Discurso no Senado Federal

REGISTRO DA REUNIÃO DOS GOVERNADORES DE OPOSIÇÃO, ONTEM, PARA DISCUSSÃO DO PACOTE ECONOMICO E SUGESTÃO DE MEDIDAS ALTERNATIVAS.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL. ELEIÇÕES.:
  • REGISTRO DA REUNIÃO DOS GOVERNADORES DE OPOSIÇÃO, ONTEM, PARA DISCUSSÃO DO PACOTE ECONOMICO E SUGESTÃO DE MEDIDAS ALTERNATIVAS.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares.
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/1998 - Página 14849
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL. ELEIÇÕES.
Indexação
  • REGISTRO, REUNIÃO, GOVERNADOR, OPOSIÇÃO, ELABORAÇÃO, PROPOSTA, ALTERNATIVA, AJUSTE FISCAL, GOVERNO, COMBATE, CRISE, NATUREZA ECONOMICA.
  • DEFESA, IMPLANTAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, BRASIL, INCENTIVO, DIALOGO, GOVERNO, PARTIDO POLITICO, OPOSIÇÃO, BUSCA, ENTENDIMENTO, SOLUÇÃO, CRISE, NATUREZA ECONOMICA.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, JOAQUIM RORIZ, EX GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF), QUALIDADE, CANDIDATO, ELEIÇÃO, GOVERNADOR, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF), PERIODO, CAMPANHA ELEITORAL.

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, quero fazer um breve registro de um fato ocorrido ontem e que considero da maior importância: a reunião dos seis governadores de oposição. Face às medidas tomadas pelo Governo, eles decidiram que iriam ter uma ação que fosse ao mesmo tempo de críticas ao pacote apresentado pelo Governo e também apresentar um conjunto de propostas. Faço isso para que não fique a imagem de que a reunião dos governadores foi um palanque para atirar pedras no Governo, como se os governadores eleitos não tivessem responsabilidade com o País, principalmente com os Estados que governam, até porque se trata de Estados - é o caso do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro - que têm um peso muito importante, tanto do ponto de vista econômico e social, quanto de suas populações. Tanto é verdade que eles não estão com um postura de simplesmente atirar pedras, que optaram por uma posição madura e adequada de fazer uma análise crítica do pacote apresentado pelo Governo e criar um grupo de trabalho articulando os governadores, não apenas os de oposição, mas todos aqueles que têm responsabilidades com os seus Estados, porque serão eles que terão que dar as respostas à população que os elegeu. Essa seria uma articulação aberta a todos os governadores e que também envolveria os prefeitos, porque o pacote do Governo e as ações do Governo partem de um princípio que fere os avanços que tivemos na Constituição de 1988. A Constituição de 1988 instituiu e assegurou uma certa autonomia para os Estados e Municípios, mas as medidas do Governo apontam para um caminho diverso, de fazer com que novamente o Governo Federal passe a ter uma postura centralizadora frente a essas conquistas, o que consideramos um retrocesso.  

Esse grupo de trabalho também irá apresentar um conjunto de ações alternativas que serão desenvolvidas pelos governadores, prefeitos e parlamentares não só de Oposição, mas também por aqueles que têm críticas ao pacote do Governo. Ouvi de vários Srs. Senadores, mesmo os da Bancada de sustentação do Governo, que eles têm uma série de críticas pontuais, que são todas procedentes, assim como também são procedentes as críticas feitas pela Oposição.  

Quero dizer ainda, Sr. Presidente, que, mediante informações de jornais - algo a ser verificado -, o Governo já haveria recuado em relação ao FEF, o que considero fundamental, porque Estados que dependem de repasses do Governo Federal com certeza seriam assustadoramente prejudicados com as ações propostas em relação ao FEF. No entanto, são informações de jornais que me causam estranheza, porque ontem o Ministro da Fazenda aqui esteve e não anunciou qualquer mudança com relação à questão.  

