Discurso no Senado Federal

RECUSA DE S.EXA. EM ACEITAR A PROCEDENCIA DA MATERIA PUBLICADA NA REVISTA EPOCA, DESTA SEMANA, INTITULADA 'CHANTAGEM DENTRO DO GOVERNO'. REPUDIO AO 'GRAMPO' TELEFONICO NÃO AUTORIZADO POR DECISÃO JUDICIAL. (COMO LIDER)

Autor
Jader Barbalho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PA)
Nome completo: Jader Fontenelle Barbalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. :
  • RECUSA DE S.EXA. EM ACEITAR A PROCEDENCIA DA MATERIA PUBLICADA NA REVISTA EPOCA, DESTA SEMANA, INTITULADA 'CHANTAGEM DENTRO DO GOVERNO'. REPUDIO AO 'GRAMPO' TELEFONICO NÃO AUTORIZADO POR DECISÃO JUDICIAL. (COMO LIDER)
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares, Bernardo Cabral, Eduardo Suplicy, Gilberto Miranda, Hugo Napoleão, José Eduardo Dutra, Odacir Soares, Pedro Piva, Pedro Simon, Ramez Tebet, Roberto Freire, Roberto Requião, Sérgio Machado.
Publicação
Publicação no DSF de 11/11/1998 - Página 15462
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • RECUSA, AUTENTICIDADE, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, EPOCA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DENUNCIA, OCORRENCIA, IRREGULARIDADE, QUALIDADE, ESCUTA TELEFONICA, PRESIDENTE, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), PERIODO, PRIVATIZAÇÃO, TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S/A (TELEBRAS).
  • SOLIDARIEDADE, ORADOR, QUALIDADE, LIDER, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), SENADO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, ACUSAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, SOCIEDADE, EMPRESA, PAIS ESTRANGEIRO, ILHA CAYMAN.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna na condição de Líder do PMDB para comentar o que considero da maior gravidade. Refiro-me à matéria constante da revista Época, intitulada “Chantagem Dentro do Governo”.

       Sr. Presidente, nós que lutamos contra a ditadura e o arbítrio, recordamos como eram penosas as violências cometidas e, dentre elas, a quebra do sigilo telefônico e a quebra do sigilo da correspondência. Portanto, foi uma luta muito grande da sociedade brasileira para que pudéssemos vivenciar um período onde episódios dessa natureza não fizessem mais parte da vida da sociedade brasileira. E agora, em plena democracia, tomamos conhecimento de que essas práticas continuam a existir, o que deixa qualquer cidadão deste País vulnerável. E, o que é mais grave, nem o Governo, com toda a sua estrutura, consegue conter essa prática antidemocrática, essa prática que viola, inclusive, o direito à privacidade. A Constituição brasileira garante esse direito à privacidade como um direito individual; só permite a sua violação, de forma especial, mediante decisão judicial para a apuração de crime, no caso do estado de defesa e, excepcionalmente, no estado de sítio.

       O Presidente da República, os seus Ministros, o Presidente do BNDES e outras autoridades tiveram suas conversas gravadas, e o pior é que o crime da quebra do sigilo telefônico tem continuidade, porque no momento em que se divulga pela imprensa, inclusive o que estaria contido nas fitas, na verdade é uma espécie de crime continuado. Há um crime na origem, que é o da quebra do sigilo, e um outro que é o de divulgar. A revista Época, Sr. Presidente, publica - e me recuso a crer -, dizendo que foram as autoridades, as quais tiveram suas conversas grampeadas, que as tornaram públicas para evitar uma possível chantagem.

       Sr. Presidente, a sociedade brasileira se considera vulnerável a essa violência, porque, se o Presidente da República, os seus Ministros e o Presidente do BNDES, nas suas conversas, são grampeados, e se essas conversas vêm a público para evitar possíveis chantagens, estamos diante de um retrocesso. Quero aqui fazer a leitura de alguns trechos da revista:

       “As fitas contêm conversas entre Mendonça de Barros, Lara Resende, Pio Borges e interessados na privatização da Telebrás. Há, por exemplo, uma conversa entre Lara Resende e Pérsio Arida, seu amigo do Banco Opportunity, sobre o interesse de seu Banco em algumas empresas privatizáveis”.

       Segundo a revista, essas conversas entre o Diretor do BNDES e o diretor de uma das empresas interessadas na privatização, estariam nessas fitas.

       Entre elas a Tele Norte Leste, que engloba 16 teles - inclusive a Telerj. Há também conversas pessoais entre FH, Mendonça de Barros e Lara Resende. Numa das fitas, Mendonça de Barros usa termos jocosos ao referir-se ao consórcio da Telemar (ou Tele Norte Leste). Chama-o de “telegangue”. Diz que seus integrantes são “rataiada”.

       Segundo a revista, essas informações teriam sido concedidas pelas autoridades que tiveram as suas conversas grampeadas.

       As autoridades, portanto que foram vítimas do grampo, é que estão a fornecer as informações, o que me parece profundamente grave.

       Quero dizer, com todo o respeito que tenho à revista, que me recuso a aceitar que isso seja verdade. Até porque, mais adiante, o texto diz:

       “O Governo diz que irá apurar o envolvimento de cada um dos personagens no grampo. Foi por meio dessa espionagem que se soube antecipadamente no mercado o valor de alguns lances que o consórcio Telecom/Opportunity faria para adquirir a Tele Norte Leste.

       Como isso seria possível? Na fita estariam valores de propostas? Recuso-me, com todo respeito à revista Época, com todo respeito aos jornalistas que escreveram a reportagem, a admitir que isso seja verdade. Recuso-me a admitir que as autoridades tenham dito que nessas fitas estariam conversas entre a autoridade que vai privatizar e o interessado na privatização. Recuso-me a imaginar que um determinado concorrente perdeu porque o outro, que grampeou, sabia o valor das propostas. Recuso-me a imaginar tudo isso, porque me parece uma comédia profundamente desagradável essa que estamos a assistir, a do retrocesso político do grampo, da vulnerabilidade das autoridades e da verdade que estaria contida nessas fitas.

