Discurso no Senado Federal

PROPOSTAS ALTERNATIVAS PARA O AJUSTE FISCAL. PROSTITUIÇÃO DE MULHERES BRASILEIRAS NO EXTERIOR.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL. POLITICA EXTERNA. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • PROPOSTAS ALTERNATIVAS PARA O AJUSTE FISCAL. PROSTITUIÇÃO DE MULHERES BRASILEIRAS NO EXTERIOR.
Publicação
Publicação no DSF de 30/10/1998 - Página 14794
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL. POLITICA EXTERNA. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, ARGUIÇÃO, PEDRO MALAN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), GUSTAVO FRANCO, PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), SENADO, ESCLARECIMENTOS, AJUSTE FISCAL, GOVERNO.
  • COMENTARIO, ESCLARECIMENTOS, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), MANUTENÇÃO, POLITICA CAMBIAL, GRADUAÇÃO, AJUSTE, TAXA DE CAMBIO, AUSENCIA, EFICACIA, RESPOSTA, REFERENCIA, PROBLEMA, JUSTIÇA, DESIGUALDADE SOCIAL, FORMA, GARANTIA, TRABALHO, RENDA, POPULAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, ERRADICAÇÃO, FOME, MISERIA.
  • SUGESTÃO, ALTERNATIVA, AJUSTE FISCAL, ESPECIFICAÇÃO, REDUÇÃO, DESEMPREGO.
  • REGISTRO, OFICIO, AUTORIA, ORADOR, ENDEREÇAMENTO, LUIZ FELIPE LAMPREIA, MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE), SOLICITAÇÃO, URGENCIA, PROVIDENCIA, GARANTIA, SEGURANÇA, BRASILEIROS, VITIMA, ALICIAMENTO, CARCERE PRIVADO, PROSTITUIÇÃO, EXTERIOR.
  • REGISTRO, OFICIO, AUTORIA, ORADOR, ENDEREÇAMENTO, EDWARDO AMADEO, CLAUDIA COSTIN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO TRABALHO (MTB), MINISTERIO DA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL E REFORMA DO ESTADO (MARE), EXPOSIÇÃO, PROBLEMA, AMIANTO, BRASIL, SOLICITAÇÃO, DEFESA, FERNANDA GIANNASI, ENGENHEIRO, FUNCIONARIO PUBLICO, RESPONSAVEL, SAUDE, TRABALHADOR, LIDER, MANIFESTAÇÃO, PROIBIÇÃO, UTILIZAÇÃO, MINERIO, VITIMA, PROCESSO, EMPRESA DE ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, registro a importância da argüição que o Senado Federal, cumprindo com o seu dever, fez hoje com as presenças do Ministro Pedro Malan e do Presidente do Banco Central, Gustavo Franco, debatendo o Plano de Estabilização Fiscal apresentado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso, que tem por finalidade gerar, em pouco tempo, um superávit primário.  

Por que razão aconteceu isso? Esta foi uma das indagações que formulamos ao Ministro Pedro Malan. Resultou, sobretudo, pelo fato de ter o Governo permitido que houvesse, ao longo dos últimos quatro anos, uma sobrevalorização do Plano Real e uma abrupta abertura da economia.  

Em virtude do crescimento tão mais acentuado das importações e das despesas com os serviços em relação ao crescimento das exportações e das receitas com serviços, ocorreu um crescente déficit em contas correntes, que, para ser financiado, criou a necessidade, por parte do Governo, de elevar sobremaneira as taxas de juros. As taxas de juros mais elevadas que em qualquer outro país do mundo acabaram resultando em decréscimo da atividade e em taxas de desemprego recordes.  

Quando perguntado a respeito da possibilidade de um ajuste da taxa cambial, o Ministro Pedro Malan mencionou que será mantida a política cambial de ajustes graduais, não se fazendo, na área cambial e do setor externo, um ajuste abrupto, como agora está desejando, por meio do que denominou de o fim do gradualismo do ajuste fiscal.  

Se se faz necessário prudência na hora do ajuste da taxa de câmbio, é preciso, entretanto, ponderar, diante das observações do Ministro Pedro Malan, que quase todos os países que desvalorizaram as suas moedas — como o México, a Rússia, a Indonésia, a Coréia e outros países asiáticos —, dada a turbulência internacional do movimento dos capitais, acabaram tendo problemas — ainda maiores do que os do período anterior à desvalorização — com inflação e decréscimo da atividade econômica.  

