Discurso no Senado Federal

FALENCIA E INVIABILIDADE DA ATUAL POLITICA ECONOMICA DO GOVERNO. RELATORIO SOBRE A REUNIÃO DOS GOVERNADORES DA OPOSIÇÃO, OCORRIDA ONTEM EM BELO HORIZONTE, OCASIÃO EM QUE FOI ANALISADA A INSOLVENCIA DE SEUS ESTADOS. TRANSCRIÇÃO DA CARTA DE BELO HORIZONTE, ASSINADA POR TODOS OS GOVERNADORES DE OPOSIÇÃO.

Autor
Emília Fernandes (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. DIVIDA PUBLICA.:
  • FALENCIA E INVIABILIDADE DA ATUAL POLITICA ECONOMICA DO GOVERNO. RELATORIO SOBRE A REUNIÃO DOS GOVERNADORES DA OPOSIÇÃO, OCORRIDA ONTEM EM BELO HORIZONTE, OCASIÃO EM QUE FOI ANALISADA A INSOLVENCIA DE SEUS ESTADOS. TRANSCRIÇÃO DA CARTA DE BELO HORIZONTE, ASSINADA POR TODOS OS GOVERNADORES DE OPOSIÇÃO.
Aparteantes
Ernandes Amorim, Jefferson Peres, José Eduardo Dutra.
Publicação
Publicação no DSF de 20/01/1999 - Página 1720
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. DIVIDA PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMPROMETIMENTO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, ESTADOS, MUNICIPIOS, PREJUIZO, APOSENTADO, PENSIONISTA, FUNCIONARIO PUBLICO, PRODUTOR RURAL, EMPRESA NACIONAL.
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, CARTA, ASSINATURA, GOVERNADOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), ESTADO DE ALAGOAS (AL), ESTADO DO AMAPA (AP), ESTADO DO ACRE (AC), REIVINDICAÇÃO, NEGOCIAÇÃO, DIVIDA MOBILIARIA, ESTADOS, UNIÃO FEDERAL, DEFESA, PACTO, FEDERAÇÃO, BRASIL.

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a crise que se instalou no País está demonstrando a verdadeira face da política econômica imposta ao Brasil pelas grandes corporações multinacionais, pelos organismos internacionais e, especialmente, pelos agiotas sem pátria.  

Um plano que originalmente deveria estar a serviço do desenvolvimento econômico e social da Nação brasileira transformou-se em algoz dos Estados e dos Municípios, das empresas, dos trabalhadores, dos produtores rurais, dos funcionários públicos e dos aposentados.  

Diante disso, antes de seguir cumprindo ordens externas ou aceitando as pressões do Executivo, as autoridades deste País e, em especial, o Congresso Nacional devem resgatar sua função e dever primordial, que é a defesa do Brasil, de sua economia e de seu povo.  

É preciso, antes de mais nada, que se diga que o que assistimos agora, com todos os seus desdobramentos negativos, é de responsabilidade exclusiva do atual Governo, da sua equipe econômica e, em especial, do seu Chefe máximo, o Presidente da República Fernando Henrique Cardoso.  

O que o Governador de Minas Gerais, Itamar Franco, primeiramente, num gesto de altivez, soberania e compromisso com o seu povo, e os demais Governadores estão fazendo é expor publicamente o quadro de falência e de inviabilidade da política econômica e social em vigor.  

Antes de atacá-los, o Governo e mesmo esta Casa devem ouvi-los, no mínimo porque representam o povo dos Estados da Federação, a não ser que desconhecer definitivamente o pacto federativo, princípio básico da construção nacional, também integre o acordo com o FMI.  

Srªs e Srs. Senadores, o Rio Grande do Sul, o Estado que represento nesta Casa, que entrou no dia 15 de janeiro com uma ação cautelar contra a União no Supremo Tribunal Federal, buscando a renegociação das condições de pagamento, assim como todos os demais Estados, não tem condições de cumprir com os contratos pactuados com o Governo Federal.  

Os termos do contrato prevêem um comprometimento de 12,5% da Receita Líquida Real (RLR) com pagamento em 1999 e de 13% para os próximos anos, totalizando um desembolso para este ano de cerca de R$660 milhões, ao que se devem somar ainda outros R$140 milhões de pagamentos considerados extra-limite, totalizando R$800 milhões.  

