Discurso no Senado Federal

VEEMENTE DEFESA DA CONTINUIDADE DA APURAÇÃO DAS IRREGULARIDADES ENVOLVENDO AGENTES PUBLICOS NO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO SISTEMA TELEBRAS, NÃO OBSTANTE A EXONERAÇÃO DO MINISTRO DAS COMUNICAÇÕES E DOS PRESIDENTE E VICE-PRESIDENTE DO BNDES.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • VEEMENTE DEFESA DA CONTINUIDADE DA APURAÇÃO DAS IRREGULARIDADES ENVOLVENDO AGENTES PUBLICOS NO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO SISTEMA TELEBRAS, NÃO OBSTANTE A EXONERAÇÃO DO MINISTRO DAS COMUNICAÇÕES E DOS PRESIDENTE E VICE-PRESIDENTE DO BNDES.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 24/11/1998 - Página 16686
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • DEFESA, CONTINUAÇÃO, APURAÇÃO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, ESCUTA TELEFONICA, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S/A (TELEBRAS), POSTERIORIDADE, RENUNCIA, LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, ANDRE LARA RESENDE, CARGO PUBLICO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DAS COMUNICAÇÕES (MC), PRESIDENTE, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES).
  • DEFESA, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), APURAÇÃO, IRREGULARIDADE, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S/A (TELEBRAS).

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje tomamos conhecimento do afastamento, a pedido, do Ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros; do Presidente do BNDES, André Lara Resende; do seu Vice-Presidente, Pio Borges; e do Secretário Executivo de Comércio Exterior, José Roberto Mendonça de Barros.  

Por ocasião da exposição do Ministro nesta Casa, na última quinta-feira, o Senador Pedro Simon praticamente fez um apelo para que renunciasse, expondo os motivos. Usando da palavra após o Senador, fiz questão de dizer que para nós, da Oposição, o assunto não se encerrava com a simples renúncia do Ministro. Na tarde de hoje, eu gostaria de ratificar essa posição.  

Sr. Presidente, sem dúvida alguma, a partir de agora o Governo tentará dar o caso por encerrado. Ele inclusive argumentará com os Senadores e Deputados de sua base, para que não assinem o requerimento para criação de uma CPI, que essa Comissão perdeu seu objeto, tendo em vista a renúncia do Ministro. Contudo, no nosso entendimento, o que se discute não é a pessoa física, Luiz Carlos Mendonça de Barros; o que merece ser apurado é a postura de um agente público, um Ministro das Comunicações, na condução de um processo de privatização tão importante como foi o do sistema Telebrás.  

Sabemos muito bem que, além da questão ética e dos problemas decorrentes do episódio, existe também a disputa - na qual não cabe a nós, da Oposição, interferir -, entre os diversos Partidos que compõem a base governista, em torno não só da vaga de Ministro das Comunicações ou das várias vagas que surgem a partir de agora, como também a respeito da proposta, que chegou a ser divulgada, da criação do Ministério da Produção, que estava sendo criado exatamente para ser ocupado pelo Dr. Luiz Carlos Mendonça de Barros.  

Essa disputa já existia, continuará existindo, e é até legítima, dentro de um consórcio governamental do qual não fazemos parte; portanto, não vamos opinar sobre o assunto. No entanto, registramos mais uma vez que, para nós, o mais importante é o devido esclarecimento dos fatos para esta Casa e para a Nação brasileira, uma vez que, até a quinta-feira passada, só as pessoas que lêem jornais e revistas tinham conhecimento do teor das gravações. Infelizmente, essas pessoas constituem um número muito pequeno em nosso País, em termos percentuais, mas desde quinta-feira as emissoras de televisão - e a própria Rede Globo , que sem dúvida alguma tem a maior audiência - passaram a apresentar trechos das gravações. Essa apresentação foi importante, porque, ouvindo o tom de voz usado nas conversas gravadas, elas passam a ter um conteúdo ainda mais forte do que a simples leitura fria das degravações. Parcela expressiva da população pôde ouvir o tom de voz do Ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros e de outros envolvidos - um tom quase de deboche, muitas vezes - e deve ter ficado ainda mais atônita, o que reforça nossa preocupação de que esse assunto deva ser esclarecido até as últimas conseqüências, não só quanto ao processo de privatização, como também quanto ao próprio grampo, que também é crime. Vamos lembrar que grampos já aconteceram em ocasiões anteriores, como no caso Sivam, mas os responsáveis não foram punidos. É exatamente esse sentimento de impunidade que acaba fazendo com que atitudes dessa natureza se repitam.  

