Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM AO DIA DO PROFESSOR.

Autor
Emília Fernandes (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM AO DIA DO PROFESSOR.
Publicação
Publicação no DSF de 16/10/1998 - Página 14084
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, PROFESSOR, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ELOGIO, TRABALHO, EDUCAÇÃO, PRECARIEDADE, CONDIÇÕES DE TRABALHO, NECESSIDADE, AUTORIDADE, SOCIEDADE CIVIL, VALORIZAÇÃO, MAGISTERIO.
  • PARTICIPAÇÃO, ORADOR, ENCONTRO, CORPO DOCENTE, AMERICA LATINA, SOLICITAÇÃO, REGISTRO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, DENUNCIA, COMPROMISSO.

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje, 15 de outubro, é o Dia dedicado ao Professor.  

Particularmente, este dia está identificado com lembranças, compromissos, saudades, esperanças, conscientização, acertos e erros, fé, utopia e realidade... Por isso quero, nesta data, dirigir-me aos meus colegas professores de todo o nosso País, em especial aos do meu Estado, o Rio Grande do Sul.  

Quero aproveitar este espaço para homenagear cada um, nesta data, como retribuição ao esforço, à luta, à garra, ao sacrifício e até mesmo à altivez com que buscam desempenhar a profissão de educar, apesar das dificuldades que enfrentam no dia-a-dia das escolas, nas salas de aula, muitas vezes esquecidos, menosprezados e até mesmo profundamente desencantados.  

Porém, quero, acima de tudo, aproveitar para fazer uma reflexão sobre a situação dos trabalhadores em educação, especialmente professores e funcionários de escolas, e também sobre a educação em geral.  

É importante que neste dia, em que as atenções estão centralizadas nessa categoria profissional, além do carinho dos alunos e do reconhecimento dos pais, os professores tenham, principalmente, a palavra de solidariedade, de valorização e de respeito profissional, especialmente por parte das autoridades e da sociedade em geral.  

É com esse espírito que, como professora, tendo exercido o magistério durante 23 anos, pela vivência com a educação em escola pública por tantos anos, com militância sindical e experiências de ensino, que vão desde a alfabetização, passando pela administração e supervisão escolar, saúdo a todos os meus colegas do Brasil e do nosso Estado, com os quais direta ou indiretamente trabalhamos durante tanto tempo por uma educação de qualidade e pela valorização da nossa categoria profissional.  

O saber, para mim, é o maior desafio deste final de século. Educação ainda é uma das poucas grandes esperanças da nossa época.  

Paralelamente a essa confiança depositada na educação, é generalizada, hoje em dia, a convicção de que este não pode ser encarado como um sistema isolado no tempo e no espaço, a existir em uma espécie de vácuo social ou território neutro, alheio às transformações sociais, econômicas, políticas, científicas, tecnológicas e culturais de cada país e do mundo.  

Outros pontos que governantes, pensadores e políticos devem ter muito presentes dentro deste contexto de avaliação e de análise é o crescente esvaziamento dos cursos de educação e de formação de professores, pela falta de perspectivas para a profissão do magistério e, acima de tudo, pela desvalorização salarial.  

Dados vêm preocupando a todos os segmentos sociais comprometidos com a educação. Governantes precisam fazer uma leitura mais crítica da realidade e apresentar soluções e tratamentos sérios.  

Se, por um lado, nos preocupa a queda no ingresso de professores, por outro, é triste a expectativa de uma parcela de profissionais que oscila entre o temor e o descrédito, a insegurança e a vontade de recorrer à aposentadoria pela instabilidade e constante pressão que exercem sobre suas atividades.  

Ao longo deste último período da vida nacional, particularmente, ajudamos a construir uma história de luta cotidiana, de mobilização constante e de compromisso renovado a cada momento, seja no âmbito do Senado, da Câmara dos Deputados, dos sindicatos, das associações, dos congressos, das escolas e das salas de aula.  

