Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE COMBATE A CRISE ECONOMICA COM ADOÇÃO DE MEDIDAS, QUE LEVEM EM CONSIDERAÇÃO SEUS REFLEXOS SOBRE POPULAÇÕES MAIS SOFRIDAS.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • NECESSIDADE DE COMBATE A CRISE ECONOMICA COM ADOÇÃO DE MEDIDAS, QUE LEVEM EM CONSIDERAÇÃO SEUS REFLEXOS SOBRE POPULAÇÕES MAIS SOFRIDAS.
Publicação
Publicação no DSF de 17/11/1998 - Página 15739
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • CRITICA, PRETENSÃO, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, VALOR, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), PREJUIZO, POPULAÇÃO CARENTE, BRASIL, PROGRAMA, ESTABILIZAÇÃO, NATUREZA FISCAL, COMBATE, CRISE, NATUREZA FINANCEIRA, AMBITO INTERNACIONAL.

           O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a sociedade brasileira se mostra perplexa e preocupada com as conseqüências da crise que o País vem enfrentando, muitas delas com raízes profundamente cravadas em outros continentes, como a Ásia, e em potências decadentes, como a antiga União Soviética. A globalização dos fatores econômicos implica em uma interligação e um nexo causal muito grandes, em todas as regiões da Terra, virtualmente impedindo que qualquer nação consiga construir seus caminhos e seu progresso à margem das quebradeiras e das oscilações econômicas mundiais.

Ainda muito dependente de capitais externos, o Brasil permanece ameaçado na necessidade vital de recursos de poupança para investir, criar empregos e fortalecer as empresas nacionais. Essa carência se torna ainda mais assustadora quando constatamos o já elevado nível do endividamento interno, hoje na casa de 320 bilhões de reais, enquanto os compromissos externos já podem ser cotados em mais de 100 bilhões de dólares. Os sinais de alerta se tornarão ainda mais estridentes se analisarmos a balança comercial - há vários meses deficitária e sem sinal concreto de reversão nessa tendência maligna. A mesma reação alarmada ocorrerá a quem ler os últimos números sobre as contas públicas e as projeções do Produto Interno Bruto para o ano que se encerra e os próximos.

A conseqüência desses problemas está na necessidade de pagar juros cada vez maiores, em termos proporcionais, já que o incentivo ao mercado de risco se destaca entre as alternativas dos condutores da política econômico-financeira, sempre a braços com dificuldades para fechar as contas da administração pública.

A nova opção adotada pelo Governo, nessa luta sem tréguas, está no recém-editado “pacote”, batizado de “Programa de Ajuste Fiscal”, que se embasa na criação e na elevação de impostos e no corte de despesas e compromissos de todos os níveis, remédios amargos que ameaçam a sobrevivência cotidiana dos cidadãos.

O aumento da CPMF, por exemplo, é algo que merece uma palavra especial, porque contraria todas as promessas trazidas pelo tributo, desde sua cogitação pelo ex-Ministro Adib Jatene. A proposta do Governo, hoje, é passar sua alíquota de 0,2% para 0,38%, uma elevação proporcional pouco superior à desejada para o Cofins, que deverá alterar, de 2% para 3%, sua incidência no faturamento das empresas.

Outras medidas importantes e igualmente dolorosas serão o aumento da contribuição previdenciária do funcionalismo civil, a nova tentativa de impor um tributo desse tipo para os inativos e, nos últimos dias, vem ganhando força a idéia de criar bases para taxação da gasolina consumida pelos cidadãos em todo o País.

São muitos e variados os aspectos em foco, mas gostaria, hoje, de dedicar atenção especial a esse último: o imposto sobre combustíveis, que atingirá direta e imediatamente todos os brasileiros, principalmente os que possuem automóveis, mas sem deixar de fora os demais, pois ninguém está isento de mercadorias, serviços e trabalhos ligados ao consumo de gasolina. Tentam os defensores desse tributo alegar que com ele será evitado um aumento da CPMF, trazendo, ainda, como conseqüência secundária, a redução dos gastos com importação de petróleo, pois a classe média - já tão sacrificada - terá dificuldades crescentes para abastecer seus carros.

Custa-me crer, Sr. Presidente, na tentativa de vender novamente esse tipo de raciocínio perverso, pois é elitista, abusivo e falso em suas premissas. É certo que a CPMF tem sérios defeitos e ninguém, em sã consciência, pode defender gratuitamente sua prorrogação, além do mais em valores majorados - mas essa alternativa proposta é a pior possível e seus defeitos se agigantam, ao ser comparada com a que pretende substituir.

