqüente que vem sendo desenvolvido pelo nosso Partido no Estado do Acre. À distância, parece-nos que está acontecendo no Acre uma verdadeira revolução democrática, pacífica e permanente, com uma evolução muito grande da consciência política dos moradores daquele Estado. O Acre, ao longo do tempo, foi manchete, no Brasil e no mundo, por fatos trágicos tanto para a causa progressista, quanto para a própria humanidade, com assassinatos de fundo político, com figuras políticas daquele Estado destacadas nas páginas policiais. O que estamos vendo é uma mudança profunda no quadro político daquele Estado, com a contribuição decisiva de V. Exª. Tenho certeza de que o companheiro Tião Viana, que virá para esta Casa representar o Estado do Acre na condição de Senador da República, exercerá um mandato tão brilhante quanto o que V. Exª vem desempenhando nesses quatro anos. O companheiro Jorge Viana, como Governador daquele Estado, já embasado na sua experiência vitoriosa como Prefeito da Capital - S. Exª deixou o Governo com índices altíssimos de aceitação -, repetirá esse desempenho à frente do Governo do Estado. Gostaria de parabenizar V. Exª e de expressar nosso júbilo, dizendo que temos certeza de que essa revolução democrática, pacífica e conseqüente continuará desenvolvendo-se no Estado do Acre. Muito obrigado. A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Agradeço o aparte de V. Exª. Realmente, o trabalho que vem sendo realizado no Estado do Acre já dura mais de 20 anos; envolveu uma rede de organizações não-governamentais, associações, cooperativas, comunidades de base. Na sua tessitura, tem a força do movimento social organizado e a participação de lideranças. Não é algo que acontece esporadicamente, como um fenômeno; é algo construído, que representa, portanto, a conquista de muitas pessoas em todos esses anos de muito trabalho e dedicação. Tenho a felicidade de dizer que o grande homenageado de tudo isso foi aquele que nos inspirou e que levou muitos para o Partido dos Trabalhadores ou para a luta social: o nosso saudoso Chico Mendes. Ele não está mais conosco, mas permanece entre nós pelos sonhos que sonhou e nos ensinou a sonhar. Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda gostaria de me referir ao processo político-eleitoral, de fazer uma breve observação sobre as eleições no plano nacional. Primeiramente, o fato de não ter havido segundo turno nas eleições presidenciais não deve dar ao eleito, o Presidente Fernando Henrique Cardoso, a sensação de que recebeu um cheque em branco da sociedade brasileira. Pelo contrário, grande parte da população manifestou seu descontentamento com a forma como os problemas vêm sendo enfrentados; foi às urnas e quase garantiu o segundo turno para o candidato da Oposição, Luiz Inácio Lula da Silva. Outro aspecto é que, diferentemente das eleições passadas, quando as pessoas foram às urnas fazendo uma verdadeira apologia das ações que vinham sendo levadas a cabo pelo então Governo Itamar Franco, principalmente no plano econômico, desta vez elas tinham a sensação de que aqueles que estavam como co-gestores da crise - já em processo de desenvolvimento - deveriam continuar a operá-la. Uma boa parte, no entanto, teve a coragem de dizer que não desejava que eles permanecessem. Diferentemente do que ocorreu em outros países, o Brasil preferiu que os co-gestores da crise continuassem a dirigir os rumos do País. Mas - repito - isso não significa um cheque em branco para o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Se, por um lado, o Presidente foi autorizado a continuar operando a crise, a Oposição também continuará a fiscali

zar e a fazer um contraponto ao que vem sendo realizado pelo atual Governo. O crescimento da Oposição é significativo, tanto é que, na Câmara dos Deputados, passamos de 96 Parlamentares para 109. Além disso, temos um saldo de cinco candidaturas de Oposição para o segundo turno no País. No caso do Estado do Amapá, se ganhar o Governador Capiberibe ou o seu oponente, que é do PDT, o Governo será de Oposição, o que é muito significativo no momento em que estamos vivendo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/10/1998 - Página 14070