       Sr. Presidente, estamos, neste momento, na obrigação de buscar uma fórmula para evitar que procedimentos dessa ordem possam estimular, nas relações entre o Poder Público e a iniciativa privada, conversas dessa natureza. Quero registrar, como Líder do PMDB, que me recuso a admitir que o texto que aqui está, com estas referências, seja verdade. Recuso-me a imaginar que o Ministro José Carlos Mendonça de Barros considere que exista uma “telegangue”, e que o Governo, mesmo sabendo da sua existência, deixe que ela participe e vença um leilão do processo de privatização. Se o Ministro sabia que existiam ratos que queriam ficar com aquilo que pertencia ao Poder Público, que uma gangue havia se armado, como permitiu que ela ganhasse? Recuso-me, perdoe-me a revista Época, a admitir que se inclua na gangue o Diretor de Política Internacional do Banco do Brasil, que teria organizado o consórcio e colocado a Previ para participar da “telegangue”. Sr. Presidente, o que estamos lendo é de um surrealismo que não tem tamanho e que me recuso - perdoe-me a revista Época - a admitir que isso possa ter procedência.

       Primeiro, quero fazer o registro de que considero que há um retrocesso, porque antes era o cidadão comum o objeto do grampo. Hoje, é a autoridade constituída; e mais, é ela que vem a público desta forma, como está aqui inserido na revista Época.

       O Sr. Bernardo Cabral (PFL-AM) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Jader Barbalho?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Ouço, com prazer, o aparte do nobre Senador Bernardo Cabral.

       O Sr. Bernardo Cabral (PFL-AM) - Senador Jader Barbalho, V. Exª, como Líder do PMDB, avaliou a responsabilidade do seu pronunciamento e tanto o fez que assinalou algumas coisas que não podem passar sem que este Plenário se manifeste. Por isso, quero logo fazer a minha observação. Em primeiro lugar, correto o raciocínio de que é um retrocesso - é muito mais do que um retrocesso - e V. Exª assinalou que, hoje, há uma garantia constitucional que não havia anteriormente, registrada no art. 5°, inciso XII, da Constituição Federal. O retrocesso é tanto mais grave que se deixa de ouvir a conversa de um ser mortal, comum; se vai à mais alta autoridade da República para se chegar ao que V. EXª diz:: pôr em dúvida a atuação de um diretor de uma entidade creditícia da respeitabilidade do Banco do Brasil. E aí V. EXª aponta a tipificação de vários crimes. Quero lhe sugerir que, ao final - se V. EXª já não tiver pensado nisso -, envie cópia do seu discurso, com o meu apoio desde logo, ao Procurador-Geral da República para que S. Exª, na qualidade de chefe do Ministério Público, tome as providências que o cargo requer, ou requisitando fichas ou instruindo, para que não passe em branco o aval que este Poder Legislativo deu à privatização. E aí é que o discurso de V. Exª adquire a grandeza que lhe precisa ser dado. Não se pode fazer tábula rasa do que aqui se passou, com o sacrifício deste Poder Legislativo, para que, por trás disso tudo, estivesse interesses escusos e inconfessáveis. Se ninguém lhe der a minha solidariedade, tome-a desde logo.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Senador Bernardo Cabral, agradeço o aparte de V. Exª e quero ressaltar o fato de que V.Exª, assim como eu, compreende a gravidade desse episódio. Antes era por motivação política que se fazia o grampo. Hoje, a motivação é outra; a motivação é se buscar informações privilegiadas, é se saber o que se passa nos bastidores do Poder Público. Portanto, tivemos, na verdade, um grande retrocesso de natureza política.

       Quanto à sugestão que V. Exª. me faz, devo dizer que esse é um papel que, creio, o Ministério Público poderá , se considerar conveniente, exercer, até porque não acredito no que estou lendo. Se eu acreditasse no que estou lendo, eu aceitaria a sugestão de V. Exª. Li, mas faço a ressalva: não acredito que o que está transcrito aqui, como o existente nas fitas, tenha qualquer procedência, porque, neste caso, estaríamos, efetivamente, num caso tipificado, como bem disse V. Exª., de apreciação por parte do Ministério Público. Como me recuso à idéia de que isso seja verdade, com todo o respeito que tenho pela revista e pelos jornalistas que fizeram - creio que há nisso tudo algum equívoco, alguma informação improcedente - , é que não acolho a sugestão de V. Exª. Se estivesse convencido do que está publicado na revista, não teria a menor dúvida, Senador Bernardo Cabral, que eu acolheria a sua sugestão. Prefiro até ganhar, de certa forma, a antipatia, prefiro até ganhar, da parte dos que redigiram, uma certa restrição a aceitar que o que está aqui seja verdade.

       O Sr. Hugo Napoleão (PFL-PI) - Permite-me V. Exª. um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Concedo o aparte ao Senador Hugo Napoleão.

       O Sr. Hugo Napoleão (PFL-PI) - Eminente Líder Jader Barbalho, valho-me da oportunidade para tecer alguns comentários ao discurso de V. Exª, menos na condição de Senador e mais na condição de advogado de prisioneiro político e de ex-Ministro de Estado das Comunicações do Brasil. Na primeira - sabe muito bem V. Exª, que pertence aos quadros dos chamados autênticos do PMDB, do chamado “PMDB histórico” - que tivemos um período de exceção extremamente difícil. Sobre esse período já tive a oportunidade de discorrer com o seu aparteante anterior, o Senador Bernardo Cabral, a respeito das dificuldades que tínhamos para defender presos políticos. Os escritórios de advocacia tinham à época seus telefones grampeados. Alguns advogados tinham, inclusive, gravadores que eram colocados em seus escritórios, às urdidas, na calada da noite, para, eventualmente, captar alguma conversação que se fizesse. Não poucas vezes, confesso a V. Exª, - o tempo já passou de modo que já transcorreu o interstício - tive que promover encontros com advogados, no Rio de Janeiro, nas praças públicas, olhando de um lado para o outro, a fim de não sermos colhidos de surpresa por algum tipo de olheiro, vamos dizer assim, porque fugíamos do telefone. Os anos se passaram, e eis que me vejo Ministro de Estado das Comunicações no Governo do Presidente Itamar Franco, em pleno regime democrático. Sabia eu, então, que só poderia haver grampos telefônicos mediante autorização judicial. Era essa a orientação, evidentemente, que as Teles e o Sistema Embratel e Telebrás tinham por minha recomendação, em decorrência da própria lei. Agora, deparamo-nos com este quadro que V. Exª comenta, que é, por certo, lamentável. No entanto, da mesma maneira que V. Exª, diria que não acredito. Não é possível, Senador Jader Barbalho, que, a essa altura em que a democracia flui, em que estamos recém-saídos das urnas, continue a haver sistema de grampo no Governo Federal. Eu não acredito também; ficaria estarrecido se houvesse. De modo que quero prestar minha solidariedade àqueles que estão envolvidos, porque não é possível -- repito -- que algo dessa natureza ainda ocorra em nosso País, que queremos democrático, aberto, progressista e com efetiva atenção aos problemas sociais. São essas as observações que me permito incluir no texto do discurso de V. Exª, que mais se assemelham a um depoimento: o de que compartilho, também, de seu pensamento a respeito desse desagradável assunto.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Agradeço o testemunho dado por V. Exª nesse aparte, em reforço aos meus argumentos. Confesso-lhe que estou duplamente estarrecido -- com a continuidade desse processo e com o texto da revista. Recuso-me a aceitar ambos os casos. Não admito o grampo, tampouco a divulgação dos seus termos.

