Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE AS POTENCIALIDADES DA AGROPECUARIA BRASILEIRA. DIFICULDADES ENFRENTADAS PELOS AGRICULTORES, EM PARTICULAR NO ESTADO DE SERGIPE. DEFESA DA AMPLIAÇÃO DO ACESSO AO CREDITO RURAL E APELO PARA A REVISÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTARIA E TRABALHISTA RURAL.

Autor
José Alves (PFL - Partido da Frente Liberal/SE)
Nome completo: José Alves do Nascimento
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
AGRICULTURA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE AS POTENCIALIDADES DA AGROPECUARIA BRASILEIRA. DIFICULDADES ENFRENTADAS PELOS AGRICULTORES, EM PARTICULAR NO ESTADO DE SERGIPE. DEFESA DA AMPLIAÇÃO DO ACESSO AO CREDITO RURAL E APELO PARA A REVISÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTARIA E TRABALHISTA RURAL.
Publicação
Publicação no DSF de 16/01/1999 - Página 1626
Assunto
Outros > AGRICULTURA.
Indexação
  • ANALISE, ATUAÇÃO, SETOR, AGRICULTURA, BRASIL.
  • APREENSÃO, INSUFICIENCIA, RECURSOS, ORÇAMENTO, DESTINAÇÃO, SETOR, AGRICULTURA, BRASIL.
  • EXPECTATIVA, CRIAÇÃO, GOVERNO, ORGÃO PUBLICO, SUBSTITUIÇÃO, DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS (DNOCS), COMBATE, SECA, REGIÃO NORDESTE.
  • COMENTARIO, AGRAVAÇÃO, PROBLEMA, AGRICULTURA, ESTADO DE SERGIPE (SE), PROVOCAÇÃO, DESEMPREGO, RESULTADO, QUEBRA, SAFRA.
  • CRITICA, GOVERNO, FAVORECIMENTO, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, PREJUIZO, SETOR, AGRICULTURA, BRASIL.
  • ANALISE, AUMENTO, CUSTO, PREÇO, INSUMO, ADUBO, SEMENTE, SIMULTANEIDADE, ESTABILIDADE, VALOR, PRODUTO AGRICOLA, PROVOCAÇÃO, PREJUIZO, AGRICULTOR.
  • ANALISE, PROPOSTA, ELABORAÇÃO, FORUM, AMBITO NACIONAL, AGRICULTURA, INCENTIVO, BRASIL.

O SR. JOSÉ ALVES (PFL-SE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já em 1700 dizia Benjamin Franklin - que na política foi um grande personagem e, nas ciências, um sábio, inventor do pára-raios - que "se o homem queimar as cidades e preservar os campos, essas ressurgirão. Mas se o homem preservar as cidades e queimar os campos, essas não sobreviverão."  

A agricultura brasileira continua a merecer maior atenção, prioridade e esforço governamental no sentido de viabilizar sua natural vocação e realizar o seu imenso potencial econômico, associado aos negócios do setor, como um complexo altamente produtivo e gerador de renda e emprego.  

A agricultura, a indústria a ela relacionada e os serviços correlatos, isto é, os negócios do ramo, participam com 40% na formação do PIB nacional e empregam 52% da população economicamente ativa do País. É preciso destacar que, nesse bolo de 40%, os agricultores, que são, na realidade, o primo pobre dessa família, participam com apenas 10% do PIB. O restante é derivado, em grande parte, da valorização no beneficiamento do seu produto e também pelos insumos e maquinários.  

A versão do Orçamento para 1999 atinge a agricultura com uma poda nas perspectivas de aumento dos seus recursos, quando já era muito pequena a sua fatia no bolo orçamentário, menos de 1,5%. E o mais preocupante é que a dívida pública já morde quase metade do Orçamento, inviabilizando investimentos em áreas que deveriam ter maior destaque de importância e prioridade.  

O Brasil, que é o sexto país do mundo em volume de exportações agrícolas, tem clima e solo extraordinariamente favoráveis à atividade rural, possui 150 milhões de hectares de áreas agricultáveis ainda não utilizadas e importa, por exemplo, mais de 100 mil toneladas de feijão por ano - só em 1997, foram 146 mil. Tendo o segundo maior rebanho bovino do Planeta, importa leite da França, arroz da Tailândia, milho dos Estados Unidos e bifes da Austrália, neste caso porque não consegue participar com mais de 2% das exportações mundiais de carne.  

