Discurso no Senado Federal

REPUDIO A CRITICAS INFUNDADAS, POR PARTE DA IMPRENSA EM RELAÇÃO AO CONGRESSO NACIONAL.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO.:
  • REPUDIO A CRITICAS INFUNDADAS, POR PARTE DA IMPRENSA EM RELAÇÃO AO CONGRESSO NACIONAL.
Aparteantes
Bello Parga, Pedro Simon, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/1998 - Página 18596
Assunto
Outros > LEGISLATIVO.
Indexação
  • PROTESTO, CRITICA, PROCEDENCIA, NOTICIARIO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, IMPRENSA, REFERENCIA, ATUAÇÃO, CONGRESSISTA, CONGRESSO NACIONAL, RESULTADO, CONVOCAÇÃO EXTRAORDINARIA, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • DEFESA, ATUAÇÃO, CONGRESSISTA, CONGRESSO NACIONAL, RESULTADO, IMPORTANCIA, VOTAÇÃO, LEGISLAÇÃO, PAIS.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é a primeira vez, desde que eu me entendo como Parlamentar, que tenho buscado mostrar aos que não convivem nesta Casa a atuação do Legislativo.  

É claro que há críticas que são fundadas, outras que são procedentes, mas, na maioria das vezes, faz-se injustiça ao Parlamento brasileiro quando se diz que ele não trabalha o suficiente para fazer jus à remuneração que lhe é destinada.  

A maioria dos Senadores - e é preciso que a sociedade brasileira saiba disso - são ex-governadores, ex-ministros de Estado, profissionais do mais alto gabarito, que compõem uma biografia - não tenho nenhum receio de dizer - que, para muitos - e eu me incluo nesses muitos -, está acima do que eles ganham. É pena que quando se dá à publicidade - e isso é feito amiúde - notícia em derredor do Parlamento brasileiro, todos somos colocados no mesmo nível. Não há a preocupação de se excetuar, de colocar uma vírgula, como diz a célebre frase. Alguns, dentre as honrosas exceções, mereciam não ser alinhados no mesmo nível de restrição.  

Nos últimos dias, tem-se feito um cavalo de batalha em torno da convocação extraordinária do Congresso Nacional. Não vi, até hoje, nenhum requerimento assinado por Senadores ou Deputados Federais pedindo que haja convocação. Geralmente, ela vem do Poder Executivo. E ninguém critica a parte de onde ela se origina: haveria uma falha na crítica, uma vez que se a Presidência da República convoca, é porque tem necessidade de ver matérias serem apreciadas - até por problema de prazo.  

Observe V. Exª, Sr. Presidente Geraldo Melo, que ainda há pouco trocávamos idéias, o Senador Elcio Alvares, V. Exª e eu, sobre como seria possível conseguirmos manter um padrão de vida com o que temos na vida paralela - um empresário, outro advogado -, porque, em verdade, não haveria o resultado que o contracheque líquido todo mês oferece. Por igual, seria importante observar aqueles que dispõem de uma biografia que foi enriquecida a custa de muito trabalho e muito sacrifício, onde não se nota nenhum traço de desonestidade, se a esses não está sendo mal pago o seu trabalho. Sabemos quais são os parlamentares assíduos. Aliás, uma das belas coisas que o Senado fez nos últimos tempos foi a implantação da TV Senado, da Rádio Senado e do Jornal do Senado , porque eles permitem ao cidadão que paga imposto saber quais são aqueles que desempenham o seu mandato com seriedade, o político que não faz do exercício do seu mandato veículo para as suas ambições sociais, mas sim para os interesses coletivos. E esses, portanto, têm condições de mostrar o seu comparecimento, a sua assiduidade e aquilo para o que receberam a outorga popular.  