       O Sr. Gilberto Miranda (PFL-AM) - Concede-me V. Exª um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Ouço V. Exª com prazer.

       O Sr. Gilberto Miranda (PFL-AM) - Senador Jader Barbalho, parabenizo V. Exª pelo discurso, que, como Líder, realmente deveria fazer. Certamente, a revista errou quanto a um ponto. Em um trecho da matéria ora citada, alega-se que o jato de minha propriedade teria ido ao Rio Grande do Sul buscar o advogado Márcio Thomás Bastos, para ver documentos relativos às denúncias feitas por toda a imprensa. Não é verdade, porque minha empresa, que tinha o jato, vendeu-o há mais de sete meses, não no Brasil, mas nos Estados Unidos. Este fato poderá ser comprovado pela revista, no DAC: o jato, prefixo PTWGM, foi vendido, por volta de março, para os Estados Unidos. Seria, portanto, impossível a afirmação da revista de que o meu avião teria ido ao Rio Grande do Sul buscar o advogado do PT para analisar documentos. Não tenho avião há mais de seis meses; costumo pegar carona com o Senador Pedro Piva, senão ando em avião normal. Isso corrobora um pouco o discurso de V. Ex.ª no sentido de que a revista, com certeza, cometeu um erro terrível. Espero que, na próxima vez, ela se redima do erro. Muito obrigado, Senador.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Obrigado pelo aparte de V. Exª, que faz uma retificação, mas confesso que o trecho dessa reportagem que me motivou vir à tribuna não é o mesmo que trouxe o Líder do PT, apesar de estarem na mesma edição. O que me preocupa é o grampo e o que está atribuído às autoridades governamentais nessas fitas, algo que prefiro não aceitar, por julgar sem procedência.

       O Sr. Roberto Freire (Bloco/PPS-PE) - V. Exª me permite um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Ouço V. Exª, Senador Roberto Freire.

       O Sr. Roberto Freire (Bloco/PPS-PE) - O assunto, evidentemente, é grave, mas gostaria de fazer uma ressalva. Tenho acompanhado inúmeros debates, não só aqui no Senado, mas em vários lugares, e ouvido a recorrente afirmação de que houve um retrocesso, de que voltamos à época da ditadura. Lembro que grampo na época da ditadura era política oficial do Governo. Devemos ter certo cuidado, senão parece que nada fizemos; no entanto, realizamos muito. O povo brasileiro reconquistou a democracia, de forma que podemos discutir aqui o crime do grampo. Naquela época, não era crime, mas defesa do Estado contra o povo brasileiro. Faço, portanto, essa ressalva inicial e digo a V. Exª que, independentemente de acreditarmos ou não -- o que é uma questão de juízo individual --, o assunto é de extrema gravidade. Poderíamos até discutir, talvez em outro momento, questões sobre CPI ou sobre como o Poder Legislativo interferiria no assunto, mas há um dado importante na Constituição que votamos. Nós demos ao Ministério Público deste País o poder de ser o fiscal da lei. A Procuradoria da República não é mais um mero órgão das políticas do Executivo; ao contrário, é fiscal da lei, instrumento da cidadania. Se há notícia de crime, quer acreditemos seja o conteúdo verdadeiro ou não -- tenho grande dificuldade em crer no que diz a revista sobre figuras da República tão respeitáveis e por mim respeitadas --, não se trata de um problema de fé ou de credo de quem quer que seja, mas de algo que envolve autoridades, sendo a principal delas o Presidente da República. Caberia, portanto, ao Ministério Público apurar, até porque o grampo por si só é uma invasão de privacidade, no caso, cometida contra uma autoridade da República. Seria importante que o Ministério Público assumisse e desse tratamento adequado, para assegurar, conforme determina a Constituição brasileira, esse direito inalienável da pessoa, que é a privacidade. A Justiça sabe o que tornar público ou manter resguardado para garantir a privacidade, já que se vinculou a quebra do sigilo telefônico à decisão judicial, à intervenção do Poder Judiciário. Nesse sentido, é da maior oportunidade a idéia de que a Procuradoria da República, de imediato, acione o Ministério Público para apurar esse fato. Algumas vezes, o Brasil gosta muito de copiar os Estados Unidos, que têm uma boa prática nisso. É evidente que o conteúdo de lá foi algo que, para nós, soou extremamente constrangedor: problemas de assédio sexual ou de atividade sexual do Presidente da República, ou o desejo de se obstruir a Justiça em relação a isso. O nosso caso é mais sério: é a discussão concreta de atos de corrução, que espero não sejam verdadeiros. Tenho esperança de que o Ministério Público possa esclarecer isso o mais rapidamente possível. Essa seria a solução para não ficarmos no constrangimento de repelir ou acreditar, de transformar isso em uma disputa política entre Governo e Oposição. É uma exigência da sociedade brasileira ver isso esclarecido, porque não se trata de um assunto qualquer, mas da máxima gravidade. Um Presidente da República sofreu impeachment, por denúncias tão graves quanto essas, e que, ao final, revelaram-se verdadeiras.

