Discurso no Senado Federal

APOIO A APROVAÇÃO RAPIDA DO PROJETO DE LEI DA CAMARA 8/91, QUE DISPÕE SOBRE A EXTINÇÃO PROGRESSIVA DOS MANICOMIOS E SUA SUBSTITUIÇÃO POR OUTROS RECURSOS ASSISTENCIAS E REGULAMENTA A INTERNAÇÃO PSIQUIATRICA COMPULSORIA.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • APOIO A APROVAÇÃO RAPIDA DO PROJETO DE LEI DA CAMARA 8/91, QUE DISPÕE SOBRE A EXTINÇÃO PROGRESSIVA DOS MANICOMIOS E SUA SUBSTITUIÇÃO POR OUTROS RECURSOS ASSISTENCIAS E REGULAMENTA A INTERNAÇÃO PSIQUIATRICA COMPULSORIA.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/1998 - Página 17638
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • APOIO, REGIME DE URGENCIA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, CAMARA DOS DEPUTADOS, EXTINÇÃO, SANATORIO, SIMULTANEIDADE, SUBSTITUIÇÃO, ALTERNATIVA, ATENDIMENTO, DEFICIENTE MENTAL, ESTABELECIMENTO PSIQUIATRICO.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL-MA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, preocupações têm sido externadas a propósito da insuficiência de verbas no Ministério da Saúde para realizar o custeio da sua responsabilidade junto ao setor hospitalar público e privado. Mesmo antes dos cortes do ajuste fiscal, já se sabia que os pagamentos referentes a outubro só poderão se efetivar em dezembro.  

Na tribuna da Câmara, no último dia 11, o Deputado Ursicino Queiroz, médico que integra a bancada do nosso PFL da Bahia, abordou esse problema da Saúde, e deu destaque às perspectivas sombrias que rondam o setor de psiquiatria. Sua Excelência teme que, num setor sem reajuste há quatro anos, a rede hospitalar psiquiátrica pode encerrar suas atividades, "lançando na rua milhares e milhares de pacientes sem a mínima condição de ser reintegrados à sociedade."  

A abordagem do assunto faz-se oportuna porque os parlamentares, no correr dos últimos meses, têm recebido renovados apelos de entidades as mais representativas favoráveis ao Projeto de Lei da Câmara n.º 08, de 1991, que dispõe sobre a extinção progressiva dos manicômios e sua substituição por outros recursos assistenciais, e regulamenta a internação psiquiátrica compulsória.  

Tal proposição, que já recebeu várias emendas no Senado, tramita, como se vê, de modo lento, nada obstante sua importância.  

O problema dos deficientes mentais corresponde a períodos de indizíveis sofrimentos para esses seres humanos.  

Na Idade Média, tinha-se o louco como um instrumento de bruxaria, situação que perdurou até a segunda metade do século 19, quando se passou a considerar o deficiente mental como um doente.  

No entanto, não obstante os tantos esforços de abnegados cientistas, os nossos hospícios se transformaram em depósitos de loucos. Recorria-se não a tratamentos terapêuticos ou medicamentosos, mas aos métodos punitivos. A descoberta de substâncias antipsicóticas e antidepressivas - que obtêm resultados mais otimistas com os doentes - só ocorreu a partir de 1950.  

Temia-se o louco como a um animal feroz, e a solução era submetê-lo a uma imersão moral e disciplinar.  

Quem se supunha louco, e efetivamente não o era, e ficava internado num manicômio - fato comprovado em farta documentação -, seguramente acabaria louco, ali mantendo-se segregado até a morte.  

Doente mental, em tempos nem assim tão remotos, significava um rótulo que abrangia desde as vítimas de transtornos psicóticos graves até os alcoólatras, mendigos e mesmo as mães solteiras, consideradas "loucas" por pais de rigor puritano radical.  

E, ao ingressarem num hospício, estavam condenados a uma segregação perpétua, que reduzia sobremodo o seu tempo de vida.  

Além das prisões, eram submetidos a eletrochoques e a lobotomias, geralmente desaconselháveis na grande maioria das vítimas.  

No famoso Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena - criado com as melhores intenções, em 1903, mas tragicamente subvertidas pelas alterações de sua rotina assistencial -, morreram mais de 60 mil internados ao longo da sua história, situação que se modificou substancialmente, para melhor, a partir da década de 80.  

Nos dramáticos tempos, os pacientes juntavam-se para comer em cochos abertos no chão de cimento, próximos a esgotos a céu aberto atravessando o hospício, nos quais os doentes amainavam sua sede. Sem o conforto de camas, alimentação adequada ou de agasalhos, padeciam o frio e a fome. Daí resultavam as diarréias e as tantas outras enfermidades que provocavam mortes a cada instante do dia.  

