Discurso no Senado Federal

TRANSCURSO DO CENTENARIO DE NASCIMENTO, NO ULTIMO DIA 7 DE NOVEMBRO, DO CARUARUENSE JOÃO LUIZ TORRES.

Autor
Joel de Hollanda (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Joel de Hollanda Cordeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • TRANSCURSO DO CENTENARIO DE NASCIMENTO, NO ULTIMO DIA 7 DE NOVEMBRO, DO CARUARUENSE JOÃO LUIZ TORRES.
Publicação
Publicação no DSF de 15/12/1998 - Página 18726
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, ANIVERSARIO, JOÃO LUIZ TORRES, CIDADÃO, MUNICIPIO, CARUARU (PE), ESTADO DE PERNAMBUCO (PE).

O SR. JOEL DE HOLLANDA (PFL-PE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o povo da cidade de Caruaru guarda a lembrança de um seus conterrâneos mais admiráveis, cuja simplicidade não impediu que se destacasse como um incansável lutador pelo bem comum e como um exemplo de dignidade e de correção em todas as circunstâncias. O centenário do nascimento de João Luiz Torres foi há pouco comemorado por parentes, amigos e autoridades, bem como pelas pessoas que nele reconhecem um legítimo representante do melhor espírito da cidade e de suas tradições.  

João Luiz Torres nasceu em 7 de novembro de 1898, no sítio Riacho da Palha, a 15 km de distância da sede do Município de Caruaru. Sua ascendência, pelo lado paterno, remonta ao sertanista Manuel de Torres, o qual, por sua importante Participação na guerra de expulsão dos holandeses, recebeu posses consideráveis na região do Agreste pernambucano, na segunda metade do século XVII. Como nos informa o historiador Nelson Barbalho, o pai de nosso homenageado, Luiz Marcelino Torres, descendia diretamente dessa linhagem ilustre;- apesar de ser um homem trabalhador, foi pobre e não teve muita sorte na vida. Quando João Luiz tomou-se órfão, aos 6 anos de idade, Iogo tratou de empunhar a enxada, para ajudar sua mãe na lavoura, ali mesmo onde nascera, no Riacho da Palha, terras de Pau-Santo, terras desbravadas e possuídas por seus ancestrais".  

Ainda conforme Nelson Barbalho, "a história de João Luiz Torres é a história de um autêntico herói caruaruense, pernambucano, brasileiro, a história do sujeito pobre, de boa origem, de boa formação, e obrigado a lutar, lutar sempre". É ele mesmo, João Luiz, quem nos relata, de modo simples e comovente, os fatos e feitos de sua vida, em uma despretensiosa autobiografia que escreveu e deixou interrompida pouco antes de falecer, em 1970.  

Vejamos alguns passos de uma vida de multa luta, mas também de muitas alegrias. Tinha ele oito anos de idade, quando o proprietário do sítio Riacho da Palha para lá levou uma professorinha, que ensinou a Luiz Torres as primeiras letras na escola improvisada, cuja existência não foi além de um ano. Logo o menino passava adiante as lições que recebera, alfabetizando as duas irmãs mais velhas. Pelo restante da vida, João Luiz iria aprender tudo o que soube fora das escolas. Já aos onze anos, começa a auxiliar um proprietário de lavoura nas contas dos trabalhadores e na venda dos bens ali produzidos. Pouco depois, passa a trabalhar no povoado de Pau Santo, como empregado em casas e comércio. Os anos transcorrem enquanto o moço batalhador alterna a atividade de comerciário com a agricultura.  