       Isso tudo não pode ficar num mero discurso. O Poder Judiciário deste País e o Ministério Público têm poder para, de imediato, intervir. E acredito que o próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso, o Governador Mário Covas, o Ministro José Serra e, evidentemente, os familiares do ex-Ministro Sérgio Motta ficariam muito satisfeitos que se esclarecesse isso. E creio que todos nós aqui.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Senador Roberto Freire, concordo com as observações de V. Exª. Mas, quero registrar, outra vez, que me recuso a imaginar essas conversas. Recuso-me a imaginar que, como está gravado nas fitas, Mendonça de Barros se refere ao consórcio da Tele Norte Leste como “telegangue”; que Lara Resende comenta com Pérsio Arida a possibilidade de ágio em alguns leilões das Teles; que Mendonça de Barros negocia com a Telefónica e com italianos da Telecom; que, em várias conversas com André Lara Resende e Mendonça de Barros, o Presidente Fernando Henrique Cardoso só aparece perguntando sobre a privatização do Sistema Telebrás.

       Recuso-me, Sr. Presidente, a acreditar que seja possível neste País, se continuar a cometer essa violência, e agora contra autoridades, e autoridades que estão à frente de assuntos da maior responsabilidade do País, que é a privatização do patrimônio público, e que essas autoridades estejam conversando com pessoas interessadas. Está escrito aqui, Sr. Presidente, recuso-me a admitir isso como verdade.

       Creio que nisso tudo há muita leviandade, há muito comentário improcedente. Mas não posso admitir, por exemplo, que uma concorrente tenha conseguido vencer a outra porque tomou conhecimento da conversa do Presidente do BNDES com a outra e que, por isso, a venceu. Como, Sr. Presidente, é possível imaginar uma operação de tal natureza? De forma alguma.

       Portanto, Sr. Presidente, creio que temos a obrigação, os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, o Ministério Público e a sociedade, de buscar mecanismos de proteção a fim de que não se coloque de forma gratuita e sob suspeita episódios que, à primeira vista, são considerados da maior gravidade.

       O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Jader Barbalho?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Pois não, nobre Senador Ramez Tebet.

       O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Senador Jader Barbalho, pretendo me congratular com V. Exª, que, como Líder do PMDB, expressa, com toda certeza, o sentimento de sua Bancada. E embora V. Exª se recuse a crer no que está lendo, no que está publicado e no que é do conhecimento da Nação, o fato é que há - como disse o Senador Roberto Freire - uma notitia criminis. E a notitia criminis é de muita gravidade, como todos salientam, porque atinge a privacidade do Presidente da República e de seus auxiliares e dá a notícia de um crime que antes era tido como crime político. Mas hoje é tido como crime comum, Senador Jader Barbalho. Como tal, é evidente que a apuração desse crime é atribuição da autoridade competente, que é a autoridade policial. O Ministério Público tem o dever indeclinável, e a esta altura já devia ter se pronunciado, no meu entender. O Ministério Público já devia ter ordenado à Polícia Federal que apurasse o fato, porque é a única autoridade competente para fazê-lo. Afinal de contas, estão noticiando um fato que, se verdadeiro for, é um fato criminoso. Há uma notícia de um crime praticado, de um crime grave que atinge as pessoas e pode atingir os negócios da República. E, nesse sentido, urge a maior transparência possível, o maior rigor e empenho possíveis na apuração dos fatos. E essa apuração só pode ser feita pela autoridade policial competente, meu caro Líder Jader Barbalho. Não há possibilidade de um outro órgão averiguar isso. Há possibilidade de um órgão do Governo averiguar o que se passa nas suas entranhas. Mas, se apurarem qualquer coisa, fatalmente, terão que remeter essas peças à autoridade policial, ao Ministério Público. É o que exige a Constituição de 1988. Portanto, na esteira da opinião do Senador Bernardo Cabral e de outros Senadores que se pronunciaram, como o Senador Roberto Freire, é que me coloco. Mas não sem antes congratular-me com V. Exª por estar discutindo com vigor e energia esse assunto, a respeito do qual a Nação brasileira acaba de tomar conhecimento nessa última semana.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Agradeço a V. Exª pelo aparte. V. Exª integrou o Ministério Público e, por isso, tem perfeita substância nos seus argumentos, no sentido de que este assunto - e insisto que recuso-me a aceitar o que está escrito na revista - merece ser aprofundado.

       O Sr. Pedro Piva (PSDB-SP) - V. Exª me permite um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Ouço com prazer V. Exª.

       O Sr. Pedro Piva (PSDB-SP) - Senador Jader Barbalho, Líder do PMDB, quero cumprimentá-lo pela sua inteligência. Ouço sempre V. Exª com respeito e admiração. Sua fala traduz bem a indignação que toma conta de diversos setores políticos e da cidadania brasileira. Quero também dizer que, citado pelo Senador Gilberto Miranda como meu carona no jato, na minha empresa fizemos nosso ajuste fiscal, antes mesmo dele. Nosso avião também foi vendido. Infelizmente, S. Exª não poderá tomar carona. Nem ele, nem qualquer advogado ou qualquer lobista podem andar num jato que não me pertence. Fico triste, gostaria até de poder ter um jato para levar todas as pessoas que me fossem caras. Eu queria fazer só este registro, de que este é um assunto fora de questão.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Muito obrigado, Senador.

       O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - V. Exª me permite um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Ouço com prazer V. Exª.

