Discurso no Senado Federal

PRONUNCIAMENTO DE POSSE NO SENADO.

Autor
Maria do Carmo Alves (PFL - Partido da Frente Liberal/SE)
Nome completo: Maria do Carmo do Nascimento Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • PRONUNCIAMENTO DE POSSE NO SENADO.
Aparteantes
Ademir Andrade, Antonio Carlos Valadares, Eduardo Siqueira Campos, José Eduardo Dutra.
Publicação
Publicação no DSF de 24/02/1999 - Página 2998
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • COMENTARIO, ELEIÇÕES, ESTADO DE SERGIPE (SE), ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA FRENTE LIBERAL (PFL).
  • APOIO, FIDELIDADE PARTIDARIA, DIVERGENCIA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO, ESPECIFICAÇÃO, FALTA, CRESCIMENTO, ECONOMIA NACIONAL, DESVALORIZAÇÃO, EMPRESA NACIONAL, DEFESA, LEGISLAÇÃO, PROTEÇÃO, PRODUTO NACIONAL.
  • ANUNCIO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, ORADOR, BENEFICIO, POVO, ESTADO DE SERGIPE (SE).

A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, este é um momento de grande importância na minha vida. Marca meu primeiro ato público como Senadora, cumprindo o mandato que honrosamente o povo sergipano me confiou. Sou, pela graça de Deus e pela vontade do povo do meu Estado, a primeira Senadora eleita na história de Sergipe, um Estado ainda pobre, localizado na sofrida região do Nordeste brasileiro. Ademais, assumo este mandato num instante extremamente grave da vida nacional, quando nosso País enfrenta uma das maiores, senão a maior das crises econômicas da nossa história. Crise que vem se somar a um quadro social dramático, onde ostentamos uma das mais cruéis concentrações de renda do mundo moderno e que, ao invés de melhorar, vem se agravando ao longo das últimas décadas. Por outro lado, convivemos com uma terrível desigualdade regional, onde a renda per capita dos nordestinos representa 1/3 da renda do Centro-Sul.  

Por tudo isso, sei das esperanças que o povo da minha terra depositou em mim ao me conceder seu voto para representá-lo na Câmara Alta. Quero, portanto, dizer aos sergipanos que dedicarei o melhor da minha mente e a totalidade das minhas forças para colaborar na construção de uma sociedade brasileira mais desenvolvida e, sobretudo, mais justa.  

Sou membro do Partido da Frente Liberal, mais do que isso, orgulho-me de ter sido fundadora do PFL ao lado do meu marido, o então Governador João Alves Filho, do nobre Presidente desta Casa, do Vice-Presidente da República, Marco Maciel, dos Senadores Hugo Napoleão e José Agripino, bem como de tantos outros valorosos líderes políticos nacionais.  

Naquele instante, escrevemos uma página de coragem e patriotismo da história política nacional. Afinal, fomos o partido decisivo para a redemocratização plena do Brasil.  

Recentemente, vivi um teste extremamente difícil durante a última eleição. Em Sergipe, o PFL se viu obrigado a lutar praticamente sozinho, quando os demais grandes partidos resolveram apoiar os candidatos oficiais. Numa disputa extremamente desigual, o isolamento do PFL foi de tal ordem que, para defender nossas idéias e não presenciar a extinção do nosso Partido no Estado, assumimos eu e meu esposo as candidaturas majoritárias – João Alves Filho, candidato ao Governo, e eu, ao Senado.  

Pois bem; não bastassem nossas imensas dificuldades, ainda tivemos toda a máquina federal a serviço da candidatura dos nossos adversários e, o que é mais grave, o apoio ostensivo do próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso ao candidato do PSDB. O Estado foi inundado por outdoors do Presidente abraçando seu correligionário local, além de os programas eleitorais divulgarem mensagens do Presidente, tecendo loas a favor do nosso adversário. Para completar, todo o programa "Pé na Estrada", com comícios eletrônicos do candidato Fernando Henrique Cardoso, foi coordenado exclusivamente pelo PSDB estadual, procurando-se passar a idéia de que seus candidatos eram os preferidos do Presidente.  

