Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE INSTITUIÇÃO DA FIDELIDADE PARTIDARIA E DE UM AMPLO DEBATE SOBRE A REFORMA POLITICA.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • NECESSIDADE DE INSTITUIÇÃO DA FIDELIDADE PARTIDARIA E DE UM AMPLO DEBATE SOBRE A REFORMA POLITICA.
Aparteantes
Ademir Andrade.
Publicação
Publicação no DSF de 15/10/1998 - Página 13654
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, DEBATE, PROPOSTA, REFORMA POLITICA, CRIAÇÃO, FIDELIDADE PARTIDARIA.
  • ANALISE, CRITICA, INTERESSE, GOVERNO, URGENCIA, VOTAÇÃO, REFORMA POLITICA, CONGRESSO NACIONAL, INCLUSÃO, DESVIO, CONCEITO, FIDELIDADE PARTIDARIA, TENTATIVA, RESTRIÇÃO, VONTADE, PRERROGATIVA, CONGRESSISTA.
  • APOIO, RELATORIO, AUTORIA, SERGIO MACHADO, SENADOR, REFORMA POLITICA, ABRANGENCIA, FIDELIDADE PARTIDARIA, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, FUNDOS PUBLICOS, IMPEDIMENTO, CONTRIBUIÇÃO, PESSOA JURIDICA, VIABILIDADE, JUSTIÇA ELEITORAL, FISCALIZAÇÃO, PUNIÇÃO, CASSAÇÃO, CANDIDATO, ABUSO, PODER ECONOMICO, DESRESPEITO, LEGISLAÇÃO.
  • COMENTARIO, POSIÇÃO, ORADOR, DEFESA, ADOÇÃO, VOTO DISTRITAL, SISTEMA PROPORCIONAL, ELEIÇÕES.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, ao término do período eleitoral vem à baila, em nosso País, a famosa discussão sobre reforma política e a conseqüente necessidade de aperfeiçoamento de nossas instituições e das regras do processo democrático.

Há no Senado uma Comissão Especial criada para discutir a reforma política, presidida pelo saudoso Senador Humberto Lucena, a qual praticamente concluiu seus trabalhos.

O relatório do Senador Sérgio Machado foi votado e aprovado em cerca de 95%, mas não foi concluído, motivo por que a matéria ainda não foi à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, para se transformar em matéria legislativa formal.

Entendemos, sim, que é necessária uma reforma política em nosso País; mas, uma vez mais, estamos vendo, em função dos interesses imediatos do Governo Federal, que um tema que poderia ser amplamente debatido na Casa, um tema que poderia obter, pelo menos em vários de seus aspectos, o consenso da Casa, com o voto da Oposição, esse tema está sendo agora pinçado, apenas uma parte dele, para atender aos interesses imediatos do Governo. Estão acenando, como urgência para ser votada pelo Congresso Nacional, com a questão da fidelidade partidária. Somos favoráveis à fidelidade partidária. Por meio de vários pronunciamentos, Parlamentares do nosso Partido e da Oposição já explicitaram isso. O problema é o que se entende por fidelidade partidária. Nós queremos a fidelidade partidária para evitar a famosa “dança das cadeiras”, para evitar o que vem ocorrendo na atual legislatura, em que Deputados, ao longo de quatro anos, pertenceram a quatro partidos distintos; para evitar que o Parlamentar seja diplomado por um partido e o troque por outro antes de tomar posse, ou no dia seguinte à posse; para evitar o que aconteceu também nesta legislatura em que mais de cem Parlamentares trocaram de partido.

Agora o Governo, ou pelo menos o que se apresenta pela imprensa como interesse do Governo, quer desvirtuar totalmente o conceito de fidelidade partidária. Essa chamada fidelidade partidária que deve ser votada com urgência, até para facilitar a aprovação de outras matérias de interesse do Governo, na verdade, trata-se de uma cassação das prerrogativas dos Parlamentares. Quer se colocar uma verdadeira coleira em todos os Parlamentares sob o manto da fidelidade partidária; quer definir-se que um Parlamentar poderá até perder o seu mandato caso vote em desacordo com a orientação do Líder do seu partido.