       O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Quero cumprimentar V. Exª pela tranqüilidade e serenidade de seu pronunciamento. Desejo também felicitar o Líder do PT, o Senador Suplicy, pela serenidade do seu pronunciamento. Aliás, cá entre nós, gostaria de felicitar o Partido dos Trabalhadores, por meio da Deputada Marta Suplicy e do seu Presidente de Honra, Luiz Inácio Lula da Silva, pela grandeza com que agiram em uma hora como essa. Tivesse esse caso vindo à tona às vésperas da eleição teria incendiado o segundo turno, e as conseqüências seriam imprevisíveis. Tiveram a grandeza de entender que o assunto era grave e que não tinham as provas suficientes. Por isso, não fizeram a denúncia. Agiram de maneira correta. Pelo que conheço do Sr. Mário Covas, do Presidente Fernando Henrique, do Sr. José Serra e do próprio Sr. Sérgio Motta, não me passa pela cabeça que eles possuam conta no exterior. Agora, com todo o respeito, entre eu me recusar a acreditar e a obrigatoriedade de investigar, há uma diferença, até porque é um assunto de muita gravidade. O prezado ex-Governador Paulo Maluf e o ex-Presidente Fernando Collor, que procurou o nobre Senador de Alagoas - segundo S. Exª mesmo confirma - afirmando que possuía provas, pediam para que fosse feita a denúncia. Então, é um ex-Presidente da República, um ex-Presidente do Banco do Brasil e um ex-Governador e candidato a Governador que dizem que têm um dossiê envolvendo pessoas do Governo. Se é falsa essa afirmativa, essas pessoas devem ser chamadas à responsabilidade, para que isso não se repita. Não se pode brincar com a honra do cidadão afirmando coisas que não são verdadeiras. O mal do Brasil é que aqui não se apura a responsabilidade quando se fala mal de alguém. Recuso-me a dizer que o Presidente Fernando Henrique Cardoso não é uma pessoa honesta; digo que é um homem de bem. Mas, de recusa em recusa, a classe política é nivelada por baixo; ninguém leva a sério a classe política. Por quê? Porque acusam e não apresentam provas; o acusado não pode defender-se, e não acontece nada a quem acusa. Penso, nobre Líder, que o ilustre ex-presidente da OAB, nosso caro relator da Assembléia Nacional Constituinte, situou bem a questão. Se quiséssemos envolvimento político, se quiséssemos fazer barulho, poderíamos votar a instalação de uma CPI para fazer a investigação. Entretanto, não é esse o caminho, os fatos não levam a isso. Os fatos levam, sim, a que a Procuradoria-Geral da República determine que um procurador especial faça ampla investigação e tire conclusões, e que, se for o caso, que o ex-Presidente Fernando Collor compareça ao Supremo Tribunal, em virtude de sua denúncia. Trata-se de crime contra a segurança nacional tentar envolver o Presidente da República em escândalo. Faço um apelo ao meu caro Líder, que faz um brilhante pronunciamento, para que aceite a proposta do Senador Bernardo Cabral, do ilustre Senador de Mato Grosso do Sul e de tantos outros, no sentido de fazer o chamamento dos denunciantes ao Supremo Tribunal Federal. É preciso, também, que a Procuradoria-Geral da República faça um estudo da matéria, que envolve também o Sr. Maluf, o Sr. Collor e o ex-presidente do Banco do Brasil.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Senador Pedro Simon, agradeço o aparte de V. Exª.

       Gostaria de chamar a atenção do Senado para a minha abordagem, que é distinta daquela feita pelo Senador Eduardo Suplicy. S. Exª se ateve à questão relativa a uma hipotética conta em um paraíso fiscal, que me recuso, de forma peremptória, a admitir como verdadeira. O que abordo é a outra parte da notícia, aquela relativa a fitas que teriam sido entregues por autoridades do Governo ao próprio Governo e à transcrição dessas fitas, atribuindo-a a autoridades do Governo. Eu me recuso a admitir essas transcrições. É coisa distinta. Num fato há um documento cuja autenticidade está sendo questionada; no outro, há fitas que as autoridades entregaram, não questionam sua existência e dizem que estão sendo chantageadas. A revista transcreve trechos da transcrição, e eu me recuso a admiti-los. Portanto, trata-se de matéria diversa da abordada pelo Senador Suplicy. Numa há notícia de um documento, mas não há prova da sua existência; na outra, fala-se de fitas entregues por um Ministro de Estado ao próprio Governo, dizendo que estava sendo chantageado. Isso é da maior gravidade, e eu me recuso, como Senador da República, solidário ao Governo, a aceitar que essas denúncias tenham procedência.

       O Sr. Odacir Soares (PTB-RO) - V. Exª concede-me um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Ouço o Senador Odacir Soares.

