Discurso durante a 119ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

INTERPELANDO O SR. LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, MINISTRO DE ESTADO DAS COMUNICAÇÕES, SOBRE O PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO SISTEMA TELEBRAS.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • INTERPELANDO O SR. LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, MINISTRO DE ESTADO DAS COMUNICAÇÕES, SOBRE O PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO SISTEMA TELEBRAS.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/1998 - Página 16318
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, SISTEMA, TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S/A (TELEBRAS).

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Sr. Ministro, inicialmente, como homem público, defensor do Estado de Direito e que deve repudiar todas as agressões, gostaria de registrar que, na minha opinião, nesta sessão, foi comprovado, por palavras inclusive do Sr. Ministro, que o Estado de Direito também foi agredido.

O Ministro disse textualmente - está nas notas taquigráficas - “que tinha uma preferência pessoal pelo Consórcio Italia Telecom Opportunity”.

Ao longo das intervenções de alguns Senadores e do próprio Ministro, tentou-se estabelecer uma separação entre licitação comum, licitação de asfalto,...

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE) - Obrigado. Tentou estabelecer-se uma diferenciação entre licitação comum, mero leilão de quermesse e uma licitação de um ativo tão importante quanto o Sistema Telebrás.

O Decreto nº 2.546, que aprovou o modelo de restruturação e desestatização das empresas do Sistema Telebrás, tem no seu art. 6º - aliás, repetindo o que tem na Lei de Licitação, na Lei Geral de Telecomunicações -, que o processo de desestatização obedecerá os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade.

Portanto, nenhum agente público, seja respaldado por sentimento de onipotência, seja respaldado por outros sentimentos, pode ter ações que impliquem no rompimento desse princípio da impessoalidade.

O Ministro disse que tinha preferência pessoal pelo Consórcio Italia Telecom Opportunity e, mais adiante, tenta atenuar essa preferência pessoal anterior ao leilão, dizendo que fatos posteriores ao leilão demostraram que a postura e o comportamento do consórcio que venceu o leilão não era a postura melhor para o interesse público.

Vamos, agora, às famosas frases. Vamos retirar as palavras menos elegantes, que foram aqui objeto de penitência, e vamos substitui-las por palavras mais de acordo com o decoro parlamentar. Vamos substituir “borocoxô” por “frágil”; vamos substituir “fazer os italianos na marra” por “envidar todos os esforços para que os italianos logrem êxito”.

Essas são frases, Sr. Ministro, que não apontam para uma ação do agente público, do Estado, apenas no sentido de viabilizar a formação do Consórcio Italia Telecom Opportunity para garantir a concorrência, mas no sentido de viabilizar o Consórcio Italia Telecom Opportunity para que ganhassem a concorrência. Aí apresenta-se como atenuante: ora, mas eles perderam! Esse simples fato por si só desmonta qualquer insinuação de que essas frases têm alguma relação com essa operação para que eles ganhem.

Em relação às frases, Sr. Ministro, existe uma palavra que não tem como ser substituída. É a palavra “inimigo”. Qual é o sentido da palavra “inimigo”? É inimigo de um grupo econômico ou - o que acredito que deva ser o mais provável, já que ela foi proferida por um agente público - inimigo do público, inimigo do interesse nacional. E aí a minha preocupação: independentemente da própria questão da relação anterior ao consórcio, temos uma situação em que ganhou um consórcio de privatização que vai operar a Tele Norte Leste, que vai atender a usuários do Rio de Janeiro ao Amazonas, passando pelo meu pequeno Estado de Sergipe, e que tem um juízo de valor, por parte do agente público responsável por esse setor, tão ruim. Todos esses setores vão ser atingidos ou vão ser servidos, melhor dizendo, por uma “telegang”? Todos esses setores vão ser servidos por uma empresa que antes do leilão, de acordo com palavras do Ministro, que disse que tinha informações especiais sobre essas operações e, após o leilão, de acordo com palavras do próprio Ministro, continuaram tendo um comportamento não condizente com o interesse público.

Aí fica a pergunta: se tínhamos um leilão entre duas empresas em que uma delas sofria esse juízo de valor tão negativo por parte do Ministro, se era um leilão e se teria que contar com o acaso, haveria a possibilidade de essa empresa ganhar o leilão, como realmente aconteceu, se havia esse risco tão grande para o interesse público, na visão do Ministro - porque estou partindo do princípio de que ele, enquanto agente público, usou a palavra “inimigo” na condição de inimigo do público -, por que o mais lógico não seria suspender ou adiar o leilão da Tele Norte Leste? Não venham dizer: “Ah, estamos querendo inviabilizar a privatização.” Não, a questão não é essa. Por que não se adiar especificamente o leilão da Tele Norte Leste na medida em que antes da sua própria efetuação, em função do resultado do leilão da Tele Centro Sul, se não me engano, já se sabia que quem iria ganhar - se não havia mais concorrência - era exatamente a “telegang”, os “inimigos”, o “consórcio borocoxô”, etc.? Essa é a primeira pergunta, Sr. Presidente.

