Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A IMPORTANCIA RELEVANTE PARA O DESENVOLVIMENTO REGIONAL, EM PARTICULAR PARA O ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL, DA INAUGURAÇÃO DO PRIMEIRO TRECHO DO GASODUTO BRASIL-BOLIVIA.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A IMPORTANCIA RELEVANTE PARA O DESENVOLVIMENTO REGIONAL, EM PARTICULAR PARA O ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL, DA INAUGURAÇÃO DO PRIMEIRO TRECHO DO GASODUTO BRASIL-BOLIVIA.
Publicação
Publicação no DSF de 25/02/1999 - Página 3567
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, POLITICA, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, REDUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL.
  • COBRANÇA, ESCLARECIMENTOS, PLANO, PROGRAMA, APROVEITAMENTO, ENERGIA, RESULTADO, INAUGURAÇÃO, GASODUTO, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, VIABILIDADE, BENEFICIO, REGIÃO, INTERIOR, ESTADOS, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS).
  • COBRANÇA, URGENCIA, COMPENSAÇÃO, PERDA, AREA, TERRITORIO, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, PORTO PRIMAVERA, PREJUIZO, POPULAÇÃO.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srª Senadora Heloisa Helena, vou destoar dos nobres colegas porque tratarei de assunto diverso daquele que aqui tem sido debatido por tantos oradores. Reconheço a importância dele. No entanto, como haverá uma sabatina na sexta-feira, penso que seria extremamente cansativo se abordasse esse mesmo assunto.  

Há muitos tipos de política: a política partidária, a política agrícola, a política industrial, a política monetária, a política fiscal. Venho falar de uma outra política, pois parece que nos esquecemos dela. Não me refiro ao Senado. Refiro-me ao próprio País. Há acontecimentos que antes eram festejados largamente e que mereciam a atenção de toda a classe política e de toda a sociedade. Refiro-me a obras de grande vulto.  

Penso que temos que nos preocupar com a administração neste País. Sr. Presidente, no dia 9 de fevereiro, fiz parte da comitiva presidencial. Desci em Corumbá, a cidade branca do meu Estado, cidade vizinha da Bolívia. Fui a solo boliviano para presenciar um ato de transcendental importância: a inauguração do primeiro trecho do gasoduto Brasil-Bolívia.  

Pois bem, Sr. Presidente, Srs. Senadores, não vejo muita discussão sobre este assunto; muito ao contrário, ele já caiu no esquecimento. Não vi saudação alguma a obra de tamanha importância, de tamanha relevância. Mas fui eleito por Mato Grosso do Sul. Minha obrigação aqui é defender os interesses do Estado que represento e que necessita de incentivos, de políticas de desenvolvimento.  

Penso que está na hora de o Governo pensar administrativamente, acenar para os Estados em desenvolvimento. São aproximadamente 722km de canos do gasoduto enterrados no solo sul-mato-grossense. Canos que vão cortar centenas de municípios do Brasil, que percorrerão mais de três mil quilômetros até chegar ao Rio Grande do Sul! E nada há de diferente para os Estados em desenvolvimento. Tantas vezes tenho dito desta tribuna, em audiências, que precisamos de política para o interior do Brasil. Por que perder uma oportunidade dessa? Por que não ir a Mato Grosso do Sul e à Bolívia dizer o que faremos com o gás que atravessará o solo sul-mato-grossense para servir ao Brasil? Fico perplexo, não consigo entender, Sr. Presidente, Srs. Senadores, que, lá em Mato Grosso do Sul, ainda não saibamos o que vai acontecer conosco.  

É preciso que os órgãos - e aí está criado o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio - pensem nisso, porque, se não levarmos o desenvolvimento para o interior, se não tivermos políticas para o interior, ficaremos eternamente marginalizados, observando as desigualdades regionais cada vez mais acentuadas.  

Essa é uma verdade verdadeira. Não vi ninguém "cantar" esse gasoduto Brasil-Bolívia, obra centenária de reivindicações, que o Presidente Fernando Henrique inaugurou juntamente com o Presidente da Bolívia.  

Deparei-me com a inauguração da usina do Porto Primavera. Vejam lá se eu tenho ou não razão. A usina do Porto Primavera foi inaugurada, e lá homenageou-se o saudoso Ministro Sérgio Motta. Mas o que está ocorrendo com o Mato Grosso do Sul? Duzentos mil hectares do território sul-mato-grossense foram alagados para servir ao Brasil. Mato Grosso do Sul é Brasil. E cadê a compensação por essa inundação?  