       O Sr. Odacir Soares (PTB-RO) - Nobre Senador Jader Barbalho, gostaria de fazer algumas considerações ao brilhante e oportuno pronunciamento de V. Exª, afastando-me um pouco da questão que está sendo objeto dos apartes e considerada como se fosse a mais importante, qual seja, a escuta telefônica. Claro que isso é gravíssimo, exceto quando autorizada judicialmente. Todos os advogados sabem disso. Esse direito à privacidade está inscrito em nossa Constituição. Mas acredito que nesse episódio esse fato é secundário. O mais importante a esta altura, depois da divulgação feita pela revista Época e pela TV Record, é o conteúdo das fitas, porque grampo telefônico já ocorreu antes no Governo e levou à demissão de vários funcionários do Palácio do Planalto. Estamos vivendo agora a continuação desse episódio. Li em nosso jornal uma frase do Senador Antonio Carlos Magalhães, e concordo com S. Exª. Não acredito que o Presidente da República ou seus ministros, ou quem quer que seja ligado ao Presidente da República, possam ter cometido qualquer ilícito ou possam ter orientado as privatizações nessa ou naquela direção. O Presidente do Senado disse que tomou conhecimento de trechos da fita e não encontrou neles nada que levasse à conclusão de que houve prática de qualquer irregularidade pelo Senhor Presidente da República. O fato mais importante a esta altura - a notícia chegou aos mais distantes rincões do País - é, efetivamente, a majestade do poder, o fato de que estão sendo questionadas a moralidade e a decência do Governo. Por isso penso que o problema não é mais o grampo. Esse é um problema policial, da alçada do Ministério Público Federal, pois trata-se de crime federal. Não deveríamos sequer estar aqui imaginando pedir ao Procurador fazer isso ou aquilo, porque é ato de ofício, é da competência originária do Procurador-Geral da República tomar determinadas iniciativas sem a provocação de quem quer que seja. Assim, não deveríamos ter aqui a preocupação de pedir ao Procurador-Geral da República que tome determinadas providências, pois isso é da sua competência privativa e originária. Acredito no Presidente da República, assim como nos seus ministros. Acredito também na isenção com que esse processo foi conduzido, mas o fato de eu acreditar não implica que o resto do País também acredite. O Governo está na obrigação de tornar transparente esse episódio. E deve fazer isso rapidamente, para pacificar a família brasileira. Aplica-se, no caso, aquele adágio: “não basta a mulher de César ser honesta; ela tem de parecer honesta”. Esse era o aparte que eu queria trazer ao discurso de V. Exª, pedindo ao Governo que seja rápido, que elucide esse episódio, que, queiramos ou não, está denegrindo a sua imagem. Acreditemos ou não, o episódio está denegrindo a imagem do Governo. Nós, que o apoiamos, não desejamos que isso perdure, porque a continuação desse episódio é ruim para o País, é ruim para a sociedade brasileira e é pior ainda porque, neste momento, estamos tratando de um grande ajuste fiscal, e o Brasil está negociando suas contas com o FMI, com organismos financeiros internacionais. Isso deixa o País muito vulnerável, queiramos ou não. Este é um dos pontos mais importantes disso tudo: o Brasil está realizando negociações seriíssimas com organismos financeiros internacionais. O fato de vir a público uma denúncia desse tipo e desse alcance, queiramos ou não, é gravíssimo, porque afeta a credibilidade do Governo brasileiro. Por isso entendo - e esta é a contribuição que trago ao discurso de V. Exª - que o Governo precisa ser rápido, precisa esclarecer o País e, se for o caso, até tornar público o conteúdo dessas fitas. Discutir o grampo ou a violência pela quebra da privacidade do cidadão, a esta altura, é bobagem, porque, diariamente, milhares e milhares de cidadãos brasileiros, em todos os escalões do Poder Público, têm sua privacidade violada por atitudes desse tipo.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Agradeço o aparte e concordo com a preocupação de V. Exª. Este é um momento muito delicado da vida nacional, e temos de reagir a esse episódio. Não podemos aceitar, de forma alguma - essa foi a motivação que me trouxe à tribuna -, que o contido na revista Época seja procedente. Creio - sem pôr, em absoluto, em dúvida a competência profissional do jornalista - na improcedência do que está aqui colocado como transcrição do que estaria contido nessas fitas.

       O Sr. Roberto Requião (PMDB-PR) - Permite-me V. Exª um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Ouço o Senador Roberto Requião.

       O Sr. Roberto Requião (PMDB-PR) - Permite V. Exª um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Ouço o Senador Roberto Requião.

       O Sr. Roberto Requião (PMDB-PR) - Senador Jader Barbalho, V. Exª colocou, com muita responsabilidade e precisão, a questão das fitas e insistiu na sua recusa pessoal em reconhecer a autenticidade das mesmas. Não sou tão generoso. Paira uma dúvida que poderá fazer com que o Brasil inteiro confira ao processo de privatização o famoso ISO 171. O art. 171 do Código Penal define os crimes de estelionato. V. Exª está cobrando, com elegância, uma atitude imediata do Ministério Público Federal, do Procurador-Geral da República, Dr. Geraldo Brindeiro, que não tem falhado com o País, que dele espera atitudes firmes. Eu queria analisar brevemente, Senador, a questão dos documentos. Eu me recuso, usando do seu artifício elegante para abordar o assunto, a acreditar que o amigo do Presidente da República, Sr. Paulo Maluf, tenha tido a leviandade, a irresponsabilidade absoluta de divulgar documentos que não fossem verdadeiros. Eu me recuso a acreditar que as filhas do Dr. Paulo Maluf tenham procurado a Deputada Marta Suplicy para induzi-la a divulgar documentos que não fossem verídicos, ou documentos de cuja veracidade elas pessoalmente não estivessem convencidas. Quero lembrar a este Senado que na CPI dos Precatórios, quando tentávamos trazer para um depoimento o Dr. Paulo Maluf, que tinha sido Prefeito de São Paulo, ele não comparecia porque estaria supostamente no exterior, mas, na verdade, ele estava com seu amigo Fernando Henrique Cardoso no Palácio do Planalto, o que demonstra que havia entre os dois uma relação de absoluta confiança. Até prova em contrário, quero acreditar que o Dr. Paulo Maluf não mentiu para o Lula, não mentiu para o Luiz Gushiken, e suas filhas não mentiram para a Deputada Marta Suplicy. Quero acreditar que o amigo do Presidente da República, ex-Prefeito de São Paulo, Dr. Paulo Maluf, acreditava na veracidade dos documentos que apresentava ao PT para viabilizar uma denúncia no processo eleitoral. Quero acreditar, até prova em contrário, e essa prova tem de ser produzida pela Procuradoria-Geral da República e pela Polícia Federal.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Eu agradeço o aparte de V. Exª e quero dizer que não faço a recusa por mera elegância parlamentar ou política, Senador Roberto Requião. Preocupa-me que num episódio de tal gravidade as pessoas envolvidas, que são da maior responsabilidade e fazem parte da vida pública do nosso País, possam precipitadamente ser julgadas. Conhecemos vários episódios da vida deste País, de longo prazo ou até de curto prazo, em que tantos homens públicos foram injustiçados.

       O que eu recuso é o grampo; o que eu me recuso é imaginar que as transcrições que a revista publica coincidam com o existente na fita. É bastante grave que o que a revista transcreveu possa existir nas fitas. Eu recuso isso tudo; eu me recuso até a imaginar, mesmo porque seria uma tremenda incompetência, uma tremenda burrice um ministro de Estado ou um Presidente de um órgão importante, como o BNDES, admitir que houve uma negociação às vésperas de uma privatização; seria uma tremenda burrice um ministro de Estado admitir que uma gangue estava a disputar uma parcela, da maior importância, da telefonia no Brasil .

       É por isso que eu faço o registro, eu não quero julgar de forma preconceituosa. Portanto, não é por elegância, Senador Roberto Requião, é, acima de tudo, por um dever de responsabilidade.

       O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - V. Exª me concede um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Ouço o Senador Eduardo Suplicy.