Diante do exposto, a Oposição continuará recolhendo assinaturas para implantar a Comissão Parlamentar de Inquérito. Além do Ministério Público e da Polícia, que estão fazendo seu trabalho, o instrumento mais eficaz de que o Congresso Nacional dispõe para apurar esse episódio é a CPI. Para aqueles que alegam que sua instalação poderia implicar na paralisação da atividade legislativa, atrapalhando a votação do pacote fiscal, repito o que já disse na semana passada: entre as atribuições do Congresso Nacional, está a elaboração de leis, a votação de medidas provisórias e de emendas constitucionais, mas também cumpre ao Poder Legislativo a fiscalização do Poder Executivo.  

Na exposição feita nesta Casa na última quinta-feira, o Sr. Ministro Mendonça de Barros deixou sem resposta uma série de perguntas, feitas até por Senadores da base governista. Portanto, insistimos em que a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito é fundamental para que cheguemos a uma conclusão a respeito da questão. Caso contrário - pelo que parece -, se depender da vontade do Governo, haverá o afastamento do Ministro, do Presidente e do Vice-Presidente do BNDES, e o problema será considerado encerrado; no entanto, continuará uma situação inexplicada por parte de um agente público. Da mesma forma que a não apuração de grampos desperta um sentimento de impunidade e faz com que esses fatos se repitam, o mesmo ocorrerá com relação à não apuração de possíveis irregularidades envolvendo o processo de privatização, já que ela ainda vai continuar. Empresas do setor elétrico estão na iminência de serem privatizadas, e o Governo Fernando Henrique Cardoso, em seu segundo mandato, provavelmente tenha a intenção de privatizar até a Petrobrás. Desse modo, como é intenção do Governo a continuação das privatizações, é necessário que esse assunto seja investigado a fundo, para que a Nação brasileira e os Parlamentares tenham tranqüilidade a respeito da condução desse processo. Para isso, o instrumento mais eficaz de que dispõe o Congresso Nacional é a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito.  

Sr. Presidente, concluo meu pronunciamento, resumindo-o em apenas uma frase: para nós, esse episódio não se encerra com a renúncia do Ministro, do Presidente e do Vice-Presidente do BNDES, enfim, de todos aqueles que estiveram envolvidos de uma forma ou de outra nesse processo.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - V. Exª concede-me um aparte?  

