Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DO CINQUENTENARIO DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS.

Autor
Odacir Soares (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • COMEMORAÇÃO DO CINQUENTENARIO DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS.
Publicação
Publicação no DSF de 09/12/1998 - Página 18182
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CINQUENTENARIO, DECLARAÇÃO, DIREITOS HUMANOS.
  • CONGRATULAÇÕES, SENADO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, RECONHECIMENTO, COMPETENCIA, CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, PAIS ESTRANGEIRO, COSTA RICA, JULGAMENTO, FATO, VIOLAÇÃO, NORMAS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, GARANTIA, DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS.

O SR. ODACIR SOARES (PTB-RO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, comemora-se no dia 10 de dezembro o cinqüentenário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Não constitui demasia festejar esse acontecimento, seja pelo tempo que já transcorreu do dia da declaração em 1948 até hoje, seja pelo significado dessa iniciativa, na qual exerceu papel preponderante o brasileiro Austregésilo de Athayde, seja pelo muito que ainda há por fazer nesse campo.  

Historicamente, a Declaração Universal representa o marco de uma luta perene, eterna: a luta do ser humano contra o poder discricionário e contra a tirania, poder e tirania exercidos quer por pessoa, quer por grupos, quer pelo Estado, quer por estruturas. Não é minha intenção sintetizar o trajeto histórico percorrido pela humanidade para chegar ao resultado atual. Quero apenas manifestar minha celebração pela data. Por fundamentar-se, por ser expressão do inalienável valor que possui o ser humano, simplesmente por ser pessoa. Dessa verdade, verdade ontológica, independente de qualquer tipo de concessão, decorre o direito à vida, à liberdade, à integridade física, o direito de procurar a própria felicidade, o direito de opção, no âmbito dos valores fundamentais.  

O Brasil, na pessoa do extraordinário Austregésilo de Athayde, esteve presente na origem do evento, o que demonstra que há na consciência e na cultura da sociedade brasileira um substrato importante em favor dos direitos humanos, constituindo terreno fértil para o nascer e desabrochar de uma realidade altamente dignificante para o mundo inteiro. Esse feito fé, sem dúvida, um dos pontos altos do século XX, um século que foi berço de uma infamante galeria de bárbaros e de crimes bárbaros, em geral perpetrados em nome do Estado.  

Muito caminho há ainda por fazer. Seria por demais longa a listagem dos problemas, ou por demais extensas as questões a discutir, desde os mais elementares direitos à saúde, à moradia digna, à educação básica e ao emprego, até direitos mais abrangentes como cidadania, participação política, liberdade, justiça, leitura e compreensão do mundo.  

Um aspecto, porém, quero sublinhar: um governo democrático é condição necessária para disciplinar a convivência humana, inclusive em relação às atividades do mercado. O governo, no entanto, não é suficiente sozinho. A participação da sociedade é imprescindível. Sem o envolvimento da sociedade civil, a implementação de planos e políticas, a caminhada mesma da sociedade torna-se lenta, cara e de resultados pequenos.  

Os grandes valores da humanidade não se concretizarão com a rapidez requerida pela sensibilidade da nossa época, sem solidariedade, sem a convicção de que cada um deve cumprir o que lhe cabe. Não acredito, e se acontecer será mais uma terrível ocasião de desalento, que o terceiro milênio viverá uma catástrofe pavorosa como a Segunda Guerra Mundial, para que os povos se convençam da necessidade da compreensão e da solidariedade.  

Não bastam, embora necessárias, as declarações formais dos direitos humanos. Também não são suficientes somente os níveis nacionais. É preciso uma globalização de consciência e de ética para que disso surjam instâncias e ação internacionais voltadas para a reafirmação prática da fé nos valores fundamentais do ser humano, na sua dignidade, no seu valor como pessoa, na igualdade entre homem e mulher, tudo costurado por um sólido pacto de cooperação e implementação.  

Não há dúvida de que a garantia dos direitos fundamentais de enormes parcelas de excluídos é um desafio presente, a ser enfrentado com denodo e criatividade, em face do que hoje acontece no sentido da globalização, do mercado mundial livre e poderoso, redutor do Estado, socializador das perdas e privatista em relação aos ganhos.  

No contexto do esforço mundial para aproximar a formalidade da realidade, quero parabenizar esta Casa pela aprovação do projeto que reconhece a competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, criada em 1978 por meio do Pacto de São José da Costa Rica. A partir de agora, a Corte é competente para opinar sobre fatos registrados e que violem imperativos dessa área. O Brasil é o vigésimo quinto país latino-americano a reconhecer a competência da Corte de São José. Na América Latina, apenas Jamaica, Barbados, Granada, República Dominicana e México ainda não reconheceram essa Corte.  

Essa iniciativa, além de sintonizar o Brasil com a sensibilidade e a convicção dos povos do mundo em referência à questão dos direitos humanos, representa um caminho auxiliar para a prática dos princípios da Constituição brasileira que consagra os direitos civis e políticos, bem como os direitos econômicos, sociais e culturais.  

Para nosso País, esse caminho, especialmente no que se refere aos direitos econômicos, sociais e culturais, não será fácil. Esses são obtidos mediante políticas públicas capazes de mudar a situação de miséria e pobreza de muitos brasileiros. Isso não é fácil, pois, hoje como ontem, nosso País continua fortemente na dependência do capital internacional, o qual não se deixa afetar pela fragilidade e vulnerabilidade dos cidadãos pobres, os cidadãos que não se enquadram no perfil dos que se beneficiam dos ajustes econômicos.  

De fato, como favorecer esse segmento de nossa sociedade se, de acordo com análise feita pelo Prof. Elias Jorge, assessor do Conselho Nacional de Saúde e citado em discurso por Wagner Gonçalves - Procurador Federal dos Direitos do Cidadão - o Brasil, em relação à dívida interna e externa, encontra-se numa situação de radical dependência, pois gasta  

- "5,5 bilhões de reais por mês em juros e amortizações;  

- 180 milhões de reais por dia;  

- 7,5 milhões de reais por hora;  

- 125 mil reais por minuto;  

- 2,1 mil reais por segundo."  

Diante de um quadro assim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, entende-se porque o Brasil vem sendo castigado por estertorosos momentos de incapacidade respiratória. Vale a pena refletir sobre uma situação dessa magnitude e tentar vislumbrar uma saída para as carências de toda ordem que ainda acabrunham a Nação.  

É preciso caminhar, criar, investir, ousar.  

Na minha opinião, no momento do cinqüentenário da Declaração Universal dos Direitos Humanos e apesar dos passos já dados, continua profundamente desejável que as intenções da carta de 1948 se tornem práxis. Parafraseando os artigos primeiro e segundo da carta, o terceiro milênio será efetivamente diferente se todos os seres humanos nascerem livres e iguais em dignidade e direitos. Se todos forem dotados de razão e consciência reconhecidas e se todos se comportarem com espírito de fraternidade. Se todos tiverem todos os direitos e todas as liberdades proclamadas na declaração, sem distinção de raça, de cor, de idioma, de religião, de opinião política ou de qualquer outra índole. De origem nacional ou social, de recursos financeiros, de nascimento ou de qualquer outra condição.  

Era o que eu tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/12/1998 - Página 18182