Não obstante, ainda que nos contrapondo à justa revolta de muitos dos nossos correligionários, pela forma injusta e desleal como fomos tratados, votamos, por uma questão de coerência partidária, a favor da candidatura de Fernando Henrique Cardoso. Já dei, portanto, em condições extremamente adversas, provas de minha fidelidade partidária.  

Nesta Casa, pretendo trabalhar seguindo as orientações partidárias emanadas do Líder, Senador Hugo Napoleão. Assim o farei, exceto quando ferirem minhas questões de consciência ou quando conflitarem com as idéias que têm norteado minha vida pública. Nesse contexto, incluo minhas profundas divergências com alguns aspectos essenciais da política econômica ora em vigor. É verdade que reconheço e aplaudo a estabilidade alcançada pelo Plano Real, na brilhante derrota sobre uma inflação, que já parecia inexoravelmente arraigada na sociedade brasileira. Sabe-se que, num processo inflacionário, os ricos, inteiramente, e a classe média, em parte, se protegem dos seus efeitos graças ao arcabouço protetor das cadernetas de poupança, letras de câmbio, RDBs, entre outros. Contudo, as camadas mais pobres, na faixa do salário mínimo, não têm como se proteger e assistem impotentes a defasagem dos seus salários, desvalorizados em 40%, 50% e até 80%, como vimos há bem poucos anos no País. Não há, portanto, como subestimar os efeitos benéficos do Plano Real, particularmente na sua fase inicial, quando funcionou como um fator inequívoco de redistribuição de rendas, atraindo milhões de brasileiros, que estavam inteiramente alijados de nossa economia, para o mercado do consumo.  

Por ironia, o grande sucesso inicial do Plano e os aplausos unânimes da Nação induziram a um grande equívoco: tratar o combate à inflação como um fim em si mesmo e não como uma etapa, ainda que importantíssima, para implantação de um modelo de desenvolvimento nacional que implicasse no crescimento da nossa economia com o conseqüente fortalecimento do nosso parque industrial e da nossa agricultura, além da vigorosa geração de empregos para o nosso povo.  

Mas, desafortunadamente, o que constatamos nesse período do Plano Real foi uma fase de sucateamento da empresa nacional, esmagada, de um lado, pela pletora dos juros mais elevados do mundo e, do outro, pela abertura escancarada do nosso mercado. As conseqüências estão aí, à vista de todos: a desnacionalização sem peias do nosso parque industrial, o crescimento brutal do endividamento das empresas que resistiram vender ao capital estrangeiro o seu controle acionário e, por fim, o desemprego crescente, alcançando índices recordes. Paralelamente, inúmeras empresas nacionais - algumas, modelos de eficiência - foram adquiridas por empresas estrangeiras.  

Cabe-me ressaltar que não tenho queda alguma nem simpatia pela xenofobia e que sou a favor de se incentivar o ingresso do capital estrangeiro no País, mas apenas quando ele vem para investir no nosso setor produtivo, não se limitando a comprar as nossas melhores empresas ou investirem maciçamente no setor especulativo. É preciso reiterar, aqui, a advertência que líderes empresariais, da estatura de Antônio Ermírio de Moraes e Eugênio Staub (Presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), vêm repetindo à exaustão: "não existe nação desenvolvida, com uma sólida economia, se não possuir empresas fortes". Ao contrário, seremos sempre um País de periferia, alijado dos centros de pesquisas de ponta e do verdadeiro desenvolvimento.  