Ora, se for para se estabelecer esse princípio de fidelidade partidária, vamos então instituir o Congresso Nacional composto apenas pelos Líderes, pelo colégio de Líderes: dispensa-se a presença dos demais Deputados e Senadores, porque o resultado final da votação será sempre a soma aritmética da composição das Bancadas. Isso em um País em que os programas partidários são extremamente falsos. Nós nos perguntamos como ficaria a situação do Parlamentar de um partido da base governista - cujo programa, muitas vezes, inclui posições diametralmente opostas àquela que o partido agora está defendendo -, se o Líder decidir pelo voto contrário ao programa do partido, e o Parlamentar votar favoravelmente ao programa e contrariamente à definição do seu Líder? Esse Parlamentar está ameaçado de perder o seu voto? Temos casos concretos que até já foram objeto de votação nesta Casa. O programa do PMDB e o programa do PSDB incluem a defesa do monopólio estatal do petróleo; no entanto, as Lideranças desses Partidos, quando da votação dessa matéria, tanto na Câmara dos Deputados, quanto no Senado, encaminharam favoravelmente à quebra do monopólio. Se existisse esse instrumento, esse conceito draconiano de fidelidade que se está querendo introduzir no Brasil, como ficariam esses Deputados que porventura se dispusessem a respeitar o programa do partido pelo qual se elegeram e desrespeitar a orientação do Líder da sua Bancada? Eles poderiam ser expulsos?

Na verdade, esse tema sobre, o qual é muito importante que o Congresso Nacional se debruce sobre ele, está sendo desvirtuado em função de um interesse imediato do Governo, que - talvez preocupado porque já viu que a sua Bancada de apoio diminuiu a partir das eleições deste ano - já começa a procurar casuísmos para tentar garantir maioria a ferro e fogo. Se vierem com esse conceito de fidelidade partidária, não terão o nosso apoio. E nós, inclusive, os denunciaremos por tentativa de cercear a vontade dos Parlamentares e de inibir o debate nesta Casa.

Se vamos discutir o conceito de fidelidade constante do relatório original do Senador Sérgio Machado, temos grandes condições de marcharmos juntos, de votarmos favoravelmente a essa tese, porque concordamos que realmente não podemos continuar com uma legislação que permite a cooptação fisiológica pelos partidos do Governo em relação aos parlamentares de outras legendas; isso faz com que o retrato, o desenho da Câmara dos Deputados e do próprio Senado Federal ao final de uma legislatura seja completamente diferente daquele do início da legislatura, em um flagrante desrespeito à vontade do conjunto do eleitorado. Se se desejar caminhar na direção desse conceito terá o nosso apoio.

Mas existem outras coisas muito mais importantes do que o conceito de fidelidade partidária - ou pelo menos tão importantes quanto. Uma delas é a questão do financiamento público. Lembro-me que na discussão da Lei Eleitoral, que iria orientar a eleição de 1998, vários Senadores e Deputados disseram textualmente que eram a favor do financiamento público mas que não seria possível votá-lo naquela ocasião porque o assunto não estava suficientemente amadurecido. Mas se comprometeram a votá-lo já para as próximas eleições. Então está na hora de se votar o financiamento público.

Essa é uma forma de pelo menos diminuir um ponto abordado aqui quando do discurso do Senador Lúcio Alcântara sobre pesquisas, particularmente em aparte do Senador Roberto Requião, que ressaltava a grande influência das pesquisas não só na indução do voto do eleitor, mas também junto às contribuições de campanha: aqueles candidatos que tinham índices mais baixos de pesquisa recebiam menos contribuição.

Defendemos que, a partir da próxima eleição, o financiamento da campanha eleitoral seja feito exclusivamente com recursos públicos e recursos de contribuições de pessoas físicas. Defendemos que se acabe com essa contribuição de pessoas jurídicas, de grandes empresas, em primeiro lugar, porque sabemos que as empresas não gastam fortunas financiando candidatos apenas por seus belos olhos, mas porque estão certas que, no futuro, os parlamentares, governadores, prefeitos ou presidentes virão a propiciar, por meio dos seus votos, de suas decisões, o retorno desse investimento que fizeram durante a campanha eleitoral. Somos radicalmente contrários à contribuição de pessoa jurídica não só porque ela permite esse incentivo à corrupção, mas também porque estabelece uma profunda desigualdade na campanha eleitoral.

