Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DO SISTEMA NACIONAL DE AUDITORIA, INDISPENSAVEL AO CONTROLE SOCIAL DO SISTEMA UNICO DE SAUDE.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DO SISTEMA NACIONAL DE AUDITORIA, INDISPENSAVEL AO CONTROLE SOCIAL DO SISTEMA UNICO DE SAUDE.
Publicação
Publicação no DSF de 16/12/1998 - Página 19005
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, REFORÇO, SISTEMA NACIONAL, AUDITORIA, GARANTIA, CONTROLE, NATUREZA SOCIAL, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS).
  • CRITICA, MEDIDAS ADMINISTRATIVAS, ADOÇÃO, JOSE SERRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), COMPROMETIMENTO, FUNCIONAMENTO, AUDITORIA, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS).
  • SOLICITAÇÃO, JOSE SERRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), CUMPRIMENTO, RECOMENDAÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), MINISTERIO DA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL E REFORMA DO ESTADO (MARE), CRIAÇÃO, CARREIRA, GRATIFICAÇÃO DE DESEMPENHO, CATEGORIA PROFISSIONAL, AUDITOR.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Sistema Único de Saúde – SUS, instituído pela atual Constituição Federal, tem apresentado inúmeras impropriedades. Seu funcionamento tem motivado denúncias de desorganização, de mau atendimento, de mau gerenciamento do dinheiro público e de corrupção.  

A existência dessas denúncias torna evidente a necessidade de o Estado brasileiro poder contar com um rápido e eficiente serviço, em nível nacional, capaz de avaliar do ponto de vista contábil, financeiro e técnico a gestão dos recursos públicos, realizada pelo Ministério e pelos Estados e Municípios, mediante repasse.  

Sabemos bem que legislação infraconstitucional assim o determina. A lei n.º 8.080, de 1990, conhecida como Lei Orgânica da Saúde, estabelece a necessidade de criação do Sistema Nacional de Auditoria como instrumento fiscalizador, atribuindo a ele a coordenação da avaliação técnica e financeira do SUS, em todo o território nacional.  

Com a extinção do INAMPS, em 1993, uma outra lei, a de n.º 8.689, finalmente criou o Sistema Nacional de Auditoria – SNA e estabeleceu como sendo de sua competência o acompanhamento, a fiscalização, o controle e a avaliação técnico-científica, contábil, financeira e patrimonial das ações e serviços de saúde.  

Posteriormente, em 1995, ocorreram mudanças, mas as atribuições principais foram mantidas. O SNA passou a ter como órgão central o Departamento de Controle, Avaliação e Auditoria – DCAA e a descentralização do mesmo fez-se por meio dos órgãos estaduais, municipais e de representação do Ministério da Saúde em cada Estado da Federação e no Distrito Federal.  

Em janeiro deste ano, porém, a ampla alteração da estrutura do Ministério da Saúde reorganizou também o DCAA. Embora a estrutura do órgão central tenha sido ampliada, houve um enfraquecimento de sua atuação com a redução do quadro da representação do SNA nos Estados.  

Sr. Presidente, consciente da importância de Sistema Nacional de Auditoria no controle social do Sistema Único de Saúde, aqui estou, neste momento, para falar sobre alguns problemas existentes na área do SNA e sobre medidas recentemente tomadas que estão fragilizando a atuação desse importante serviço.  

No início de novembro deste ano, o Ministro da Saúde, José Serra, anunciou a consolidação de uma série de medidas capazes de proporcionar uma economia de quase R$ 700 milhões de reais, sendo R$ 399,45 milhões em 1998 e os restantes R$ 259,9 milhões em 1999.  

O Ministro afirmou, na ocasião, que essas economias não prejudicariam, em momento algum, as atividades prioritárias do Ministério, mas há indícios que alguns setores estão sendo afetados gravemente pelas medidas adotadas. O Sistema Nacional de Auditoria é um deles.  

Na ânsia de reduzir custos, o Ministério da Saúde tomou medidas que vêm contribuindo para dificultar as ações de fiscalização empreendidas pelo Sistema Nacional de Auditoria.  

Srªs e Srs. Senadores, a realidade dos fatos vem demonstrando que o Sistema de Auditoria do Ministério da Saúde vêm sofrendo um processo de fragmentação e desestruturação nos últimos tempos, principalmente neste último ano.  

Segundo levantamento realizado em fins de novembro passado, o quantitativo existente no quadro de pessoal que desenvolve atividades de auditoria é de 1.102 servidores em todo o País, incluindo o pessoal de apoio administrativo.  