Por outro lado, nestes últimos cinco anos, enquanto nossa dívida externa crescia em progressão aritmética, nossa dívida interna aumentava a índices geométricos. Enquanto isso, o fantasma do desemprego rondava os lares do nosso operariado - e já hoje alcançamos índices recordes de 8% em nossa taxa de desemprego. Segundo recente pesquisa formulada pela CNI - competentemente presidida pelo Senador Fernando Bezerra -, caso não haja uma profunda reversão em nossa economia, alcançaremos, em breve, o explosivo patamar de 12% de desemprego.  

Mas, enfim, o que aconteceu para que num período tão curto se acumulassem nuvens tão sombrias sobre a economia brasileira?  

Ocorre que os formuladores do Plano Real não souberam aproveitar o indubitável êxito inicial com a derrubada da inflação e aumento da renda real de milhões de brasileiros das faixas C e D, para consolidarem um modelo de desenvolvimento auto-sustentável, aprovando, no Congresso Nacional, as medidas essenciais. Obstinadamente, basearam todo o Plano no binômio juros altos e taxas de câmbio favorecidas e sacrificaram tudo no altar da preservação da estabilidade econômica. Para tanto, foi implantado um rígido modelo monetarista, e, sob o pretexto de não permitir o aumento dos preços no mercado interno, foram derrubadas as barreiras alfandegárias, inundando o nosso mercado de produtos importados, inclusive das quinquilharias mais supérfluas. Dessa maneira, criava-se um clima quase unânime de euforia nacional: nas classes mais pobres, por ascenderem ao sonhado mercado de consumo, ao tempo em que se massageava o ego das classes média e alta, deslumbradas com o consumo de produtos importados, os mais sofisticados. Nesse processo esqueceu-se de um fator essencial: a proteção das empresas nacionais. Nossa abertura econômica foi feita de forma intempestiva, numa insana rapidez, sem o necessário planejamento estratégico e sem a indispensável negociação com as nações para as quais abríamos o nosso ambicionado mercado interno. Por exemplo, se abrimos o mercado para a Ford nos vender os seus Taurus, os Estados Unidos deveriam abolir a taxa alfandegária de 50% do nosso suco de laranja; se a Chrysler queria nos vender os seus Cherokees, em compensação, o nosso aço deveria entrar no mercado americano sem pagar sobretaxas de até 80%. Na verdade, não estaríamos inovando as regras do mercado internacional, mas seguindo inúmeros outros exemplos bem-sucedidos, numa relação de troca.  

Nada disso, porém, foi feito, nem mesmo criada uma moderna legislação "anti-dumping" para proteger o nosso parque industrial de práticas desleais. Apenas para comparar: segundo a Cepal, o mercado norte-americano é protegido por dez mil mecanismos de defesa para a empresa nacional. Trata-se de um protecionismo supersofisticado, encoberto sob o manto retórico do livre mercado. Todos os países do Primeiro Mundo exercem a proteção dos seus preciosos mercados, seja por meio de mecanismos mais sofisticados, como nos Estados Unidos, seja por intermédio de uma legislação mais rígida, como na União Européia, seja pelo uso de leis draconianas, como as que protegem a fechadíssima economia japonesa, o mais hermético mercado do Primeiro Mundo.  

Nós, brasileiros, ingenuamente - para não dizer incompetentemente -, resolvemos praticar o laissez-faire, levando à falência inúmeras empresas nacionais, incapazes, sem as necessárias medidas de proteção, de concorrer com o chamado mercado globalizado. E não se trata de falta de competência para concorrer em pé de igualdade, mas da sua absoluta incapacidade, pelas distorções do custo Brasil. Como podemos, por exemplo, concorrer com os japoneses em produtos eletrônicos, quando pagamos juros de 40% ao ano, e os nipônicos apenas 2%? Isso para não falar a respeito de diferenças igualmente expressivas quando se comparam as legislações tributárias e trabalhistas dos dois países.

 

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - V. Exª me concede um aparte?  

A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL-SE) - Pois não, Excelência.  

