Discurso no Senado Federal

TRANSCRIÇÃO, NOS ANAIS DA CASA, DA SENTENÇA PROLATADA PELO JUIZ FRANCISCO NEVES DA CUNHA ABSOLVENDO O DR. FRANCISCO PINHEIRO DA ROCHA, MEDICO QUE ASSISTIU O PRESIDENTE TANCREDO NEVES.

Autor
Elcio Alvares (PFL - Partido da Frente Liberal/ES)
Nome completo: Élcio Alvares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • TRANSCRIÇÃO, NOS ANAIS DA CASA, DA SENTENÇA PROLATADA PELO JUIZ FRANCISCO NEVES DA CUNHA ABSOLVENDO O DR. FRANCISCO PINHEIRO DA ROCHA, MEDICO QUE ASSISTIU O PRESIDENTE TANCREDO NEVES.
Publicação
Publicação no DSF de 08/12/1998 - Página 18006
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, SENTENÇA JUDICIAL, ABSOLVIÇÃO, FRANCISCO PINHEIRO DA ROCHA, MEDICO, DISTRITO FEDERAL (DF).
  • SAUDAÇÃO, ABSOLVIÇÃO, FRANCISCO PINHEIRO DA ROCHA, MEDICO, DISTRITO FEDERAL (DF).

O SR. ELCIO ALVARES (PFL-ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foi com satisfação que tomei conhecimento, pelo Diário de Justiça de 10 de setembro passado, da sentença prolatada pelo Dr. Francisco Neves da Cunha, Juiz Federal da 16ª Vara de Brasília, em favor do Dr. Francisco Pinheiro da Rocha, rebelando-se contra decisão do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal e, conseqüentemente, anulando a penalidade que lhe fora imposta.  

É preciso, desde logo, lembrar os dolorosos acontecimentos em que se viu envolvido o Dr. Pinheiro da Rocha, por ocasião da doença que vitimou o Dr. Tancredo Neves, recém-eleito Presidente da República.  

O Juiz resume com clareza a situação: "Relutante em aceitar submeter-se a qualquer intervenção cirúrgica, sequer de que se divulgasse qualquer anomalia com sua saúde, o adiantado da doença obrigou Tancredo a submeter-se aos cuidados cirúrgicos antes que tomasse posse no almejado cargo. A família comungava das mesmas preocupações do Presidente com a opinião pública e com o delicado quadro político-institucional reinante."  

Por força das circunstâncias, o Dr. Pinheiro da Rocha foi o médico responsável pela primeira cirurgia a que se submeteu o Dr. Tancredo na véspera de ser empossado no cargo de Presidente da República. A tensão em que vivia o País transformou o episódio em autêntica tragédia, conforme acentua o Dr. Francisco Neves da Cunha ao dizer que "... desenrolava-se uma situação sui generis , inédita, jamais acontecida em toda a História do Brasil, de uma gravidade e ao mesmo tempo de uma delicadeza ímpares, a ser conduzida com maior esmero e trato possíveis."  

Constatado que o Presidente eleito era portador de um leiomioma, militares e políticos da maior responsabilidade apoiaram decisão dos familiares do Dr. Tancredo de omitir esse resultado, mesmo tratando-se de tumor benigno, evitando atestados e declarações que pudessem criar alarde. Acresce que a cirurgia foi bem sucedida, encontrando-se o doente em franca recuperação, e, assim, optou-se pela declaração de que o presidente eleito fora operado de divertículo de Meckel, antes mesmo do resultado final do exame.  

Como é acentuado na magistral sentença, na ocasião não se afrontava o Código de Ética Médica em vigência. Somente em posterior diploma legal se estabeleceria que seria passível de pena "expedir boletim médico falso ou tendencioso." Daí, ter destacado o Juiz Francisco Neves da Cunha que "por tais argumentos, pecou o veredicto combatido por aplicar a um fato anteriormente acontecido lei inexistente naquele tempo, norma posterior e mais grave."  

Da audiência de testemunhas ficou evidente o acerto da cirurgia e o desenrolar de uma recuperação que possibilitaria alta do paciente em pouco tempo, a fim de assumir o cargo de Presidente da República, conforme seu desejo. Isso não veio a se dar em face de uma série de problemas surgidos posteriormente e que agravaram o estado de saúde do doente. Profissionais da maior competência, não só de Brasília, como do Rio de Janeiro, de Belo Horizonte e, sobretudo, de São Paulo, que constituíram uma junta médica, publicaram um boletim com um parecer elogiando a conduta médico-cirúrgica "que foi e continua sendo correta".  

Em todos os depoimentos tomados durante o processo, sobressai a competência médica e a lisura do Dr. Pinheiro da Rocha. O Dr. Walter Pinotti, que aqui apareceu como um membro a mais da junta médica e que se ofereceu para ficar cuidando do paciente, diz textualmente: "Não houve nenhum erro no tratamento a que foi submetido o Excelentíssimo Senhor Presidente da República durante a cirurgia realizada no dia 14 de março deste ano. As conseqüências registradas decorreram do próprio organismo do paciente, independentemente da vontade de qualquer médico, em qualquer lugar."  

