Pronunciamento de Júlio Campos em 18/01/1999
Discurso no Senado Federal
CLAMOR EM FAVOR DE UM PROJETO NACIONAL DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO DA CIENCIA E TECNOLOGIA NO BRASIL.
- Autor
- Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
- Nome completo: Júlio José de Campos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
- CLAMOR EM FAVOR DE UM PROJETO NACIONAL DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO DA CIENCIA E TECNOLOGIA NO BRASIL.
- Publicação
- Publicação no DSF de 19/01/1999 - Página 1695
- Assunto
- Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
- Indexação
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- DEFESA, INVESTIMENTO, BRASIL, PROJETO, AMBITO NACIONAL, APOIO, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO, SETOR, PESQUISA, CIENCIA E TECNOLOGIA, PROMOÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO, PAIS.
O SR. JÚLIO CAMPOS
(PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje todas os oradores que me antecederam falaram sobre economia, falaram sobre o aumento do dólar, sobre a queda do real, sobre os problemas que vive este mundo globalizado; mundo este que, agora, queria transformar o Brasil na "bola da vez", o que, oxalá, não será realidade.
Ocupo na tarde de hoje esta tribuna não para falar de economia, mas de um assunto muito importante para o nosso País: ciência e tecnologia.
O desenvolvimento de uma Nação está, neste final de milênio, mais do que nunca ligado, de modo umbilical, ao nível educacional de sua população e à sua capacidade de gerar novos conhecimentos em ciência e tecnologia.
Educar e fazer ciência e tecnologia são ações que demandam que a sociedade tenha de si mesma uma imagem bem definida e, a partir dela, um projeto de desenvolvimento que impulsione tais ações. Se assim não for, todo esforço que se fizer cairá no vazio por falta de objetivo; ou pior, gerar-se-á um processo de imobilização da sociedade por falta de motivação para empreender. Em ambas as alternativas, o resultado será um só: o atraso e a vassalagem desta Nação por aquelas que tomarem a dianteira científica e tecnológica em um mundo cada vez mais competitivo.
Enganam-se aqueles que pensam que mantendo os seus povos submissos pela ignorância preservarão assim o seu poder pessoal e conquistarão posição de preeminência no cenário mundial. Engano fatal que levou o Sr. Ferdinand Marcos, ditador das Filipinas, ao fim que teve. Políticas de exclusão e de domínio pela ignorância são visões míopes do ser humano e da humanidade. Jamais tais posturas conduzirão quaisquer povos ao sucesso.
Desde que a história da humanidade começou a ser escrita, só as nações de maior desenvolvimento científico-tecnológico é que se destacaram sobre os seus contemporâneos, qualquer que seja o período da história que se analise. Da antigüidade mais remota aos nossos dias, a força do saber acabou sempre por prevalecer sobre qualquer outra.
É este, então, o imperativo para as nações que se querem manter soberanas e autodeterminadas: desenvolverem-se em ciência e tecnologia, em todas as camadas sociais. Às demais nações não restará muito espaço a não ser a servidão aos detentores do conhecimento.
Srªs e Srs. Senadores, não haverá espaço para um Brasil independente e autodeterminado se ele não tiver acesso a um saber mais atualizado. Importar tecnologia é oportuno quando se torna inútil refazer caminhos que outros já trilharam e que estão disponíveis para serem compartilhados. Todavia, cada povo, cada nação têm suas próprias peculiaridades que lhes abrem o espaço para forjar seus próprios projetos de desenvolvimento científico e técnico.
Sr. Presidente, não nos iludamos: produzir novos conhecimentos é a moeda forte na distribuição atual do poder econômico mundial. Se há quem duvide dessa realidade, basta que olhe para o atual perfil de distribuição das descobertas e da geração de novos conhecimentos entre países do mundo. Ao final da década de 80, 67% da produção científica e tecnológica do planeta saía de apenas 7 países. Desses, apenas os Estados Unidos da América, sozinhos, produzem 35% do que a humanidade gera em novos conhecimentos, o que confirma sua hegemonia planetária neste final de século. Por isso todos dizem: "Os Estados Unidos mandam no mundo!" Realmente!
Nesse competitivo contexto de desenvolvimento científico e tecnológico, como fica o nosso Brasil? Infelizmente, estamos mal. Muito mal. Falta-nos o alicerce em cima do qual gerar conhecimento: um projeto nacional de desenvolvimento que contemple todas as áreas do interesse nacional.
Sistematicamente, ouvimos que o País deve escolarizar sua população. Mas para quê, se não dispomos de um projeto de formação de mão-de-obra que eleja as áreas de conhecimento e produção de que necessitamos? Como gerar, então, massa crítica para trabalhar o saber da grande maioria de nossa população? Estudar para quê? É o que se pergunta o cidadão comum, a quem não é oferecida a perspectiva do uso dos conhecimentos que adquire.
Exemplo claro do que é ter um projeto nacional de desenvolvimento é o que fazem os Estados Unidos, com o Programa Viagem a Marte. Mais do que a simples investigação do que acontece em um planeta bem distante da Terra, o que querem os Estados Unidos é dominar o processo de reciclagem de materiais, conhecimento tecnológico fundamental para manter a hegemonia no próximo milênio. As longas viagens até Marte exigem, pela dificuldade de eliminar os dejetos, inclusive os humanos, que se desenvolvam sofisticados processos de reciclagem de materiais, visando ao seu reaproveitamento ou neutralização. Esse gigantesco projeto envolve não só agências de governo, como entidades privadas, empresas, universidades, laboratórios, indústrias, numa abrangente mobilização de boa parte da sociedade americana, com vistas ao futuro.