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Senadora Maria do Carmo, Sergipe sabe da distância abissal que nos separa no campo da política. Eu pretendia fazer um aparte meramente protocolar de boas-vindas a V. Exª como representante eleita do povo sergipano para o Senado, mas não posso deixar de registrar que concordo com boa parte do pronunciamento que V. Exª vem fazendo até o momento. Várias das ponderações, dos questionamentos que V. Exª faz no seu pronunciamento já foram feitos, nesta Casa, por Parlamentares dos mais diversos Partidos e sempre foram classificados pelo Presidente da República ou pela cúpula governante deste País como manifestação de "fracassomania", de recalque de derrotados nas eleições e coisas do gênero. V. Exª, como afirmou, votou no Presidente da República, como política filiada ao PFL, que é o Partido da sua base de sustentação. Mas quero louvar o pronunciamento de V. Exª, um pronunciamento corajoso, muito claro e que, espero, venha a nortear a atuação de V. Exª nesta Casa, naturalmente, seguindo a orientação partidária, como V. Exª mesmo disse, tendo uma ação disciplinada, mas levantando essas ponderações tão importantes. Esperamos que, nesta Legislatura, tais ponderações venham a ser feitas por um maior número de parlamentares de partidos da base governista, para que o Senado não se comporte como mero carimbador, como aconteceu na legislatura passada; como uma Casa onde o Governo conseguia aprovar o que queria e da forma que queria. Espero, também, que o exemplo que V. Exª está dando neste momento se concretize nos seus votos e ações e inspire os outros Senadores da base governista, do PFL, ou de qualquer outro partido. Se for mantida a política econômica do Governo da forma como vem sendo aplicada nesses quatro anos - o que parece ser a intenção do Presidente da República -, o Brasil continuará a se deparar com problemas insolúveis. Parabenizo V. Exª. Boas-vindas, Senadora Maria do Carmo!  

A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL-SE) - Muito obrigada, nobre Senador José Eduardo Dutra.  

Analisemos, então, a receita monetarista de elevar os juros para conter o consumo e a inflação. O fato é que os nossos ministros esqueceram que essa receita só funciona dentro de um tempo limitado, sob pena de, quando usada em excesso, ao invés de curar pode matar o paciente. É o que lamentavelmente está ocorrendo no Brasil.  

Aqui a ensandecida política dos juros mais altos do mundo teve também o objetivo de manter uma relação cambial artificialmente elevada. Em decorrência, fomos ficando cada vez mais dependentes do famigerado capital especulativo internacional.  

A partir daí, vimos vários efeitos nefastos se acumularem na economia brasileira.  

O primeiro efeito do real supervalorizado em comparação ao dólar foi a fragilização da nossa capacidade de exportar e a promoção de déficits crescentes em nossa balança comercial. Tudo isso aumentou nossa demanda de capital estrangeiro a qualquer custo, ainda que perigosamente especulativo e promoveu o crescimento exponencial de nossa dívida interna. Em um perverso círculo vicioso, para atender a nossa necessidade crescente da entrada de divisas em moeda forte, fomos oferecendo, como pólo de atração, juros cada vez mais elevados, numa insensata autofagia.  

Um exemplo prático demonstra os efeitos perniciosos dessa política. Em 1993, o então Ministro Eliseu Rezende, em conferência fechada para nossa elite financeira na Febraban, apresentou o resumo de um plano que havia elaborado para eliminar totalmente a dívida interna que totalizava, à época, US$64 bilhões. Demonstrava que, contando com a venda de apenas 40% do total da participação societária da União em empresas estatais, avaliadas em mais de US$150 bilhões, zeraríamos nossa dívida interna e, conseqüentemente, acabaríamos com a ciranda financeira a que eram submetidos os operadores do Banco Central, além de eliminar o nosso principal foco inflacionário. Desafortunadamente, a presença do Ministro Eliseu Rezende foi rápida e S. Exª não consolidou o seu plano.  