       O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Senador Jader Barbalho, é muito importante que V. Exª traga o assunto à discussão e, obviamente, com a sua incredulidade quanto à possibilidade da existência de fatos tão graves, está querendo um esclarecimento. Hoje, a Nação brasileira, o próprio Fernando Henrique Cardoso - acredito -, todos os Srs. Senadores e Deputados Federais desejam uma completa explicação acerca desses fatos. Assim, essa elucidação caberá aos órgãos responsáveis -- que são, de um lado, o Congresso Nacional, que tem a função de fiscalizar os atos do Poder Executivo e sempre contribuir para que assuntos como este sejam inteiramente resolvidos, e, evidentemente, também, a Procuradoria-Geral da República. O Ministério da Justiça e a Agência Brasileira de Inteligência, sob a responsabilidade da Casa Militar, têm a capacidade de colaborar para que o episódio seja esclarecido. Fiz um requerimento para que o General Alberto Cardoso compareça à Comissão de Fiscalização e Controle e nos esclareça tudo o que apurou até o momento a respeito da existência ou não dos documentos citados na revista Época e no pronunciamento de V. Exª. Tudo aquilo que puder ser feito para a elucidação dos fatos, no mais rápido tempo possível, será importante para a Nação brasileira.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Senador Eduardo Suplicy, não tenho dúvida de que esse é o objetivo de todos nós. Faço esses comentários exatamente em relação à improcedência do que estaria contido nessas fitas.

       O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Permite V. Exª um aparte?

       O Sr. Sérgio Machado (PSDB-CE) - Permite V. Exª um aparte?

        O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - O Presidente da Casa me chama a atenção com relação ao tempo. Não sei se seria possível, Sr. Presidente, ouvir o ilustre Líder do PT e o ilustre Líder do PSDB, que me solicitam a palavra. Se a benevolência de V. Exª assim o permitir, com muita honra e alegria, ouvirei os dois.

       O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - Acho que o Líder do PT já aparteou.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Refiro-me ao Senador José Eduardo Dutra.

       O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - V. Exª se refere, então, ao futuro Líder.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Desculpe-me, Sr. Presidente.

       O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - O Senador Antonio Carlos Magalhães ainda não se filiou ao PT, mas, se algum dia o fizer, terá direito a votar a indicação dos nossos Líderes. Foi um comentário simpático. Senador Jader Barbalho, V. Exª tem feito questão de registrar que está tecendo comentários apenas sobre o episódio relativo às fitas. O Senador Eduardo Suplicy fez um pronunciamento anteriormente a V. Exª, tratando apenas dos episódios relativos à possível conta existente num paraíso fiscal. Durante a intervenção de V. Exª e de apartes de diversos Senadores, nós ouvimos, por muitas vezes, dizerem: “Eu me recuso a acreditar nisso, eu me recuso a acreditar naquilo”. Eu, particularmente, não me recuso a acreditar em nada. Em tudo aquilo que for provado, cabe a qualquer pessoa de bom senso acreditar. Agora, neste momento, a discussão não pode ser, de forma alguma, sobre quem tem mais fé ou quem tem menos fé, até porque tanto os crédulos quanto os incrédulos têm lugar no Reino dos Céus. O fundamental é que é inadmissível que continuem “grampos” atingindo autoridades da República. Há dois anos, salvo engano, foi denunciada a utilização de “grampo” relacionado ao caso Sivam e ficou por isso mesmo. A continuidade da prática desse tipo de ilícito decorre principalmente da impunidade. É inaceitável que tal situação continue. Se o Presidente da República não tem garantida a sua privacidade, imaginem o que cada um de nós, simples mortais, ou cada brasileiro, mais mortais ainda, começarão a sentir a respeito do seu direito de privacidade. Esse é o primeiro ponto. O segundo é que não tenho dúvida de que, se o Partido dos Trabalhadores tivesse de forma leviana feito denúncias que se comprovassem falsas, os Céus voltariam sua ira contra nós. Assim, se há depoimentos tão contundentes sobre a tentativa de lideranças políticas deste País levantarem acusações levianas - e vou partir do princípio que o são até o momento em que chegar comprovação em contrário - o rigor cobrado dessas pessoas deve ser o mesmo que seria cobrado da Oposição caso tivéssemos feito acusações levianas. Naturalmente, caminhos já foram apresentados por vários Senadores: ação do Ministério Público, ação das instituições para que todas as informações relativas ao processo sejam devidamente apuradas e para que não tenhamos, de ano em ano ou de dois em dois anos, de nos deparar com situações como essa, que acabam contribuindo para enfraquecer as instituições democráticas deste País. Muito obrigado.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Agradeço o aparte de V. Exª. Em primeiro lugar, quero cumprimentá-lo, por não guardar as dúvidas que tenho. Tenho mais dúvidas do que V. Exª. Por isso mesmo, recuso-me a admitir as acusações como procedentes.

       O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Senador, permita-me esclarecer que eu não disse que não tenho dúvidas. Nunca vou usar o termo “recuso-me a acreditar” porque, se qualquer fato for comprovado, vou ter que, em nome do bom senso, acreditar. Não vou usar o termo “recuso-me a acreditar” para nada, assim como não uso o termo “afirmo que isso ou aquilo é verdadeiro”.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Perfeito. Então, V. Exª tem mais dúvidas do que eu. Tenho mais certezas do que V. Exª, ou menos dúvidas, no caso.

       Por outro lado, eu estou solidário com V. Exª sobre a questão do “grampo”. Isso há de ter um fim. Não é possível que de tempos em tempos episódios dessa natureza coloquem não só autoridades deste País, mas também o cidadão comum em situação profundamente vulnerável.

       E quanto à apuração, também concordo com V. Exª.

       O Sr. Sérgio Machado (PSDB-CE) - V. Exª me permite um aparte?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Concedo o aparte a V. Exª e, em seguida, Sr. Presidente, encerrarei meu pronunciamento.