Na ação cautelar, seus autores afirmam que "o Estado do Rio Grande do Sul envida esforços na busca do diálogo em favor do bem comum e, caso não se viabilize tal desiderato, continuará confiante de que o Supremo Tribunal Federal, como garantia do pacto federativo insculpido em nossa Carta Magna, é o fórum para debater a eficácia do gravame imposto pela União aos entes federados".  

Para impedir a intervenção federal em virtude do débito e evitar que, por força do acordo, o Estado seja considerado inadimplente, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul ofereceu como caução uma quantia de R$31.260.537,09 (trinta e um milhões, duzentos e sessenta mil, quinhentos e trinta e sete reais e nove centavos), depositada na Caixa Econômica Federal, em conta vinculada à ação, nos termos do Decreto-Lei n° 759/69.  

Esse valor corresponde à primeira parcela da dívida vencida em 15 de janeiro de 1999, que, somada a uma segunda parcela, totaliza cerca de R$57 milhões, que devem ser pagos durante o mês de janeiro, por conta do acordo feito pelo governo anterior.  

Aceitar essas condições, que impedem desenvolver o Estado e atender às necessidades sociais da população, é abdicar do direito e do dever de governar, que não é apenas uma prerrogativa, mas uma delegação democrática das urnas, conferida pelos eleitores nas últimas eleições.  

As imposições contidas no acordo feito pelo Governo anterior não se sustentam diante de um quadro de recessão, em que a receita do ICMS no Rio Grande do Sul, que era de 8,3% do total nacional em 1994, caiu para menos de 7% em 1998, como denunciamos durante a recente campanha eleitoral.  

Ainda, em conseqüência dessa política econômica desastrosa, as contas do Estado apresentaram, sem os recursos advindos das privatizações que foram feitas no meu Estado, déficits sucessivos anuais, atingindo R$20 milhões em 1995; R$800 milhões em 1996, R$1,2 bilhão em 1997 e valores ainda maiores em 1998 - ao que se somam, ainda, as perdas por conta da Lei Kandir e do FEF, que atingem cerca de R$700 milhões.  

A decisão do Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Carlos Velloso, de autorizar o governo gaúcho a depositar em juízo, na Caixa Econômica Federal, a parcela da dívida do dia 15 de janeiro, ampara-se na certeza "de que estão em debate, no litígio entre a União e o Estado-membro, princípios constitucionais embasadores do pacto federativo, dos quais o Supremo Tribunal Federal é o guardião maior".  

Srªs e Srs. Senadores, nesse sentido, além das medidas já adotadas pelos Estados individualmente, a reunião realizada ontem, dia 18 de janeiro de 1999, em Belo Horizonte, reunindo Governadores dos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Amapá e Acre, reafirmou a defesa do pacto federativo e a necessidade de renegociação das dívidas estaduais.  

Presente na reunião, ao lado de outros Senadores, Deputados Federais e Prefeitos, que foram até Minas Gerais levar seu apoio, constatei e quero registrar o sentimento de compromisso com o Brasil, de soberania e de civismo que marcou o encontro, traduzindo a história e o exemplo que, neste momento, o povo mineiro, mais uma vez, dá ao povo brasileiro.  

Denunciando a quebra do pacto federativo, a inviabilidade dos acordos firmados e apontando o caminho da renegociação, o encontro definiu uma comissão representativa para buscar o diálogo com os Poderes Legislativo e Executivo, formada pelos Governadores Anthony Garotinho, Olívio Dutra e Ronaldo Lessa; e também marcou uma nova reunião desses Governadores para o próximo dia 05 de fevereiro, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.  

Encontro que, segundo informações, se dará no sentido da busca da negociação e do diálogo, o mais breve possível, entre os Governadores e o Presidente da República. Isso é o que esperamos.  

Os compromissos e propostas que resultaram do encontro foram inscritas na "Carta de Belo Horizonte", cuja transcrição nos Anais desta Casa solicito agora, pela sua importância, com a certeza de que ela dá início a uma nova era na história política do País.  

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - V. Exª me permite um aparte, Senadora Emilia Fernandes?  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Concedo o aparte, Senador.  