Analisando nossa situação atual, constatamos nossa imensa fragilidade relativa. A maioria de nossas empresas estatais foram privatizadas, mas nossa dívida interna ultrapassa R$350 bilhões e, só de juros, neste ano, teremos de pagar a estonteante cifra de R$80 bilhões, bem mais do que o total da dívida vigente há apenas 6 anos.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não me arvoro aqui da capacidade de apresentar um receituário mágico para corrigir os rumos da política econômica. Minha formação acadêmica é de advogada e trabalho, há quase 3 décadas, na administração de empresas.  

O Sr. Ademir Andrade (Bloco/PSB-PA) - Permite-me V. Exª um aparte?  

A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL-SE) - Ouço o aparte do nobre Senador Ademir Andrade.  

O Sr. Ademir Andrade (Bloco/PSB-PA) - Senadora Maria do Carmo Alves, gostaria de dar as boas-vindas a V. Exª. Seu discurso, sinceramente, surpreende-me muito, pois está dentro da realidade, sintonizado com os fatos que estão ocorrendo em nosso País, também, com o que pensa o povo brasileiro. Isso demonstra que esta nova Legislatura, independentemente das siglas partidárias dos parlamentares, vem com força, com o sentimento das ruas, com o sentimento do povo e com vontade de corrigir os erros que possam ser encontrados pela frente. Seu discurso combina muito com tudo o que o Bloco de Oposição tem dito ao longo dos anos nesta e na outra Casa do Congresso. A presença de V. Exª e a de outros parlamentares no Senado Federal poderá modificar os rumos da atual situação. Pelo seu discurso, depreende-se que V. Exª será independente, autônoma, e defenderá, acima de tudo, o que determinar a sua consciência. Seu irmão, o ex-Senador José Alves, honrou esta Casa com suas posições políticas, com seus pronunciamentos e pareceres nas comissões. Tenho certeza de que V. Exª também agirá da mesma forma. Isso nos anima, porque, por imposição do Governo, temos sofrido muitas derrotas neste Senado Federal. O Governo dá as ordens aqui, determina e, lamentavelmente, a maioria dos nossos Pares as cumpre sem nenhum questionamento. Vejo que V. Exª chega com esse questionamento e entendo que isto é muito positivo para o povo de Sergipe e para o nosso País. Muito obrigado a V. Exª.  

A SRª MARIA DO CARMO (PFL-SE) - Muito obrigada a V. Exª, nobre Senador.  

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - Permite V. Exª um aparte?  

A SRª MARIA DO CARMO (PFL-SE) - Pois não. Ouço o aparte de V. Exª, nobre Senador.  

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB-SE) - Nobre Senadora Maria do Carmo, depois da brilhante vitória de V. Exª, quando muitos nem esperavam a sua candidatura ao Senado, guardei comigo não a esperança mas a certeza de que teríamos nesta Casa uma Senadora atuante representando o nosso Estado nas causas maiores, teríamos um voto consciente, independente e autônomo, em reconhecimento à votação consagradora que o povo lhe concedeu, independentemente de partido político. A sua bandeira, antes de tudo, assinala um avanço contra a prepotência do Governo, o reconhecimento do seu trabalho na área social, e, também, sua atuação contra os acordos espúrios muitas vezes assumidos pelos políticos em época de eleição, sem prestarem uma explicação devida à população e à comunidade. A sua eleição, portanto, simboliza a independência do povo de Sergipe. O seu pronunciamento demonstra, insofismavelmente, sua personalidade, sua condição excepcional de bem exercer o mandato que o povo lhe outorgou. V. Exª terá uma atuação benéfica para o Senado Federal, disso não tenho a menor dúvida. O pronunciamento de V. Exª está carregado de verdades, denuncia à Nação aquilo com o que nós da Oposição concordamos in totum , haja vista que a política econômica do Governo privilegiou o capital em detrimento do trabalho, deixando uma dívida social enorme para o nosso País. Hoje os jornais anunciam, Senadora Maria do Carmo, que o Governo Federal resolveu cortar pela metade a cesta básica distribuída às populações mais pobres, como também retirou o complemento da alimentação escolar concedida a mais de 1,3 mil alunos das regiões mais pobres do nosso País, o que configura uma indisposição do Governo para com a política social que deveria ser implementada, a fim de corrigir as injustiças e distorções, que são muitas em nosso País, principalmente no Nordeste do Brasil. Portanto, a minha palavra é, antes de tudo, de solidariedade ao seu discurso, que já assinala, por antecipação, o comportamento independente que marcará seu mandato de Senadora da República, a primeira Senadora de Sergipe. Os meus parabéns, as nossas boas- vindas e as nossas felicitações em face desse posicionamento consciente perante o Senado da República acerca dos problemas da nacionalidade.  