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE) - Concedo o aparte a V. Exª, com muito prazer.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Senador José Eduardo Dutra, eu gostaria de expressar meu apoio às ponderações de V. Exª. Avalio que a Comissão Parlamentar de Inquérito faz-se ainda mais premente. O ato pelo qual, na manhã de hoje, o Presidente Fernando Henrique Cardoso exonerou o Ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, o Presidente do Banco Central, André Lara Resende e o Secretário-Executivo da Câmara de Comércio Exterior, José Roberto Mendonça de Barros, constitui um reconhecimento, por parte do Presidente da República, de que houve impropriedade de procedimento por parte dessas pessoas que eram membros importantíssimos de seu Governo e que, no processo de privatização das teles, agiram de maneira que estarreceu a opinião pública. Interessante ressaltar, prezado Senador José Eduardo Dutra, alguns editoriais dos principais jornais do País. O Globo , por exemplo, que tem posição muito conhecida favorável a todo o sistema de privatização, publicou, sexta-feira, diante da revelação das conversas, um editorial de primeira página com o título "O Dever de Sair", em que explicitava que aquelas gravações denotavam um comportamento do Ministro e dos que agora se afastam que feria o princípio de isonomia que deveria pautar o responsável pela condução de um leilão de teles. V. Exª, semana passada, deu um exemplo bastante interessante em área que o povo brasileiro conhece muito bem. V. Exª falou a respeito do gol no futebol, do juiz ladrão que, mesmo que tivesse roubado para o time perdedor, ainda assim, tendo efetuado essas ações, teria que ter averiguada sua responsabilidade. Nesse final de semana, fiquei pensando em um exemplo desse tipo. Vamos fazer um paralelo disso com o jogo do Corinthians contra o Grêmio. Vamos supor que o juiz, sendo um torcedor do Corinthians, de repente avisasse ao Marcelinho Carioca para bater logo a falta e fazer um gol aproveitando-se de uma falha na barreira do time. Ainda que o Marcelinho Carioca tivesse atingido a trave, sem conseguir fazer o gol, a ação do juiz, obviamente, teria sido parcial. Pois bem. Houve o reconhecimento de praticamente todos os articulistas, nos últimos dias, de que o procedimento estampado naquelas conversas infringiu as normas de impessoalidade, de imparcialidade. Mas, por que precisamos ir até o fim, até a instauração da comissão parlamentar de inquérito, e averiguar os fatos? Primeiro, porque eles envolvem enorme complexidade. Ali houve a revelação de procedimentos do Governo em relação a privatizações; de como o Governo utiliza não apenas o BNDES para prover de recursos um grupo para que adquira as ações de uma empresa que era de propriedade do povo; de como o Governo orienta o BNDES para emprestar recursos ou comprar ações ou emprestar dinheiro; de como o Governo solicita ao Banco do Brasil que dê aval a essa ou àquela operação do consórcio que vai agir dessa ou daquela maneira; como o Governo orienta diretores do Banco do Brasil que, estranhamente – agora se sabe com maior clareza –, têm o poder de definir a ação a ser tomada pelos diretores da Previ. Senador José Eduardo Dutra, ainda vou falar mais nesta tarde, quando tiver o direito à palavra, porque a nota que a Direção da Previ publica hoje é reveladora de mais alguns fatos. Não sei se V. Exª teve a oportunidade de lê-la, mas observa-se ali que, quando da privatização da Companhia Vale do Rio Doce, a Previ agiu de maneira semelhante com o Banco Opportunity, a fim de participar do consórcio que adquiriu o controle da Vale. Fico pensando como V. Exª deve estar se sentindo como geólogo daquela Companhia. Será que houve procedimento de igual natureza? Será que o Palácio do Planalto agiu coordenando ações de maneira semelhante a essas que agora se tornaram públicas? Assim, Senador José Eduardo Dutra, é muito importante que venhamos a apurar, com profundidade, todo o processo de privatizações. As luzes apenas começam a iluminar o que precisa ser do conhecimento da população brasileira. Portanto, vamos sim insistir na necessidade da CPI.  

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA

(Bloco/PT-SE) - Muito obrigado, Senador Eduardo Suplicy. V. Exª lembra um fato importante ao qual eu não havia feito referência, que é a nota da Previ. O próprio Ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros disse aqui em plenário que o comportamento do BNDES havia sido o mesmo em outras privatizações. E chegou a citar especificamente o caso da Companhia Vale do Rio Doce. Afirmou que havia sido o mesmo, como quem diz que sempre foi assim, que nunca houve problemas, nem reclamações. Ninguém reclamou, nem houve problemas entre aspas, porque, na verdade, não surgiram fitas gravadas, não surgiram diálogos tão comprometedores como agora, o que aumenta inclusive nossa responsabilidade no sentido de apurar o assunto. Como disse anteriormente, outras privatizações vão ser realizadas, no setor elétrico, e é necessário que o comportamento do agente público seja diferente.  

