Discurso no Senado Federal

CONTRARIO AO PEDIDO DOS LIDERES GOVERNAMENTAIS PARA APRECIAÇÃO, EM REGIME DE URGENCIA, DO PROJETO DE LEI DA CAMARA 8, DE 1991, QUE TRATA SOBRE A REFORMA PSIQUIATRICA NO PAIS.

Autor
Sebastião Bala Rocha (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AP)
Nome completo: Sebastião Ferreira da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • CONTRARIO AO PEDIDO DOS LIDERES GOVERNAMENTAIS PARA APRECIAÇÃO, EM REGIME DE URGENCIA, DO PROJETO DE LEI DA CAMARA 8, DE 1991, QUE TRATA SOBRE A REFORMA PSIQUIATRICA NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 27/11/1998 - Página 17069
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, LIDER, ADIAMENTO, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI, CAMARA DOS DEPUTADOS, REFORMULAÇÃO, ESTABELECIMENTO PSIQUIATRICO, SANATORIO.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA (Bloco/PDT-AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na semana que passou, os Líderes, sobretudo governistas, decidiram por assinar um requerimento de urgência, solicitando a votação do PLC nº8, de 1991, que trata da reforma psiquiátrica. Esse projeto é de autoria do Deputado Paulo Delgado, foi aprovado na Câmara dos Deputados, e tramita no Senado há aproximadamente sete anos, já tendo passado por vários relatores. Recebeu, recentemente, parecer favorável, na forma de um substitutivo, apresentado pelo Senador Lucídio Portella.  

Posteriormente, em função de apresentação de emendas de plenário, fui designado, pelo Presidente da Comissão de Assuntos Sociais, relator dessas emendas. Esse projeto, na sua essência, propõe a extinção dos hospitais psiquiátricos, denominados no projeto de manicômios e propõe ainda que não haja destinação de recursos públicos para construção de novos hospitais psiquiátricos no País nem a contratação de novos leitos pelo SUS em hospitais privados.  

Trata-se de um projeto extremamente polêmico, porque existem no Brasil duas correntes muito diferenciadas, com encaminhamentos ideologicamente bastante divergentes. De um lado, a proposta do Deputado Paulo Delgado deseja a substituição desses hospitais psiquiátricos por outras unidades de saúde que visem humanizar, cada vez mais, o tratamento das pessoas portadoras de transtornos mentais, por outro lado, há uma corrente vinculada aos proprietários de hospitais, a Federação Brasileira de Hospitais que defendem exatamente o contrário: a continuidade do modelo assistencial; que o modelo de atendimento predominante continue sendo a internação da pessoa portadora de transtorno mental em hospital especializado, portanto, em hospital psiquiátrico. Se bem que já houve - e é importante que se reconheça um mérito no relatório do Senador Lucídio Portella -, de certa forma, um avanço no sentido da humanização dos serviços e da proposição de implementação de novos serviços assistenciais, como o hospital-dia, como o hospital-noite, como a pensão protegida, enfermarias psiquiátricas em hospitais gerais e emergência psiquiátrica em prontos-socorros gerais.  

De fato, esses pontos se constituem em avanços, mas não resolvem a questão central da discussão, do debate, da polêmica, que é exatamente saber se os hospitais especializados, se os hospitais denominados psiquiátricos devem ou não continuar como modelo, como um dos estabelecimentos de atendimento à pessoa portadora de transtorno mental.  