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Senadora Emilia Fernandes, V. Exª traz ao Senado, com muita competência, a situação em que se encontra o Estado do Rio Grande do Sul, Estado aqui tão bem representado por V. Exª. Faz também um relato do que presenciou ontem na reunião em Belo Horizonte. Esta é a Casa da Federação. Seria fundamental que o Senado da República se inserisse não apenas como mero espectador, não apenas como um mero cartório onde são carimbados ou depositados os acordos entre União e Estados, mas que se inserisse como ator principal, como ator político, neste momento em que estamos vivendo uma autêntica quebra do pacto federativo. Por isso, aproveito o pronunciamento de V. Exª para, no plenário do Senado, como já o fiz na Comissão, registrar o meu misto de indignação e perplexidade. Indignação pela postura absurda que foi tomada pelos Senadores da base governista na Comissão de Assuntos Econômicos, e perplexidade porque, no meu entendimento, a decisão tomada pela maioria daquele fórum foi quase uma confissão de inutilidade. Na medida em que o requerimento de autoria dos Senadores Eduardo Suplicy e Jefferson Péres, que simplesmente convidava os Governadores dos Estados a comparecerem àquela Comissão para expor a situação dos seus Estados e propiciar um debate naquele fórum técnico e político sobre esse assunto, foi rejeitado pelo voto da maioria, a Comissão de Assuntos Econômicos, ao invés de estar ajudando o Governo, estar ajudando o Brasil, acabou, na minha opinião, por prestar um desserviço à Nação. Não acredito que ajudar o Governo, ajudar o Brasil seja, sob quaisquer argumentos, sob quaisquer circunstâncias, tomar decisões que reduzem o papel do Congresso Nacional e, particularmente, o papel do Senado Federal. Parabenizo V. Exª pelo seu pronunciamento e agradeço o aparte. Muito obrigado.  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Agradeço o aparte e me somo à preocupação manifestada por V. Exª. A nossa Carta Magna estabelece a representatividade dos Estados através de três representantes eleitos por cada um dos Estados para, conjuntamente, discutirem as questões nacionais e observarem, de perto e cuidadosamente, as questões dos seus Estados. Nada mais correto, nada mais oportuno que esta Casa ouvisse, urgentemente, os governadores, os prefeitos municipais, estabelecendo-se um grande fórum de debate nacional, não apenas em relação aos endividamentos. Penso que deveríamos ir muito além da própria política nacional, econômica e social, porque vemos que a direção dada, nesses últimos quatro anos, se esmorece e se enfraquece - realmente não está correta e não está atingindo os seus objetivos.  

Lamentamos profundamente que esta Casa constantemente abra mão das suas prerrogativas em detrimento de um apoio que considero que não é sincero, porque o apoio sincero e honesto, de amigo para amigo, de companheiro para companheiro, deve ser aquele que estabelece com clareza o que está certo e o que está errado.  

A postura do Congresso Nacional realmente deixa dúvidas e o coloca vulnerável a críticas, fragilizando principalmente o poder que o Senado deveria ter diante do Poder Executivo e até mesmo a posição que, hoje, toda a sociedade brasileira está a cobrar.  

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Permite-me V. Exª um aparte?  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Pois não. Ouço o aparte de V. Exª, nobre Senador Jefferson Péres.

 

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Nobre Senadora, meu aparte é apenas para corroborar as palavras do nobre Senador José Eduardo Dutra. Hoje saí contristado da reunião da Comissão de Assuntos Econômicos. Sou do PSDB, da base governista portanto, mas sem abdicar do meu direito de crítica, e fiquei perplexo que uma Comissão do Senado, a Casa da Federação por excelência - o Congresso, num momento de crise nacional, deveria estar no centro da crise, discutindo, buscando soluções -, por uma avaliação, a meu ver, inteiramente equivocada dos partidos do Governo, tenha rejeitado o meu requerimento e do Senador José Eduardo Dutra. E não voltou atrás nem quando tentamos reduzir o número de Governadores aos três integrantes da comissão de Belo Horizonte. O Senado, pela sua Comissão de Assuntos Econômicos, recusou-se a receber, ouvir e debater com três Governadores. Senadora, fiquei realmente desolado de ver como um Poder da República se omite e se demite do seu papel na vida nacional. Era o que tinha a dizer. Parabéns pelo seu pronunciamento!  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Cumprimento V. Exª pela sua postura clara, reafirmando as atribuições e a vontade que cada Parlamentar deve ter em relação ao seu País e aos Estados que representam. Queremos, ainda, mais uma vez, chamar o Congresso Nacional para uma reflexão. Esta Legislatura recusou a vinda dos Governadores, dos representantes apontados, que se colocaram à disposição de vir a esta Casa. No entanto, segundo as informações que temos, o Presidente da República já teria manifestado, publicamente, o desejo de se reunir com esses governadores. Por que, então, o Congresso Nacional se omite diante disso? Mais uma vez, vamos pagar um alto preço.  

