Discurso no Senado Federal

DEFESA DA PROPAGANDA ELEITORAL GRATUITA NO RADIO E NA TELEVISÃO COMO FORMA DE EVITAR O ABUSO DO PODER ECONOMICO.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • DEFESA DA PROPAGANDA ELEITORAL GRATUITA NO RADIO E NA TELEVISÃO COMO FORMA DE EVITAR O ABUSO DO PODER ECONOMICO.
Aparteantes
Ademir Andrade, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 21/11/1998 - Página 16417
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • DEFESA, IMPLANTAÇÃO, PAIS, GRATUIDADE, PROPAGANDA ELEITORAL, RADIO, TELEVISÃO, IMPEDIMENTO, ABUSO, PODER ECONOMICO, CAMPANHA ELEITORAL, APERFEIÇOAMENTO, LEGISLAÇÃO, MELHORAMENTO, DEMOCRACIA, BRASIL.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos saindo de um processo eleitoral marcado pelas mais diversas polêmicas, que oscilaram desde a óbvia disputa entre os candidatos e seus partidos até a discussão ardorosa de teses e propostas paralelas, algumas distantes, outras próximas da essência da questão.  

Já tive a oportunidade de abordar, nesta tribuna, pontos como voto distrital, proporcionalidade das representações estaduais, financiamento das campanhas pela própria sociedade e um tema que volto a analisar, hoje: a propaganda eleitoral gratuita pelo rádio e pela televisão.  

De dois em dois anos, acendem-se as divergências de opiniões e os choques de interesses, sob a alegação de que o espaço cedido aos candidatos para exposição de suas idéias e seus programas seria uma usurpação do direito comercial das empresas concessionárias; que seria uma violência contra os princípios da livre economia, um atentado à estrutura empresarial do setor. Nem mesmo o pagamento indireto recebido pelas emissoras consegue aplacar a fúria e a avidez dos que condenam a propaganda eleitoral - porque a eles, no fundo, o que interessa mesmo é restringir, progressivamente, as possibilidades eleitorais dos candidatos mais pobres.  

Por essas pessoas, apenas quem tiver dinheiro, muito dinheiro, dinheiro para comprar e pagar os caríssimos espaços das redes, só esses poderão ter acesso ao maior e mais eficiente meio de divulgação de nossos tempos.  

Ouvimos seguidas afirmações de que isso seria um sintoma do nosso subdesenvolvimento, uma ingerência indevida do Estado na economia das empresas, um gesto espúrio de paternalismo, uma tentativa de beneficiar gente humilde que, mesmo com fortes ligações com o povo, só poderia lhe falar das carrocerias dos caminhões e dos coretos onde se realizam os comícios, cada vez menos concorridos.  

E, para variar, os inimigos da propaganda eleitoral gratuita vão buscar no Exterior citações em abono de suas teses elitistas e excludentes.  

Dizem eles que "no país tal isso não aconteceria", "isso é coisa de subdesenvolvido", "é por isso que o Custo Brasil torna inviável qualquer atividade comercial" – e vão por aí afora, encadeando sofismas e arrazoados completamente alheios à nossa realidade e às próprias contingências do processo eleitoral.  

Pois bem: já que é para citar outros países, vamos começar logo pelos Estados Unidos, certamente o modelo de democracia republicana dos últimos séculos e que servirá de paradigma, ainda por muitos anos, no milênio que se avizinha.  

Os norte-americanos estão descobrindo, como grande novidade e solução para o problema do abuso econômico no processo eleitoral, aquela velha prática brasileira: a propaganda gratuita.  

Tenho em mãos uma notícia, distribuída para todos os Estados Unidos pela tradicional e sempre respeitada agência Associated Press , uma das mais antigas do mundo e ainda hoje padrão de ética e de responsabilidade jornalística. Faço questão de dizer que a tradução da matéria foi feita pelo serviço específico do Senado, atendendo a solicitação oficial do meu Gabinete - e, ao agradecer o trabalho da tradutora Theresa Catharina, enalteço também os bons funcionários que ainda movem os serviços da Casa.  

Diz a nota:  

"Nas eleições futuras, os candidatos poderiam ter  
propaganda gratuita na televisão  

 

WASHINGTON - Os meios de comunicação deveriam conceder tempo gratuito de transmissão a candidatos políticos, antes de toda eleição, afirma uma comissão presidencial.  

