Discurso no Senado Federal

ANALISE DAS CONSEQUENCIAS DO AJUSTE FISCAL SOBRE OS VENCIMENTOS DOS SERVIDORES PUBLICOS.

Autor
Junia Marise (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MG)
Nome completo: Júnia Marise Azeredo Coutinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • ANALISE DAS CONSEQUENCIAS DO AJUSTE FISCAL SOBRE OS VENCIMENTOS DOS SERVIDORES PUBLICOS.
Publicação
Publicação no DSF de 30/10/1998 - Página 14772
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, PROGRAMA, AJUSTE FISCAL, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, DESEMPREGO, IMPOSTOS, ESPECIFICAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), AUSENCIA, REDUÇÃO, TAXAS, INFLAÇÃO, AMPLIAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA, FUNCIONARIO PUBLICO, EXIGENCIA, APOSENTADO, PAGAMENTO, CONTRIBUIÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • QUESTIONAMENTO, AUSENCIA, GOVERNO, PROMOÇÃO, RECUPERAÇÃO, SALARIO, FUNCIONARIO PUBLICO, DESCUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL.
  • MANIFESTAÇÃO, OPOSIÇÃO, INCIDENCIA, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA, SALARIO, APOSENTADO, AUMENTO, PERCENTAGEM, FUNCIONARIO PUBLICO.

A SRª JÚNIA MARISE (Bloco/PDT-MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje pela manhã, ouvimos a exposição de motivos do Ministro da Fazenda, Pedro Malan. Inscrevi-me para fazer algumas indagações a S. Exª, mas o critério, evidentemente correto, foi o de que os primeiros a ocupar a tribuna para as interpelações fossem os Membros da Comissão de Assuntos Econômicos e as Lideranças. Conseqüentemente, e devido ao avançado da hora, resolvemos deixar para este momento e para os próximos a análise realista sobre os desdobramentos desta situação que se abate sobre o nosso País e sobre as medidas anunciadas pelo Governo e por sua equipe econômica.

Uma das indagações que desejaria fazer diretamente ao Ministro da Fazenda, Pedro Malan, era exatamente esta: no final do ano passado, tivemos a crise asiática e, por isso, o Governo imediatamente veio com o ajuste fiscal. Mas, durante esses últimos dois, três anos, temos tido crises em vários países. Quando da crise do México e da crise do Chile, a equipe econômica manifestou que o Brasil não seria atingido, que nenhuma conseqüência nos atingiria, que o Brasil estava com sua economia estável e que, portanto, não teríamos repercussão alguma, como a que está ocorrendo nesses países. Essa sempre foi a resposta do Governo brasileiro, a resposta do Ministro da Fazenda nos últimos dois ou três anos.

Quando os próprios grandes economistas internacionais disseram que o Brasil sofreria conseqüências seriíssimas na área econômica e financeira, o Governo brasileiro insistia em dizer o contrário, que tínhamos uma economia estável e que todas as iniciativas estavam sendo tomadas para impedir que as crises do outro lado do mundo repercutissem aqui.

Pois bem. Será que estamos com dois ministros da Fazenda: um, em um tempo; e o outro, em outro tempo? Uma das minhas indagações seria exatamente esta: a qual ministro da Fazenda vamos nos dirigir hoje? Porque ele sempre dizia: “Não, o Brasil não será a bola da vez e, portanto, não há crise capaz de se abater sobre o nosso País”.

Sr. Presidente, ainda ontem fizemos aqui, nos cinco minutos que me foram dados, algumas reflexões sobre essas questões e iniciativas desses pacotes anunciados pelo Governo.

Durante toda recente campanha eleitoral que tivemos, o Presidente Fernando Henrique, no seu programa de televisão, disse: “Nós vamos acabar com o desemprego no Brasil”. Foi uma promessa de campanha. Sua Excelência usou a expressão: “Quem acaba com a inflação acaba com o desemprego”.