O Sr. Ministro generalizou esse caso, mas ressalto que nem sempre é assim. Quando há capacidade ociosa e taxas de desemprego tão altas como as que vivemos, um ajuste um pouco mais acelerado da taxa cambial pode ser compatível com a estabilidade de preços e o não-agravamento da inflação, sobretudo se esse ajuste promover o crescimento das exportações, da atividade econômica e do emprego.  

Em muito maior dificuldade estão os trabalhadores, quando as taxas de desemprego estão extremamente altas. Obviamente, para os desempregados, bem pior é a situação, porque a sua remuneração equivale a praticamente zero.  

Haveria alternativas? Sim, como, por exemplo, a coordenação de um aumento de tarifas ou de barreiras no âmbito do Mercosul, até porque a economia desses países, como a da Argentina, passa por problemas semelhantes. E isso pode ser feito sem ferir nenhum compromisso com a Organização Mundial do Comércio. Também seria possível colocar maiores entraves a despesas com turismo internacional, cartões internacionais de crédito e compras nos free-shops; poder-se-iam aumentar as taxas sobre as remessas de pagamentos ao exterior, mas este caminho não foi seguido.  

Perguntei ao Ministro Pedro Malan sobre a outra preocupação muito forte que tenho no que tange à questão da justiça, da desigualdade, de como se garantir trabalho e renda para todos os brasileiros e contribuir mais rapidamente para a erradicação da fome e da miséria. O Ministro agradeceu o livro que lhe dei, "O Novo Exame da Desigualdade", do laureado com o Prêmio Nobel de Economia, Amartya Sen, mas, questionado a respeito de por que o Governo não anunciou nenhuma medida compensatória, quero aqui registrar que senti ausência de uma resposta mais convincente e que pudesse estar à altura dos elogios que fez a Amartya Sen, pois este economista, ao longo de sua vida, tem-se preocupado sobretudo com aqueles que nada têm. Salientou Rubens Ricúpero*, Ministro da Fazenda no Governo Itamar Franco — época em que Pedro Malan era Presidente do Banco Central —, em seu último artigo na Folha de S.Paulo , que Amartya Sen, certo dia, quando perguntado sobre se teria disposição de fazer proposições para informar investidores quanto à melhor forma de aplicarem seus recursos para conseguirem a maior rentabilidade possível, respondeu que sua preocupação era sobretudo com aquelas pessoas que nunca tinham nenhum recurso para aplicar.  

Gostaria, diante da desigualdade tão acentuada que caracteriza a economia brasileira, fazendo com que tenhamos um índice GINI da ordem de 60,1 — pior somente que o de Serra Leoa, que apresenta, segundo o último relatório do Banco Mundial, um índice GINI de 62,9 —, de dizer que seria razoável ouvirmos do Ministro Pedro Malan não apenas elogios a Amartya Sen, mas proposições para se expandir o seguro-desemprego. Se a intenção é fazer com que o Governo Federal realize convênios com Estados e Municípios, para melhor administrar o programa, este poderia ser, perfeitamente, universalizado. Refiro-me à possibilidade concreta de introduzir, de forma universal, muito mais rapidamente do que o Governo tenciona, a garantia de uma renda mínima para todas as famílias, para todos os brasileiros.  

Infelizmente, em nenhum país do mundo, nem em Serra Leoa, os 10% mais ricos, conforme os dados de 1995, portanto depois do Plano Real, detêm tanto — 47,9% da renda nacional — como no Brasil, enquanto, que para os 40% mais pobres, apenas 8,2% são destinados da renda nacional.  

Quando perguntado sobre se as mais altas taxas de juros colocadas em prática pelo Governo não estariam a provocar ainda maior agravamento do problema da desigualdade; maior concentração em favor das grandes empresas, que têm maior acesso a fontes externas mais baratas do que as pequenas, não ouvi, da parte do Sr. Ministro, uma resposta convincente no sentido de que estivéssemos no caminho de trilhar maior justiça, o quanto antes, em nosso País.  