Basta, Sr. Presidente, dar uma breve olhada, ainda que seja de relance, no Jornal do Senado de hoje: "Senado já apreciou mais de 400 matérias em 1998." Entre as decisões, Sr. Presidente, para aqueles que não conhecem, estão a punição ao trabalho escravo e, ainda anteontem, a autorização para o acordo de ajuda financeira internacional ao Brasil. Sr. Presidente, somente do dia 4 ao dia 11 de dezembro foram aprovados cinco projetos e enviados à sanção; oito foram aprovados e enviados à promulgação; dois foram aprovados e enviados à Câmara, num total de quinze matérias aprovadas em uma semana.  

Agora, Sr. Presidente, faço o paralelo com a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Nessa Comissão, Sr. Presidente, da qual tenho a honra de ser um dos integrantes, foram aprovados projetos de leis, dentre os quais o que dispõe sobre o contrato de trabalho por prazo determinado; proposta de emenda à Constituição que modifica o regime e dispõe sobre princípios e normas da administração pública, servidores e agentes políticos, controle de despesas, finanças públicas e custeio de atividades a cargo do Distrito Federal.  

A matéria que passa pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania é exaustivamente apreciada, analisada, discutida e votada por aqueles que lá se encontram. E tenho aqui os dados, Sr. Presidente: exatamente nesse período 53 matérias foram apreciadas.  

Ora, se fôssemos fazer a análise justa, criteriosa, correta, mostrando que o Parlamento, mercê desta ou daquela falha - que é inerente ao ser humano -, produz, teríamos um Parlamento devidamente acreditado. E, o que é mais grave - e faço questão de registrar isso -, é uma pena que a imprensa não esteja vivamente entrosada, mesclada com o Parlamento, porque, observem, uma das coisas que mais deleita um ditador é garrotear a imprensa, censurá-la e fechar o Legislativo.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Nobre Senador, não quero perturbar a brilhante e importante exposição de V. Exª. Eu só pediria que, quando V. Exª achasse oportuno, me permitisse um aparte. V. Exª está fazendo uma exposição que não quero atrapalhar. Mais adiante, quando V. Exª entender que é o momento, farei o aparte. V. Exª fala em uma linha perfeita e deve chegar ao final dela.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Terei muita honra em receber o aparte de V. Exª. Fique V. Exª certo de que a seguir eu o darei, até porque assim verei saneadas quaisquer falhas que porventura existam.  

Eu dizia, Sr. Presidente, que essa conjugação é que falta. Se a crítica fosse feita dizendo-se que Fulano e Beltrano são parlamentares que não cumprem o seu mandato, essa crítica seria perfeita, ainda que não se dissesse e não se registrasse quais são os que produzem. Mas quando se misturam todos, sem se fazer, até por delicadeza, a exceção à regra, você está misturado no mesmo cadinho, como se fosse possível não se extrair nada de bom ainda que a coisa tenha quase tudo de mal.  

O que quero dizer com isso, Sr. Presidente? Lembro que ainda agora falava que o que mais agrada à ditadura é ou ser elogiada por órgão de imprensa - como no DIP, de triste memória, na ditadura da Era Vargas -, ou, em não podendo ser elogiada, num elogio barato, comprado ou vendido, seja lá o que for, sendo esse ditador censurado, normalmente, a análise crítica ou construtiva passa a ser uma forma de censura cujo fio condutor filosófico, para o ditador, é amordaçar e, às vezes até, como se chamava na minha época, empastelar o órgão de imprensa. Ainda bem que isto não está ocorrendo, porque não estamos numa ditadura, a não ser que se possa falar em ditadura democrática.  

Mas se não houver, Sr. Presidente - e eu digo isso porque fiz o meu curso de Direito junto com Jornalismo; fui fundador do Sindicato dos Jornalistas Profissionais da minha terra; conheço muito bem a imprensa por dentro para me impressionar com ela por fora -, todas as vezes que se fizer uma análise global, a exceção aos que produzem, aos que comparecem, aos que estão aqui dizendo à Nação por que vieram para cá, nós vamos ter, todos os parlamentares, o mesmo nível de envolvimento dos que estão sofrendo a restrição.  