Pois bem. Esse pacote aumentará o desemprego no nosso País, porque atinge duramente o setor produtivo nacional, como atinge duramente as finanças públicas de Estados e de Municípios. Com isso, teremos um crescimento acelerado do desemprego, que hoje já chega a patamares inconcebíveis no nosso País, transformando o Brasil, em termos percentuais, na Nação que tem maior índice de desemprego da América Latina e, quiçá, de todos os países desenvolvidos.

Essa situação se agrava ainda mais quando vemos hoje que o Governo pretende aumentar o imposto sobre a movimentação financeira, a CPMF, não para beneficiar a saúde, porque isso não está ocorrendo, mas principalmente para destinar esse aumento ao pagamento da dívida pública.

Estamos vivendo hoje duas situações extremamente distintas. Enquanto o Governo, de uma forma que eu diria até hipotética, anuncia um pacote fiscal prometendo reduzir suas despesas, ao mesmo tempo, quer ampliar a sua arrecadação aumentando os impostos. Na medida em que aumentam os impostos, seguramente o processo de quebradeira do setor produtivo nacional vai aumentar neste País com as empresas asfixiadas por esses impostos que estão sendo aumentados e, ao mesmo tempo, com a falta de condições reais de poderem sobreviver neste País com as altas taxas de juros que temos hoje.

Não vimos, por exemplo, nenhum aceno objetivo por parte do Governo na questão da redução das altas taxas de juros. O que nós temos observado até o presente momento são palavras de que o Governo vai se empenhar a curto ou médio de prazo para a redução das taxas de juros, mas não há nenhum aceno que possa, realmente, ser definido dentro de um programa e de uma manifestação de um projeto de Governo, da sua equipe econômica, para promover imediatamente, mesmo que de forma gradual, a redução das altas taxas de juros nos patamares inclusive estabelecidos pela própria Constituição Federal.

A outra questão, Sr. Presidente, que me traz uma grande preocupação, é exatamente a questão da CPMF. Quero fazer aqui algumas considerações de ordem social em relação ao aumento da CPMF. O Ministro Pedro Malan disse aqui o seguinte, “nós queremos o aumento da CPMF. Esse acréscimo vai vigorar no ano de 1999. E a partir do ano 2000, retomaria aos patamares em que, hoje, está o imposto do cheque”.

Ora, Sr. Presidente, eu tenho certeza de que neste País nenhum cidadão ou cidadã brasileira acredita nesta afirmação que foi dita, aí, hoje pela manhã, pelo Sr. Ministro da Fazenda. E sabe por quê? Porque a CPMF é, exatamente, aquele imposto provisório que vem sendo prorrogado. Antes era o IPMF e virou a CPMF e cada vez mais o Governo vem aumentando sua alíquota. Tínhamos o IPMF com data previamente marcada para ser extinto porque era um estado de emergência. Votamos, aqui, no Congresso Nacional a CPMF com prazo previamente estabelecido, que iria vigorar durante um ano e, no entanto, vem o Governo novamente e pede que a CPMF continue em vigor neste País.

Nenhum cidadão tem confiança porque o Ministro da Fazenda não tem a credibilidade de todos os brasileiros para fazer uma afirmação como esta porque nós sabemos que no próximo ano o Governo virá novamente com um outro Pacote, quem sabe, para pedir ao País o sacrifício da sociedade. Agora, dizer que só aqueles que detêm uma conta bancária, um talão do cheque de um banco, serão atingidos pela CPMF é uma brincadeira.