No que diz respeito à consistência diante de uma situação de capacidade ociosa se realizar um ajuste da taxa cambial e se conseguir dominar a inflação, ter a estabilidade de preço e razoável crescimento da economia, é interessante registrar o que foi expresso no seu último artigo pelo ex-Ministro e Deputado Federal, com o qual muitas vezes tenho divergências. Mas, neste caso, é interessante notar que, com precisão, S. Exª mostra que, nos casos do Canadá e da Austrália - ambos países obviamente com níveis de renda per capita maiores do que os nossos, da ordem de US$20 mil per capita anualmente - e a Nova Zelândia com renda per capita da ordem de US$16 mil, ocorreu, entre setembro de 1997 e setembro de 1998, no Canadá, uma desvalorização aproximada e com formas flexíveis de desvalorizar da ordem de 20%; em relação à moeda australiana, a desvalorização foi da ordem de 35% e da moeda neo-zelandesa, da ordem de 40%.  

Mostra ainda que, no caso desses três países, não houve aumento muito significativo da inflação e houve razoável crescimento das suas economias, de tal maneira que aí estão três casos em que uma maior flexibilização da taxa cambial não resultou em problemas – e aqui estou levando em consideração que se trata de países mais desenvolvidos do que o Brasil e cujas economias não estavam com desequilíbrios internos e externos tão fortes quanto os que atualmente caracterizam a economia brasileira.  

Gostaria de registrar que achei proveitoso o debate havido e, inclusive, quero cumprimentar os meus companheiros de Bancada, os Senadores José Eduardo Dutra e Lauro Campos, pela maneira como argüíram e contestaram as observações do Ministro Pedro Malan.  

Sr. Presidente, quero aqui registrar ofício que estou encaminhando a Exmº Sr. Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Luiz Felipe Lampréia, nos seguintes termos:  

Sr. Ministro, a imprensa brasileira noticiou, esta semana, um fato que há muito tempo tem nos preocupado: o aliciamento de mulheres brasileiras para prostituição nos países da Europa e agora em Israel. Essas mulheres são convidadas a deixarem o País com promessas de trabalho no exterior, mas, ao chegarem lá, têm o passaporte confiscado pelos donos de casas de prostituição e passam a viver em cárcere privado.  

A morte da carioca Kelly Fernanda Martins, de 26 anos de idade, no último dia 17, em Tel Aviv, é um exemplo da seriedade desse problema. Selma Rosa, mãe de Kelly, denunciou à imprensa que sua filha estava sendo obrigada a se prostituir pela máfia russa, que atua em Israel. Kelly havia escrito cartas à família, onde contava que estava sendo ameaçada de morte por um homem chamado Yossi, dono da casa de prostituição para onde havia sido levada. O corpo de Kelly foi encontrado em uma rua em Tel Aviv. De acordo com informações da mãe dela, Kelly estava com os dentes quebrados e tinha hematomas no corpo. A polícia israelense ainda não divulgou as causas da morte da moça.  

De acordo com as denúncias que têm chegado ao Brasil, o esquema da máfia russa de prostituição conta com o trabalho de brasileiros no Rio de Janeiro e em Israel. Essas pessoas ganham dinheiro aliciando mulheres pobres que procuram trabalho. Em Israel, elas são obrigadas a fazer até 15 programas por dia e passam a viver em condições subumanas.  

Apelo a Vossa Excelência para que tome providências urgentes no sentido de garantir a segurança das oito brasileiras, resgatadas das casas de prostituição pela polícia israelense, mas que continuam em Tel Aviv, prestando depoimento. Essas mulheres estão pedindo proteção policial, já que estão sendo ameaçadas de morte pelos componentes da máfia russa e, desde sábado, não contam com os guardas que faziam a segurança no hotel onde estão hospedadas. Apelo ainda para que Vossa Excelência peça um levantamento no sentido de descobrir se existem outras mulheres na mesma situação.  

No aguardo de resposta ao presente Ofício e, esperando que sejam tomadas as urgentes providências que o caso requer, agradeço desde já a sua atenção.

 

Respeitosamente, 

Senador Eduardo Suplicy  

Líder do Bloco Parlamentar de Oposição e do PT no Senado Federal."  

