Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM AOS CINQUENTA ANOS DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA INTERNACIONAL.:
  • HOMENAGEM AOS CINQUENTA ANOS DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS.
Publicação
Publicação no DSF de 11/12/1998 - Página 18306
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, DECLARAÇÃO, DIREITOS HUMANOS.
  • COMENTARIO, ANIVERSARIO, IMPLANTAÇÃO, ATO INSTITUCIONAL, EPOCA, DITADURA, REGIME MILITAR.
  • SAUDAÇÃO, DECISÃO, MINISTRO, INTERIOR, PAIS ESTRANGEIRO, INGLATERRA, AUTORIZAÇÃO, PROCESSO, EXTRADIÇÃO, AUGUSTO PINOCHET, EX PRESIDENTE, CHILE.
  • COMENTARIO, ANIVERSARIO DE MORTE, CHICO MENDES, SERINGUEIRO, ESTADO DO ACRE (AC).
  • HOMENAGEM, ATUAÇÃO, HERBERT DE SOUZA, SOCIOLOGO, PAULO EVARISTO ARNS, CARDEAL, IGREJA CATOLICA, LUTA, FAVORECIMENTO, RESPEITO, DIREITOS HUMANOS, BRASIL.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, prezado Senador Geraldo Melo, gostaria, antes de iniciar o meu pronunciamento, de perguntar a respeito da ocupação das galerias. O Presidente Antonio Carlos Magalhães, há cerca de 20 minutos, autorizou a entrada de inúmeras pessoas que desejam assistir a esta sessão - em número de aproximadamente cinqüenta. No entanto, essas pessoas continuam à porta, lá embaixo, há quinze ou vinte minutos, e não sei por que razão não conseguem chegar às galerias.  

Pediria a V. Exª que verificasse o que está ocorrendo, o que está impedindo a entrada dessas pessoas, já que a Segurança foi informada de que eles poderiam ter acesso às galerias.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Senador Suplicy, se há uma decisão da Presidência autorizando a abertura das portas das galerias, certamente os órgãos próprios da administração da Casa cumprirão essa determinação.  

Recomendo, entretanto, à Secretaria-Geral da Mesa que entre em contato com a Segurança do Senado Federal, para verificar se há alguma razão especial que justifique o fato de não se ter atendido à determinação da Presidência até agora.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Obrigado.  

Sr. Presidente, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, ao completar, nesta data, meio século de existência, afirma-se como um dos mais importantes documentos já produzidos pela humanidade em toda a sua história.  

Juntamente com o Pacto sobre Direitos Civis e Políticos e o Pacto sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que lhe sobrevieram e lhe deram força jurídica, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é a pedra fundamental na qual se assentam as novas conquistas deste final de século.  

Entre os instrumentos que antecederam a doutrina dos Direitos Humanos, podemos citar a Magna Charta Libertarum , de 1215; a Petition of Rights , de 1628; e o Habeas Corpus Act , de 1679. Mas é com a promulgação, em 1689, do Bill of Rights , declaração que reconhecia os direitos naturais do cidadão inglês, anteriores a qualquer imposição da sociedade organizada, que se pavimenta o reconhecimento dos direitos humanos tais como concebidos hodiernamente.  

Conquanto preconizasse os direitos inerentes ao homem e limitasse o poder do Estado, o Bill of Rights referia-se apenas à condição dos cidadãos ingleses. A humanidade teria novo e substancial documento, reconhecendo idênticos direitos, em 1776, com a Declaração de Virgínia; mas esperaria até 1789 para que aqueles direitos fossem reconhecidos universalmente, na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, votada pela Assembléia em plena Revolução Francesa.  

Lembro aqui o papel fundamental exercido por Thomas Paine nesse processo. Paine nasceu na Inglaterra e emigrou para a América do Norte em 1774, onde se transformou num dos principais ideólogos das Revoluções Americana e Francesa, e grande divulgador dos direitos do homem. Assim fez por meio de uma série de panfletos intitulada American Crisis e da obra Common Sense, que foi incalculavelmente influente na época.  