O painel, que hoje se reúne para redigir suas recomendações finais, vem considerando uma (recomendação) pela qual os meios de comunicação deveriam voluntariamente conceder tempo gratuito de transmissão. Mas, se não houver consenso, pode recomendar uma exigência compulsória de tempo gratuito.  

Isso aconteceria se alguns dos representantes dos meios de comunicação que participam do painel, inclusive o Presidente da CBS Television , Leslie Moonves, recusar sua aprovação por estar em desacordo com uma outra recomendação proposta disseram pessoas envolvidas nas negociações, que pediram que seus nomes não fossem revelados.  

"Penso que haverá um documento de consenso, mas, francamente, não sei exatamente qual será a posição de alguns representantes dos meios de comunicação", afirmou Norman Ornstein, dirigente do American Enterprise Institute

Tempo gratuito é uma das várias recomendações que o grupo vai fazer sobre a dívida das estações de TV para com o público, pois recebem valiosas concessões de canal digital do governo, sem encargos financeiros . 

Os telespectadores provavelmente não verão mudanças durante um longo tempo, considerando-se que virtualmente todas as recomendações deveriam ser implementadas pela Comissão Federal de Comunicações ou pelo Congresso.  

O Presidente Clinton e o Vice-Presidente Al Gore têm pressionado por tempo gratuito obrigatório, e a administração não diz se a Casa Branca estaria satisfeita com o tempo voluntário de transmissão gratuita.  

De acordo com a recomendação da Comissão, os meios de comunicação ofereceriam voluntariamente cinco minutos gratuitos de transmissão, toda noite, nos 30 dias anteriores a uma eleição.  

O Centro para Educação nos Meios de Comunicação, um grupo de advocacia, pressionará a FCC (Comissão Federal de Comunicações) a tornar obrigatório o tempo gratuito de transmissão se o painel não fizer isso, afirmou seu porta-voz Jeffrey Chester".  

Sr. Presidente, Srªs e Senhores Senadores, essa notícia, como informei antes de proceder à sua leitura, foi distribuída para toda a imprensa dos Estados Unidos pela Associated Press , no dia 8 de novembro último - e portanto, já é uma reação das lideranças políticas e da própria sociedade aos abusos cometidos pelo poderio econômico no processo eleitoral daquele grande país do Hemisfério Norte.  

Não sou daqueles que se extasiam com as maravilhas da sociedade americana; ao contrário, vejo nela alguns problemas de difícil solução. Mas sei que só através do livre debate e da franca abordagem dos temas polêmicos, tais problemas encontrarão soluções. E esse debate jamais faltou nos Estados Unidos. Como não está faltando agora.  

É importante que se ressalte, na matéria citada, um tópico que sempre destacamos aqui e que, não raro, tem-nos valido uma série de acusações e críticas descabidas: "tempo gratuito é uma das várias recomendações que o grupo vai fazer sobre a dívida das estações de TV para com o público, pois recebem valiosas concessões de canal digital do Governo, sem encargos financeiros".  

Essa afirmação é no sentido de que a sociedade exige e merece um retorno pela concessão de espaços que lhe pertencem, nas ondas de transmissão de som e imagem. Não é lícito permitir que um grupo econômico se privilegie no uso de bens comuns, pertencentes ao conjunto da sociedade

É secundária a dimensão, em si, do espaço que vier a ser destinado às legendas. O importante é a tese, é o princípio: todos os legítimos candidatos devem ter o direito de falar diretamente à sociedade, sem preconceitos ou barreiras, livres do verdadeiro massacre hoje exercido pelo poder econômico dos concorrentes ricos ou subsidiados por grandes grupos financeiros

O aperfeiçoamento das instituições democráticas em seu ponto medular, o processo eleitoral, é uma constante preocupação de todos quantos se dedicam à causa da liberdade nos Estados Unidos, no Brasil, no Mundo inteiro!  

Em muitos campos temos uma posição de quase pioneirismo, como é o caso da propaganda gratuita pelo rádio e pela televisão, prática que hoje até os Estados Unidos se propõem a seguir. E por que motivo não poderíamos seguir outros exemplos?  

Já abordei, recentemente, a questão do financiamento das campanhas pela sociedade, através de subsídios diretamente entregues aos Partidos e sob severo controle dos órgãos oficiais de finanças e da própria Justiça Eleitoral.  