Sr. Presidente, ainda cumpre a mim registrar ofício que encaminhei, em igual teor, ao Sr. Ministro do Trabalho, Edward Amadeo, e à Srª Cláudia Costin, Ministra da Administração, nos seguintes termos:  

Sr. Ministro, Srª Ministra, desde 1997 não é permitido vender, importar ou fabricar qualquer produto com amianto na França, com base em relatório do Instituto Nacional de Saúde e de Pesquisas Médicas, que atribuía a morte de 2 mil pessoas por ano ao câncer de pulmão ou da pleura, provocados pela aspiração da poeira do asbesto.  

O produto já foi banido em 11 países, entre eles os Estados Unidos, entretanto no Brasil sua fabricação continua autorizada. A única mina existente é explorada pela empresa Eternit S/A, que, segundo denúncia encaminhada à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, estaria intimidando centenas de seus ex-empregados a aceitar acordos indenizatórios "indecentes, face a doenças crônicas adquiridas durante a existência de quase 50 anos da empresa em Osasco".  

Fernanda Giannasi, engenheira do Serviço de Segurança Ocupacional do Ministério do Trabalho, que tem a responsabilidade profissional de proteger a saúde do trabalhador e lidera um movimento pela proibição do uso do amianto no Brasil, está sendo processada pela Eternit S/A por ter escrito artigo onde expõe "a propaganda enganosa" da indústria do amianto na literatura médica. O referido processo causou indignação em várias organizações dedicadas à segurança no trabalho que manifestaram seu apoio a Giannasi, dentre elas a Associação Americana de Saúde Pública.  

Fernanda Giannasi é uma profissional dedicada que vem realizando o seu trabalho com seriedade e profissionalismo. Graças à sua integridade e persistência, aliada a defesa inconteste do cumprimento da lei, muitas injustiças têm sido evitadas.  

Independentemente de estar ou não com a razão, Fernanda Giannasi agiu no exercício de suas funções e é dever do Estado garantir os seus atos nos limites das atribuições conferidas a sua servidora. É inadmissível, portanto, que Giannasi tenha que arcar com o ônus de constituir um advogado para promover sua defesa.  

Nesta quarta-feira, ontem, foi realizado um ato na Câmara Municipal de Osasco, para expor a questão do amianto no Brasil e na região, onde juntamente com as entidades sindicais e organizações não governamentais foi hipotecado apoio ao trabalho da engenheira Fernanda Giannasi. Encaminho em anexo, e peço que seja transcrito, cópia do pronunciamento por ela proferido no evento.  

Certo de que V. Exª adotará as providências que o caso requer, aproveito o ensejo para renovar meus protestos de estima e consideração.  

Gostaria de informar, Sr. Presidente, que recebi hoje telefonema do Presidente da Eternit, Sr. Antônio Luiz Aulicínio, que manifestou a vontade de explicar-me em detalhes a questão da indústria do amianto no Brasil.  

Informou-me que gostaria de promover um diálogo no sentido de esclarecer as condições de trabalho das pessoas hoje empregadas na Eternit, o acordo que foi realizado com o sindicato dos trabalhadores e quais os cuidados com a saúde que têm sido tomados por essa empresa em relação, inclusive, a outras alternativas que muitas vezes seriam prejudiciais à saúde dos trabalhadores.  

No caso da Srª Fernanda Giannasi, a preocupação é que não haja termos que possam ser considerados ofensivos à empresa Eternit, de tal maneira que o diálogo sobre esse assunto se dê de forma respeitosa.  

Tenho conhecimento, conforme expliquei ao Sr. Antônio Luiz Aulicínio, da seriedade do trabalho, da coragem e da assertividade da senhora Fernanda Giannasi; coragem essa que já havia sido observada em outros episódios, como na explosão ocorrida no ano passado na fábrica nitro-química do grupo Votorantim, em São Miguel Paulista, São Paulo. Naquela ocasião, ela assegurou que o sindicato dos trabalhadores poderia entrar na fábrica para examinar o que havia ocorrido com um trabalhador que ali havia sido morto, os possíveis danos a outros trabalhadores. Trata-se, portanto, de uma profissional – engenheira do Ministério do Trabalho – que procura cumprir com a sua responsabilidade. Obviamente, precisamos ouvir a manifestação do presidente da Eternit; é nosso dever e responsabilidade. Registramos, nesse momento, Sr. Presidente, o documento em que S. Sª, segundo me afirmou, irá expor o ponto de vista da Eternit.  

Muito obrigado.  

 

Î Ö


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/10/1998 - Página 14794