Observem V. Exªs, Sr. Presidente e eminentes Senadores, por que falei nas 400 matérias analisadas no plenário e na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Foi exatamente para demonstrar que se produz. Se se produz, que se registre a produção. Se essa produção é boa, que se incentive aqueles que estão querendo fazer parte do Poder Legislativo a que, amanhã, compareçam a ele. Eu duvido que, como se fazia na minha época, das lideranças universitárias, atualmente alguém ainda se sinta estimulado a vir para o Parlamento, porque há crítica aos bons, que começam a se omitir, e os maus tomam conta, preenchendo a lacuna. E o que é mais grave: transformaram, por meio do poder econômico, a conquista de um mandato em algo ao alcance apenas daqueles que são mais privilegiados.  

E o que se nota, Sr. Presidente, é isto: um Parlamento desmotivado. E aqueles que já começam a pensar - como me dizia ainda agora um amigo meu, Senador - no retorno ao seu escritório de advocacia, porque de pouco adiantou o trabalho aqui produzido.  

O Sr. Bello Parga (PFL-MA) - Permite-me V. EXª um aparte?  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Neste instante, ouço o aparte do Senador Bello Barga e, em seguida, o do Senador Pedro Simon.  

O Sr. Bello Parga (PFL-MA) - Ilustre Senador Bernardo Cabral, quero apenas trazer, como colaboração ao brilhante pronunciamento de V. EXª, o meu entendimento de que, na realidade, existe preconceito e má vontade da imprensa. Porque esses dados - e refiro-me apenas ao aspecto quantitativo - estão disponíveis para quem quer que freqüente o Parlamento, para quem quer que receba o Jornal do Senado , para quem quer que se dê ao trabalho, em seu ofício de jornalista, de procurar as salas das comissões, os avulsos do Senado e até mesmo da Câmara dos Deputados. Mas nada disso é anunciado. E como sempre ocorre a propósito de uma possível convocação do Congresso Nacional, começam a citar números fantásticos, de uma remuneração quatro ou cinco vezes maior do que seria normal, do que a que o Parlamentar faria jus em uma convocação extraordinária. Para encerrar, quero dizer que a única forma de cessarem essas críticas injustas, essas informações que não correspondem à realidade, seria se eles estivessem aqui ou estivessem na Câmara dos Srs. Deputados. Neste caso, então, notariam, diriam, achariam, proclamariam que a remuneração é justa, correta e adequada. Mas como não estão aqui, estão na bancada da imprensa, essa remuneração é exagerada para o nosso trabalho, para o trabalho, em geral, do Parlamento. Se tivessem assento nesta Casa ou na outra do Congresso Nacional, os subsídios seriam mais do que corretos.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Senador Bello Parga, creio que as coisas devem ser colocadas da seguinte forma: há de existir a crítica. Ela, muitas vezes, é oportuna, sobretudo quando fiscaliza, quando orienta, quando mostra onde estão os lados defeituosos. Mas volto ao que disse: se essa crítica é injusta, porque coloca todos no mesmo nível, no mesmo patamar de quem não produz, de quem não trabalha, ela passa a ser uma crítica que vai fazendo, aos poucos, como o sol faz com a pele, crestado, e o que recebe passa a não ligar.

 

Essa história das convocações extraordinárias já venho ouvindo há muito tempo. Nem por isso cessam as convocações, os seus equívocos não são corrigidos e - como diz V. Exª - o que é fácil da crítica seria muito mais fácil se quem a faz fosse em busca de um mandato, porque, no Império, havia o privilégio que o imperador criava quando escolhia os Senados.  

Hoje não é assim. Hoje, qualquer um pode ser candidato ao Senado Federal e à Câmara dos Deputados, basta que tenha desejo e que tenha fôlego suficiente para aturar e receber, às vezes, de uma certa camada de eleitores, pedidos que não tem condições - pelo menos eu não tenho - de atender.  

Então, acho, penso, assalta-me a idéia de que há de existir a crítica que excetue aqueles que produzem. Não posso concordar, Senador Bello Parga, que se generalize a restrição quando nem todos estamos sujeitos a ela.  