Para evitar isso é que queremos que, da mesma forma como ocorreu com os representantes dos Estados, que se reuniram em Belo Horizonte, as autoridades municipais também comecem a se mobilizar neste momento. Eles já fizeram uma grande manifestação no ano passado: deslocaram-se para Brasília e apresentaram uma proposta da qual constavam vários itens - infelizmente, até hoje não receberam nenhuma resposta do Poder Executivo.  

Que governadores, prefeitos e a sociedade se manifestem. Que o Congresso Nacional pense e repense a sua posição, porque sabemos que os municípios estão muito próximos de uma situação explosiva, decorrência da penúria e do empobrecimento a que vêm sendo submetidas as suas populações.  

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Permite-me V. Exª um aparte?  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Chamo a atenção para a situação do meu Estado e o faço com conhecimento de causa. O Rio Grande do Sul é um Estado que, se comparado a outros, está em melhor situação. No entanto, mesmo lá, temos diferenças acentuadas: a metade sul do Rio Grande vive um desencontro econômico e social, reconhecido até pelo Presidente da República; a região da fronteira se encontra profundamente empobrecida e o extremo norte também enfrenta problemas muito sérios. Se formos analisar o restante do País, encontraremos situações até mais graves.  

Concedo o aparte a V. Exª, Senador Ernandes Amorim.  

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Nobre Senadora, há pouco fiquei sabendo que foi rejeitada a vinda dos governadores - ou de alguns dos governadores - a esta Casa. A despeito do refinanciamento das dívidas dos Estados, vivemos hoje um triste momento na área da economia. Esta Casa tem sua parcela de culpa, porque, na hora de refinanciar os Estados, de rolar as dívidas, algumas vezes agiu de maneira errada. Prova disso é que foi concedido um crédito ao Estado de Rondônia sem autorização para a assinatura do contrato e para o estabelecimento da modalidade de pagamento. Além disso, criaram um termo aditivo possibilitando mais dívidas. Isso foi feito pelo Banco Central, pela área econômica, sem a anuência desta Casa. Apresentei um requerimento para obter informações do Ministro sobre esse assunto, que foi respondido com a confirmação de que tudo havia sido feito sem autorização desta Casa. Houve, portanto, irregularidades - inclusive cometidas por esta Casa - envolvendo as negociações entre o Governo Federal, o Senado e os Governos estaduais. Fico decepcionado e envergonhado ao ver a submissão ao sistema por parte de alguns colegas senadores. Não é possível que esta Casa tenha de andar de joelhos, submetendo-se à vontade de quem quer que seja, sendo-nos tirado até o direito de ouvir os governadores e os prefeitos da maneira como ouvimos o Presidente do Banco Central, o próprio Ministro e tantos outros representantes da área econômica. Entristece-me e decepciona-me a situação em que se coloca o Senado neste momento: em razão da posição de alguns, beneficiados por esse Governo, querem deixar os outros senadores de joelhos, submissos a uma vontade que não é a deles.  

A SR ª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Agradeço o aparte de V. Exª e o incorporo ao meu pronunciamento.  

Diante dessa situação e das considerações que aqui foram feitas, espera-se que o Governo Federal, neste momento, tenha um mínimo de senso de realidade e compreenda a necessidade de se encontrar uma solução para a situação dos Estados e dos Municípios, sob pena de isolar-se irreversivelmente, antecipando uma crise institucional de graves proporções.  

"Quando o povo encontra-se unido em torno do seu governador" - como ocorre em Minas e em outros Estados brasileiros - "pode-se ficar certo de que algo histórico está para acontecer", definiu com clareza e profundidade o líder trabalhista Leonel Brizola, também presente no encontro de Minas Gerais, ontem, ressaltando a importância do momento que estamos vivendo.  