Sr. Presidente, Srs. Senadores, esse tipo de projeto é o de que o Brasil necessita: projetos mobilizadores da sociedade que tenha como objetivo alçar o Brasil ao topo das nações desenvolvidas.
Dentro dessa perspectiva, inclui-se o apoio eficaz às instituições efetivamente produtivas ou que têm potencial de vir a sê-lo. Nessa situação estão boa parte das universidades públicas federais, algumas estaduais e diversos centros de pesquisa do complexo do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq, onde se produz a quase totalidade das pesquisas no Brasil. Dessas, as dez mais produtivas são as universidades públicas de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pernambuco e a nossa Universidade de Brasília. A conclusão que se tira é que fazer pesquisa no Brasil é, sobretudo, uma atividade estatal, mas não um projeto da sociedade.
Sr. Presidente, Srs. Senadores, há de haver por trás de qualquer investimento que se faça neste País um projeto de Nação, de desenvolvimento, de construção de um certo tipo de sociedade para que se possa falar em políticas de ciência e tecnologia.
Distribuir gratificações por atividades de pesquisa não significa ter uma política de desenvolvimento tecnológico e científico. Mais parece querer tapar o sol com a peneira; uma espécie de "cala boca" para os famintos e abnegados brasileiros que ainda têm coragem de se dedicar aos estudos; uma pálida tentativa de evitar que eles emigrem para outros países, onde dispõem de melhores oportunidades de trabalho. Mesmo assim, ao visitar os melhores centros de pesquisas nos Estados Unidos e na Europa, é comum encontrarmos brasileiros entre seus principais pesquisadores.
Um projeto de desenvolvimento social só dá resultados se ele é consentido pela sociedade, que nele se engaja. Assim fazem os norte-americanos com seus projetos bilionários de viagens espaciais, cujas conseqüências, no conhecimento e no saber, são incomensuráveis e cujas repercussões tecnológicas são difíceis de avaliar pelos que estão fora do processo. Enquanto isso, no Brasil, o processo de sucateamento dos centros de pesquisas avança em velocidade cada vez mais acelerada. A pretexto da falta de recursos, deixa-se ao desamparo um grande parque de laboratórios e valiosos cérebros, cuja formação e montagem custaram vultosos recursos da Nação e cuja produtividade está comprometida pelo desprestígio a que estão relegados.
Sr. Presidente, eu sei que não sou o primeiro e não serei o último a clamar por providências na área de ciência e tecnologia neste País. Concluo o meu mandato no dia 31 de janeiro próximo e espero, todavia, que algo seja feito para tirar o Brasil do impasse em que nos encontramos.
Não nos faltam questões a resolver e cuja solução passa pela pesquisa tecnológica ou científica. A crônica seca no Nordeste de V. Exª, Senador Ronaldo Cunha Lima, que representa o sofrido Estado da Paraíba, precisa ser estudada para que esse problema seja resolvido; o necessário aumento de nossa produtividade agrícola, pela produção de novas sementes e melhoria da qualidade do solo, principalmente do cerrado; a modernização da nossa indústria eletroeletrônica ; o aproveitamento racional e ecologicamente equilibrado de nossos importantes recursos naturais; a produção de medicamentos a partir da vastíssima flora de que dispomos; o aprofundamento do conhecimento dos recursos da Amazônia e de seu uso produtivo e saudável. Muitos dizem que a Amazônia deixaria de ser nossa devido ao grande interesse das multinacionais naquela região. Devo ainda citar o aperfeiçoamento da medicina tropical adaptada às condições brasileiras; a pesquisa em ciência de base. Essas são algumas das inúmeras questões à espera de que o País lhes dê adequadas e urgentes respostas.
Preocupo-me muito com o abandono que esse setor teve nesses últimos tempos. Ainda recentemente, por ocasião da reforma administrativa no final deste Governo Fernando Henrique, chegou-se até a comentar a possibilidade da extinção do Ministério da Ciência e Tecnologia. Felizmente, porque Sua Excelência é um homem preparado, um intelectual, essa proposta não foi adiante e continuamos com o nosso Ministério, que, agora, não mais está nas mãos do professor Israel Vargas, mas sob o comando de Bresser Pereira.
Temos certeza de que o Presidente da República há de buscar o mínimo de recurso necessário para o bom funcionamento do Ministério da Ciência e Tecnologia. Queremos, sim, um projeto brasileiro que seja suprapartidário e que envolva toda a sociedade civil, traduzindo, indiscutivelmente, a visão que temos de nós mesmos nos próximos séculos. Não temos mais muito tempo para perdermos em discussão sobre nossa identidade, se quisermos que ela não nos seja imposta de fora para dentro. Há que se estabelecer, já e agora, um fórum nacional que trace as linhas mestras e os meios de realização de um projeto nacional em favor da ciência e da tecnologia.
Espero que algum Senador que vá continuar o seu mandato ou que esteja chegando para iniciá-lo continue essa nossa luta permanente em favor da ciência e da tecnologia no nosso Brasil.
Muito obrigado.
ntÅ ß