A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL-SE) - Muito obrigada, meu querido Senador.  

Aqui e agora, meus amigos, sou, acima de tudo, a política, cujo principal dever é auscultar e procurar transmitir as angústias, o inconformismo e as aspirações da nossa gente. Eu particularmente venho de um Estado ainda pobre, cuja gente sofrida me confiou um mandato que farei questão de honrar acima de todos os interesses. Essa mesma gente sofrida é a vítima maior desses aprendizes de feiticeiros que estão levando a nossa economia ao impasse.  

Repito: não tenho soluções mágicas a apresentar, mas existem idéias que são absolutamente óbvias e urgem ser viabilizadas. Delas separei alguns exemplos para comentar neste pronunciamento.  

O controle racional das nossas importações é uma das mais urgentes. Não é lógico, por exemplo, que um país pobre como o nosso se dê ao luxo de importar US$2 bilhões em automóveis por ano. A Coréia, um dos países beneficiados por nossa incauta política de abertura comercial, protege seu mercado automobilístico com tal zelo que permite o acesso de um máximo de 4,2 mil carros por ano. Por que, estão, deveríamos escancarar nosso mercado interno sem mínimas limitações, nem reciprocidades comerciais compatíveis?

 

Precisamos, igualmente, de elaborar uma rígida legislação antidumping , impedindo práticas desleais que tanto prejudicam nossas empresas.  

Por outro lado, cabe-nos reduzir, em caráter de urgência urgentíssima, nossos juros a padrões internacionais, medida vital não apenas para salvar as empresas nacionais, mas também para sustar o crescimento ensandecido da nossa dívida interna.  

Por igual, compete-nos combater a terrível chaga do desemprego, que aflige crescentemente os lares das famílias brasileiras, mediante medidas objetivas e não apenas retóricas. De prático, por exemplo, devemos incentivar maciçamente setores como o turismo, maior empregador do mundo moderno, a agricultura, que se encontra lamentavelmente estagnada, e a construção civil, setor que mais emprega no Brasil, especialmente as camadas menos especializadas que tanto nossa economia precisa absorver.  

Esses são segmentos estratégicos que poderiam, juntos, gerar milhões de empregos.  

Teríamos, também, de investir em uma política prioritária para a correção de um dos nossos problemas mais importantes, qual seja, a desigualdade regional, conquistando paralelamente um novo e gigantesco mercado interno para nosso parque industrial. Pelo aspecto absolutamente crucial para o nosso País, tratarei detalhadamente desse tema em nosso próximo pronunciamento.  