Posso dizer, de minha parte, Sr. Presidente, que freqüento o Senado. Se não for um dos mais assíduos, estou muito perto disso. Desempenho o meu mandato com absoluta seriedade e sinto-me profundamente desconfortável quando me vejo incluído, por causa da generalidade, numa crítica que não mereço e que, por sinal, a mim não atinge.  

Fica, neste instante, para reflexão, que está na hora de o Parlamento mostrar o que faz, para que não fique apenas no circuito interno. Ainda bem que, hoje, as imagens da TV Senado são mostradas e o Jornal do Senado é distribuído País afora, a mostrar que esta Casa, queiram ou não, é onde ecoam todos os clamores populares. É aqui que o povo ouve de volta a sua voz, pela palavra daquele que ele escolheu para ser seu representante.  

Por isso mesmo ouço o Senador Pedro Simon, em aparte anteriormente solicitado.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - É da maior importância o seu pronunciamento. V. Exª fala com autoridade não só pelo seu passado, pela sua história, mas, basicamente, pelo assunto que é tratado por V. Exª. É difícil que exista algum Senador que tenha mais constância nos trabalhos desta Casa do que V. Exª. A partir do próximo ano, serei seu colega, porque, cansado de lutar para que, nesta Casa, haja, conforme proposta minha, um período determinado em que trabalhamos de segunda a domingo e um período em que ficamos em casa, virei morar em Brasília. A partir de fevereiro do próximo ano, serei um daqueles que estarão no Congresso de segunda a sexta-feira, e, uma vez por mês, quando houver um feriadão, irei para Porto Alegre. Mas, na verdade, V. Exª aborda uma questão muito importante. Deve ficar claro que eu, V. Exª e todos os demais Srs. Senadores ganhamos R$4,4 mil líquidos por mês. Se se comparar o nosso salário com o salário mínimo, essa quantia é uma enormidade. Há um projeto de lei que determina que o maior salário não pode ser 20 vezes maior que o menor salário. Mas não ganhamos nem a metade do que ganham alguns jornalistas e apresentadores de televisão, que são os que mais nos criticam. Qualquer pessoa importante, qualquer executivo de segunda classe ganha muito mais do que nós. Os Deputados Federais do Rio Grande do Sul, com certa malícia - não o fazem de má-fé, mas sim por brincadeira -, ao lhe perguntarem quanto ganha um Deputado e um Senador, respondem: "Um Deputado ganha tanto, mas não sei quanto ganha um Senador". Já que um Senador ganha voto majoritário, é candidato por maioria e tem um mandato de oito anos, permanece aquela pergunta: quanto ganha um Senador? Ganhamos o mesmo salário dos Deputados Federais, que, como nós, levam para casa R$4,6 mil líquidos; esse é o salário que V. Exª e eu recebemos. Há uma outra grande questão. V. Exª, por sua liderança, por sua competência e capacidade - V. Exª já esteve na Presidência da OAB, na Relatoria da Assembléia Nacional Constituinte, na Presidência da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e no Ministério da Justiça -, poderia iniciar um movimento nesse sentido. Não se pode resumir essa questão dessa forma. No ano passado, ficávamos aqui nas sextas-feiras e debatíamos essas matérias longamente, mas elas não tinham conseqüência. Justiça seja feita ao Presidente Antonio Carlos Magalhães, de quem alguns podem gostar e outros podem não gostar - S. Exª tem qualidades e defeitos -, pois S. Exª está levando adiante as medidas que vem tomando. Existem algumas coisas que deveríamos fazer. Por exemplo, seria muito bom se escolhêssemos três Senadores, se a imprensa escolhesse três Parlamentares e se, num sábado ou num domingo à tarde, debatêssemos à vontade na TV Senado , pois, assim, eles diriam o que pensam de nós e nós diríamos o que achamos deles. Essa proposta seria altamente produtiva para a sociedade brasileira, porque, na verdade, hoje, há um fato novo: a TV Senado . A implantação do Jornal do Senado e da TV Senado foi a razão básica de eu ter sido reeleito, porque, até então, noventa e nove por cento da imprensa local não sabia sequer de 1% dos projetos e discursos que eu havia feito. Por mais de um ano, fiquei sem falar na rádio mais importante do Rio Grande do Sul. Embora a TV Senado ainda não esteja em UHF - a Mesa do Senado está tomando uma providência muito importante nesse sentido -, mesmo assim, essa emissora é assistida pela elite dirigente. Em qualquer cidade do interior do Rio Grande do Sul, vereadores, presidentes de partido, padres, líderes sindicais, pequenos empresários e lideranças - não estou falando de lideranças intelectuais nem de pessoas ricas: falo de pessoas simples e humildes, mas que têm interesse nesses programas - estão assistindo à TV Senado , e o seu conceito está mudando. Primeiramente, Senador Bernardo