Para manutenção dessa força de trabalho, é necessário que se estimule esses servidores com a criação de uma carreira estruturada que lhes dê a credencial e o apoio logístico necessários ao bom desempenho dessa função estratégica do Ministério.  

Hoje, várias divisões existentes em alguns Estados não dispõem de pessoal em número suficiente para executar as ações de auditoria.  

O golpe de misericórdia veio com a Portaria nº 3.926, de 12 de novembro de 1998. Esse ato propiciou o estrangulamento definitivo do Sistema de Auditoria.  

Sr. Presidente, a União Nacional dos Auditores do Sistema Único de Saúde – UNASUS, integrada por servidores do Departamento de Controle, Avaliação e Auditoria – DCAA, do Ministério da Saúde, e das Divisões de Auditoria daquele Ministério nos Estados, vem manifestando sua preocupação e apreensão com as medidas recentemente adotadas pelo Ministro José Serra.  

Essas medidas transformam as Divisões de Auditoria existentes nos Estados em meras Unidades de Serviço, prejudicando sensivelmente o andamento dos trabalhos de auditoria e reduzindo ainda mais o quantitativo das atividades realizadas pelo SNA, através de seu Departamento, o DCAA, e de suas Divisões.  

Todos nós sabemos muito bem que a fiscalização rigorosa da aplicação dos recursos públicos inibe os desvios, dificulta as irregularidades e as fraudes. Com uma auditoria rigorosa, consegue-se tapar os ralos por onde escoa dinheiro público, numa infinidade de formas de corrupção, freqüentemente denunciadas pela imprensa e que pretendo mostrar num próximo pronunciamento a respeito dessa temática.  

O próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso defende a tese de que a má gestão na saúde, em especial o desperdício e a falta de uma administração consciente por parte de muitos dos envolvidos na gestão do sistema público, leva a gastos exagerados, sem que se consiga promover o atendimento da população de forma adequada.  

Sr. Presidente, nada evidencia melhor a importância das ações empreendidas pelo Sistema Nacional de Auditoria do que o aumento significativo do número de auditorias realizadas, registrado pelo Ministério da Saúde entre os anos de 1996 e 1997.  

Esse número subiu de cerca de 1.200 auditorias, em 1996, para 3.500, em 1997. De dois anos para cá, o volume de notificação de débito cresceu cerca de 87 milhões de reais.  

Esse expressivo aumento se deu principalmente em razão da implementação de um sistema de capacitação contínua dos profissionais integrantes do SNA, mediante cursos e treinamentos, em nível técnico, administrativo e gerencial, ocorrido tanto na esfera federal (Departamento), quanto nas esferas estaduais (Divisões).  

Nos últimos 3 anos, o Ministério da Saúde, via Departamento de Controle, Avaliação e Auditoria, investiu em treinamentos específicos e cursos para a maioria dos servidores lotados no DCAA. Hoje, esses funcionários encontram-se treinados e qualificados para as atividades que executam e, como apontaram os números acima mencionados, os resultados desse investimento não se fizeram esperar.  

Sensíveis melhorias foram detectadas no desenrolar dos processos: rotinas, fluxos, manuais e relatórios foram aperfeiçoados; a gestão pela qualidade e produtividade foi disseminada pelo Departamento em quase todos os Estados da Federação.  

Sr. Presidente, todos somos a favor da adoção de medidas que resultem em ganhos para os cofres públicos. Uma gestão eficiente dos escassos recursos destinados à saúde pública no Brasil merece aplausos, desde, obviamente, que essa economia não acarrete prejuízos para a nossa população, principalmente para a população mais carente, que só pode contar com os serviços oferecidos pelo SUS.  

Sabemos que o acompanhamento das gestões municipais feito por componentes do Sistema federal de auditoria evita que procedimentos incorretos passem despercebidos.  

Considerando os bons resultados apresentados nos últimos anos, não parece ser oportuno o enxugamento da estrutura organizacional, decidido recentemente pelo Ministério da Saúde. Estou convicto de que a fragilização do Sistema de Auditoria do Ministério da Saúde acarretará um menor rigor na fiscalização e proporcionará um número muito maior de fraudes e de corrupções.  

Os maiores prejudicados serão os usuários do Sistema Único de Saúde.  

Embora eu seja um ferrenho defensor da descentralização dos serviços de saúde, considero que essa descentralização exige constante e eficaz vigilância.  

Fragilizar a auditoria e o controle dos recursos pelo Governo Federal é criar condições para a ocorrência de desmandos indesejáveis em nosso País onde os recursos destinados à saúde são insuficientes para atender as reais necessidades da população.  

A Lei nº 9.649 de 27/05/98, ratifica como função legal do Ministério da Saúde a coordenação e a fiscalização do Sistema Único de Saúde, e essa função tem de ser mantida e rigorosamente realizada.  

