Discurso no Senado Federal

DISCORDANCIA COM O TRATAMENTO DESRESPEITOSO DO PRESIDENTE DA REPUBLICA AO GOVERNADOR ITAMAR FRANCO. DEFESA DO DIALOGO DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO COM OS SEGMENTOS DA OPOSIÇÃO. OFICIO ENCAMINHADO AO PRESIDENTE DA CAMARA DE VEREADORES DA CIDADE DE SÃO PAULO, DEMONSTRANDO A IMPORTANCIA DA ABERTURA DE UMA CPI PARA INVESTIGAR DENUNCIAS DE CORRUPÇÃO DE FISCAIS QUE ACHACARAM COMERCIANTES, AMBULANTES E CIDADÃOS PAULISTANOS EM GERAL.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVIDA PUBLICA. ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO MUNICIPAL.:
  • DISCORDANCIA COM O TRATAMENTO DESRESPEITOSO DO PRESIDENTE DA REPUBLICA AO GOVERNADOR ITAMAR FRANCO. DEFESA DO DIALOGO DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO COM OS SEGMENTOS DA OPOSIÇÃO. OFICIO ENCAMINHADO AO PRESIDENTE DA CAMARA DE VEREADORES DA CIDADE DE SÃO PAULO, DEMONSTRANDO A IMPORTANCIA DA ABERTURA DE UMA CPI PARA INVESTIGAR DENUNCIAS DE CORRUPÇÃO DE FISCAIS QUE ACHACARAM COMERCIANTES, AMBULANTES E CIDADÃOS PAULISTANOS EM GERAL.
Publicação
Publicação no DSF de 24/02/1999 - Página 3012
Assunto
Outros > DIVIDA PUBLICA. ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO MUNICIPAL.
Indexação
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESRESPEITO, GOVERNADOR, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), INEFICACIA, TRATAMENTO, CONFLITO, PAGAMENTO, DIVIDA PUBLICA.
  • DEFESA, DEBATE, PARTIDO POLITICO, OPOSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, GOVERNADOR, ESTADOS, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, SENADO, CRISE, DIVIDA PUBLICA.
  • LEITURA, OFICIO, AUTORIA, ORADOR, DESTINATARIO, PRESIDENTE, CAMARA MUNICIPAL, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), SOLICITAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, TENTATIVA, HOMICIDIO, VEREADOR, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, FISCALIZAÇÃO, COMERCIANTE AMBULANTE.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar gostaria de manifestar a minha discordância com relação à maneira com que o Presidente Fernando Henrique Cardoso ontem referiu-se ao Governador Itamar Franco. Ainda que não tenha nominado especificamente o Governador de Minas Gerais, claramente fez uma referência a S. Exª, o que acabou fazendo com que muitos jornais hoje registrassem a alusão do Presidente Fernando Henrique Cardoso como uma comparação de Itamar Franco a Silvério dos Reis, pessoa que tem, para todos os brasileiros que conhecem a história do Brasil, a imagem efetivamente de alguém que, em função de interesse pessoal, revolveu trair seus companheiros que lutavam pela independência do Brasil, sobretudo, a figura de Tiradentes.  

Ora, o Presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou: "Há muita gente cuja corda na mão é de Silvério dos Reis, não de Tiradentes. Não tem coragem de enfrentar os problemas e busca refúgio em falsidades."  

Por que será que os que estavam ali em Vitória do Espírito Santo, ouvindo o Presidente, todos os jornalistas - a Imprensa - hoje resolveram dizer que a referência era específica ao Governador de Minas Gerais?  

Sr. Presidente, parece-me que esta questão está indo além da conta. O Presidente Fernando Henrique Cardoso, neste caso, quis como que entornar ainda mais o caldo, envenenar ainda mais sua relação com a pessoa que, todos sabemos, afinal de contas, com Sua Excelência conviveu aqui no Senado Federal de 1982 até que deixasse o Senado Federal, quando Itamar o deixou em 1990. Pelo menos por oito anos eles aqui conviveram, e os Anais do Senado Federal estão a demonstrar que, na maior parte das lutas, dos ideais, na luta pela democratização do País, ambos estavam de acordo. Em segundo lugar, quando foi Presidente Itamar Franco, escolheu-o para ser seu Ministro das Relações Exteriores e, posteriormente, para ser seu Ministro da Fazenda o hoje Presidente Fernando Henrique Cardoso. E tantas vezes dialogaram como pessoas que se respeitavam, como pessoas que eram amigas, que traçaram ideais comuns para este País. E quando, recebeu o apoio do Presidente Itamar Franco para ser eleito Presidente, eleito o Presidente Fernando Henrique Cardoso, o designou para ser seu Embaixador em Portugal e na OEA.  