Se não vejamos, a CPMF é universal, é a única forma de extrair algum tributo dos sonegadores, especuladores, marginais da economia em todos os matizes. Atinge, principalmente, os que fazem movimentação corrente de cheques e outros instrumentos bancários, coisas que, como sabemos, são cada vez mais proibitivas para a massa da sociedade brasileira. A população nacional está na casa dos 162 milhões de habitantes, dos quais apenas oito milhões declaram regularmente seus rendimentos para fins tributários, cabendo a cinco milhões a obrigação de efetivamente pagar o Imposto de Renda, todos, ou quase todos, assalariados que não têm como fugir do “leão”, porque seus contracheques já registram, inexoravelmente, a mordida na fonte. Os grandes executivos e empresários dispõem de recursos e malabarismos contábeis que os deixam, não raro, isentos ou devedores de quantias irrisórias.

Permitam-me V. Exªs retomar e ampliar um ponto já apontado neste pronunciamento. A maldade embutida no aumento dos preços dos derivados de petróleo, pois suas conseqüências se abaterão com maior gravidade sobre os pobres, os esquecidos, como as populações do interior da Amazônia, do Nordeste e de outras regiões desprovidas da pujança do Centro-Sul. O cidadão ribeirinho, o caboclo do agreste, o pequeno lavrador das roças precárias desse Brasil abandonado estarão, mais uma vez, pagando o preço de sua insistência em trabalhar, procurar produzir riquezas, educar e criar os filhos isso tudo em nome de preservar os lucros e os ganhos dos investidores e especuladores dos grandes mercados, inclusive e principalmente, os rapinantes que vêm do exterior para drenar os parcos frutos da economia nacional, sem qualquer preocupação de estabelecer processo produtivos e gerar riquezas sociais.

A CPMF, como todo e qualquer tributo, repito, é malvada.

Isto é a essência da palavra “imposto”: uma imposição, algo que, se não for feito coercitivamente, sob risco e pena de castigos legais, ninguém aceitará cumprir. Mas, sendo “imposto”, não há como fugir. É cumpri-lo dentro do tradicional “paga e não bufa”, tão citado pela sabedoria popular.

Acrescente-se, ainda, o fato de que existem recursos e mecanismos voltados para a proteção dos trabalhadores mais pobres. Coisas como isenção para quem ganha até R$200,00 mensais, isenção para os aplicadores na caderneta de poupança popular, que não usam os seus ganhos com finalidade especulativas. Isso além da grande realidade: pobre não usa cheque, porque a chamada “reingenharia” dos bancos praticamente fechou as portas para quem não dispõe de renda mínima compatível com a avidez de lucros e ganhos do sistema financeiro.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é inegável a necessidade de encontrar soluções para a grave crise que ameaça o emprego e a própria sobrevivência de milhões de brasileiros. Mas não podemos jamais, em tempo algum, esquecer que estamos falando de gente, de uma população sofrida e desesperada, que vê seus postos de trabalho e sua capacidade social se esvaindo a cada dia, num emprobrecimento que contrasta com a recente oferta de bilhões de dólares por organismos internacionais e governos estrangeiros. Será que eles estão movidos pela simpatia que sentem por nosso povo, pelo carnaval, pelo futebol que já foi vitorioso? Ou será que os move apenas a perspectiva de grandes lucros, com os investimentos e os empréstimos que nos fazem?

Nenhum grande especulador vai deixar de colher no Brasil as maiores taxas de juros do Ocidente, só porque seu cheque sofrerá uma taxação adicional de 0,18%; nenhum traficante, nenhum sonegador, nenhum beneficiário da economia informal vai abandonar a galinha dos ovos de ouro por 0,18%. Isso eles ganham, muitas vezes, proporcionalmente, em apenas algumas horas de aplicação!

Mas não quero deixar a imagem de que, para mim, a CPMF é apenas um tributo sobre a economia marginal. Não é, porque também atinge os cidadãos honestos e cumpridores de suas obrigações com a sociedade - mas faço questão de reafirmar que essa contribuição atinge apenas os que movimentam, com alguma regularidade, contas bancárias, numericamente muito poucos, em termos de cidadania.

O assunto permanecerá na pauta das preocupações do povo brasileiro e de seus legítimos representantes, no Congresso Nacional. A ele voltaremos, com nossos votos, no momento regimentalmente apropriado. Mas não poderia deixar de registrar, desde logo, meu repúdio a mais esse grande golpe que se articula contra o cidadão comum, a classe média, que já está pagando a maior parte do “pacote” a cuja apreciação hoje nos dedicamos. Sacrifício que se faz rotineiro, nesse país de “pacotes” e “remédios amargos” que invariavelmente caem com força maior sobre os ombros de quem nada mais pode tirar de sua mesa e da manutenção da família.

É hora de mudar essa triste tradição. É hora de olharmos com respeito e dignidade a classe média, o assalariado, sob pena de agravar e tornar insuportável a sobrevivência de quem procura construir uma nação próspera, promissora e marcada pela justiça social.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/11/1998 - Página 15739