Em 1791 publicou The Rights of Man (Os Direitos do Homem), que teve enorme sucesso popular. Seu livro é uma rigorosa defesa dos ideais da Revolução Francesa e uma chamada aos ingleses para que substituíssem as instituições aristocráticas, baseadas em princípios de privilégio e hereditariedade, por instituições liberais, nas quais se valorizassem o talento e o mérito.  

Paine considerava que cada época e cada geração deveria agir por si mesma e construir sua própria ordem política e social. Nesse sentido, defendeu ardorosamente, há mais de 200 anos, programas que garantissem a todos o direito de usufruir da riqueza da nação, o direito à educação e à vida.  

Faz-se necessário, então, que toda sociedade tome consciência de que um país não pode progredir se grande parte de sua população vive em situação de miséria, sem o mínimo de dignidade. A exemplo disso, venho defendendo há tantos anos, nesta Casa, a aprovação do Projeto de Garantia de Renda Mínima, como um mecanismo que dignifique o cidadão e remova a pobreza no Brasil.  

Se é verdade que a humanidade caminha aos saltos, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em 10 de dezembro de 1948, representa uma dessas grandes investidas. O mundo, em escombros, sobressaltado, vivia ainda os traumas de uma carnificina, de atrocidades inimagináveis ocorridas durante a Segunda Guerra Mundial.  

Os governos de todas as partes do mundo, ainda aturdidos, conscientizaram-se da necessidade de se estabelecer um pacto que viesse preservar a vida e a dignidade das pessoas. A guerra deixara marcas indeléveis, elevando a barbárie humana ao seu paroxismo. Nesse contexto de inseguranças e de incertezas, produziu-se, sob os auspícios da recém-criada ONU, um documento básico, sobre o qual se erigiu um novo ramo do Direito Internacional: a Declaração Universal dos Direitos Humanos.  

Desde então, tem sido essa Carta o documento mais importante no que respeita aos direitos das pessoas, servindo como referencial ao sistema jurídico dos países signatários e inaugurando, dado o seu conteúdo universal, uma nova etapa nas relações internacionais. Além disso, foi a raiz de numerosos pactos, protocolos, tratados e convenções que ampliaram significativamente o alcance dos direitos humanos em todo o mundo.  

A expansão desse novo ramo do Direito Internacional se pode comprovar pela cronologia dos fatos. À Declaração de 1948 seguiram, entre outros instrumentos normativos: Convenção sobre Genocídio, no mesmo ano; Convenção para a Supressão do Tráfico de Mulheres, em 1950; Convenção de Genebra sobre o Tratamento de Prisioneiros de Guerra, no mesmo ano; Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados, em 1951; Convenção sobre os Direitos da Mulher, em 1953; Convenção relativa à Escravatura, no mesmo ano; Declaração dos Direitos da Criança, em 1959; Declaração de Concessão de Independência para Países e Povos Coloniais, em 1961; Pacto dos Direitos Civis e Políticos e dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 1966; 1ª Conferência dos Direitos Humanos, em Teerã, em 1968; Convenção sobre a Imprescritibilidade dos crimes contra a Humanidade, no mesmo ano.  

A década de 70 reiniciaria a normatização dos direitos humanos com a Declaração dos Direitos do Deficiente Mental, em 1971, seguindo-se a Declaração sobre a Erradicação da Fome e da Desnutrição, em 1974; Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, no ano seguinte; e Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, em 1979.  

Na década seguinte, seriam estes os principais instrumentos: Declaração sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e Discriminação fundadas nas Religiões ou nas Convicções, em 1981; Convenção sobre a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, em 1984; Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, em 1986; Conjunto de Princípios para Proteção de Todas as Pessoas Detidas, em 1988; e Convenção sobre os Direitos da Criança, em 1989.  

Na presente década, além da 2ª Conferência sobre Direitos Humanos, realizada em Viena, em 1993, foram produzidos os seguintes instrumentos: Convenção de Proteção de todos os Direitos dos Trabalhadores Migrantes, em 1990; Convenção sobre Povos Indígenas, no ano seguinte; e Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, em 1994.  