Apesar de todas as dificuldades, dos baixos salários, das ameaças que pairam sobre a cabeça de cada professor, a cada novo pacote ou medida provisória, os professores, principalmente os da rede pública, em todos os níveis, têm não apenas resistido mas avançado em consciência, organização e disposição de ultrapassar as barreiras.  

A educação, como um todo, diante dos desafios que estão postos não pode ser analisada de forma isolada do contexto econômico e político. E, portanto, desvincular esse debate é, sem dúvida, um equívoco muito grande, é um erro estratégico e político que a nenhum governante se permite incorrer.  

Além de garantir o acesso à educação para todos, bem como de um ensino de qualidade, o País precisa assegurar mercado de trabalho para os jovens, com as devidas condições de aproveitamento das capacidade aprendidas ou desenvolvidas sem o que o processo de ensino terá permanecido elitista, excludente e ineficaz. Para isso, as mudanças no processo educacional devem estar integradas com um grande debate nacional que resulte na adoção de uma política econômica que combine desenvolvimento com soberania política, valorização dos direitos sociais e democracia.  

Diante disso, é fundamental que o discurso oficial a respeito da melhoria da qualidade do ensino contemple a valorização dos professores que passa por salários dignos, estímulo e aperfeiçoamento.  

Educação, infelizmente, ainda rima com exclusão, desmotivação e até mesmo eleição, quando, na verdade, deveria ser sinônimo de integração, libertação, participação e revolução.  

Não podemos continuar olhando a educação como um subproduto desta política econômica que se implanta, que avassala, que exclui e que, principalmente, impõe ao País, cada vez mais, um discurso que não condiz com as ações que são praticadas no dia-a-dia nos Estados e no País como um todo.  

É por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que estamos aproveitando esta data para conclamar o Congresso Nacional, os professores em geral e a sociedade como um todo para que se unam nesta grande luta em defesa da educação e, principalmente, dos seus sujeitos: professor, alunos, pais e comunidade.  

Queremos, também, nesta oportunidade em que lembramos os nossos colegas professores, registrar um evento, do mais alto significado, transcorrido neste ano, do qual, inclusive, participamos. Refiro-me ao Encontro de Equipes Docentes da América Latina, realizado na Bolívia, de 5 a 11 de janeiro deste ano. Lá estiveram professores cristãos de escolas públicas de vários Países como a Venezuela, Uruguai, República Dominicana, Peru, Paraguai, México, Honduras, Estados Unidos, Equador, Colômbia, Chile, Bolívia, Argentina e Brasil, e ainda a presença de observadores e professores cristãos da Índia e da França.  

Desse encontro retirou-se uma declaração das Equipes Docentes da América Latina que gostaríamos que fosse registrado nos Anais desta Casa como caminho, como luz, mostrando a todos os professores do nosso País as preocupações, as denúncias e os compromissos assumidos por todos aqueles que lá estiveram.  

Os delegados das equipes docentes, professores cristãos das escolas públicas da América Latina, denunciam o modelo de sociedade sustentado em injustas estruturas sociais, econômicas e culturais, que não respeitam nem as nações, nem as culturas, nem as pessoas nem o Criador; que fomenta a corrupção do Estado; que destrói uma escola que deveria construir - a partir da educação - uma sociedade crítica, solidária, onde os pobres tenham vida, voz, participação e dignidade; que contrariam o Evangelho, a Boa Nova para todos, a partir dos pobres, nos quais Cristo reconheceu como seus privilegiados.  

Solidarizam-se com as vítimas das injustiças sociais, resultante do atual modelo neoliberal; com os agricultores sem terras; com as crianças exploradas e abandonadas; com as mulheres e homens excluídos e desempregados sem direito à vida. Solidarizam-se com os povos indígenas e com os injustiçados da História. Solidarizam-se com as vítimas dos massacres de todo o mundo.  