Finalmente, é preciso nos conscientizarmos de que, em período de crise, urge concitarmos uma união nacional, abrangendo se possível todas as camadas da sociedade brasileira. E quando digo toda a sociedade brasileira incluo a Oposição, que naturalmente tem consciência da gravidade da atual situação nacional e certamente, tanto quanto nós, aspira encontrar saídas para uma crise que ameaça esmagar-nos a todos.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há poucos anos, um país também latino enfrentava uma enorme crise. Saía da escuridão de uma ditadura tenebrosa que durara mais de 40 anos e cuja origem foi uma cruel guerra civil que dividiu irmãos e matou milhões de seus filhos. Confirmando a tese de que é nas crises que os homens se agigantam e partem para grandes decisões, a Espanha, a partir do Pacto de Moncloa, alcançou a união nacional, na busca de um plano econômico, social e político que transformaria profundamente a nação espanhola, levando-a em poucos anos a desfrutar os privilégios de ser um dos principais países do Primeiro Mundo - a propósito, esse país é grande investidor no Brasil.  

Ora, se os espanhóis conseguiram sucesso em circunstâncias bem mais adversas, por que não podem também fazê-lo os brasileiros? Claro que podemos. Depende de todos, mas principalmente de nós que fazemos parte do Congresso Nacional e constituímos a elite política nacional, a quem cabe a principal responsabilidade nesse processo.  

Srªs e Srs. Senadores, quando Salomão foi ungido Rei e Deus lhe perguntou o que desejava receber, pediu: "um coração sábio capaz de escutar para governar seu povo e para discernir entre o bem e o mal".  

Que pediria eu, se me fosse possível escolher? Servir ao meu povo, que confiou em mim, nos limites das minhas forças e da minha inteligência.  

Que pedido faria a classe política, se lhe fosse assegurada a mesma oportunidade? Creio que pediria para nos superarmos a nós mesmos e não falharmos ao povo brasileiro, nesta decisiva hora da verdade.  

O Sr. Eduardo Siqueira Campos (PFL-TO) - Nobre Senadora Maria do Carmo, antes que V. Exª termine seu pronunciamento, peço-lhe um aparte.  

A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL-SE) - Sim, concedo o aparte a V. Exª.  

O Sr. Eduardo Siqueira Campos PFL-TO) - Nobre Senadora, em primeiro lugar, quero parabenizar-lhe pelo discurso que marca sua estréia nesta Casa. Igualmente, chego ao Senado Federal vindo de um Estado ainda em desenvolvimento, o Tocantins. E quero, nobre Senadora, igualmente aos Senadores que me antecederam e que lhe apartearam, marcar aqui a nossa posição. Antes de pertencermos a uma base governista, pertencemos a uma base popular. Viemos a esta Casa manifestar o legítimo interesse da nossa população e o inconformismo, que quero incorporar ao seu pronunciamento, diante de medidas como a anunciada na data de hoje e amplamente divulgada pela imprensa nacional, qual seja, o corte que o Governo Federal vem efetuando na verba para a cesta básica e para a merenda escolar. Não será desta forma que o País haverá de encontrar o caminho para resolver seus problemas mais graves. Portanto, nobre Senadora, nós que conhecemos a tradição e o trabalho do ex-Governador João Alves, ex-Ministro, homem de larga tradição e de relevantes serviços prestados à Nação, quero dizer que nós, membros do mesmo Partido, o Partido da Frente Liberal, chegamos a esta Casa, igualmente, com a posição de dar a nossa contribuição, criticando, se for o caso, como o fiz nesta oportunidade em relação aos cortes efetuados na cesta básica e na merenda escolar, pois não será este o caminho que nos permitirá ver este País reerguer-se. Parabenizo-a e peço que V. Exª incorpore ao seu discurso a minha indignação com relação a essas medidas que o Governo Federal vem tomando. Muito obrigado.  

A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL-SE) - Muito obrigada, Senador. Espero que esta Casa tome uma posição clara, porque não é possível que o castigo venha com o corte na merenda escolar. Sabemos que a merenda escolar é o grande motivo de os pais mandarem seus filhos para a escola. Sem esse incentivo, fica muito mais difícil a situação da educação no Brasil.  

Muito obrigada.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/02/1999 - Página 2998