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - Permite-me V. Exª um aparte?  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Concedo o aparte ao ilustre Senador Antonio Carlos Valadares.  

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - Senadora Marina Silva, V. Exª aborda um assunto da maior importância para o aprofundamento do debate nesta Casa a respeito das medidas do Governo. O Governo, depois das eleições, age de uma forma diferente de como deveria ter agido com os seus companheiros de Partido, que fizeram uma verdadeira farra nos Estados para se reelegerem governadores. Em Estados pobres do Nordeste, como Rio Grande do Norte e Sergipe, os governadores despenderam quantias enormes nas suas campanhas à reeleição, inclusive vendendo as companhias energéticas e aplicando o dinheiro que poderia ser utilizado em obras sociais e em obras de infra-estrutura. Não houve disciplina do Governo Federal antes das eleições. Porém, passado o período da farra eleitoral, o Governo se mostra preocupado com as finanças dos Estados e quer impor sacrifícios, inclusive aos governadores que foram eleitos com o discurso da austeridade. E não haverá nenhuma necessidade de o Governo entrar na autonomia dos Estados brasileiros, reduzindo os direitos da federação mais do que já foram reduzidos. De forma que aproveito a oportunidade do aparte para apresentar aos governadores da Oposição a nossa solidariedade e o entendimento de que o Governo Federal deve deixar aos Estados a responsabilidade que cabe a cada um desses governadores na adoção de medidas visando projetos ou planos de austeridade fiscal. Se o Governo Federal está impondo sacrifícios à própria União, os Estados naturalmente terão de se habilitar nesse sentido, porém sem prejuízo das soluções dos problemas estaduais, principalmente na área social, que está a exigir dos governadores uma ação pronta e firme. Agradeço a V. Exª pelo aparte.  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Agradeço a V. Exª.  

V. Exª fala de uma questão muito interessante: a austeridade.  

Dizem que a Oposição continua no palanque jogando pedra. Não considero essa observação justa. As pessoas, muitas vezes, fazem um apelo para que esqueçamos o que foi dito no palanque, mas isso é muito difícil, porque foi exatamente no palanque que as ouvimos dizer que tudo estava sob controle, que não haveria medidas drásticas, que os programas sociais continuariam a ser tocados, que a nossa economia iria crescer. É como se o Brasil realmente fosse uma maravilha. E, dois meses depois, não dá para esquecer. É muito duro para o povo brasileiro, que sonhou com esse Brasil que esperamos um dia possa ser real.  

Não é o caso de se fazer um apelo para a Oposição esquecer o que foi dito no palanque. No Brasil, precisamos ter uma cultura de cobrar daqueles que se elegeram que cumpram o que disseram no palanque. Caso contrário, ganha-se a eleição em cima de determinadas propostas e, depois, pede-se para esquecê-las. Aliás, essa história de pedir para esquecer o que foi dito é conhecida, mas não quero entrar no mérito dessa questão.  

Foi no palanque que disseram que tudo estava sob controle e, depois, anuncia-se ao povo brasileiro que a situação não está tão sob controle assim.  

Quanto à questão da austeridade, ontem ouvi um depoimento emocionante do Governador Capiberibe, do Amapá, um Estado da Amazônia com muitas dificuldades, dependente de repasses da União. Dizia S. Exª que chegou a ter um índice de rejeição de 70% e foi reeleito, graças a Deus: "Cheguei a essa situação, porque governei com austeridade. Não fiz nenhum plano mirabolante que comprometesse as finanças do meu Estado, que, hoje, está completamente saneado, pronto para ser governado, para se fazer as coisas corretas que precisam ser feitas, porque tomamos medidas de base". O Governador Capiberibe, que realizou todo esse esforço, que não tem participação nos problemas da dívida pública do Governo, vai ser penalizado tanto quanto aqueles que, conforme o Senador Antonio Carlos Valadares, fizeram um verdadeiro banquete com os recursos públicos, para ganhar as eleições.  