A data que hoje comemoramos representa uma boa oportunidade para reafirmarmos nosso compromisso com a defesa das liberdades e garantias essenciais dos nossos cidadãos. Apesar do compromisso do Estado brasileiro de construir um país mais justo, e apesar da dignidade da pessoa humana ser reconhecida constitucionalmente, é preciso registrar que temos uma longa história de desrespeito ou omissão no que tange aos direitos humanos e que, infelizmente, continua a ocorrer.  

É importante, Sr. Presidente, neste momento, registrar a presença, nas galerias do Senado Federal, de dezenas de representantes do Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo, que é composto pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Associação Brasileira de Reforma Agrária, Cáritas, o Conselho Indigenista Missionário, a Confederação Nacional dos Servidores do INCRA, o Conselho Nacional das Igrejas Cristãs, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, a Comissão Pastoral da Terra, o Instituto Nacional dos Estudos Sócio-Econômicos, o Movimento Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a Articulação Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais.  

Dom Tomás Balduíno está, inclusive, acompanhando o coordenador nacional do Movimento Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, João Pedro Stédile, e o representante do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs, que estiveram, há poucos instantes, em audiência com o Presidente Antonio Carlos Magalhães e, neste momento, estão em audiência com o Presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer, entregando um documento e expondo aos Presidentes de ambas as Casas do Congresso Nacional a importância de se dar muito maior celeridade à realização da reforma agrária.  

Num documento que irei ler em seguida, mostram a sua preocupação com os cortes no Orçamento da União e a sua avaliação crítica no procedimento do Governo brasileiro no que diz respeito à questão da terra.  

A realidade nos mostra, diariamente, bandos de meninos e meninas de rua perambulando pelas metrópoles, sem qualquer assistência; legiões de desempregados que não têm como prover o sustento de suas famílias; trabalhadores sem terra que, no limite do desespero, aguardam pela reforma agrária; grandes contingentes de idosos que morrem aos poucos, à míngua de assistência médica; meninas violentadas ou prostituídas em tenra idade; crianças em idade escolar alijadas do sistema nacional de ensino.  

A essa realidade somam-se os episódios degradantes, aos poucos esquecidos por força da sucessão de tragédias nacionais: a morte de 111 presos numa rebelião no presídio de Carandiru, em São Paulo; a Chacina da Candelária, que resultou na morte de 8 meninos, no Rio; a Chacina de Vigário Geral, com a morte de 21 moradores dessa localidade, no Rio de Janeiro; a chacina, pela Polícia Militar, de 19 trabalhadores sem terra em Eldorado dos Carajás, no Pará; e de 11 trabalhadores em Corumbiara, Rondônia, entre tantos outros crimes que envergonham e deprimem a sociedade brasileira e que até agora não tiveram, ainda, a responsabilização daqueles que cometeram tais atos.

 

Congratulo-me, neste momento, com Luiza Canuto, que está recebendo hoje, em Paris, berço da luta pelos direitos do homem, o Prêmio Internacional de Direitos Humanos. Luiza Canuto é professora de primeiro grau em Rio Maria, no Estado do Pará, e há 13 anos luta para que sejam punidos os pistoleiros que assassinaram seu pai, o líder camponês João Canuto.  

Registramos, também, o Prêmio conferido pela ONU ao Secretário de Direitos Humanos, José Gregori, mas avaliamos que ele pode desempenhar um papel muito mais ativo no sentido de chamar diariamente a atenção do Governo FHC de que este ainda está muito distante de se aproximar com a velocidade que seria necessária do objetivo de construirmos uma nação justa, onde os direitos humanos sejam de fato respeitados.  

Sr. Presidente, o IBGE divulgou, ontem, os dados relativos à distribuição da renda no Brasil para 1996, revelando uma situação extremamente grave: os 10% mais ricos continuam tendo algo como 46% ou 47% da renda nacional, cabendo aos 40% mais pobres algo em torno de 8% da renda nacional, o que faz com que o Brasil continue sendo um dos líderes: somos campeões ou vice-campeões mundiais da desigualdade sócio-econômica. E a presente política econômica tem sido muito lenta em reverter esse dramático quadro.  