Cabral, quero dizer que há um desafio. A imprensa brasileira quer competir com o Senado para ver quem toma o comando. A imprensa brasileira quer decidir o que se vota e o que não se vota, o que se faz e o que não se faz, o que existe e o que não existe. V. Exª, com seu brilho aqui em Brasília, e eu, lá na Assembléia Legislativa, estávamos acostumados a ver a tribuna da imprensa lotada. Na Câmara e no Senado, a tribuna da imprensa ficava lotada de jornalistas, que tomavam conhecimento dos pronunciamentos, que, no dia seguinte, eram publicados no jornal e divulgados pela rádio e pela televisão. Hoje, não há ninguém naquela tribuna. Nunca há ninguém ali, porque hoje ocorre o contrário: os jornalistas dos grandes jornais, das grandes rádios e das grandes televisões saem de lá com a pauta pronta. Eles vêm aqui para discutir a pauta determinada pelo editor. V. Exª pode fazer esse discurso brilhante, podemos falar aqui o que quisermos, mas, amanhã ou hoje à noite, será divulgado pelo jornal, pela rádio ou pela televisão aquilo que o editor determinar. Vão até o gabinete de V. Exª, do Senador Ramez Tebet ou do Líder do Governo, nosso querido Elcio Alvares, e perguntam o que querem. Quem faz a pauta, quem diz o que vai acontecer, quem determina o que o Brasil vai conhecer é a imprensa, que passa a competir conosco. Infelizmente, diga-se de passagem, no mundo inteiro, mas principalmente no Brasil, a manchete sensacionalista é a que importa, é a que chama atenção e a que todos lêem. Como a notícia de um acidente ou de uma briga em que morreram várias pessoas, a desgraça, chama mais a atenção do que uma notícia boa e feliz, a imprensa leva para as grandes manchetes as notícias negativas. Lamentavelmente, um discurso como o de V. Exª não chama a atenção, a não ser que seja excepcional. Vou repetir um caso que já contei na tribuna do Senado. Em Porto Alegre, um grande amigo meu trabalhava na direção do então Última Hora , que, depois da revolução, transformou-se no jornal Zero Hora . Um amigo meu assumiu o cargo de Deputado, devido às cassações que ocorreram; V. Exª deve lembrar-se de que, quando das primeiras cassações de 1964, o suplente podia assumir. Cassaram João Caruso, e, em seu lugar, ficou um suplente do interior, gente simples, humilde, que não estava acostumado com a vida da capital. Ele saiu à noite para conhecer a cidade de Porto Alegre e entrou em um barzinho, quando, de repente, por volta das 18h, deu-se um tiroteio. Ele não sabia que aquele barzinho era freqüentado pela garotada; ele viu o barzinho e nele entrou. Esse fato foi capa de jornal; praticamente desmontaram a vida dele. Conversei com meu amigo, então Diretor Nestor Felício Fedrizzi, que é uma das pessoas mais dignas, mais sérias, mais corretas e mais honestas que já conheci em minha vida. Eu lhe perguntei: "Para que uma coisa dessas? Para que isso?" Ele me disse: "Tu achas que isso não é importante? Um deputado chega aqui e, no dia seguinte, está envolvido num negócio desse tipo? Isso é importante". Eu lhe disse: "Mas por que vocês não publicam as coisas boas que acontecem?" Ele me disse: "Não. Nós publicamos as coisas boas. Apresente um projeto excepcional, algo realmente positivo, que isso será manchete de jornal. Agora, votar é obrigação de vocês; vocês são pagos para isso. Não temos obrigação de publicar o dia-a-dia. Publicamos o que é excepcionalmente bom e o que é excepcionalmente ruim". Nesse ponto, ele me deu um exemplo: "Se você sair daqui agora, for até a rua e um cachorro o morder, isso não será publicado no jornal. Como vou publicar no jornal que um cachorro mordeu o Pedro Simon? Isso não é notícia. Se você quiser ser capa de jornal amanhã, você tem que morder o cachorro! Assim, você será capa e manchete de jornal". Lamentavelmente, essa é a realidade. Desculpe-me por estar me alongando. Só gostaria de acrescentar mais um item: somado a isso, meu querido Senador, há a impunidade. Fala-se que Pedro Simon roubou, que fulano fez isso e aquilo; falam mal de todo o mundo. Algumas vezes, isso é verdade. Na imensa maioria das vezes, isso não é verdade, mas, como nada acontece, ninguém é preso, condenado ou absolvido. Nós, V. Exª, eu, o Congresso e o Senado somos julgados por baixo. Isso não acontece com o jogador de futebol, com o médico, com o advogado. Com exceção de um Josaphat Marinho da vida, que é um homem que está acima do bem e do mal, em geral o homem público é julgado por baixo. Por quê? Porque o que a imprensa publica, normalmente brincando com a honra das pessoas, muitas vezes é verdade, mas na maioria das vezes não é. Como não se fazem retificações, como não tem conseqüência esse comportamento, nós somos julgados por baixo. Meus cumprimentos pelo excepcional pronunciamento de V. Exª.