Por que é que toda a sociedade, inclusive os pobres, vão ser sacrificados com a CPMF ? Explico. Veja bem, Senador Jefferson Péres. O dono da padaria, o dono do supermercado, do açougue, essas pequenas e médias empresas prestadoras de serviços vão pagar a CPMF maior. De onde é que eles vão cobrar a conta desse aumento de imposto? Exatamente dos consumidores, e é por isso que os preços vão aumentar e a população vai pagar um alto preço por esse ajuste fiscal, pelo aumento desses impostos. Não vamos e nem podemos fazer aqui o proselitismo de afirmações, - como está fazendo o Governo -, que não serão cumpridas daqui a doze meses, porque isso já está se transformando em uma verdade absoluta, como está ocorrendo com o próprio imposto do cheque.

Esta semana, por exemplo, conversando com um motorista de táxi em Belo Horizonte, que não é nenhum economista, mas certamente faz a sua própria contabilidade caseira, doméstica, do seu dia-a-dia, ele me fazia uma indagação das mais brilhantes em relação ao que está acontecendo hoje no Brasil. Perguntava-me: Senadora Júnia Marise, por que esse pessoal do Governo, da área econômica, o Presidente, já sabendo da situação econômica que está acontecendo no Brasil, por que, há dois, três, quatro anos atrás não se preveniram e não fizeram as correções que deviam fazer para que não estivéssemos hoje sendo atingidos desta forma? E por que nós temos que “pagar o pato” das coisas que acontecem lá do outro lado do mundo, como aconteceu com a crise asiática do Japão e como está acontecendo hoje com a crise da moratória russa.

São essas indagações que os cidadãos estão fazendo. Mais do que isso, Sr. Presidente, colocar hoje - e o nosso Senador do Amapá fez aqui um pronunciamento com absoluta correção diante desta realidade -, o servidor público do nosso País, os aposentados do nosso País como os grandes bodes expiatórios desses ajustes, como se eles fossem os responsáveis pelo que está acontecendo com a economia e pelo crescimento da dívida pública do nosso País. Sr. Presidente, isto é uma situação que não convence a ninguém.

É exatamente dentro dessas indagações que gostaríamos de mencionar aqui um dos fatos inexplicáveis por parte do Governo. Por exemplo: há quatro anos os servidores públicos não recebem um centavo de aumento sequer nos seus salários. Por que o Governo não está promovendo a recuperação salarial dos servidores públicos, descumprindo a lei, aprovada pelo Congresso Nacional, que estabelece todos os anos aumento salarial para os servidores públicos, mesmo que seja em índices e patamares de acordo com a inflação?

Quando um trabalhador ou um servidor começa a trabalhar, ele faz um contrato com o Instituto de Previdência Pública. Paga um percentual sabendo que, tendo trabalhado 35 anos, ao final desse tempo terá direito à sua aposentadoria. E as regras desse vínculo empregatício, ou seja, do vínculo do trabalhador ou servidor com a Previdência Pública, estão estabelecidas. No entanto, de uma hora para outra, o Governo quer mudar as regras do jogo, porque agora quer praticar a incidência de uma taxa para os aposentados e pensionistas deste País.

Portanto, consideramos que nesses pontos o Governo não só está cometendo uma injustiça, mas, quem sabe, uma ilegalidade jurídica, que poderá ser questionada nos nossos tribunais por todos aqueles que considerem que estão sendo atingidos por medidas que não são aquelas correspondentes ao instituto da legalidade.

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Permite V. Exª um aparte?

A SRª JÚNIA MARISE (Bloco/PDT-MG) - Concedo o aparte ao nobre Senador Jefferson Péres.

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Desculpe-me, Senadora Júnia Marise, por interromper a linha do seu raciocínio, do seu brilhante pronunciamento, mas apenas o pedi para salientar a V. Exª a situação constrangedora em que o Governo vai deixar o Congresso. Pedem-nos que aprovemos o ajuste porque o País está quebrado, ou prestes a quebrar - e o culpado não sou eu nem V. Exª, com certeza.

A SRª JÚNIA MARISE (Bloco/PDT-MG) - E nem o povo.

