Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM AOS CINQUENTA ANOS DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM AOS CINQUENTA ANOS DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS.
Publicação
Publicação no DSF de 11/12/1998 - Página 18319
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, DECLARAÇÃO, DIREITOS HUMANOS.

O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos reunidos para comemorar o cinqüentenário de um dos mais importantes marcos da evolução intelectual da humanidade: a Declaração Universal dos Direitos Humanos.  

Reunimo-nos para comemorar o dia em que direitos comuns a todos os nossos semelhantes e a nós mesmos foram reconhecidos como ideais intrínsecos à natureza humana, deixando de ocultar-se no subconsciente coletivo para aflorar com a objetividade de regras supranacionais destinadas a gerar leis internacionais aprovadas por todos os que se crêem dignos da condição de humanos. Comemoramos o dia em que direitos amoldados a características psicológicas que diferenciam pessoas de bichos fundiram-se ao calor gerado pelas chamas da vida, do amor e da liberdade, produzindo uma das mais belas páginas da História. O dia em que direitos universais escaparam do subjetivo para, com limpidez e força de axioma, passarem a ser automaticamente reconhecidos a cada nascimento de um ser humano. O dia em que os direitos fundamentais da espécie transformaram-se em verdades acima das interpretações políticas, econômicas ou sociais. O dia em que a Organização das Nações Unidas proclamou o primeiro capítulo daquilo que poderá vir a ser a Constituição Cidadã da Terra.  

A rigor, Srªs e Srs. Senadores, caso os homens se houvessem dado as mãos há muito mais tempo, ter-se-iam orientado melhor pelo cântico à convivência harmônica, que está na essência de todas as religiões monoteístas. Teriam acelerado a própria caminhada em direção ao estágio supremo da evolução humana, antevista, por exemplo, na conclamação de Nosso Senhor Jesus Cristo a todos os homens para só fazerem ao próximo aquilo que desejem a si mesmos.  

Creio que, em sã consciência, ninguém deseje para si a injustiça, a opressão, o sofrimento, o desespero. Entretanto, milhões de seres humanos precisaram sofrer o opróbrio e a violência por longo tempo, como ainda sofrem em várias partes do mundo, para aceitarem um consenso laico sobre o significado da caridade exaltada no monoteísmo. Só depois de tanto sofrimento irracional, levado ao ápice nas duas guerras mundiais, os povos admitiram regras claras com valor de leis universais para definir direitos que nascem e permanecem com as pessoas. Direitos infelizmente ainda espezinhados em alguns baluartes da brutalidade e da ignorância. Mas, de qualquer forma, embora continue a existir quem os desrespeite, os Direitos Humanos estão aqui, consolidados numa resolução da ONU, subscrita por mais de 170 países, entre os quais o Brasil, de forma a assinalar permanentemente uma certeza: quem os viola comete crime contra a humanidade. Constituem o mais retumbante brado de que os fins não justificam os meios. Evidenciam que, tão importante quanto os objetivos almejados, é a natureza dos meios utilizados para alcançá-los.  

Apesar dos percalços, afigura-se inegável o avanço na busca dos ideais que ditaram a Resolução 217 A (111), da Assembléia-Geral das Nações Unidas, no dia 10 de dezembro de 1948, quando, em Paris, 48 países deram a primeira aprovação unânime à Declaração Universal dos Direitos Humanos. Isto nos motiva, hoje, a comemorar aquilo que podemos considerar como o replantio das sementes de liberdade, fraternidade e igualdade que, um século e meio antes, a Revolução Francesa tencionara universalizar e não conseguira porque autocratas de todos os matizes procuraram esterilizá-las pelos quatro cantos do mundo.  