Apenas, portanto, para recordar: pessoas que agiram em comum por tanto tempo, que tantas vezes dialogaram, um com o outro, de forma franca, respeitosa, por que agora estão chegando a este ponto? Por que será que o Presidente Fernando Henrique Cardoso ainda não telefonou diretamente para o Governador Itamar Franco, chamando-o para conversar?", "Vamos nos encontrar olho no olho para colocar estas diferenças de lado?"  

O antes Presidente da República, hoje Governador Itamar Franco, explicitou nas suas últimas entrevistas, como, por exemplo, na concedida ao jornalista Boris Casoy no domingo último, a sua avaliação de que o gesto deveria vir primeiro de quem está no alto, de quem está em cima hoje, ou seja, respeitando a condição de Presidente de Fernando Henrique Cardoso, quase faz a sugestão: por que o gesto primeiro não vem do Presidente?  

E por que este não o faz? Por que precisa agora comparar Itamar Franco com Joaquim Silvério dos Reis? Será que a sua atitude de dizer que está com dificuldades de pagar tem algo a ver com traição? Parece-me claramente que não. E o Presidente da República ainda não respondeu com clareza, com a devida educação, àquilo que explicou o Governador Itamar Franco, já exposto em inúmeras entrevistas, inclusive aos Governadores, aos Senadores que tiveram oportunidade de ouvi-lo pessoalmente. Logo que S. Exª assumiu o Governo de Minas Gerais, espantado com a situação financeira que lhe fora deixada pelo Governador Eduardo Azeredo, solicitou ao Secretário de Fazenda, Alexandre de Paula Dupeyrat Martins, que sua primeira iniciativa e providência fosse um telefonema ao Ministro da Fazenda, Pedro Malan, que por sua vez havia sido Presidente do Banco Central, quando Itamar Franco ocupou a Presidência da República. Portanto, uma pessoa que deveria ter pelo menos uma relação de respeito e até de amizade com o Governador e com o seu colega de equipe de Governo, porque Alexandre Dupeyrat havia sido Ministro da Justiça quando Pedro Malan era Presidente do Banco Central. Segundo me foi explicado em detalhes pelo Secretário Alexandre Dupeyrat, que teve a gentileza de me fazer um visita em São Paulo, depois que telefonou não recebeu o telefonema de volta. Em primeiro lugar, por intermédio de sua secretária, disse que não poderia atender. Depois, na parte da tarde do primeiro dia útil de governo, quem ligou de volta foi o Secretário-Executivo Pedro Parente e a este foi dito pelo Secretário Alexandre Dupeyrat, que o Governador Itamar Franco tinha necessidade urgente de uma conversa sobre assunto grave com o Ministro Pedro Malan, entretanto, esse não quis conversar.  

Na quarta-feira, conforme Itamar Franco relatou a Boris Casoy num programa de domingo à noite, ele recebeu um fax do Secretário-Executivo Pedro Parente, em que constava uma nota enviada à imprensa pelo Ministro Pedro Malan, e, ao mesmo tempo dizendo que ele, Pedro Parente, se encontrava à disposição para qualquer esclarecimento ao Secretário Alexandre Dupeyrat.  

Ora, Senadora Maria do Carmo, temos de convir que não se trata de um procedimento entre pessoas que foram colegas de equipe de Governo. Por que razão isso? Poder-se-á então explicar que há outros motivos, mas a cada dia se sucedem desentendimentos. O Ministro Pimenta da Veiga foi a Belo Horizonte, mas como há uma história de desavenças e desentendimentos entre eles - inclusive o Ministro Pimenta da Veiga tem uma história de processos mútuos, de ações mútuas entre ele próprio e o vice-governador -, o Governador Itamar Franco não se sentiu tão à vontade para receber a palavra do emissário do Presidente.  