Em sua brilhante e minuciosa sentença, o juiz Francisco Neves da Cunha diz que o autor-indiciado "escolheu o resguardo do direito do paciente e de seus familiares, o sigilo, o segredo quanto ao exato estado do doente, não descendo a pormenores, em primeiro lugar, não deixando, entretanto, de dar uma satisfação ao público e à mídia, em geral, com informações mais genéricas, mas prudentes, quanto ao desencadear da doença do ilustre homem público", o que exime o Dr. Pinheiro da Rocha de qualquer responsabilidade, pois agia ele "transmitindo ao público as informações permitidas pelas normas que regulam a profissão, em face do segredo médico a que estava obrigado e recomendado pelo paciente e familiares, que eram, na escala de interesse e importância, aqueles a quem, em primeiro lugar, o médico devia satisfação".  

Lembra ainda o juiz que os próprios Conselhos Regional e Federal de Medicina reconhecem que o autor-indiciado agiu "corretamente no tocante à informação verdadeira ao paciente e familiares". E, já no final da sentença, complementa: "O autor da ação é cirurgião. Não lhe caberia, pois, responsabilidade pela elaboração do lauto anatomopatológico, que, como se sabe, é da competência técnica dos médicos patologistas que o deverão ter assinado, conforme testemunho do Dr. Hélcio Mizziara, se verdadeiramente existiu. Tecnicamente, não caberia ao cirurgião assinar laudo anatomopatológico, nem há nos autos comprovação documental de tal autoria."  

E, finalizando, o Dr. Francisco Neves da Cunha afirma: "...o responsável, em última palavra, pelo passamento do saudoso Presidente Tancredo Neves, foi ele próprio, pelo seu estoicismo, o seu acendrado patriotismo e amor à causa pública, se bem que não seja esta a questão sub examen , mas que é necessário acentuar para o melhor e mais amplo entendimento do caso".  

E foi assim, com satisfação, que lemos o último trecho da sentença: "Com respaldo nas razões de fato e de direito suso estipuladas, julgo procedentes ambas as ações ordinária e cautelar, para anular o julgamento do autor e, conseqüentemente, a penalidade a ele imposta."  

Sr. Presidente, finalmente, foi feita justiça a um profissional a quem esta cidade e o Congresso Nacional muito devem, cujo nome será mencionado prioritariamente sempre que se queira rememorar a história de Brasília, pois decisiva foi sua ação para que a nova Capital dispusesse de excelentes serviços médicos, tornando-se hoje um dos centros mais importantes do País no tocante à medicina.  

Refiro-me ao Dr. Francisco Pinheiro da Rocha, o Dr. Pinheiro – como todos em Brasília o conhecem –, que tem ocupado cargos importantes em Brasília, desde a sua inauguração. Médico do Hospital Distrital de Brasília; da Câmara dos Deputados; cirurgião eminente; foi Secretário de Saúde e Presidente da Fundação Hospitalar do Distrito Federal de junho de 1964 a abril de 1967, período em que construiu e inaugurou diversos hospitais integrados à rede hospitalar e postos de saúde nas cidades satélites.  

Durante os 36 anos de efetivo trabalho do Hospital de Base, o Dr. Pinheiro ocupou várias chefias, realizou mais de 6 mil intervenções cirúrgicas e formou mais de 200 residentes na área de cirurgia geral. Atualmente, exerce as funções de consultor científico no setor de cirurgia geral daquele nosocômio.  

A imensa atividade médica e administrativa que desenvolveu nos cargos que ocupou nesta cidade não impediu que o Dr. Pinheiro se empenhasse, simultaneamente, na sua própria modernização como cirurgião, tendo feito sucessivos cursos de atualização no Exterior e se tornado membro titular da Associação Francesa de Cirurgiões.  

Mais importante que títulos, quaisquer que sejam, são as qualidades e virtudes pessoais do Dr. Pinheiro, de inigualável e invejável notoriedade no Distrito Federal e no País. Administrador extraordinário, o Dr. Pinheiro é sobejamente conhecido nas duas Casas do Congresso Nacional e em todo o Distrito Federal pela sua competência e dedicação aos clientes, virtudes que o tornam figura singular no círculo médico de Brasília, atendendo a todos que o procuravam no Serviço Médico da Câmara dos Deputados, no Hospital de Base e em sua própria residência, com igual dedicação, realizando incontáveis cirurgias nesta cidade, onde permanece em plena atividade, para gáudio de todos nós.  

Sr. Presidente, eminentes colegas, esse discurso é de gratidão, marcado pelo meu coração e pelo meu sentimento. Quando cheguei aqui, em 1970, a minha mãe vinha do Espírito Santo, portadora de um câncer inoperável, para ficar junto ao filho dela, então Deputado Federal, e contar dias para o seu falecimento.  

O Dr. Pinheiro da Rocha fez um exame e se atreveu a fazer uma cirurgia em minha mãe, embora todos os exames, inclusive as chapas de raios–X, apontassem para que o câncer permanecesse como estava, porque uma cirurgia não teria mais o alcance necessário. O Dr. Pinheiro da Rocha fez essa operação. Minha mãe ficou sete dias na UTI, praticamente em estado de coma, mas o Dr. Pinheiro da Rocha conseguiu reerguer minha mãe, que viveu mais 11 anos em minha companhia. Portanto, este pronunciamento é, acima de tudo, de gratidão.  

Por tudo isso, Sr. Presidente, é que nos trouxe imensa satisfação a sentença do eminente Juiz Dr. Francisco Neves da Cunha, pois, finalmente, a justiça foi feita, e o Dr. Pinheiro recebeu a reparação que merecia.  

Solicitamos, Sr. Presidente, a transcrição, nos Anais desta Casa, da íntegra da sentença que faço chegar à Mesa neste instante.  

Muito obrigado.  

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SENADOR ELCIO ALVARES EM SEU PRONUNCIAMENTO:  

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/12/1998 - Página 18006