       O Sr. Sérgio Machado (PSDB-CE) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, nobre Líder Jader Barbalho, o interessante desse fato é que, de todas aquelas pessoas que tiveram a pseudodenúncia na mão, nenhuma teve coragem de assumi-la. Foi assim com o ex-Presidente Fernando Collor de Mello, que procurou o nobre Senador Djalma Falcão dizendo que tinha uma denúncia gravíssima - nem sei se ele tem condição moral de fazer isso. O Senador Djalma Falcão disse que faria a denúncia, mas, como qualquer cidadão responsável, queria as provas. E as provas ficaram de ir para as mãos dele na semana seguinte e na outra - e veja que isso foi no período eleitoral, em que as pessoas ficam mais ousadas. Depois, o ex-Prefeito Paulo Maluf procurou o candidato a Presidente Lula, trazendo as provas. O PT analisou as acusações com responsabilidade. O Sr. Paulo Maluf não teve coragem de denunciar. Portanto, fica claro que a denúncia não tem base. Nem na eleição os adversários tiveram coragem de usá-la. Ela não tem base. Nós temos de ter responsabilidade, temos de respeitar as autoridades. Esse tipo de atitude não tem mais lugar no nosso País. Nós também temos de avançar, agir com responsabilidade, pois estão sendo negociados assuntos fundamentais para o Brasil no mercado internacional; sendo assim, não cabem denúncias que ninguém assume, que uns jogam para os outros de forma irresponsável. Por que as pessoas que tinham a denúncia na mão não a apresentaram? Por que um ex-Presidente da República não a apresentou? Por que um ex-Prefeito não a apresentou e buscou outros para fazer a denúncia? Porque sabem que as denúncias são falsas e não tiveram coragem de assumir.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Senador Sérgio Machado, não me interessei por essa parte do tema exatamente pelas razões que V. Exª está a apresentar; porém, interessei-me por outro assunto. As denúncias foram apresentadas por um Ministro de Estado, Ministro que diz estar sendo chantageado e leva ao Governo as fitas. É diferente! Preocupou-me a transcrição parcial das fitas publicada pela revista Época, cujos trechos são da maior gravidade.

       Concordo plenamente com V. Exª. Por isso não me interessei pela outra parte. Eu me interessei pelo que tem consistência, ou seja, o fato de um Ministro de Estado dizer ao Presidente da República que está sendo chantageado e uma revista da respeitabilidade da Época transcrever parte do que integraria essas fitas, transcrição essa que eu, mais uma vez, me recuso a admitir que tenha qualquer procedência.

       O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Jader Barbalho?

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Senador Antonio Carlos Valadares, não quero, absolutamente, abusar do outro Antonio Carlos, o nosso Presidente.

       O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - O PT falou. Agora gostaria que o Sr. Presidente, em sua liberalidade, permitisse que o PSB também falasse.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Com a aquiescência do Presidente, eu me comprometo, após ouvir V. Exª, a encerrar meu pronunciamento.

       O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - Senador Jader Barbalho, o que nos causa espécie nada tem a ver com o que ocorre nas hostes do Governo. Causa-me espécie que companheiros que fazem parte da base de sustentação do Governo Fernando Henrique Cardoso tenham sido instrumento para convencer determinados partidos de Oposição de que tais denúncias seriam verídicas. E causa-me espécie ainda o fato de o Presidente da República, uma das pessoas lembradas nas supostas acusações, não ter ainda movido uma ação por perdas e danos contra a revista Época, que se encarregou de levar ao Brasil inteiro notícias tão bombásticas envolvendo autoridades ligadas ao Governo. Num caso como este, se a notícia é inverídica, se a notícia é improcedente e há uma calúnia, uma injúria sendo praticada contra a autoridade constituída, o Presidente da República deveria ser o primeiro a bater às portas da Justiça não só para averiguar a veracidade de que o “grampo” tenha sido feito por este ou aquele cidadão, mas também para mover uma ação criminal, porque divulgar “grampo” é crime. Uma denúncia desse gênero, como dispõe a Constituição, prejudica a imagem de qualquer cidadão, imaginem a do Presidente da República. Então, como integrante do PSB, quero dizer que fazemos oposição aberta ao Presidente da República, mas jamais utilizaríamos expedientes tão baixos como este para atingir a imagem, a figura do Presidente da República por meios condenáveis e que são, inclusive, objeto de punição prevista na legislação penal e, também, condenados por nossa própria Constituição. Em resumo, penso que o Presidente da República tem um nome, até prova em contrário, digno e respeitado pela Nação, não só pelo seu passado, mas também por ser um homem progressista, um intelectual. O próprio Governador de São Paulo diz: “Olha, não é o meu forte roubar”. Ora, se eles estão sendo atingidos, notadamente o Presidente da República, a primeira coisa que Sua Excelência deve fazer é mover uma ação, representar a revista Época junto ao Ministério Público, porque só assim conseguiremos chegar em quem colocou à disposição da revista fitas tão bombásticas que estão sendo divulgadas e causando, tenho certeza, mal-estar no âmbito do Governo e constrangimentos entre Senadores, principalmente Senadores da base de sustentação do Governo. Agradeço a V. Exª, Senador Jader Barbalho, a paciência com que me ouviu.

       O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA) - Eu é que agradeço o aparte de V. Exª e a tolerância do Presidente.

       Antes de encerrar, quero dizer a V. Exª, em primeiro lugar, que só o Dr. Paulo Maluf é que pode explicar o motivo que o levou a procurar o Partido dos Trabalhadores. Não tenho a menor condição de explicar isso.

       Discordo de V. Exª quando diz que o Presidente deveria processar a revista, uma vez que ela não inventou o fato, tanto que os personagens envolvidos estão a dar testemunho da existência dele. Em relação às fitas, um Ministro do Estado é que teria procurado o Presidente da República para pedir providências quanto a uma possível chantagem.

       Sr. Presidente, encerro aqui meu pronunciamento agradecendo a benevolência de V. Exª. E, na condição de Líder do PMDB na Casa, gostaria de reiterar a minha solidariedade ao Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Estou certo da improcedência dessas matérias que procuram, no meu entendimento, publicar a questão de forma equivocada em relação ao assunto, e estou certo também de que o Presidente da República, o Congresso Nacional, o Poder Judiciário e a sociedade brasileira buscarão fórmulas para evitar que procedimentos antidemocráticos, como o caso do “grampo”, continuem lamentavelmente a fazer parte da nossa história.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/11/1998 - Página 15462