Aos dezenove anos, ele se encontrava novamente em Pau Santo, como gerente de uma mercearia e padaria, quando ocorre um fato marcante em sua vida: apaixona-se pela irmã do seu patrão, da prestigiosa família Bezerra. Havia, entretanto, sérios obstáculos para que os dois jovens realizassem o seu desejo de união, como nos explica João Luiz, "Ela a princesa. Sua mãe era proprietária, tinha fazenda de gado, vendia tecidos. Os irmãos comerciantes, fazendeiros de café. Eu, plebeu, de família humilde, apenas um simples empregado de balcão. O tempo esquentou, como se costuma dizer." Com sua firmeza e constância características, João Luiz Torres conseguiu dobrar as resistências e desposou sua adorada "Mariinha", tendo com ela 15 filhos e uma convivência harmoniosa que durou 48 anos.  

A vida de João Luiz Torres prossegue, dedicando-se à família e a diversas ocupações, como as de barbeiro e comerciante. Em 1935, é nomeado "Distribuidor e Partidor" da Comarca de Caruaru, pelo Interventor de Pernambuco, Carlos de Lima Cavalcanti, ocupando o cargo até janeiro de 1938, quando o Interventor seguinte, representando agora o Estado Novo, o demite.  

Em 1940, assume o controle da arrecadação e da administração dos Patrimônios das Igrejas de Nossa Senhora da Conceição, Nossa Senhora das Dores, Nossa Senhora do Rosário e do Bom Jesus do Monte, mostrando um zelo verdadeiramente religioso nessa função, na qual permaneceu até quase seus últimos dias de vida.  

Também nesse ano, ao mesmo tempo em que mantinha a atividade de comerciante, passou a trabalhar como agenciador de registros de nascimento, de casamentos civis, requerendo também alistamento ou quitação do serviço militar. Desse modo, antes da instalação da Circunscrição de Recrutamento em Caruaru, na época da Segunda Guerra, ele, sozinho, realizara uma verdadeira campanha de alistamento, obtendo certificados de reservista do Exército para mais de 5.000 rapazes de Caruaru e das cidades vizinhas. Fez serem lavrados nos cartórios mais de 7.000 registros de nascimento, promovendo ainda a legalização de milhares de matrimônios cujos cônjuges eram casados apenas no religioso.  

João Luiz Torres teve notável participação em uma série de importantes eventos na vida caruaruense, como a comemoração do centenário da concessão de foros de cidade à antiga vila de Caruaru, em 18 de maio de 1957. Poucas vezes afastou-se da região onde nasceu: em uma delas, foi ao Rio de Janeiro em companhia de seu amigo Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, nesse mesmo ano de 1957. Pouco tempo depois, vai a Parnaíba, no Piauí, para assistir à posse, como Bispo daquela cidade, de seu amigo fraternal Dom Paulo Hipólito de Sousa Libório, com quem trabalhara durante 10 anos na Diocese de Caruaru. Visita ainda a nova capital do País, quando ela ainda não completara dois anos de existência.  

Ressaltemos o zelo extremo com que se dedicou à sua família, propiciando a melhor educação aos filhos, entre os quais citamos, na impossibilidade de nos referirmos a todos, os destacados jornalistas Luiz Torres e José Bezerra Torres, que são, respectivamente, o primogênito e o caçula. É especialmente comovente o amor que o uniu por toda vida a Dona Mariinha, como transparece a cada momento de seu relato autobiográfico. Em 1969, escreve e publica o soneto "Vestida de Branco", comemorando os 50 anos do despertar do sentimento que os uniu, enquanto estiveram vivos. Mas é nesse mesmo ano que ocorre a dolorosa separação, com o falecimento de Dona Mariinha, meses depois. A notória tristeza do esposo na narração do episódio faz com que interrompa, pouco depois e abruptamente, o seu relato. No ano seguinte, em 24 de setembro de 1970, é a vez do ilustre filho de Caruaru se despedir.  

Pelo exemplo de vida que deixa para todos nós, especialmente para o povo de sua terra, - exemplo de simplicidade e de bondade, de hombridade e de disposição para a luta, qualidades que hoje em dia não devemos lembrar são, infelizmente, tão freqüentes como o deveriam, sempre de João Luiz Torres, benfeitor de Caruaru.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/12/1998 - Página 18726