É com esse sentimento que me solidarizo com a posição adotada pelo Governador Itamar Franco, que apóio decisão do Governador do meu Estado, Olívio Dutra, e de todos os demais Estados da Federação - como o Rio de Janeiro, por exemplo -, que exigem renegociar as suas dívidas.  

Desta tribuna, não nos cansamos de alertar para o risco de se chegar onde chegamos e, ainda, principalmente, para as causas que fizeram a economia atingir esse ponto de estrangulamento, desordem e caos.  

Quando assumi, adverti que apenas comemorar inflação baixa era insuficiente, lembrando que o México havia quebrado com a inflação próxima de zero. Ao mesmo tempo, pedia um projeto de desenvolvimento econômico, com políticas industrial, agrícola e de geração de empregos.  

Também cobramos, em todos os momentos, a adoção primordial de uma reforma tributária que afirmasse o pacto federativo, desonerasse a produção e democratizasse os impostos, em especial em relação às pessoas físicas.  

Desde então, o que se viu foi que essa política de dependência ao capital estrangeiro especulativo aumentou sobremaneira, transformando definitivamente o Brasil em refém do que há de mais arcaico, apodrecido e desumano no sistema econômico mundial.  

O Governo manteve o câmbio congelado, escancarou criminosamente as fronteiras do País às importações, até mesmo de produtos primários, e fez das taxas de juros praticadas no Brasil as maiores do mundo.  

O resultado não poderia ser outro: desemprego em massa, descapitalização da agropecuária, falência da indústria nacional e dificuldades econômicas e sociais extremas para Estados e Municípios.  

Diferente da posição adotada pelos governadores, ao invés de postar-se com dignidade, grandeza e soberania, que requer a nossa condição de nona economia do mundo, o atual governo preferiu trilhar a senda da submissão internacional, que leva apenas a mais concessões, a mais sacrifícios e sofrimento para o povo.  

Antes de defender, preservar e ampliar os interesses nacionais, como fez Getúlio Vargas, em plena Segunda Guerra Mundial, o atual governo investe contra o país, contra sua economia, contra seus trabalhadores, contra as mulheres, contra os servidores públicos e aposentados, atribuindo a eles a culpa de sua incompetência e subserviência.  

Agora mesmo, pela quinta vez, o Governo investe sobre aqueles que consideramos não serem os culpados dos desmandos e da falta de recursos deste País: os assalariados e os funcionários públicos. Mais uma vez o Governo busca confiscar, de forma covarde e inconstitucional, os salários dos servidores públicos e aposentados por meio da cobrança de contribuição previdenciária, aumentando as dificuldades de sobrevivência para pessoas que já pagaram para garantir seus direitos atuais.  

Essa postura submissa aos banqueiros e aos especuladores internacionais, que tem contado com o aval do Congresso Nacional, infelizmente, além de não aplacar a voracidade dos especuladores, levou o País a um processo de destruição sem precedentes na história recente do Brasil.  

As estatais estratégicas foram vendidas, Estados e Municípios tiveram seus recursos confiscados, funcionários públicos estão com salários congelados há mais de quatro anos, direitos sociais foram cortados. E qual foi, ou está sendo, o resultado? Estamos a caminho do desenvolvimento e da geração de empregos?  

Os assalariados estão sendo confiscados, tendo seus rendimentos reduzidos por conta do aumento dos reajustes de preços, além da inflação, do aumento do Imposto de Renda e da cobrança da CPMF, entre outros descontos. E qual tem sido o benefício para o povo? Estamos promovendo a melhoria das condições de vida das pessoas, das famílias e das populações?  

Não. O Brasil foi empurrado para trás, para a desnacionalização, para a falência de sua agropecuária, para a abertura indiscriminada de suas fronteiras, para o desemprego recorde e para a maior taxa de juros do mundo, como já disse, ameaçando retroceder ao período pré-Vargas.  

E o mais grave de tudo isso é que os sacrifícios impostos à Nação, em grande parte avalizados pelo Congresso Nacional, não têm levado a outro caminho que não o do aumento das taxas de juro, como ocorreu novamente ontem, com o conseqüente aumento das dívidas interna e externa.  

A dívida interna, por exemplo, passou de cerca de 60 bilhões no início do mandato do atual presidente - em 1995, para mais de US$ 400 bilhões neste início de ano, aniquilando o sistema produtivo, gerando desemprego e enriquecendo ainda mais os únicos beneficiários dessa política, os especuladores internacionais.

