Pronunciamento de Casildo Maldaner em 13/11/1998
Discurso no Senado Federal
DEFESA DA INDUSTRIALIZAÇÃO DE MEDICAMENTOS A BASE DE PLANTAS NACIONAIS EM FACE DA RIQUEZA DA FLORA BRASILEIRA.
- Autor
- Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
- Nome completo: Casildo João Maldaner
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SAUDE.:
- DEFESA DA INDUSTRIALIZAÇÃO DE MEDICAMENTOS A BASE DE PLANTAS NACIONAIS EM FACE DA RIQUEZA DA FLORA BRASILEIRA.
- Publicação
- Publicação no DSF de 14/11/1998 - Página 15706
- Assunto
- Outros > SAUDE.
- Indexação
-
- DEFESA, INCENTIVO, INVESTIMENTO, INDUSTRIALIZAÇÃO, MEDICAMENTOS, PROCEDENCIA, FLORA, VEGETAIS, UTILIZAÇÃO, MEDICINA, BRASIL, PROMOÇÃO, MELHORIA, ATENDIMENTO, ASSISTENCIA MEDICO-HOSPITALAR, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS).
O SR. CASILDO MALDANER
(PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, a saúde é, hoje, no Brasil, um caso de calamidade pública. É impossível para nós, no exercício da função parlamentar, omitirmo-nos diante do inexorável processo de deterioração das condições de saúde em nosso País. Os incontáveis casos de fraude, corrupção, negligência no atendimento médico, má administração de hospitais e toda a sorte de desrespeito ao bem-estar da população levam-me a ocupar freqüentemente esta tribuna para manifestar o meu repúdio ao estado de descalabro da gestão da saúde e à indiferença dos responsáveis em relação ao sofrimento do povo brasileiro.
Ainda recentemente, pronunciei-me a respeito do escândalo da fraude de medicamentos, que, até hoje, continua a nos surpreender com desdobramentos inesperados e alarmantes.
Hoje, volto ao tema dos medicamentos não mais para denunciar a prática das falsificações, mas para apelar ao Governo Federal no sentido de desenvolver programas específicos de incentivo à produção comercial de remédios elaborados à base de plantas brasileiras, como alternativa para barateamento do custo, melhoria da qualidade e valorização de nossa matéria-prima.
Não se trata, como pode parecer à primeira vista, de questão secundária ou paliativa no quadro dos grandes problemas da saúde. A Organização Mundial da Saúde - OMS, consciente da importância do poder curativo da flora, incluiu as plantas no programa Saúde para Todos no Ano 2.000, atestando a relevância da utilização dessa riqueza natural para a produção de medicamentos eficazes na recuperação e manutenção da saúde das populações. A OMS estima que 80% da população do mundo, de algum modo, usam plantas como medicamentos, sendo utilizadas cerca de 25 mil espécies vegetais na medicina tradicional.
O Brasil é um dos quatro países que apresentam maior biodiversidade em todo o mundo, sendo o primeiro em número total de espécies. Em nossos três milhões e quinhentos mil quilômetros quadrados de florestas, existe a mais diversificada reserva de plantas do planeta, isto é, 20% do total de espécies vegetais encontradas na Terra. Só dentro da Floresta Amazônica existem entre 5 milhões e 30 milhões de plantas diferentes. Não se sabe o número preciso porque poucas foram estudadas, mas só as que têm gênero e espécie identificados somam 30 mil e representam 10% das plantas de todo o planeta.
Por outro lado, estatísticas da OMS apontam o Brasil como o quarto maior consumidor de medicamentos do planeta, só perdendo para os Estados Unidos, a França e a Alemanha.
Diante desses dados, nada mais oportuno, portanto, do que ocupar esta tribuna para falar sobre a riqueza da flora brasileira e a necessidade de estimular-se, cada vez mais, a industrialização de medicamentos à base de plantas em nosso País.
No Brasil, além da abundância da flora, ou exatamente em razão disso, existe uma vasta tradição de transmissão de ensinamentos sobre as plantas e suas propriedades curativas, a ponto de constituir uma verdadeira ciência popular, riquíssima, no que concerne à utilização de plantas, de folhas e de raízes, que é preciso ser resgatada e preservada, como componente da nossa cultura e identidade nacional.
Nesse sentido, existem expectativas promissoras de ampliar e consolidar a utilização de medicamentos à base de plantas nos serviços públicos de saúde de nosso País. Vários Estados da Federação e o Distrito Federal vêm introduzindo a fitoterapia em seus programas de atenção primária à saúde pela eficácia, facilidade de acesso e maior adequação dos medicamentos à realidade socioeconômica do País.