A segunda pergunta: quero insistir na pergunta que já foi feita pelo Senador Jader Barbalho e pelo Senador Ademir Andrade, se não me engano, cuja resposta não me satisfez. V. Exª informou aqui, categoricamente, e colocou também em nota oficial do Ministério das Comunicações, que o lance da Italia Telecom Opportunity era superior em R$1 bilhão ao lance que ganhou. Como V. Exª mesmo afirmou, não teve conhecimento do lance previamente e todas as propostas foram destruídas. V. Exª informou, aqui neste plenário, que tomou conhecimento desse lance de R$1 bilhão após o leilão, informado pela própria Telecom.

Ora, Sr. Ministro, num ambiente de tantas traições, como V. Exª mesmo disse - não sabemos ainda que traições são essas, apesar de ter sido perguntado por um Senador e gostaria, inclusive, de adendar essa pergunta -, o fato de o Ministro assumir essa informação da Telecom em uma nota oficial e em depoimento no Senado da República, sem qualquer receito de que essa informação pós-leilão não fosse mais uma traição, já que não poderia ser comprovada, já que a proposta oficial havia sido destruída, não significaria que, na verdade, essa informação foi anterior ao leilão? Fico por aqui, Sr. Presidente, e guardo o tempo para a réplica.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE) - Sr. Ministro, na audiência com o Ministro Pedro Malan fiz uma referência cinematográfica. Em sua exposição, na resposta à pergunta de um Senador, V. Exª faz também uma referência a um filme. V. Exª agora fala em situação kafkiana. Confesso a V. Exª que, analisando todo esse processo, se fosse usar algum filme como inspiração, com certeza seria Os Intocáveis, porque estamos diante de uma situação em que temos diversos representantes do povo diante de informações truncadas, às quais V. Exª faz insinuações muito claras, mais até do que insinuações, ao se referir às fitas; de que as fitas surgiram pós-leilão com algum interesse, em função de algum interesse; chega-se a falar em chantagem. Ora, se há chantagem, há exigência de alguma coisa, e o Congresso Nacional, o Senado Federal e a Nação inteira têm o direito de saber o que está sendo exigido nesse processo de chantagem, porque senão vamos chegar a uma situação em que a discussão vai ser de fé: creio no Ministro Malan, creio na equipe do Governo, creio em todos os seus membros ou não creio. Cada um de nós aqui tem o direito de acreditar ou não, até porque no reino dos céus há lugar até para os incrédulos.

Mas se V. Exª insiste em fazer as insinuações de que tem conhecimento, ou seja, de quais são os interesses que estão por trás da chantagem da divulgação das fitas, entendo que seja obrigação de V. Exª informar à Nação e aos Senadores quais são essas informações, até porque é isso que possibilitará que o Congresso Nacional escolha o caminho da sua investigação.

Eu, particularmente, ao contrário do Senador Pedro Simon, não entendo que a renúncia de V. Exª resolva o problema. Entendo que o que está em discussão é o interesse público, é a condição da sociedade brasileira investigar se o processo de privatização foi ou não legítimo, se o processo de privatização foi ou não limpo, se houve ou não manipulação, porque continuo entendendo - V. Exª pode dizer que foi montagem, que foi edição, que foi manipulação -, mas continuo entendendo que em função do que está escrito na lei, no que diz respeito à impessoalidade, em função das frases que apontam não para a ação no sentido de viabilizar um consórcio, mas no sentido de ganhá-lo, entendo que houve ferimento no Estado de Direito. E nesse sentido é que nós continuamos insistindo na tese da Comissão Parlamentar de Inquérito, não com o objetivo de escolher um ou outro “cristo” - acredito que V. Exª não tem vocação para isso - que vá pagar por um episódio que, depois, poderá continuar acontecendo, em função de que o Congresso Nacional muitas vezes começa a investigar um processo e depois pára. Está aí o exemplo da velha CPI das Empreiteiras, que o Senador Pedro Simon volta e meia cita no plenário desta Casa e que até hoje não foi concluída.

Para concluir, Sr. Ministro, eu gostaria de insistir: a que V. Exª estava se referindo quando falou em traições? Acredito, inclusive, que essa afirmação tem a ver com as insinuações que V. Exª fez no sentido de ter conhecimento ou informações, pelo menos próximas da verdade, de quem é responsável pela divulgação das fitas, quem é responsável por fazer os grampos e quais são os interesses.

E, por último, a impressão que nos dá é que as fitas foram divulgadas a partir de uma possibilidade do BNDES vender os 25% que tem para a Italia Telecom, que são os mesmos italianos citados no processo antes do leilão. Gostaria de saber se V. Exª confirma essa dedução que estou fazendo das insinuações que fez durante o seu depoimento.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE) - Podemos fazer a do grampo também. Sem problemas.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/1998 - Página 16318