Nenhum de nós ignora que podem existir, nos Estados e Municípios, pessoas inescrupulosas muito mais interessadas em compatibilizar interesses políticos regionais do que em garantir a viabilidade do Sistema Único de Saúde e o bom atendimento à população.  

As evidências de que o Ministério da Saúde não tem demonstrado interesse em fortalecer o Sistema Nacional de Auditoria são preocupantes. As bases do SNA vêm sendo desestruturadas. Serviços que são específicos de auditoria estão sendo retirados, procedendo-se à criação de serviços paralelos para executá-los.  

Além desse fato, cabe destacar também o descaso das autoridades da área de saúde em fortalecer esse núcleo considerado estratégico na estrutura do Ministério. Até hoje não foi criada a carreira específica e a Gratificação de Desempenho por Atividade de Auditoria, amplamente discutida e amadurecida com técnicos do Ministério Extraordinário para a Reforma do Estado – MARE.  

Convém lembrar que o MARE especificou, para cada Ministério, quais as carreiras que deveriam ser criadas para fortalecer o núcleo estratégico do Governo. Foram então criadas, nos diferentes Ministérios, carreiras específicas como as de Fiscal Agropecuário, no Ministério da Agricultura, Analista de Comércio Exterior, no Ministério da Indústria e Comércio, Supervisor Médico Pericial e Analista Previdenciário, no Ministério da Previdência e Assistência Social, Especialista em Educação, no Ministério da Educação, entre outros.  

No Ministério da Saúde já deveria ter sido criada a carreira de Auditor de Saúde, mas tal ainda não ocorreu.  

Face à morosidade verificada no processo de reestruturação do Ministério da Saúde, em geral, e no Sistema Nacional de Auditoria, em particular, o Tribunal de Contas da União – TCU, nos últimos anos, vem cobrando providências.

 

Em sua decisão n.º 132/98, publicada no DOU de 07/04/1998,o TCU determinou no Processo TC 001.381/97, no item 8.1 " ao Ministro de Estado da Saúde que, mediante a adoção das medidas cabíveis junto as unidades competentes de sua pasta: (...) redefina as competências do Sistema Nacional de Auditoria – SNA, nas três esferas, de maneira clara, possibilitando o exercício das atividades de forma descentralizada e integrada, com divisão de responsabilidades entre os níveis de gestão".  

Recomendou também ao Ministro de Estado da Saúde que "adote providências no sentido de dotar o SNA, nível federal, de recursos materiais e humanos necessários ao desempenho de suas funções (item 8.2.4)" e que "adote providências com vistas à elaboração de um Plano de Cargos e Salários para os Auditores da Área de Saúde (item 8.2.5)".  

Como bem assinalou a observação constante da Ata n.º 38, de 1992, do Tribunal de Contas da União, "se o controle tem custo, a falta de controle tem custo muito maior. O que se investe na fiscalização não é despesa, mas antes economia." Isso significa, Senhoras e Senhores Senadores, que os resultados do controle podem ser quantificados. Levada a efeito, a auditoria evita despesas indevidas, fraudes, superfaturamentos de contas.  

As denúncias de irregularidades apontadas ao Ministério da Saúde pelos trabalhos de auditoria são freqüentemente graves e sua detecção evita desperdício de dinheiro público.  

Denúncias de cobranças incorretas de procedimentos, de ausência de documentos comprobatórios de despesas realizadas, de cobranças em duplicidade, de concomitância de atividades médicas no ambulatório e no serviço de urgência, de prescrição incompatível com a diagnóstico, são apenas alguns exemplos do imenso leque de irregularidades detectadas.  

Lamento não poder estender-me mais sobre o assunto e trazer ao conhecimento de todos denúncias e outros problemas que afetam o bom funcionamento do Sistema Nacional de Auditoria do Ministério da Saúde. Não disponho do tempo necessário, mas pretendo fazê-lo em outra oportunidade.  

Ao concluir meu pronunciamento, gostaria de fazer dois apelos ao Ministro da Saúde, nosso colega José Serra. O primeiro apelo é para que sejam cumpridas as determinações e recomendações do Tribunal de Contas da União e do MARE com respeito à criação da carreira e da Gratificação de Desempenho por Atividade de Auditoria.  

O segundo apelo é para que, ao invés de fragilizar a estrutura do Sistema Nacional de Auditoria, busque reforçá-la, pois o trabalho desenvolvido pelo SNA é da maior importância para que os recursos públicos destinados à saúde não sejam desviados e fraudados, em prejuízo da população brasileira.  

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/12/1998 - Página 19005