 

Frente a isso, é hipocrisia atacar os salários dos inativos, para juntar cerca de US$ 5 bilhões, quando apenas com a devalorização do Real, da noite para o dia, o governo aumentou a dívida externa em mais de US$ 20 bilhões.  

Srªs e Srs., é preciso mudar essa política nefasta aos interesses do Brasil e do povo brasileiro, o que passa por uma ampla, séria e responsável discussão nacional, envolvendo todos os segmentos sociais, econômicos e políticos da sociedade.  

O atual Governo, pela sua postura de subserviência, pela sucessiva ineficácia de suas medidas e pela arrogância ditatorial, perdeu a autoridade frente ao seu povo e diante do mundo, o que impõe a presença efetiva da sociedade e de seus representantes - parlamentares, governadores, prefeitos, a sociedade organizada representativa de trabalhadores e empregadores -, nas graves decisões que precisam ser tomadas com urgência.  

O caminho da submissão ao FMI, da dependência ao capital especulativo e das altas taxas de juros já se mostraram inviáveis, tanto no Brasil, quanto em outros países do mundo que, recentemente, experimentaram o fracasso dessas políticas.  

No final de 1997, diante da crise das bolsas, o Congresso aprovou, contra o voto da Oposição, um pacote fiscal para o Governo arrecadar US$50 bilhões, com a promessa de reduzir juros, o que não ocorreu.  

Agora, radicalizando esse processo de destruição da economia nacional, alguns dias depois da liberação do câmbio, os jornais anunciam que o Governo pretende usar os juros altos para conter a inflação, o que vai trazer, certamente, mais falências, desemprego e miséria.  

Ou seja, nem o País submeter-se ao FMI, chegando ao ponto de ter um escritório do Fundo instalado no Brasil, como informam os jornais, e nem o Congresso Nacional sujeitar-se as pressões e chantagens do Executivo, é caminho para se buscar alternativas para o Brasil, com a realizada encarregou-se de mostrar nestes últimos anos.  

O momento que estamos vivendo é de extrema gravidade, exigindo de todos nós análise dos fatos, reflexão sobre a atual política econômica e suas conseqüências e, acima de tudo, coragem e independência para decidir.  

Os governadores já se apresentaram, dando a sua contribuição cívica e patriótica ao debate, sob diversas formas. O Congresso Nacional está sendo chamado a se posicionar, mas, hoje, infelizmente, deu essa triste demonstração de submissão e conivência, abrindo mão de suas prerrogativas. O povo, por meio de suas entidades e organizações, como sempre, está disposto a participar. Temos certeza disso.  

Portanto, o Congresso Nacional, em particular, talvez tenha - e acredito que tenha aberto mão disso -, neste momento, a sua derradeira chance de mostrar-se independente e soberano. Vejam, Senhores, que, neste momento em que estamos usando da tribuna, a Comissão de Assuntos Econômicos, que se reuniu à tarde e deliberou sobre a questão, teria tomado outra posição, porque a vinda dos governadores não é para fazer oposição ao Governo Federal, mas para ouvirmos e sabermos da realidade pelos próprios representantes eleitos pelo povo. Por isso tínhamos a idéia de que essa seria uma grande chance. Infelizmente, abriu-se mão disso. Vamos seguir com outros empreendimentos e outras formas de manifestar o nosso interesse e a nossa participação nesse processo.  

É preciso aprofundar o debate nacional no sentido de realizar uma verdadeira reforma tributária, fortalecer o pacto federativo, valorizando Estados e Municípios, reduzir as taxas de juros, estimular a indústria nacional, fortalecer o mercado interno e gerar empregos.  

Ao Governo, por sua vez, está colocado escolher entre o debate e a busca democrática de soluções, que passa por ouvir os governadores, o Congresso Nacional, os empresários e os trabalhadores, ou o enfrentamento nas ruas, ao que a sociedade brasileira tem sabido recorrer com ordem, sabedoria e eficácia comprovada.  

Peço, Sr. Presidente, que faça parte do meu pronunciamento, na sua totalidade, a Carta de Belo Horizonte, assinada pelos governadores que lá estiveram no dia de ontem.  

Obrigada. 

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/01/1999 - Página 1720