Sr. Presidente, neste momento de crise, volto a repetir: a Oposição tem responsabilidade de apresentar respostas para a crise, mas não significa aderir, pura e simplesmente, ao que está sendo proposto pelo Governo. Aliás, numa democracia e na maturidade dessa democracia, o importante é que sejamos capazes de confrontar projetos políticos diferentes para, a partir daí, sermos capazes de construir a alternativa possível à realidade que queremos enfrentar.  

Ontem, a Oposição reuniu os Governadores, que estão dispostos a dar as suas contribuições, apresentando um conjunto de medidas, dentre elas uma que consideraram fundamental. Nesses quatro anos, o Governo não apresentou proposta de reforma tributária, tão importante e que fazia parte das medidas estruturais, talvez em face da preocupação com a reeleição, da preocupação de manter coesa a base do Governo. A reforma tributária, com certeza, iria mexer nesse calcanhar-de-aquiles porque envolve muitos interesses.  

Nós queremos dar a nossa parcela de contribuição, queremos apresentar as nossas propostas, mas queremos que elas sejam discutidas, não como uma proposta diferente para ser contra pura e simplesmente, mas como uma nova idéia a ser discutida.  

Entendo que, no momento em que o Governo acenou que quer conversar com os Governadores da Oposição, talvez o melhor a fazer seja colocar imediatamente em prática essa proposta, chamando-os para uma conversa. Até porque esses Governadores estão se sentindo prejudicados na realização de suas metas, naquilo que se comprometeram como proposta de campanha.  

Ainda retomando o discurso do Senador Antonio Carlos Valadares, estava pensando que alguns Governadores da Oposição são muito mais importantes para o Governo num momento como este do que determinados aliados. Vi o Governador Cristovam Buarque perder uma eleição porque teve a coragem de assumir uma posição austera e de respeito com as finanças públicas e dizer que não ia dar aumento a qualquer custo, enquanto seu adversário, aliado do Governo, no momento em que o Governo faz um apelo para que o funcionalismo público, para que essas pessoas sejam compreensivas e dêem a sua parcela de sacrifício, ganhava a eleição porque fez inúmeras propostas mirabolantes, sem considerar em absoluto o que o Governo está propondo.  

Muitas vezes, determinados aliados são muito piores do que uma Oposição ética e comprometida com propostas que não façam das finanças do Estado um carnaval para se ganhar votos. Foi o que aconteceu com o Governador Cristovam Buarque, que adotou uma postura séria. Como Governador de Oposição, S. Exª poderia muito bem dizer que daria aumento aos servidores e que esse aumento dependeria do Governo Federal. Por ser uma pessoa que tem compromisso e respeito com a verdade, não o fez. Agora, a população já começa a cobrar as promessas de quem se elegeu. Até porque, do meu ponto de vista, foram promessas e expectativas falsas. Quero ver como é que os amigos do Planalto repassarão verbas para que o Governador eleito Joaquim Roriz pague os 28% aos servidores sem se indispor com os Governadores eleitos dos demais partidos.  

É por isso que digo: é muito melhor uma Oposição ética, que sabe o que diz, sabe o que faz e não promove esse tipo de demagogia para se eleger pura e simplesmente do que determinados "aliados", que se comportam dessa forma.

 

Quero resgatar o sentido da reunião dos Governadores de Oposição. Não se trata da idéia de que foi um grupo de seis Governadores - e Governadores de Estados importantes - que se reuniu para simplesmente continuar um palanque oposicionista. Ao contrário, foi para colocar um palanque da situação que o Brasil vive hoje, que é a mesma que já vivia antes das eleições; ou seja, de dificuldades econômicas, de dificuldades financeiras e que não foram combatidas no período certo.  

Ouvi falar em antibiótico, em dose certa. Não adianta se dar uma dose cavalar de antibiótico para um paciente terminal de pneumonia, porque ele vai morrer. Deve-se identificar o problema antecipadamente para que as doses do remédio sejam dadas na medida correta para salvar o paciente.  

Muito obrigada, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/1998 - Página 14849