A democracia pressupõe, sim, liberdade de informação; a democracia pressupõe, sim, a existência de partidos livres; a democracia pressupõe, sim, o debate político; mas a democracia pressupõe, principalmente, mínima igualdade na competição. A última campanha eleitoral mostrou isso de forma ainda mais flagrante, particularmente a campanha presidencial. É inadmissível que um candidato tenha todos os recursos possíveis para fazer sua campanha enquanto outros não disponham de nenhum.

           Entendemos que o financiamento público de campanha e a proibição da contribuição de pessoas jurídicas vão dar à Justiça Eleitoral instrumentos mais eficazes para fiscalizar se a lei está sendo cumprida ou não.

           Hoje as chamadas prestações de contas dos candidatos constituem peças de ficção. É risível a prestação de algumas contas. Muitos candidatos dizem que gastaram apenas 15, 20, 25 mil reais, mas todos viram a suntuosidade das campanhas.

Hoje a Justiça Eleitoral não dispõe de instrumentos eficazes para fiscalizar, punir e cassar os candidatos por abuso de poder econômico ou por desrespeito à lei. Mas, repito, a introdução do financiamento público de campanha e a proibição da contribuição de pessoa jurídica dariam à Justiça Eleitoral tais instrumentos, porque a sociedade tomaria conhecimento, no início da campanha, da quantia de que cada partido ou cada candidato disporia. A distribuição desse fundo naturalmente seria feito de acordo com o número de parlamentares que o partido elegeu ou com o número de votos que o partido recebeu na eleição anterior. Haveria transparência. Uma vez proibida a contribuição da pessoa jurídica, seria muito mais fácil aferir se a campanha do candidato estava ou não de acordo com os recursos públicos que lhe foram destinados.

Gostaria de comentar um terceiro aspecto que considero importante para a discussão da reforma política. Trata-se de uma avaliação pessoal, pois meu Partido ainda não decidiu sobre essa questão. De modo geral, o PT e a Esquerda fazem muita restrição ao chamado voto distrital misto. Particularmente, estou convencido de que temos de caminhar nesse sentido. Estamos vendo atualmente, nas eleições para deputados estaduais e federais, que o candidato de um partido não disputa o eleitor com o candidato de outro partido; a disputa ocorre dentro das bancadas entre os candidatos do próprio partido. É óbvio. É mais fácil roubar o voto de um candidato do próprio partido, com o qual se tem maior afinidade político-ideológica, do que disputar o voto de um eleitor que se dispõe a votar em um candidato de outro partido. Isso está estabelecendo uma inversão da disputa política em nosso País. A disputa deve ocorrer entre projetos. A disputa deve ocorrer entre partidos. A disputa deve ocorrer entre diferentes visões de mundo e de país. Como o sistema atual é proporcional - elege-se os mais votados de cada partido - , a tendência cada vez maior é essa disputa fratricida. Isso está ocorrendo em todos os partidos.

O fato de que o voto está sendo cada vez mais “distritalizado” em prejuízo dos centros mais urbanizados também ajuda a me convencer da necessidade de adotar o voto distrital. Hoje, em algumas cidades menores, o voto fica restrito aos candidatos daquele município, mas, nas grandes cidades, o eleitorado é mais solto. Isso faz com que alguns Municípios maiores não tenham representação proporcional à dos Municípios menores. E volto a dizer: essa “distritalização” está ocorrendo em prejuízo do voto mais consciente, do voto mais urbanizado.

É necessário que se instituam algumas precauções. Se vamos copiar o sistema misto, que é classicamente definido como sistema alemão, é preciso que copiá-lo de forma completa. É necessário estabelecer que a distribuição das cadeiras no Congresso leve em consideração a proporcionalidade dos votos que cada partido obtiver. A partir daí, completam-se as cadeiras com as votações majoritárias, ou seja, a parte que não é proporcional. Se aquele partido completar o número de cadeiras a que teria direito na proporcionalidade da lista partidária, encerra-se o processo; caso contrário, entram os candidatos da lista partidária. Essa é uma forma de garantia para os partidos com mais ideologia ou que tenham mais dificuldade inclusive para competir em eleições majoritárias, pois sabemos que a parte majoritária da eleição será uma disputa para a prefeitura ou para o Governo do Estado, em que a própria influência política terá um peso maior. Isso pode acabar causando distorções na composição da Câmara dos Deputados. Assim, algumas representações ou correntes políticas que teriam, vamos supor, 5% ou 10% dos votos, se o voto fosse proporcional, teriam representação, mas, em virtude da parcela majoritária, a representação desses partidos fica diminuída ou impedida. Esses são instrumentos eficazes que deram certo em outros países e que contribuiriam para aperfeiçoarmos a nossa democracia.