Isto ocorria - e praza aos Céus que não mais ocorra - em praticamente todos os manicômios brasileiros, senão na maior parte do mundo, até tempos recentíssimos.  

Manifestações da sociedade puseram um paradeiro a tanto sofrimento. Cientistas de vários países insurgiram-se contra os métodos errados utilizados na assistência aos deficientes mentais. Vieram em seguida os Princípios da Organização Mundial de Saúde, de 1991, e da Organização Panamericana de Saúde, além das Resoluções, datadas de 1994, do Conselho Federal de Medicina.  

Vemos, pelas datas, que é muito recente o despertar da sensibilidade - abrangendo um número significativo de pessoas e entidades - para problema tão lamentável como o da fragilidade com que a sociedade vinha encarando a assistência devida aos doentes mentais.  

Consubstanciando as conquistas da nova orientação psiquiátrica predominante nos meios científicos, foi apresentado e obteve êxito na Câmara o projeto do Deputado Paulo Delgado, dispondo sobre a extinção progressiva dos manicômios e sua substituição por outros recursos assistenciais e regulamenta a internação psiquiátrica compulsória.  

No Senado, sob o número PLC 8/91, este projeto criou, acrescido da emenda do Senador Lúcio Alcântara, perspectivas entusiásticas junto aos meios científicos e médicos do Brasil.  

Aqui no Senado, recebemos a visita de numerosas delegações, que pleiteavam a aprovação do projeto com a referida emenda. Entre elas, as representativas da Associação Brasileira das Organizações não Governamentais, Associação Brasileira de Psiquiatria, Associação dos Juizes para Democracia, Conselho Federal de Medicina, Conselho Federal de Psicologia, Conselho Nacional de Saúde, Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde, Departamento Intersindical de Estudos sobre Saúde e Ambiente do Trabalho, Federação Nacional dos Médicos, Federação Nacional dos Psicólogos e da CUT.  

Num manifesto que nos trouxeram, está dito em alguns dos seus trechos:  

"Nós, familiares de pessoas com sofrimento psíquico, estamos aqui para dizer que não queremos mais ver nossos familiares isolados, cronificados e mal tratados em tristes hospitais psiquiátricos e manicômios. Queremos e exigimos a continuidade e a criação dos serviços substitutivos aos hospitais psiquiátricos e manicômios com tratamento humano, digno e dentro do convívio social...  

"Nós, trabalhadores de saúde mental estamos aqui para dizer que não queremos ser agentes da exclusão e da violência; não admitimos usar nosso papel técnico para legitimar as instituições psiquiátricas que excluem, abandonam e confinam as pessoas com sofrimento psíquico. Queremos e exigimos realizar ciência com consciência e ética...  

"Nós, integrantes de movimentos sociais da sociedade civil, estamos aqui para dizer que nos opomos a todas as formas de opressão, estigma, discriminação e desigualdade de direitos. E temos certeza: a exclusão de alguns significa a exclusão de todos...  

"O projeto de lei do Deputado Paulo Delgado com as emendas do Senador Lúcio Alcântara tem amplo apoio na sociedade cabendo destacar: Conselho Federal de Medicina, Associação Brasileira de Psiquiatria, Conselhos Federais de Psicologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, Serviço social, Enfermagem, Fonoaudiologia e as diversas Associações de Usuários e Familiares dos serviços de Saúde Mental."  

Sr. Presidente, ressalte-se que não ingresso no mérito do PLC 8/91, pois estou certo de que a proposição que sair desta Casa, a ser por nós votada, atenderá plenamente o objetivo humano da assistência a que têm direito os deficientes mentais.  

O que pleiteio é que se dê mais agilidade a essa votação, sustando as críticas que já se fazem ao Senado pela delonga com que estamos apreciando matéria de tal magnitude.  

É importante que ofereçamos à sociedade brasileira, e em especial à comunidade científica nacional e internacional, o instrumento legal que se reclama como de grande importância, em nosso País, para curar ou amenizar os males mentais que atormentam tantos dos nossos patrícios e seus familiares.  

Creio que já tarda a hora de estabelecermos, no Brasil, as normas legais que presidam os métodos e técnicas que, já aplicados em muitas de nossas casas hospitalares e em outras Nações, estão obtendo resultados alvissareiros nesse setor da medicina.  

Era o que eu tinha a dizer.  

Obrigado. 

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/1998 - Página 17638