O Brasil tem o maior potencial de expansão de áreas agricultáveis do mundo, uma alternativa para resolver boa parte de seus problemas sociais e econômicos. As importações agrícolas do ano passado, no geral, alcançaram a cifra de U$5 bilhões. A safra do período 1997/1998, apesar dos efeitos perversos das alterações climáticas no Nordeste, deverá se aproximar de 80 milhões de toneladas, prometendo crescer ainda mais no próximo período, 1998/1999, se o sistema financeiro conseguir operar os 10 bilhões consignados inicialmente para o custeio agrícola. Com relação, por exemplo, à safra do feijão, que é um artigo de primeira necessidade na dieta alimentar e sobrevivência da população regional, embora a média nacional tenha caído apenas 3% neste ano, com relação à safra do período anterior, no Nordeste o feijão de sequeiro teve uma queda de safra de 55%. Alguns Estados perderam até 90%.  

A seca continua sendo uma ameaça constante, apesar das providências do Governo. Uma delas, a mais recente, em sentido oposto, foi a extinção do DNOCS, que já vinha dos tempos do Império, lutando, muitas vezes timidamente, para amenizar os efeitos perversos desse fenômeno. Esperamos que o Governo crie, em seu lugar, outro mecanismo, outra instituição mais eficaz, que não seja mais uma sigla e que tenha mais poder, recursos e prioridades para cuidar de um assunto tão relevante como prover os meios e condições para a convivência do homem com a seca.  

Em Sergipe, os efeitos da estiagem, aliados às dificuldades que a agricultura já vinha enfrentando como parte dessa realidade nacional, a situação também é muito grave. Muitos pequenos proprietários estão vendendo suas terras, ou simplesmente deixando de produzir nelas, por falta de condições e incentivos. Na citricultura, por exemplo, que emprega mais de cem mil trabalhadores, ocorre uma crise sem precedentes, com alto índice de desemprego e uma quebra de safra, no Estado, superior a 70%, com relação ao ano anterior.  

No âmbito nacional, além da escassez de recursos, dos juros elevados, da inadimplência universal do meio rural, onde a dívida agrícola dos proprietários rurais chega a R$12 bilhões, do medo generalizado do endividamento, do atraso nos financiamentos com relação ao período de preparo da terra e do plantio, que não podem esperar, ainda existe o fato de que não deve chegar a 20% a parcela dos agricultores brasileiros que têm acesso ao crédito rural, pois a maior parte deles, especialmente os pequenos, financiam seus custos com recursos próprios ou se endividando a juros altíssimos e usando, inclusive, cartão e cheque especial.  

Outro problema seriíssimo que a agricultura vem atravessando é a sua aclamação, pelos gestores da política econômica, como a grande patrocinadora compulsória da causa do Real, eleita que foi como âncora da estabilização da moeda, salvadora da economia e promotora do bem-estar dos brasileiros, quando, há anos, já vinha sendo sacrificada, exaurida e desprezada pelas prioridades de Governo.  

Se por um lado isso serve para mostrar a grande resistência e potencial econômico do trabalho agrícola e da fertilidade generosa do suor na terra, produzindo alimento para as mesas dos brasileiros, por outro, mostra a contribuição desproporcional imposta pelo Governo com relação a outros setores mais ricos da economia. Por exemplo, enquanto o sistema financeiro, tomando dinheiro ao preço de uma inflação que, felizmente, mal alcança 1%, chega a emprestar esse dinheiro a até 10% ao mês, ou dez vezes a inflação, como no caso de cheques especiais e cartões de créditos, num País de cidadãos endividados, contribuindo de forma usurável com a estabilização da moeda, para conter o consumo e atrair capitais especulativos, a nossa agricultura e os nossos pobres agricultores se descapitalizam com a terrível desproporção entre os preços agrícolas e o custo dos insumos e do dinheiro.  

Basta o seguinte argumento para comprovar a veracidade desta análise. A cesta básica, composta de uns 40 produtos, custava R$106,40 em julho de 1994. Em julho deste ano custava R$111,47, tendo subido 4,7% neste período, quando o Índice Geral de Preços de Mercado, o IGPM, medido pela Fundação Getúlio Vargas, registrou uma variação, isto é, uma inflação, nestes 4 anos, de 60,3%. Alguns ramos da atividade econômica simplesmente dobraram os seus preços neste período, escola particular, por exemplo. O setor público elevou consideravelmente as contas de luz, água, telefone, combustível e outras tarifas.  