Com relação ao percentual de votos da parte majoritária e da parte proporcional, ou a parte majoritária com a parte político-partidária, gostaria de dizer que não concordo com o projeto de autoria, se não me engano, do Senador José Serra, em andamento na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que estabelece que 70% das cadeiras seriam definidas no voto majoritário e apenas 30% no voto proporcional. Penso que isso aumentaria, ainda mais, a distorção em favor das grandes representações.

Volto a dizer que o modelo clássico preconiza o preenchimento de 50% das cadeiras pelo voto majoritário e 50% pelo voto proporcional. Se é para copiar, vamos fazê-lo de forma completa.

O Sr. Ademir Andrade (Bloco/PSB-PA) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE) - Concedo, com muito prazer, o aparte a V. Exª.

O Sr. Ademir Andrade (Bloco/PSB-PA) - Senador José Eduardo Dutra, em primeiro lugar, quero dizer da minha alegria de ver V. Exª adotar essa posição com relação ao voto distrital misto. A Esquerda como um todo sempre foi radicalmente contrária ao voto distrital. Tenho vivido neste Congresso Nacional há alguns anos. Desde 1982 estou no Parlamento, e sempre que se falou a respeito do tema as posições adotadas pelo PT, pelo PC do B e pelo PCB foram radicalmente contrárias à posição do voto distrital. Particularmente, sempre fui favorável a ele. Entendo até que poderia ser total, porque, ao contrário do que pregam alguns, penso que ele democratiza, identifica mais o eleitor com o candidato e possibilita à população melhor aprendizado político. O voto proporcional, como ocorre hoje - e a observação que vou fazer associa-se à questão da fidelidade partidária, que o Presidente Fernando Henrique está cobrando -, proporciona o que vemos acontecer: um pretenso candidato a Deputado federal fazer um acerto com um prefeito. Este apresenta o nome do candidato à população sem que esta conheça a sua história, o seu Partido, ou as causas que defendeu. Percebemos que a maioria dos parlamentares que são eleitos hoje o são pelo esquema da máquina oficial, do poder do Governo, do poder de quem dirige uma prefeitura ou é Governador de Estado, ou até de quem é Presidente da República e comanda Ministérios. Ou seja, um cidadão consegue uma verba em um Ministério como o da Reforma Agrária, do Planejamento ou da Educação, por exemplo, para determinado prefeito, que se compromete em elegê-lo. Depois esse Parlamentar vem votar no Congresso contra os interesses do população de seu Estado. É assim que funciona. Por isso, entendo ser o voto distrital mais identificado e politizado do que o proporcional. A Esquerda tem perdido muito com o voto proporcional, ao contrário do que defendem alguns companheiros do PC do B, do PPS e do próprio PT. É muito importante avançarmos neste processo de discussão. Com relação à fidelidade partidária, o Governo Fernando Henrique dá uma demonstração clara, neste momento, de que está cansado do fisiologismo. Ele confessa o seu fisiologismo, quando, a cada votação que pretende favorável no Congresso Nacional - e, normalmente, o que se defende são interesses que atendem ao capital internacional, ao processo de globalização, à ascensão do poder econômico no mundo; Fernando Henrique está contribuindo com isso -, tem de negociar com cada parlamentar individualmente, tem de dar emprego, fazer a nomeação do parente, do amigo, do afilhado ou tem de ceder determinada verba para o amigo de algum deputado, ou tem de financiar algum empresário ligado àquele parlamentar, ou tem de legalizar uma propriedade rural de algum empresário, ou perdoar, ou liberar alguma dívida. O Presidente, ao invés de denunciar esse tipo de atitude, essa cobrança desonesta de grande parte dos parlamentares do Congresso Nacional, que todos sabemos existe, Sua Excelência cede; aliás tem cedido seguidamente a esse tipo de pressão e tem conquistado os votos na base do fisiologismo, do “toma-lá-dá-cá”, da troca mais aética que se possa imaginar no processo político. Esse desejo de que a fidelidade partidária exista, da forma como Sua Excelência pretende que ela exista, fará com que o parlamentar tenha de votar como o seu Líder determinar, ou como meia dúzia de parlamentares que comandam o partido concluir que determinada matéria seja tratada. Assim, todos terão de ficar absolutamente calados. Isto, a meu ver, não é mais que uma confissão clara, transparente de que Sua Excelência está cansado do fisiologismo que tem praticado ao longo dos seus anos de Governo, almejando agora impor a ditadura das direções partidárias aos parlamentares, de uma maneira geral. Quero parabenizar V. Exª por trazer à baila temas de tamanha importância. Exponho aqui o meu ponto de vista acerca do assunto em nome do meu Partido, o Partido Socialista Brasileiro.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE) - Muito obrigado, Senador Ademir Andrade.