Direitos civis, econômicos e sociais compõem os 30 (trinta) artigos da Declaração, a começar pela sublime afirmação de que "todos os seres humanos nascem livres, com a mesma dignidade e com direitos iguais." Deles decorreram duas convenções, autorizadas pela Assembléia-Geral em 1955: o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que compõem a Carta Internacional dos Direitos Humanos. Esse conjunto de normas constitui "fonte de inspiração permanente para a elaboração de textos legais em todo o mundo". Tais regras, tornadas efetivas em 1976, adquirem força de lei nos países que ratificam os pactos, possibilitando, com isso, também uma forma de efetiva observação internacional sobre as ações de cada Estado no campo dos Direitos Humanos.  

Os Direitos Humanos proclamados pela ONU limitam-se tão somente pelo reconhecimento dos mesmos direitos e liberdades dos outros e pelos requisitos de moralidade, ordem pública e bem-estar geral. Estão, entre eles, o direito à vida, à liberdade, à segurança pessoal, ao julgamento justo, à libertação em caso de prisão arbitrária, o direito de ser considerado inocente até prova em contrário. Englobam ainda a inviolabilidade de domicilio e correspondência; a liberdade de ir, vir e residir; o asilo, nacionalidade e propriedade; a liberdade de pensamento, de consciência, de religião, de opinião e de expressão; o direito à associação, à reunião pacifica, à participação no governo, à segurança social, ao trabalho, ao descanso e a um padrão de vida que produza saúde e bem-estar; o direito à educação e à participação na vida social da comunidade.  

Tem razão Sua Excelência, o Presidente Fernando Henrique Cardoso, quando diz que Direitos Humanos é o nome da "luta pela liberdade e pela democracia". Demonstra coerência com os atos que vem praticando no Poder Executivo pelo menos a partir de maio de 1993, quando tomou a iniciativa de reunir, no Ministério das Relações Exteriores, representantes do Ministério da Justiça e da Procuradoria Geral da República com parlamentares e as mais importantes organizações não-governamentais de direitos humanos para definir a agenda do Brasil à Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena no mês seguinte. O resultado dessa iniciativa pode ser avaliado pelo fato de o Comitê de Redação da conferência ter sido presidido pelo Brasil. A notável e louvável preocupação de Sua Excelência com o tema foi demonstrada também três anos depois, quando, já na Presidência da República, determinou ao Excelentíssimo Ministro da Justiça, durante as comemorações de Sete de Setembro, a elaboração do Programa Nacional de Direitos Humanos - PNDH. Deve-se muito da existência e implementação desse plano de ação governamental, avançado em relação ao que prognostica a ONU e se faz em outros países, ao Excelentíssimo Secretário Nacional de Direitos Humanos, Dr. José Gregori, que, hoje (10/12), será o primeiro brasileiro a receber um prêmio da Organização das Nações Unidas nesse campo. Aliás, a Secretaria Nacional de Direitos Humanos é órgão criado pelo atual governo e sua importância, não bastasse a relação direta com a organização e execução daquele Programa, aflora de seus objetivos com total clareza. São eles:  

"promover e defender os direitos da cidadania, da criança, do adolescente, da mulher e das minorias; promover e defender os direitos humanos e encaminhar providências em casos de violações; desenvolver estudos e encaminhar providências referentes às liberdades públicas; atuar junto às instituições que representam os direitos da cidadania, na comunidade; adotar medidas de defesa dos interesses difusos em articulação com o Ministério Público; formular, normatizar e coordenar, em todo o território nacional, a política de defesa dos direitos da criança e do adolescente, bem como prestar assistência técnica a órgãos e entidades que executam esta política; defender os direitos das pessoas portadoras de deficiência e promover sua integração à vida comunitária; fazer cumprir o Estatuto da Criança e do Adolescente; e, finalmente prestar serviços de secretaria-executiva aos Conselhos não providos destes serviços por outras unidades do Ministério da Justiça."  

A Constituição Federal de 1988 enfatizou o respeito aos Direitos Humanos de tal forma que a estrutura do Estado democrático de direito ficou voltada à tutela desses direitos, conforme se verifica mesmo num exame superficial dos fundamentos nela inscritos. Basta ler o caput do art. 5º para antever o que mais se segue, sempre com o objetivo de preservar a cidadania. Diz ele:  

"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade."  