O reconhecimento jurídico dos direitos humanos ampliou-se de forma extraordinária, desde a promulgação da Declaração de 1948. Os direitos essenciais e inerentes ao homem foram não apenas entendidos como tal, mas especificados e esmiuçados de tal forma que Norberto Bobbio não hesitou em classificar o período que vivemos como "A Era dos Direitos".  

No entanto, recente levantamento da Anistia Internacional, divulgado pela Folha de S.Paulo , revelou que, em 141 dos 185 países que fazem parte das Nações Unidas, "foram constatadas violações dos direitos humanos cometidas por governos e grupos armados de oposição". Essas violações incluem crimes bárbaros, como torturas, homicídios, encarceramento de presos de consciência e "desaparecimentos".  

No que tange aos direitos econômicos, sociais e culturais, a globalização econômica nos deixa apreensivos. O novo paradigma econômico tem violentado os direitos humanos em numerosas partes do planeta. Dos três bilhões de trabalhadores de todo o mundo, de acordo com recente relatório da Organização Internacional do Trabalho, nada menos que 1 bilhão estará desempregado ou subempregado, em 1999. Em busca de emprego, estima-se que mais de 6 milhões de pessoas procurarão emigrar ilegalmente.  

Os fluxos migratórios são apenas uma das conseqüências perversas da globalização, que tem um potencial altamente desorganizador e conflitivo no âmbito social. Quanto maior é a interdependência econômica e financeira, maiores parecem ser a desigualdade e a exclusão por ela provocadas, sob a forma de desemprego estrutural, degradação dos salários diretos, desmantelamento dos sistemas de seguridade, precarização das condições de trabalho, feminização e infantilização da mão-de-obra, desconstitucionalização dos direitos sociais, desmanche dos direitos laborais e multiplicação dos bolsões de miséria.  

Apesar de tudo, não há como negar os imensos benefícios do reconhecimento jurídico dos direitos humanos, especialmente quando se tratam de indivíduos ou grupos postos em condições desvantajosas. Por isso, é preciso celebrar, festivamente, o Cinqüentenário da Declaração de 1948, não esmorecendo nunca na luta pela proteção dos mais elementares direitos do ser humano.  

No próximo dia 13, se completarão 30 anos de uma das datas mais tristes de nosso País: a promulgação do Ato Institucional nº 5. A revista Veja, desta semana, traz um depoimento chocante de um ex-torturador e de pessoas que foram torturadas nos porões da ditadura militar. São fatos de enorme gravidade, que não podem jamais ser esquecidos, para que o povo brasileiro não perca de vista sua história recente.  

Aproveito para celebrar a decisão do Ministro do Interior da Inglaterra, que autorizou a extradição de Augusto Pinochet, ditador que tanto mal causou ao Chile e às democracias latino-americanas como um todo. Sua condenação, neste final de milênio, será extremamente importante para a humanidade, pois significará que os crimes perpetrados contra os direitos humanos não ficarão impunes.  

Não poderia também deixar, neste pronunciamento, de mencionar que hoje relembramos 10 anos da morte de Chico Mendes. A Senadora Marina Silva, no habitual café dos Senadores, ofereceu um café aos membros representantes do Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo, inclusive Dom Tomás Balduíno, numa demonstração desse sentimento de comunhão de todos aos ideais de Chico Mendes, de justiça no campo, bem como o reconhecimento do seu empenho ao longo de vida para que houvesse um desenvolvimento econômico, sobretudo para os povos da Amazônia e a preservação da Região.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não poderia encerrar esse pronunciamento sem homenagear dois brasileiros ilustres pelo heróico esforço desenvolvido em favor da dignidade e dos direitos humanos. Um deles não mais se encontra entre nós: trata-se do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, que, mesmo debilitado, superou suas próprias forças para lançar, com determinação, a Campanha da Cidadania Contra a Fome e a Miséria.  

É importante relembrar que, no seu discurso de posse, em 1º de janeiro de 1995, o Presidente Fernando Henrique Cardoso disse que iria varrer a miséria deste País. Entretanto, estamos ainda extremamente distantes da realização desse objetivo.  