Sr. Presidente, Srs. Senadores, hoje, vim à tribuna para manifestar o meu desacordo com relação a esse pedido de urgência. Entendo que não há nenhuma motivação, do ponto de vista legislativo, do ponto de vista de atendimento ao interesse público, ao interesse público que se justifique com relação a esse requerimento de urgência dos Líderes, sobretudo dos partidos governistas no Senado. Nesta oportunidade, eu gostaria de pedir aos Líderes que refletissem e revissem sim a decisão de requerer a urgência para esse projeto. Informo que já havia decidido convocar audiências públicas para que pudéssemos, mais uma vez, ouvir os dois segmentos, que têm pensamentos extremamente divergentes, como já mencionei, a respeito do assunto; mas, sobretudo, ouvir o Ministério da Saúde e o Governo. Como se trata de um projeto de interesse da sociedade brasileira, não posso conceber que o Governo, por intermédio do Ministério da Saúde principalmente, deixe de manifestar-se a respeito da matéria.  

O que está acontecendo? Sobretudo na época do Ministro Carlos César Albuquerque - estive duas vezes no Ministério -, procurei obter uma posição oficial do Ministério a respeito do assunto. Isso não foi possível. Depois que o Ministro Serra assumiu o Ministério da Saúde, em algumas oportunidades, conversamos com o Ministro a respeito, mas, também, não houve ainda uma posição definitiva, não há um consenso dentro do Ministério a respeito dessa matéria, que é fundamental para que se possa estabelecer no País a chamada reforma psiquiátrica. Acredito que o Ministro da Saúde, que o Governo não pode ficar de fora desse debate, não pode ficar isento da discussão.  

Ainda há pouco, questionado na Comissão de Assuntos Sociais, onde o Ministro da Saúde está prestando um depoimento, participando de um debate, o Ministro José Serra, mais uma vez, disse que nem sequer teve conhecimento dessa solicitação, dessa urgência; que não coube ao Ministério qualquer solicitação aos Líderes para que esse requerimento de urgência pudesse ingressar nesta Casa, pudesse ser apresentado pelos Líderes.  

Portanto, creio que seria extremamente importante se o Senado tivesse a oportunidade, sobretudo a Comissão de Assuntos Sociais, mais uma vez, de debater essa matéria e que o Governo pudesse oficialmente se posicionar, haja vista que a reforma psiquiátrica foi implantada em outros países por iniciativa do próprio governo. Portanto, é matéria de interesse do Poder Executivo, em especial do Ministério da Saúde, que não pode, de maneira nenhuma, deixar de opinar, até para orientar os Senadores governistas sobre a posição que devem adotar quando da votação do projeto. Particularmente, não tenho, na condição de Relator, nenhuma posição mais radical sobre o assunto.  

O objetivo de aprofundarmos o debate por intermédio de audiências públicas seria, certamente, para tentar extrair os pontos de convergência das duas correntes que divergem acentuadamente sobre a matéria. Então, ouvindo especialistas, representantes desses dois segmentos e, sobretudo, o Ministério da Saúde, poderíamos, finalmente, ter um projeto condizente com os reais interesses da sociedade, da coletividade; das pessoas portadoras de transtornos mentais e de seus familiares.  

Não tenho nenhuma intenção em radicalizar. Na verdade, queremos agregar tudo de bom, tudo de positivo que já foi produzido durante o período em que o projeto tramita no Senado e caminhar para um modelo assistencial que priorize a pessoa portadora de transtornos mentais, os seus familiares e o restante da sociedade. O que não pode, de forma nenhuma, é prevalecer o interesse econômico, o interesse apenas dos proprietários, digamos, dos hospitais. Espero que não seja esta a ênfase a ser dada quando da discussão, quando do debate desse projeto, porque não seria de forma nenhuma condizente com o espírito democrático, com o espírito que esta Casa tem demonstrado de preservação dos interesses da sociedade como um todo.  

Portanto, esse é o apelo que deixo no Senado, para que haja uma reflexão dos Líderes, a fim de que esse projeto seja votado no ano que vem. Poderá haver um aprofundamento dos debates na Comissão de Assuntos Sociais, com a realização das audiências públicas, o que, no meu entendimento, são fundamentais para que possamos ter em mão um projeto isento de qualquer deformidade, sobretudo no intuito de nos aproximarmos de um consenso.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/11/1998 - Página 17069