Segundo reportagem da Folha de S. Paulo de 30 de junho último, o programa de Fitoterapia da Klabin do Paraná Produtos Florestais, de Telâmaco Borba, é responsável por 70% dos atendimentos médicos da empresa. São beneficiadas cerca de 15 mil pessoas, entre funcionários e seus dependentes. Implantado em 1984, o programa tem o invejável índice de 97% de aceitação entre as pessoas atendidas. Em média, a empresa realiza 40 mil atendimentos médicos por ano. Além de mais eficientes, os fitoterápicos saem 56% mais baratos para a empresa, se comparados aos medicamentos convencionais.
Por isso, Srªs e Srs. Senadores, muitas outras experiências poderiam ser citadas. Entretanto, o êxito dessas iniciativas não é o resultado de uma ação ampla, de abrangência nacional, mas de tentativas localizadas e de alcance limitado, se consideradas as dimensões e o potencial do País.
A verdade é que o Governo Federal não vem dando a devida atenção às possibilidades econômicas da industrialização de medicamentos fitoterápicos. A conseqüência mais grave dessa atitude é pagarmos custos altíssimos para utilizarmos medicamentos produzidos por indústrias estrangeiras, que investiram recursos em pesquisas de nossa riquíssima flora, recorreram a nossos pesquisadores e, hoje, faturam milhões de dólares com a industrialização farmacêutica de matéria-prima extraída das plantas brasileiras.
A esse respeito, o caso da espinheira-santa é exemplar. O Japão patenteou propriedades ativas da planta para o combate à dor no tratamento do câncer e como antiinflamatório para o combate a úlceras e lesões no estômago. Planta tipicamente brasileira, as duas espécies conhecidas de espinheira-santa só se desenvolvem por aqui. Os japoneses terão de comprar matéria-prima do Brasil, mas o registro da patente dificulta a liberação de recursos para a pesquisa de novos medicamentos a partir do princípio ativo.
Esses e outros riscos exigem medidas efetivas por parte do Governo. É preciso que existam programas específicos para incentivar a produção comercial de plantas medicinais no País. Com o crédito de programas como o Pronaf - Programa de Incentivo à Agricultura Familiar - seria possível a produção, em pequenas propriedades, de plantas medicinais.
É preciso também retomar as propostas de implantação da alternativa fitoterápica no âmbito do Sistema Único de Saúde, bem como de normatização do setor de medicamentos fitoterápicos, como forma de garantir o indispensável controle de qualidade.
Finalizando, Sr. Presidente, nobres Colegas, volto ao apelo fundamental deste breve pronunciamento, que consiste na defesa da necessidade de adoção de medidas destinadas a estimular a industrialização de medicamentos feitos a partir dos princípios ativos encontrados na flora brasileira.
Uma política vigorosa de valorização do setor de medicamentos fitoterápicos encontra respaldos econômicos, culturais e ideológicos em nossa realidade. Os altos custos dos medicamentos industrializados tradicionais, freqüentemente fora do alcance do poder aquisitivo de imensa parcela de nossa população, justificam amplamente a valorização das nossas riquezas naturais, do nosso imenso patrimônio terapêutico e a sua utilização para a produção de medicamentos de baixo custo e comprovada eficácia.
A flora brasileira é uma das mais diversificadas do mundo. Precisamos conservá-la e também explorar seu potencial com critério e cuidados de sustentabilidade. Não podemos permitir que a omissão e o desinteresse acarretem, às nossas reservas vegetais, conseqüências análogas às historicamente verificadas com outras riquezas naturais de nosso País.
Era o que desejava dizer, Sr. Presidente, nobres Colegas. Embora breves as considerações, eu não poderia deixar de trazer a esta Casa o cuidado que acredito o Ministério da Saúde deveria ter principalmente com esse assunto. É necessário atenção maior do Governo como um todo para que possamos atender a maior parte da população brasileira com alternativas mais econômicas, mais baratas e mais simples que vamos encontrar na nossa flora.
Caso não tomemos o devido cuidado, teremos prejuízo, pois há países, como o Japão, que já patentearam medicamentos produzidos com matéria-prima da flora brasileira. Creio que isso dificultará o registro de patentes por empresas nossas. Se nos descuidarmos, outros tomarão conta e ficaremos à margem do processo, nós que somos a quarta potência do mundo em flora medicinal.
Portanto, é preciso atenção das autoridades do setor para que venhamos a avançar na produção desses medicamentos, que são mais baratos, como já comprovado, em vez de importarmos medicamentos de empresas internacionais, que os fabricam lá fora, por alto custo, o que dificulta a sua aquisição pela população.
Creio que com essa solução que apresento teríamos condições de introduzir, no Sistema Único de Saúde, um atendimento melhor e mais acessível à grande maioria da população brasileira.
Este é um assunto que deveria merecer uma atenção bem maior das autoridades do nosso País.
Sr. Presidente, eram estas algumas considerações que eu tinha que trazer a esta Casa e ao País na manhã de hoje.