Gostaria de referir-me também ao Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns - que ao meio-dia celebrará missa no Senado Federal -, porque o considero um dos pastores mais importantes da Igreja Católica, que lutou em favor das liberdades políticas e em defesa dos povos oprimidos. Quando pessoas foram torturadas neste País, Sua Eminência procurou resguardar os seus direitos e, com coragem e tenacidade, trabalhou junto aos oprimidos para superar episódios de mesquinhez, egoísmo e de miséria em nosso País.  

Registro ainda o teor do documento entregue ao Presidente do Senado Federal Antonio Carlos Magalhães, nesta manhã, pelo Fórum Nacional pela Reforma Agrária, em que as entidades integrantes vêm no dia em que a Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 50 anos para tratar de questões relativas à política fundiária. O Brasil possui uma área territorial de 850 milhões de hectares, dos quais, 390 milhões são considerados áreas próprias para a atividade agropecuária, sendo que 31% dessa área (120 milhões de hectares) permanecem ociosos. Esse grau de ociosidade constitui mais uma seqüela do elevado grau de concentração de posse e do uso da terra no País que joga na exclusão social milhões de trabalhadores brasileiros. Os dados do recadastramento realizado pelo INCRA, em 1992, mostram que, dos cerca de 3 milhões de imóveis rurais no Brasil, 62% ocupavam 8% da área total recadastrada de 331 milhões de hectares. No outro extremo, verifica-se que 3% dos imóveis constituem grandes propriedades ocupando 57% da área total.  

O resultado dessa realidade implica profundas violações dos direitos humanos, sociais e econômicos, no aumento da miséria, na crescente deterioração do grau de desenvolvimento humano do nosso povo, que passa fome, quer terra para produzir, escola, moradia, saúde, emprego, para viver com dignidade.  

Nesse documento, o Fórum Nacional pela Reforma Agrária faz as suas críticas ao Banco da Terra, explicitando que para implementar o seu principal instrumento para a condução da política agrária de mercado, o Banco da Terra, o Governo, com apoio do Banco Mundial, iniciou a implantação, em 1997, em quatro Estados, do projeto piloto Cédula da Terra, que, na avaliação do Fórum, tem causado problemas em relação ao alto custo dos financiamentos, especialmente se comparados aos rendimentos obtidos na produção agropecuária, ao fato de que as terras até agora negociadas se concentrarem em imóveis de tamanho médio e pequeno, a constituição de associações fantasmas para acessar os recursos do Programa, a baixa qualidade das terras compradas e ao aumento do preço da terra.  

Dessa maneira, eles têm se posicionado contrários à continuidade do Programa Cédula da Terra, na forma do Banco da Terra, e especificam as razões.  

Também protestam contra os cortes orçamentários do INCRA, pois a Proposta orçamentária para 1999 revela a absoluta indiferença do Governo em relação a uma das principais demandas sociais e econômicas do País, a reforma agrária. A proposta orçamentária final do INCRA para 1999 apresenta um corte, nas dotações do órgão, comparativamente ao total autorizado para 1998, equivalente a 38%, o que representa a inviabilização, de vez, da reforma agrária no Brasil e na redução da meta de assentamento de 111 mil, previstas para 1998, para 53 mil famílias em 1999.  

Sr. Presidente, como V.Exª atendeu à solicitação do Coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, João Pedro Stédile, D. Tomás Balduíno e outros do Fórum Nacional pela Reforma Agrária de que seja realizada uma audiência pública, aqui no Congresso Nacional, envolvendo as duas Casas; esperamos que, em breve, possa ser realizado, no âmbito da Comissão de Assuntos Sociais - cujo Presidente, o Senador Ademir Andrade, está presente - um fórum nacional ou uma audiência pública com todos os interessados na questão, para avaliarmos como está sendo realizada, ou não, a reforma agrária no País.  

Gostaria de assinalar o compromisso firmado, para que isso seja feito, em breve, no Congresso Nacional.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/12/1998 - Página 18306