Verdadeiramente um absurdo, uma injustiça, os preços agrícolas estão estáveis. É bom para a população, mas o custo dos insumos, adubos, sementes, maquinário, informações tecnológicas, impostos, tarifas públicas, tudo subiu, na formação destes 60,3%. Alguns itens essenciais à atividade agrícola dobraram de preço, menos o preço da terra, que é o patrimônio do proprietário rural, desvalorizado pelo risco permanente da atividade, pelo novo ITR e pela ameaça constante de litígios fundiários, questões trabalhistas e desapropriações.  

É preciso uma revisão urgente das legislações tributária e trabalhista rurais, visando uma maior simplificação dos procedimentos e adequação à realidade do campo, de forma que possam melhorar as relações laborais e a geração de emprego. Em muitos casos o emprego rural está se tornando uma armadilha para o empregador ou uma sonegação de direitos para o empregado, tão grandes são as dificuldades operacionais e exigências legais para o homem do campo cumprir, formal e tempestivamente, os encargos da burocracia e a voracidade do Fisco, que, com o tempo, estão tornando proibitiva a atividade rural  

Pelo ângulo das receitas e das despesas, o produtor rural, hoje, está comprando mais do que vendendo, pois raramente cobre comercialmente os seus custos.  

Uma das soluções para a produtividade da agricultura, nestes tempos de mercado competitivo e de progresso tecnológico, é a irrigação, com a qual pode-se obter até três safras por ano, mas que, infelizmente, requer investimentos mais elevados, indispensáveis à ampliação da parceria do setor público, com obras de infra-estrutura, com o setor privado.  

Neste contexto de dificuldades conjunturais e estruturais, que aprisiona a grande vocação e o imenso potencial da agricultura de nosso País, surge uma luz no horizonte, com promessa de tempos e resultados promissores.  

Trata-se, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de um importante organismo de estudos, reflexões, debates, exercício de criatividade e formulação de propostas e políticas para os negócios da agricultura, o Fórum Nacional da Agricultura, composto por pessoas da mais alta qualificação, experiência e comprometimento com o setor.  

Instituída em 1996, com participação eqüitativa de autoridades do setor público e personalidades, especialistas e dirigentes de instituições do setor privado, desdobrada em coordenadorias temáticas para estudar e propor medidas concretas para a solução e estabelecimento conjunto de prioridades para cada uma das áreas de nossa agricultura, essa entidade já apresenta os primeiros resultados.  

Em suas conclusões, alerta que a produção de alimentos no mundo terá que triplicar nos próximos 40 anos para suprir a demanda de alimentos para cerca de 9 bilhões de pessoas; em nosso País, a produção agrícola deverá crescer a taxas superiores a 3% ano para alimentar a população e gerar divisas e emprego.  

Recebi, em meu gabinete, um relatório preliminar do Fórum Nacional da Agricultura, que é atualmente a mais elevada expressão da inteligência no setor, contendo uma breve síntese do trabalho realizado nestes dois últimos anos e das conclusões, uma contribuição da mais alta valia para a nossa agricultura.  

Desse trabalho, intitulado "Mais do que uma Política Agrícola", constam as 10 propostas mais importantes, com as respectivas alternativas de solução, desdobradas nos seguintes tópicos: o financiamento do agronegócio; a modernização da comercialização interna e externa; a desoneração e simplificação tributária; a redução dos custos; o desenvolvimento tecnológico no setor; a modernização da defesa agropecuária; a sustentabilidade da agricultura; a agricultura familiar; a política fundiária e a coordenação institucional do agronegócio.

 

Com a explosão demográfica que vem por aí no próximo século, milhões de bocas a mais para alimentar, imensos contingentes de população urbana apenas consumindo produtos agrícolas e pouco se dedicando ao campo, é necessário que se pense na agricultura com mais responsabilidade e menos amadorismo.  

O Brasil do início do século é mais de 80% cidade e menos de 20% campo, mas as cidades não sobreviverão sem o campo, de onde lhes chega à mesa o alimento diário.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/01/1999 - Página 1626