Fico novamente pensando: por que será que o Presidente Fernando Henrique Cardoso ligou nada menos do que cinco vezes para a residência de Lula, seu principal adversário nas eleições de dezembro último? Sua Excelência falou com um filho de Lula, depois falou com outro, falou duas vezes com Marisa, até que Lula chegou em casa e conversou com o Presidente. Falaram-se por telefone e, depois, pessoalmente. Então, se, com o principal adversário das eleições, o Presidente soube ser insistente para conversar por telefone e lhe pedir que viesse a Brasília para encontrá-lo, por que não age dessa forma com aquele que foi seu colega no Senado, de quem foi Ministro e a quem nomeou Embaixador; não pode haver um diálogo?  

O Presidente Antonio Carlos Magalhães disse ontem que é preciso que mudemos a pauta, porque há dois meses só se fala nesse desentendimento. Mas para que se mude a pauta, para que haja uma pauta positiva, faz-se necessário um gesto de estadista por parte do Presidente da República, um gesto que signifique um passo no sentido de um diálogo com a Oposição, com os Governadores que lhe fazem oposição, porque é mais do que justo que possa haver divergências.  

Os sete Governadores reuniram-se em Belo Horizonte a convite de Itamar Franco e, depois, em Porto Alegre, a convite de Olívio Dutra, redigiram documentos com críticas e sugestões ao Governo, por outro lado, o Presidente da República resolveu suspender a liberação de verbas para Minas Gerais e para o Rio Grande do Sul, por que não ter um gesto de grandeza?  

Tenho certeza, Senador José Alencar, de que é muito mais fácil superar esse problema do que, por exemplo, superar um iminente risco de guerra em Kosovo. Nem sei se a essa altura já não houve explosões, mas há esforços pela paz naquele lugar.  

Se não tomarmos cuidado - o Senado também tem responsabilidades nesse sentido -, se não alertarmos o Presidente da República de que seria mais adequado propor um caminho, essa situação poderá chegar a uma explosão.  

Gostaria de transmitir a todos os colegas do Senado o que hoje os 14 Senadores do Bloco de Oposição, reunidos, avaliamos: é muito importante que possamos ouvir os Governadores de Estado. Na Legislatura passada, o Bloco de Oposição apresentou um requerimento convidando os Governadores, mas os partidos da base governamental avaliaram que não era cabível naquele momento ouvi-los. Agora, na Legislatura que se inicia, tendo havido a renovação de um terço do Senado, queremos propor novamente que possamos ouvir os Governadores sobre a questão do pacto federativo, das proposições apresentadas por todos os Srs. Governadores, incluindo os da Oposição.  

Tivemos notícia de que o PMDB receberá, na próxima semana, o Governador Itamar Franco. Transmito-lhes que nós do Bloco da Oposição também gostaríamos de ouvi-lo, assim como gostaríamos de ouvir também os Governadores da Oposição, Anthony Garotinho, Olívio Dutra e Ronaldo Lessa, designados para representar o grupo dos 7. Avaliamos que seria próprio que o Senado ouvisse os Governadores que são o suporte do Governo, aqueles que são de outros partidos, que fazem oposição ao Governo porque é nossa responsabilidade colaborar para que haja uma solução.  

Sr. Presidente, quero ainda registrar ofício que encaminhei, hoje, ao Vereador Armando Mellão, Presidente da Câmara Municipal de São Paulo, com os os seguintes termos:  

"O atentado contra o Sr. Afonso José da Silva, Presidente da Associação dos Camelôs Independentes do Brás, constitui ato de extrema gravidade, sobretudo em função das denúncias que ele havia formulado a respeito de procedimento de fiscais da municipalidade que estavam recolhendo recursos ilegalmente junto aos vendedores ambulantes.  

Venho transmitir à Câmara Municipal de São Paulo a necessidade urgente de se realizar a Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar, da forma mais isenta e rigorosa possível, os fatos relacionados à maneira como os fiscais, administradores e outros se organizaram para achacar comerciantes, ambulantes e cidadãos paulistanos em geral.

 

De todos os segmentos da cidade, venho recebendo mensagens no sentido de alertar os vereadores sobre a importância de instaurarem essa CPI. Podem estar certos os vereadores que, por mais difícil e delicada que seja essa tarefa, a população de São Paulo considera uma questão de honra a apuração desses fatos e dos responsáveis envolvidos nesses episódios, incluindo o atentado contra o Sr. Afonso José da Silva, para que haja o resgate essencial na busca da ética na vida política brasileira."  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/02/1999 - Página 3012