Aquele Programa Nacional representa, a nosso ver, importante passo para acelerar a prática dos direitos individuais que, na Constituição, reproduzem o conteúdo da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Como reza o texto do Programa, os Direitos Humanos são de todos e "devem ser protegidos em todos os Estados e nações". O Brasil procura fazê-lo apesar das dificuldades impostas por suas dimensões continentais e pela escassez de recursos. A própria existência do Programa Nacional de Direitos Humanos é uma prova disso.  

No ano passado, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos desencadeou sua Campanha Mundial de Informação Pública no contexto das comemorações do cinqüentenário. Instou todos os Estados-Membros a elaborarem programas e estratégias concretas para incrementar ao máximo o nível de educação e difusão de informação pública, assim como preparar planos nacionais de ação destinados à promoção e proteção dos Direitos Humanos. Portanto, relativamente às iniciativas que já tinham sido adotadas pelo Governo do Brasil, essa campanha pouco pôde acrescentar. Aliás, conforme o Ministério das Relações Exteriores, "o Governo brasileiro atribui excepcional valor à Declaração, que considera referência fundamental para a definição de padrões de convivência coletiva, tanto no interior dos países quanto no plano internacional. Por isso, está conferindo especial relevo à celebração do Cinqüentenário da Declaração."  

Na área do Poder Executivo, as comemorações foram organizadas por um grupo de trabalho interministerial. Assim, por exemplo, todas as publicações da Secretaria Nacional de Direitos Humanos passaram a apresentar a íntegra da Declaração. Prefeitos de todo o País foram solicitados a dar o nome de "Direitos Humanos" a prédios oficiais e logradouros públicos e o Prêmio Direitos Humanos, deste ano, adotou na categoria "Estudantes" o tema

"Cinqüenta anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos - Como você vê a Declaração? " Em setembro último, houve, no Rio de Janeiro, um seminário internacional organizado pelo Ministério das Relações Exteriores, envolvendo pesquisadores de alto nível de todo o mundo para discutir temas referentes aos Direitos Humanos e os efeitos da Declaração Universal. Entre outras iniciativas, criou-se, com apoio do Ministério das Comunicações, da Empresa de Correios e Telégrafos e da Telebrás, a logomarca das comemorações brasileiras do cinqüentenário. Ainda na área do Ministério das Comunicações, a Telesp confeccionou uma série especial de cartões sobre os direitos humanos. Por sua vez, o Ministério da Educação e do Desporto promoveu um concurso nacional de frases sobre o tema para estudantes de 1.' grau. O INSS colocou artigos e comentários sobre a Declaração nas correspondências enviadas aos seus 17 milhões de beneficiários e o mesmo fez o Estado Maior das Forças Armadas nos contra cheques dos funcionários das três Forças. As comemorações abrangeram ainda os ministérios do Trabalho, da Saúde, Cultura e o Banco Central.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, continuemos a comungar o espírito de solidariedade que empolga a Nação neste momento. Prossigamos na busca do primado dos Direitos Humanos de forma a afastar o horror da fome, da doença, da ignorância e da violência que ainda flagelam grandes parcelas da espécie humana, inclusive no Brasil. Um horror realçado por assassinatos, chacinas, extermínios, sequestros, pelo crime organizado e pelo tráfico de drogas e de armas, que não admitem tolerância ou apatia. Todos os seres humanos, sem exceção de espécie alguma, possuem os mesmos direitos fundamentais, expressos na Declaração Universal, cujo cinqüentenário estamos comemorando. Portanto, todos os seres humanos devem ser respeitados e ter sua integridade assegurada. Esta Casa se situa na linha mais avançada de defesa desses direitos. Lembremo-nos disto sempre.  

Muito obrigado.  

 

fx


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/12/1998 - Página 18319