Discurso no Senado Federal

AVALIA AS DENUNCIAS DE FRAUDE NA PRIVATIZAÇÃO DA TELEBRAS.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO. PRIVATIZAÇÃO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • AVALIA AS DENUNCIAS DE FRAUDE NA PRIVATIZAÇÃO DA TELEBRAS.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/1998 - Página 16085
Assunto
Outros > LEGISLATIVO. PRIVATIZAÇÃO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • DEFESA, ATUAÇÃO, OPOSIÇÃO, VIABILIDADE, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INSTRUMENTO, GARANTIA, PRERROGATIVA, CONGRESSO NACIONAL, FISCALIZAÇÃO, ATIVIDADE, EXECUTIVO.
  • COMENTARIO, EMPRESTIMO, FUNDOS PUBLICOS, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), GRUPO, SETOR PRIVADO, VIABILIDADE, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S/A (TELEBRAS), EMPRESA DE ENERGIA ELETRICA.
  • MANIFESTAÇÃO, OPINIÃO, NECESSIDADE, INTERESSE, GOVERNO, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), GARANTIA, LEGALIDADE, ATUAÇÃO, EXECUTIVO, DEFESA, INTERESSE PUBLICO.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria também de deixar registrada minha opinião e minha avaliação sobre este momento de denúncias por que passa o Brasil: denúncias da prática de grampos e de falsificação de documentos.

Ao contrário do que pensam alguns, nós, da Oposição, não somos de forma alguma adeptos da tese do quanto pior melhor. Até porque o Brasil passou muito recentemente pelo trauma de ter que afastar constitucionalmente seu Presidente da República por utilização indevida das prerrogativas de seu cargo.

Enganam-se, principalmente no meio político, os que pensam que denúncias envolvendo a chamada classe política não acaba respingando sobre todos nós. Sabemos muito bem que episódios como este só reforçam a imagem pouco recomendável que a população tem de todos nós.

           Como já foi registrado aqui por vários parlamentares, inclusive em trechos da Senadora Benedita da Silva, a Oposição, desde que surgiu este assunto, tem adotado uma posição de absoluta cautela, a qual se relaciona à responsabilidade que temos como homens públicos. Todavia, entendemos que essa cautela não pode, de forma alguma, ser confundida com omissão, porque aí estaríamos fugindo à responsabilidade e desrespeitando a população que nos credenciou exatamente para fazer o papel de Oposição.

Preocupa-me a posição da Bancada governista nesta Casa na sucessão de fatos que envolveram necessidade de investigação durante o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, qual seja, de constantemente dizer que não se pode instaurar CPI a fim de não atrapalhar o cumprimento das tarefas do Congresso Nacional: legislar, votar o pacote fiscal - argumento de hoje; votar a reforma da Previdência - argumento de ontem; votar a reforma administrativa - argumento de anteontem.

O papel constitucionalmente atribuído ao Congresso Nacional não é apenas o de legislar nem o de votar medidas provisórias - até porque ele não tem cumprido, de modo geral, esse papel -, mas também o de fiscalizar as ações do Executivo. Dentro desse papel específico do Congresso Nacional, insere-se, fundamentalmente, a ação da Oposição, a ação da minoria.

Ora, ao se estabelecer na Constituição que, para se instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito, exige-se, não a maioria dos membros do Congresso Nacional, não o quorum qualificado de três quintos, mas a assinatura de um terço dos membros de cada Casa - no caso de CPI mista -, demonstra-se o objetivo principal de garantir a possibilidade de a minoria exercer, na plenitude, o seu papel fiscalizador.

Portanto, mais uma vez, brandir o argumento da inoportunidade de se aprofundar investigações, muito mais que deixar a desconfiança grassar não só entre os parlamentares como no conjunto da população brasileira - porque o velho ditado de “quem não deve não teme” fica cada vez mais atual nesses momentos -, é, a meu ver, trabalhar no sentido de se deixar atrofiar uma das prerrogativas do Congresso Nacional ou de qualquer Poder Legislativo: a fiscalização.

A História tem mostrado que é falso o argumento de que as CPIs podem paralisar o Congresso Nacional. Ora, os únicos dois exemplos recentes que chegaram a essa situação ocorreram porque o escândalo foi tão grande que acabou efetivamente paralisando: foi o caso da CPI do Orçamento e da CPI do PC.

Recentemente, houve uma CPI no Senado Federal com grande repercussão, que teve sobre si muitos holofotes, mas nem por isso o Senado, em qualquer momento, paralisou a sua atividade legislativa. Portanto, esse episódio já tem elementos para a convocação de uma CPI. O que está em discussão não são as fitas simplesmente. Quero aqui registrar que é necessário apurar com rigor quem está sendo responsável por esses grampos, porque aconteceu um recentemente, no caso Sivam, que não foi apurado, e ninguém foi punido.

Ora, a lógica da impunidade acaba incentivando esse tipo de prática, e é inadmissível que nós tenhamos a figura do Presidente da República e de Ministros com a privacidade devassada de forma ilegal. Se isso acontece com o Presidente, imagina o que não pode acontecer com os brasileiros comuns!