Existem muitas formas de garantir-se a lisura do pronunciamento dos cidadãos, a afirmação de sua vontade, nas eleições periódicas - mas essas duas são as básicas: a propaganda eleitoral gratuita pela mídia eletrônica e a eliminação do poder econômico nas campanhas. Se conseguirmos consolidar ambas as tendências e, ao mesmo tempo, coibir os abusos e a proliferação das legendas de aluguel, teremos dado um passo gigantesco no sentido do fortalecimento e da dignidade do sistema consagrado em nosso direito constitucional.  

Porque a democracia é o regime que a humanidade consagrou como o único capaz de resguardar os direitos dos cidadãos, propiciar igualdade de oportunidades e gerar um mínimo de bem-estar geral, de liberdade e de espaços emocionais coletivos.  

Peço à Presidência que autorize a transcrição, como anexo ao presente discurso, do texto original, em inglês, da matéria da Agência Associated Press , distribuída nacionalmente nos Estados Unidos e que encontrei nas páginas do jornal The Orlando Sentinel , um dos mais expressivos da Flórida, em sua edição do dia 9 de novembro último.  

O Sr. Ademir Andrade (Bloco/PSB-PA) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC) - Com muito prazer, Senador Ademir Andrade.  

O Sr. Ademir Andrade (Bloco/PSB-PA) - Pelo que percebo, V. Exª está defendendo a permanência da propaganda eleitoral e fazendo uma condenação àqueles que acham que deveriam receber recursos públicos por essa propaganda. Associo-me a V. Exª e quero dizer, Senador Nabor Júnior, que já fomos vítimas desse tipo de lobby, desse tipo de pressão dos meios de comunicação. E o Congresso foi conivente com esse lobby, porque a propaganda eleitoral hoje é reduzida se comparada à do passado. Primeiro, ela começa, hoje, quarenta e cinco dias antes da eleição, enquanto antes começava a sessenta dias da eleição. Segundo, deixamos de ter propaganda aos domingos, quer dizer, cortaram um dia da propaganda eleitoral. Aí já houve, de certa forma, um atendimento a esse jogo de pressão dos grandes meios de comunicação no nosso País. Tivemos, na campanha de 1998, uma redução drástica no nosso tempo de televisão, porque houve redução de 15 dias, de 60 para 45 dias antes das eleições, e ainda de nove dias, ou seja, foram cortados todos os domingos. Condenamos esse tipo de decisão do Congresso Nacional e votamos contrariamente à aprovação da matéria. Precisamos nos modernizar e fazer um trabalho mais real com a população. A televisão não recebe nada para dar aquele espaço, o que é justo, porque ela tem uma concessão do Governo, ganha fábulas do poder privado e do próprio Governo, que é quem faz mais propagandas nos meios de comunicação. Por isso, é justo que a televisão ceda aquele espaço. Mas, do jeito como a situação está montada, a produção de um programa eleitoral passa a ser tão cara - ou mais cara - quanto se fôssemos pagar o tempo na televisão. Hoje, o candidato não é uma coisa real, é um produto imaginário, algo que é transformado, burilado pelos "marqueteiros". A campanha de um "marqueteiro" famoso custa muito dinheiro. Imagino quanto tenha pago o Presidente Fernando Henrique pela sua campanha na televisão! Precisamos mudar essas regras, estabelecer um contato mais direto do candidato com o eleitor, evitar que o candidato seja um produto, como se fosse uma Coca-Cola, um cigarro ou um alimento. O candidato tem que ter idéia, pensamento. Precisamos ampliar a quantidade de debates na televisão, fazer com que o candidato esteja mais presente, falando, discutindo, apresentando suas idéias, e não sendo apresentado com um produto de

marketing. Creio que o Congresso Nacional tem o dever de trabalhar essa questão e de mudar a forma de fazer propaganda. Associo-me à manifestação de V. Exª e à sua posição com relação a essa matéria. Muito obrigado.  

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC) - Senador Ademir Andrade, agradeço a intervenção de V. Exª, como sempre muito oportuna, que vem robustecer a tese que venho defendendo e que me trouxe, há poucos dias, a esta mesma tribuna: a propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão tem de ser ao vivo!  