E se comprometem fortemente a manifestar permanentemente a sua indignação frente a tudo isso que é uma afronta aos direitos dos seres humanos e da criação. Comprometem-se a recriar a escola pública com todos os agentes da sociedade: professores, pais, alunos, sindicatos, Municípios, instituições da sociedade, autoridades responsáveis pela educação nacional, onde os pobres terão direito a uma educação gratuita, de qualidade, construtora de uma sociedade diferente desta. Comprometem, acima de tudo, a defender a independência e a soberania da América Latina e a combater este modelo neoliberal.  

Esta é a Declaração das Equipes Docentes da América Latina tirado em Cochabamba, na Bolívia, onde se realizou, em janeiro deste ano, o 8º Encontro dos Professores Cristãos das Escolas Públicas.  

Por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a educação, sem dúvida, representa o espaço que permite ver o mundo com suas inquietutes; pode pressupor o sonho como a antecipação da realidade, pode fortalecer a luta contra a inércia e a passividade de atitudes.  

Por meio do saber, do conhecimento, o ser humano retoma suas qualidades superiores. Dotado de inteligência, da capacidade de ver, julgar, agir, pode experimentar, conquistar, manifestar vontades, buscar equilíbrio, transformar.  

Cada professor com suas angústias, decepções, esperanças e história de vida, segue caminhos diferentes, porém, no fundo todos os educadores têm realidades semelhantes e, freqüentemente, bastante fortes.  

Educação tem como critério primar não apenas pelo que o ser humano é, mas principalmente pelo que o ser humano poderá ser. A matéria-prima que a educação trabalha não é metal, papel, argila ou qualquer outro material descartável; são seres em formação, consciências dos novos tempos, daqueles que vão assumir papéis depois de nós. Educação não se faz com propaganda apenas; não se faz com publicidade, mas com qualidade e aperfeiçoamento do seu quadro funcional, com a diminuição do número de analfabetos, que hoje é de 20 milhões. Educação se faz com criança na escola e não nas ruas e no trabalho precoce; educação se faz, alterando-se os dados que apontam que, para cada 100 crianças que entram na 1ª série, 44 concluem o 1º Grau, 20 chegam ao 2º Grau, e apenas 5 conseguem chegar ao ensino universitário.  

Tenho certeza, portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de que esta homenagem que não é apenas minha, mas de todos os Senadores, do Senado Federal como um todo; é de extrema justiça, não apenas pela relevância dos educadores no contexto social, mas pela dedicação, pelo profundo sentimento cívico e pelo amor à profissão, demonstrados cotidianamente nas escolas e, acima de tudo, pelo que significa o educador como agente de transformação, diante dos desafios políticos, econômicos e sociais impostos à sociedade no dia-a-dia.

 

Poucas pessoas não têm um professor ou funcionário da escola — que também é esquecido e desvalorizado — em seu círculo familiar ou de amizade. Eles estão presentes em todos os cantos do País, até nas localidades mais isoladas; desempenham uma função social política importantíssima. Ao mesmo tempo, é importante registrar o posicionamento cívico dos professores, que atuam na luta pela educação e valorização profissional de forma integrada com as demais políticas econômicas e sociais do País.  

Nesse sentido, quero registrar e direcionar a minha homenagem a todos os professores deste País, em especial, aos do meu Estado, que possuem uma militância sindical exemplar. Posso afirmar que boa parte da história do Rio Grande do Sul e do balanço das relações de cidadania e da consciência crítica, hoje tão reconhecida e elogiada em todo País, deriva justamente da forma clara, transparente e consciente com que cada professor age. Deriva, inclusive, da tensão provocada pela luta dos professores nas assembléias, nas ruas, nas praças e até nos embates com os governos.  

Este era o registro, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que gostaria de fazer neste 15 de outubro, dia dedicado ao professor. Que esta data extrapole as salas de aulas, as escolas, o Congresso Nacional, as Assembléias Legislativas, as Câmaras de Vereadores, a ação dos sindicatos e se transforme, realmente, na força que fortalecerá e moverá o mundo nesta virada de século e no novo milênio que se aproxima.  

Muito obrigada.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

´¶


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/10/1998 - Página 14084