O problema é que o que está gravado e foi transcrito pela revista Veja foi confirmado pelo Ministro. O Ministro confirma - e nós ouvimos agora no discurso do Senador Sergio Machado - que aquele comportamento, aquela forma de atuação, enquanto responsável, enquanto gestor principal do programa de privatização, é um comportamento correto. É um juízo de valor que pode ter um Ministro, é um juízo de valor que pode ter a bancada governista, mas será que é um juízo de valor universal? Entendo que não. Se é verdade que não caberia ao Ministro das Comunicações ou a um gestor de um processo de privatização um papel absolutamente passivo nesse processo, também é verdade que não poderia caminhar no sentido de estabelecer um processo que viesse a interferir e, o que é pior, não somente interferir mas utilizar instrumentos do Estado para poder viabilizar a formação de consórcios.

O fato é que muitas vezes se criticam as empresas estatais, apresentando-se como argumento principal de que essas empresas têm sido, ao longo da história, um sugadouro de recursos públicos. Ao mesmo tempo, se isso é e foi verdade ao longo do tempo, também é verdade que o processo de privatização do Brasil, não só nas telecomunicações assim como no setor elétrico, se transformou em um sugador de recursos públicos. Grande parte da viabilização de algumas privatizações foi feita com dinheiro público, do BNDES, emprestado a grupos privados, com juros de pais para filho, para se poder viabilizar o processo de privatização e para poder o Governo e seus Ministros ir para as emissoras de televisão apresentarem um projeto como grande vencedor, como um grande sucesso neste País.

Todas as privatizações de grande porte, como a da Companhia Vale do Rio Doce, Telebrás, empresas de energia elétrica, contaram com a ação fundamental do Estado, por intermédio do BNDES, com o dinheiro público que estava sendo carreado para grupos privados com a finalidade de viabilizar o processo de privatização. Isso sem se falar nos fundos de pensão das estatais, a principal fonte de financiamento de nosso País, porque é quem, efetivamente, tem dinheiro. Sabemos que, na prática, a sua gestão acaba sendo direcionada não para o interesse dos seus mantenedores ou dos seus associados, mas orientada principalmente a partir das ordens emanadas seja do Palácio do Planalto, seja dos Ministérios que sejam vinculados ao processo de privatização.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Bancada governista diz que o Ministro vem aqui quinta-feira para explicar. O fato de ter escolhido o Senado é absolutamente sintomático. No Senado, o mando de campo do Governo é ainda mais acentuado. Usando a linguagem futebolística, aqui é quase que a Rua Bariri, do ponto de vista dos interesses do Governo, comparando as condições que o local tem para facilitar a vida do Ministro. Além disso, temos visto aqui várias audiências com Ministros das diversas áreas, para tratar dos mais variados temas. Recentemente, veio aqui o Ministro Pedro Malan para justificar o pacote fiscal. Sabemos que num processo em que o Ministro comparece apenas para dar informações, quando S. Exª não está sob juramento, que aqueles que o estão inquirindo não têm acesso a documentos que poderiam orientar de forma fundamental suas perguntas, o Ministro, naturalmente, tem absoluto campo, seja para tergiversar, seja para não responder as perguntas, seja para não dar informações que forem requeridas, seja até para dar informações que não têm absoluta consonância com a verdade, como já aconteceu em tantas ocasiões relativas a esse processo de vinda de Ministros.

Todavia, se o Regimento do Senado e a Constituição Federal prevêem não só a vinda de Ministros ao Senado para prestar esclarecimentos, mas prevê também a Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar episódios dessa natureza, eu entenderia que o principal interessado em que todo esse processo fosse devidamente esclarecido, sem qualquer dúvida, seja por parte da oposição, seja por parte da população que vai acompanhar o processo, esse principal interessado deveria ser exatamente o Governo, para garantir a sua legalidade e se ele estava sendo absolutamente defensor dos interesses públicos e não agindo como agente de setores privados nesse processo.

Sr. Presidente, sei que essa vai ser uma batalha com procedimentos semelhantes a que já tivemos em outras ocasiões. Infelizmente, parece que o pronunciamento do Senador Eduardo Suplicy, assinalando que o interesse em aprovar essa CPI deveria ser de todos os Senadores, da maioria, da minoria, do Governo e da oposição, não deverá ocorrer. Provavelmente, teremos aqui episódios que já aconteceram nesta Casa, às vezes até deprimentes, quase que vexatórios, de Parlamentares que assinam e que, depois, são convencidos pelas lideranças do Governo a retirar suas assinaturas. Espero que não se chegue àquele absurdo maior que foi a CPI do Sistema Financeiro, que foi criada com um número de assinaturas regimental, instalada e depois abortada pelo Plenário do Senado Federal, a partir de um voto de maioria, que feriu um direito fundamental inscrito em nossa Constituição, que é o direito da minoria fiscalizar os governos que estão ocupando os cargos.

Sr. Presidente, embora façamos o registro da quase que constante inutilidade da vinda de ministros a esta Casa, a fim de prestar esclarecimentos no que diz respeito a informações, ao compromisso com a verdade, nós da Oposição estaremos aqui na próxima quinta-feira inquirindo o Ministro Mendonça de Barros. Esperamos que seja o mais convincente possível. Vamos continuar trabalhando para viabilizar a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito, por entender que este é o instrumento mais eficaz de que dispõe o Congresso Nacional neste momento e, aliás, em qualquer momento de sua história, a fim de poder garantir na plenitude as suas prerrogativas constitucionais.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/1998 - Página 16085