Está na hora de rever a sistemática das últimas eleições, que privilegia o esquema de contratar "marqueteiros" para produzir, escrever e fazer a gravação dos programas, os quais serão transmitidos pelas emissoras de rádio e televisão. Isso, na verdade, praticamente anula as possibilidades dos candidatos mais pobres, porque são poucos os que têm condições de pagar os custos das campanhas - tão sofisticadas! - que se mostram pouco ou nada coerentes com as propostas ou bandeiras dos partidos, ao contrário, baseiam-se crescentemente em técnicas e estatísticas voláteis.  

Temos que fazer reviver práticas saudáveis, como a da legislação eleitoral que induzia os partidos e os candidatos a fazerem ao vivo a propaganda no rádio e na televisão. Quem postulava o voto do cidadão ia aos estúdios e lá, sem artifícios, expunha com transparência seus pontos de vista, defendia suas propostas e suas teses. É preciso, realmente, banir essa parafernália, que resulta em programas caríssimos - pois, na forma atual, estamos cristalizando a obrigatoriedade de gastos muito acima das possibilidades financeiras da maioria dos candidatos.  

Concordo inteiramente com V. Exª e acredito que o Congresso Nacional se mostrará sensível, na devida oportunidade, à necessidade de criar novas regras, voltadas para o aperfeiçoamento da lei vigente em nosso País, com relação à propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão.  

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Nabor Júnior?  

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC) - Concedo o aparte, com muito prazer, ao Senador Ramez Tebet.  

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Senador Nabor Júnior, quero cumprimentá-lo até mesmo pela oportunidade do seu pronunciamento. Creio que precisamos promover a reforma política no País, inclusive atendendo a esses pontos fundamentais que V. Exª aborda, entre os quais se destaca o da propaganda eleitoral, que é "gratuita". Como V. Exª e todos sabemos - e V. Exª o reafirma com precisão no seu pronunciamento -, a propaganda eleitoral é gratuita só no nome, uma vez que é muito cara, Senador Nabor Júnior! Muitos candidatos não têm sequer condições de patrocinar a propaganda no rádio e na televisão no período em que a lei permite. Quero cumprimentá-lo e enfatizar o tema "oportunidade". Creio que devemos fazer reforma política e votar as leis não em cima da hora, como tem acontecido até agora. Recordo-me de que, no pleito de 1996, votamos na undécima hora - fui o Relator da matéria no Senado - a legislação que regulamentou os pleitos municipais. Ora, o País exige uma reforma política de tal amplitude que ela tem que ser feita já no ano que vem. A sociedade espera isso de nós, porque a necessidade dessa reforma ao lado da reforma tributária tem sido decantada em prosa e verso. Realmente o assunto reforma política vem sendo protelado, em detrimento do aperfeiçoamento da democracia no País. Cumprimento V. Exª.  

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC) - Muito obrigado, Senador Ramez Tebet.  

Na verdade, já existe um anteprojeto de lei referente à reforma política. Tendo como Relator o Senador Sérgio Machado, foi aprovado na Comissão Especial e propõe várias alterações na atual sistemática de organização, de funcionamento dos partidos, de processo eleitoral, etc.  

Espero que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, da qual V. Exª é um dos mais ilustres membros, aprecie a importante matéria - que já lhe foi encaminhada - com presteza e com a habitual acuidade, permitindo-lhe tramitar no plenário do Senado Federal para, caso mereça aprovação, ser encaminhada à revisão, na Câmara dos Deputados. Será o passo essencial no sentido da aprovação de uma lei definitiva, não somente com relação às eleições realizadas a cada dois anos, mas também quanto à criação e ao funcionamento dos partidos políticos, ao financiamento das campanhas eleitorais, ao voto distrital e à obrigatoriedade ou não do voto.  

Uma série de providências estão sendo sugeridas nesse relatório do Senador Sérgio Machado, que, torno a lembrar, encontra-se sob a apreciação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Espero que tenhamos a oportunidade de implantar as modificações que a sociedade brasileira está exigindo para aprimorar o nosso sistema democrático.  

Citei, no meu pronunciamento, que os Estados Unidos, onde o custo das campanhas eleitorais é um dos mais caros do mundo, agora estão procurando adotar algo similar ao sistema que o Brasil já vem adotando há muito tempo, no caso da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão. Os americanos, conscientes do alto alcance da medida, realmente democrática, estão querendo imitar o Brasil nesse aspecto.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. NABOR JÚNIOR EM SEU PRONUNCIAMENTO:  

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/11/1998 - Página 16417