 

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Senador Bernardo Cabral, permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Sr. Presidente ainda disponho de algum tempo para poder concluir o meu pronunciamento?  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Pela natureza da sessão de hoje, sim, embora o tempo de V. Exª já esteja ultrapassado em 7 minutos.  

O Sr Pedro Simon (PMDB-RS) - Eu usei 10 minutos desse tempo e, como estou inscrito, se for possível, gostaria de ceder o meu tempo para o Senador Bernardo Cabral e não falar mais.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Como de costume, como sabe V. Exª, Senador Pedro Simon, o seu aparte faz parte do discurso do Senador Bernardo Cabral, mas é claro que a Casa deseja continuar ouvindo a palavra de S. Exª.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Sr. Presidente, fiz essa pergunta pelo seguinte. O nosso velho Rui Barbosa dizia que o aparte é uma concessão que se faz. Às vezes o aparte pode se intrometer no discurso e não construir nada, mas há apartes que engrandecem os discursos; há apartes que tornam o discurso, do ponto de vista do orador, melhor para que ele possa ser cotejado amanhã.  

É o caso do Senador Pedro Simon. O seu aparte não me tomou tempo do discurso. Quando lhe perguntei, Sr. Presidente, se ainda sobrava algum tempo é porque quero ter a alegria de ouvir o Senador Ramez Tebet, que já me havia pedido um aparte. Eu sairia frustrado se, depois de ter ouvido o Senador Pedro Simon, não tivesse a alegria de ouvir o Senador Ramez Tebet, meu velho companheiro da Ordem dos Advogados do Brasil.  

Ouço, portanto, V. Exª, Senador Ramez Tebet.  