Com relação a esse modelo de fidelidade partidária que, ao que parece, o Governo vai propor - e, evidentemente, não de forma exaustiva -, fiz uma pesquisa superficial a fim de averiguar se há algum país onde se adote esse critério. Pude constatar que apenas o Peru o adota - país este que não dá realmente um bom exemplo de democracia.

Houve, recentemente, um caso emblemático no Congresso norte-americano, quando em votação um assunto grave que interessava fundamentalmente ao Partido Democrata, a saber: a autorização para abertura do processo de impeachment do Presidente Bill Clinton. Na ocasião, mais de 30 Deputados votaram contrariamente ao interesse do partido, a favor da abertura do processo.

No tocante à questão do voto distrital, o argumento principal que a Esquerda sempre apresentou contra a implementação do sistema é o de que haveria um risco de o Congresso Nacional se transformar numa grande Câmara de Vereadores, onde os parlamentares discutiriam apenas os interesses específicos das suas paróquias, ficando os grandes temas nacionais relegados a segundo plano. Este argumento é correto em parte; e, exatamente por entender que nele há uma parte de verdade, defendo a existência do voto distrital misto, porque a metade proporcional permitiria que esses candidatos parlamentares, que não têm uma base geográfica definida em seus Estados - e podemos citar de São Paulo o caso de José Genoíno, Delfim Netto e Ulysses Guimarães -, tivessem chances de se eleger, sem o que, não há dúvida, rebaixar-se-ia bastante o debate político nesta Casa. Todavia, o fato é que, hoje, já existe uma grande parcela - e talvez mais da metade - de parlamentares que são eleitos com base nessas regiões, nessa definição daquele município no qual o prefeito apóia e investe num candidato, como já disse o Senador Ademir Andrade, o que faz com que hoje isso já se verifique na realidade.

Volto a registrar: o voto está-se “distritalizando”, em prejuízo dos maiores centros urbanos. Por isso continuo entendendo que o voto distrital misto seria um meio termo tanto no sentido de garantir essa representação mais direta do eleito com o eleitor, como de ser uma forma de garantir que parlamentares sem essa vinculação geográfica com seus Estados, e que são importantes para o debate político nesta Casa, sejam eleitos, bem como para a necessidade de as pessoas passarem a votar nos partidos políticos. A meu sentir, o fato é que sempre se diz que a democracia é construída com partidos, e que sem partidos fortes não há democracia forte; todavia, a história da democracia brasileira sempre foi provocada por traumas, que não deram sequer tempo de os partidos se consolidarem, e, também, os instrumentos legislativos não facilitam ou não contribuem para essa consolidação.

           De 1946 a 1964, tivemos pelo menos dois ou três Partidos que já estavam se consolidando no conjunto - ou até no subconsciente - do eleitorado: o PSD, a UDN e o PTB, mas que foram dissolvidos à força.

           Agora, estamos mais uma vez tentando a consolidação desses partidos. Entretanto, é necessário que haja instrumentos para se garantir o fortalecimento dos partidos, para fazer com que o mandato passe a ser efetivamente do partido e para fazer com que a disputa seja entre correntes partidárias, entre partidos, e não entre pessoas, como estamos vendo hoje.

Avalio que, se o Congresso não se dispuser a fazer essa reforma política com uma maior abrangência até meados do ano que vem, a reforma política vai, mais uma vez, ser um tema que sempre surge após uma eleição, mas que depois acaba caindo no esquecimento.

Em segundo lugar, é inadmissível que o Governo queira tentar pinçar um ponto da reforma política - e um ponto que está sendo, inclusive, no interesse casuístico do Governo, profundamente do Governo -, considerando-o o mais importante para a reforma em questão e para o nosso País.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eram essas as contribuições que gostaria de trazer ao debate no dia de hoje.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/10/1998 - Página 13654