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM)- Nem o povo. E nos pedem, veja bem, que reduzamos o salário dos servidores públicos com o aumento da contribuição para até 20%, que reduzamos os proventos dos aposentados com a instituição da contribuição previdenciária, que não existe no momento, mas nós, parlamentares, e os militares não teremos que pagar esse aumento. Como é que vamos aprovar o plano, Senadora Júnia Marise, e dizer aos servidores públicos e ao povo em geral: estamos aumentando a CPMF, estamos reduzindo salários e proventos de vocês porque é preciso sacrifício de todos, mas não estamos fazendo sacrifício algum? Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.

SRª JÚNIA MARISE (Bloco/PDT-MG) - Agradeço e incorporo a esse nosso pronunciamento o aparte de V. Exª, como sempre, assumindo posições muito claras, muito coerentes com a sua atuação política neste plenário do Senado Federal. As indagações de V. Exª certamente fazem parte das reflexões e das indagações de todo o Brasil. No entanto, não queremos nos situar apenas nessas questões, já que entendemos que o Governo não poderia e não poderá cometer a injustiça de exigir essa contribuição dos aposentados do nosso País, até porque os proventos de aposentadoria no Brasil são lastimáveis, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.

Hoje sabemos, com toda a segurança, as dificuldades por que passam os aposentados do nosso País. E o próprio Ministro da Fazenda reconhece, como reconheceu hoje aqui, que na verdade não são os trabalhadores e nem os servidores que estão pesando na questão do endividamento e do crescimento da dívida pública, mas, mesmo assim, pede o sacrifício deles, pede que façam a sua parte. O Governo está prometendo fazer um corte de despesas - está aqui neste material que foi distribuído pelo Ministro da Fazenda, em seu diagnóstico, como uma síntese da sua exposição no plenário hoje pela manhã - da ordem de R$8.6 bilhões. Muito bem. Pergunto, então: quem é que vai acreditar que o Governo vai fazer esse corte? Digo isso porque já vem prometendo há quatro anos sem que tenha havido corte algum nas despesas públicas. O Governo não está extinguindo cargos, não está fazendo a sua parte. Aliás, todos sabemos o quanto foi gasto em publicidade, neste País, com o seu “Programa Brasil em Ação”. E houve um crescimento muito grande dos recursos destinados à publicidade do Governo, principalmente nos meses que antecederam o início da campanha eleitoral neste País. Não houve, portanto, nenhuma intenção do Governo em promover a redução dos custos, a redução de despesas na esfera administrativa.

Concluindo, Sr. Presidente, vamos continuar pontuando aqui e trazendo ao Plenário desta Casa as nossas reflexões sobre as iniciativas do Governo, sobre os pacotes que estão sendo anunciados para a discussão e o debate da sociedade e do Congresso Nacional.

Só queria lamentar duas coisas: em primeiro lugar, na verdade, todas essas iniciativas e todos esses pacotes têm sido, como ocorreu no final do ano passado, aprovados aqui sem o debate amplo por parte da sociedade brasileira. A equipe econômica vem ao Senado, quem sabe amanhã vai à Câmara, discute com Deputados e Senadores, mas a sociedade está de fora. E depois é a sociedade quem vai pagar esta conta. É isso é lamentável.

Concluindo, queremos reafirmar que nós não consideramos cabível neste momento - e vamos defender esta posição - que algum ponto do Programa de Ajuste Fiscal do Governo venha a incidir sobre o salário dos aposentados e dos servidores públicos. Nós não aceitamos que, mais uma vez, eles venham a ser chamados a pagar a conta daquilo que não tiveram a menor responsabilidade: o endividamento das contas públicas de nosso País; até porque nos últimos quatro anos os servidores públicos neste País estão sendo considerados sempre os verdadeiros bodes expiatórios de uma política que inclui o modelo da globalização e o modelo neoliberal, que promove o arrocho, provoca a destruição do setor produtivo nacional, o desemprego e, cada vez mais, a situação falimentar das empresas do Brasil.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/10/1998 - Página 14772