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Senador Bernardo Cabral, é um pecado apartear um homem do talento de V. Exª, especialmente depois de ter recebido um aparte tão profundo quanto o do Senador Pedro Simon. Esse é que é o pecado! Quero colocar a minha cunha no seu pronunciamento por uma razão muito simples. Fui fazer uma palestra sobre política para estudantes de uma cidade do interior do meu Estado. Após a palestra, houve um debate, em que tive a oportunidade de explicar por que a vida do político é muito mais vasculhada do que a vida de quem exerce qualquer outra atividade, como o médico, o dentista, o advogado, o comerciante ou o trabalhador. Isso ocorre porque o político é que tem a responsabilidade de decidir a vida de uma sociedade. Nessa época, debatíamos aqui o problema das reformas, e perguntei àqueles jovens: "Vocês sabem que, nesta hora, senadores e deputados estão decidindo a vida de alguém da família de vocês? Vocês sabem tudo o que se passa por lá?" Pude sentir, Senador Bernardo Cabral, a importância do programa do Senado Fala Cidadão , que está prestando um relevante serviço à sociedade, um serviço de cidadania, de civismo à sociedade brasileira. Quero cumprimentá-lo por suas palavras e concordar com elas: não há jeito, jamais vamos deixar de ser vidraça. Como está em nossas mãos a responsabilidade do destino deste País, os fracassos serão sempre debitados a nós, políticos. Infelizmente, quando se vence, o crédito não é dado à classe política. Mas isso não tem importância, pois políticos como V. Exª e outros desta Casa têm um consolo, um conforto: a consciência do dever cumprido altaneiramente. Não há lei de imprensa capaz de fazer com que haja equilíbrio e fidelidade quando se retrata o trabalho dos parlamentares desta Casa. O Senador Pedro Simon disse muito bem: a manchete vale mais do que o conteúdo da notícia e, às vezes, ela não corresponde ao conteúdo da notícia ou à realidade dos fatos. Senador Bernardo Cabral, V. Exª fala em defesa de nossa classe, em defesa do Brasil, porque é preciso que se exerça e se estimule a atividade política no País. Receio que haja um desestímulo à atividade política exatamente quando nós, a imprensa, todos juntos, deveríamos estimular a juventude a participar da vida pública. Cumprimento V. Exª pela defesa que faz do Congresso Nacional e da atividade política.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Agradeço a V. Exª, Senador Ramez Tebet.  

Entendo que o bom político é aquele que não confunde a verdade nem tropeça na razão. No exercício do seu mandato, sendo homem que apóia o governo ou sendo de oposição ao governo, se o político consegue trazer a sua contribuição, para que não fique apenas no diagnóstico sem apresentar terapêutica, ele está exercendo bem o seu mandato. Ele pode não receber uma manchete, mas o conteúdo da sua atuação, ainda que não seja reconhecido pelos seus contemporâneos, será proclamado pelos seus pósteros.  

Há sempre quem faça história; há sempre quem pesquise em biblioteca; há sempre quem tenha o cuidado de repor a verdade histórica dos fatos. Vejam V. Exªs que a retomada da discussão sobre o Ato Institucional nº 5 é uma reposição da história: trinta anos depois, aqueles que não tropeçaram na razão, que não confundiram a verdade estão sendo vistos com justiça. Refiro-me a Pedro Aleixo, um homem que soube conduzir bem o seu mandato. Ele não recebeu a manchete na hora, foi impedido de assumir a Presidência da República, mas os seus pósteros estão reconhecendo que ele exerceu seu mandato com autoridade.  

Sr. Presidente, quero agradecer a V. Exª a tolerância com que me ouviu, a delicadeza com que permitiu que eu ultrapassasse o tempo que me é destinado. Estou certo de que hoje estamos contrariando o velho aforismo, que já vem de milênios, segundo o qual uma grande marcha começa com o primeiro passo. Estamos corrigindo-o: uma grande marcha começa com a decisão que antecede o primeiro passo. E essa decisão está sendo posta hoje, inclusive por sugestão do Senador Pedro Simon. Uma vez que o nosso Presidente, Senador Antonio Carlos Magalhães, conseguiu deslocar pela primeira vez o eixo político da Câmara para o Senado, transformando o Senado na vitrine do Congresso - inclusive decidindo o dia da convocação extraordinária - que o Senado aproveite e tome esta decisão de antecipar o primeiro passo hoje e mostre à Nação quais são os que trabalham, os que produzem e os que exercem seu mandato com dignidade.  

 

Ð Í 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/1998 - Página 18596