De repente, os Senadores da base governista e o próprio Ministro tentam passar a imagem de que o juiz desse episódio é que tem que manter neutralidade; que o leiloeiro, que vai bater o martelo, é que tem que ser neutro; o Ministério não tem que ser neutro, e o BNDES não tem que ser neutro. Mas sabemos que, em um leilão com envelopes fechados, o papel do leiloeiro é simplesmente bater o martelo; não há que falar em postura de decisão, nem postura de juiz.  

Quero registrar mais um episódio que, inclusive, nos passou despercebido. E aí vem a importância de a imprensa estar fiscalizando e acompanhando. Não sei se V. Exª se lembra daquela história da informação privilegiada que o Ministro disse que tinha, mas que não informou, que é o fato de o outro consórcio, Telemar, ter dificuldade para arrecadar dinheiro para cobrir o preço mínimo. Há um trecho da gravação, em que está conversando com o diretor do Banco do Brasil, que diz: "Estamos aqui eu, o Pio, o Pérsio. Está faltando o dinheiro." Isso, infelizmente, passou despercebido a todos nós aqui, ao contestar essa informação do Ministro. Não é verdade que essa informação não foi passada para o consórcio Opportunity, porque, de acordo com a fita, quando ele fala que está faltando dinheiro, conversando com alguém do Banco do Brasil, ele faz referência dizendo que estavam presentes Pio Borges e Pérsio Arida. Não sei se V. Exª se lembra desse episódio.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Prezado Senador José Eduardo Dutra, esse episódio é aquele, exatamente, para o qual resolvi preparar-me hoje. Há um fato extremamente importante, Sr. Presidente. Todos hão de lembrar que, no começo da sessão, formulei uma questão de ordem sobre a importância do compromisso do Ministro de falar apenas a verdade. Eu estava muito preocupado, porque não me soou bem o comentário do irmão de S. Exª, Sr. José Roberto, ao qualificar como ontológico o fato de todos mentirem. Avaliei, então, ser muito importante garantir que o Ministro falasse a verdade aqui. Perguntei ao Presidente se, tal como por ocasião das CPI´s, haveria o compromisso firmado. S. Exª considerou que, na vinda normal de Ministros ao plenário do Senado, não haveria esse compromisso, mas o pressuposto seria o de que o Ministro falasse apenas a verdade. Agora estamos com a evidência de que o Ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros faltou com a verdade em seu depoimento com respeito a esse ponto. E já adianto ao Presidente da sessão, Senador Geraldo Melo, que o demonstrarei durante o meu pronunciamento. É o caso, portanto, de se dar oportunidade ao Ministro de retificar sua declaração, para que revele, então, toda a verdade, já que é compreensível que qualquer ser humano cometa uma falha. Uma vez detectada, que S. Exª tenha o direito de retificá-la, porque, de outra forma, terá cometido o crime de responsabilidade previsto no art. 50 da Constituição. Bem lembrou V. Exª que há este episódio que precisa ser analisado minuciosamente pelo Senado Federal.  

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE) - Concordo plenamente com V. Exª, Senador Eduardo Suplicy. Todos esses episódios demonstram à exaustão que o Congresso Nacional não pode considerar encerrado esse assunto, com o simples afastamento do Ministro e dos personagens direta ou indiretamente envolvidos.  

Como já disse anteriormente, o que está em discussão não é a pessoa física Luiz Carlos Mendonça de Barros, mas o agente público Ministro das Comunicações. Nesse sentido, até para evitar que episódios como esse venham a se repetir, é necessário que o Congresso se aprofunde nas investigações e puna os responsáveis, caso existam culpados nesse episódio.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/11/1998 - Página 16686