Reclamei desta tribuna reiteradas vezes. Solicitei ao Governo de São Paulo e às Centrais Elétricas daquele Estado que atendessem aos reclamos da população marginalizada, da população pobre, dos oleiros, dos ceramistas, dos pescadores, da população indígena ali residente, que foi desajolada. Vim pedir que ajudassem o sul-mato-grossense e o Estado do Mato Grosso do Sul.  

Pois bem, foi firmado um convênio entre Mato Grosso do Sul e São Paulo há alguns anos por causa da Usina de Porto Primavera. Porém, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos vendo apenas parte ou quase nada dessas compensações: uma obra ou outra em algum Município. O Estado de São Paulo, por meio da CESP, responsabilizou-se pela construção de 150 km de pavimentação asfáltica, que uniria os Municípios de Bataguaçu a Santa Rita do Pardo e de Bataguaçu a Brasilândia. Parece-me inteiramente inexplicável que essas obras estejam paralisadas sob as mais diversas e diferentes desculpas.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vamos saudar essas grandes obras, sim, mas vamos criar uma política para o seu aproveitamento, porque tenho ouvido dizer que elas já não servem mais para nada. Como não servem? Levantei uma estatística em que 3 milhões de propriedades agrícolas no Brasil dependem de lamparina para sua iluminação. Portanto, é preciso ter energia elétrica.  

Teremos energia do gasoduto não poluente da Bolívia. Está certo, está tudo decantado, mas meu Estado será o corredor disso? Será que as indústrias vão para lá se não tivermos um preço diferenciado da energia para Mato Grosso do Sul? Será que não é justo? O gasoduto sai do território boliviano a US$ 0,90 para entrar em Corumbá a US$ 2,70. É preciso atentar para isso, ou vamos continuar servindo os grandes centros deste País em detrimento do nosso interior e das regiões mais pobres?  

O Governo não pode perder essa oportunidade. É preciso levar esperança a esses brasileiros. É preciso inaugurar essa usina sem desalojar as populações. É preciso que a Usina do Porto Primavera entre em funcionamento para atender aos reclamos sociais.  

Vinte milhões de brasileiros ainda não possuem eletricidade em suas casas. É um número muito grande! Precisamos ter uma política nesse sentido. Não é possível que apenas um terço da população rural deste País tenha acesso à energia e o restante funcione à lamparina.  

Precisamos falar também de política de administração. Discutir política partidária, sim! Discutir reformas políticas, sim! Estamos vivendo numa tormenta econômica? Sim! Há uma tempestade? Sim, há uma tempestade. Mas há raios de esperança, Sr. Presidente. Precisamos levar esperança ao povo com entusiasmo, com sentimento.  

Por que os organismos federais não apontam soluções para ajudar Mato Grosso do Sul, por exemplo? Cito meu Estado, falando de desigualdades regionais. Cito meu Estado, porque esses dois empreendimentos a que me referi estão diretamente ligados a Mato Grosso do Sul. Um deles nos faz perder duzentos mil hectares de terra. Não é brincadeira, para um Estado cujas usinas, de Jupiá e Ilha Solteira, por exemplo, constituem o maior conjunto hidrelétrico do continente, com capacidade de 3,4 milhões KW. Em que redundou esse fato para Mato Grosso do Sul, que até ontem comprava energia elétrica de fora? É preciso olhar para o interior e atendê-lo. É preciso voltar ao tempo das políticas de desenvolvimento regional! Não podemos mais ficar discutindo apenas política monetária.  

Nesse momento, é muito séria a preocupação que temos com os destinos do País. Ontem, o dólar superou a casa dos R$2,00, o que é muito grave. Concordo com a importância de se discutir esse fato, mas isso não pode inibir, não pode frear os estudos e as realizações - o IPEA deve ter estudos à vontade. Precisamos de força para levar o progresso ao interior; precisamos ter metas e sinalizar; precisamos levar as agroindústrias para o interior. Não precisamos mais das chaminés que poluem as grandes metrópoles deste País, pois o Gasoduto da Bolívia vai passar por aqui, uma energia não poluente. As termelétricas previstas para Corumbá e Campo Grande estão à espera de realização há quanto tempo? Foram prometidas há quanto tempo? Está próxima a inauguração do gasoduto.  

Desculpem-me. Não se trata de um complexo de inferioridade diante dos grandes centros, mas da verificação, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de uma realidade. Não podemos mais concentrar o Brasil nas grandes metrópoles; ao contrário, precisamos desafogá-las. Para que haja esse desafogo, é imprescindível o sentimento de ir ao interior. É preciso que o Governo trabalhe administrativamente nesse sentido. Chegamos a um momento em que, talvez, a superação dessa crise tenha estreita relação com nossos próprios erros. Temos de reconhecer que erramos e conhecer os nosso próprios erros.  

É evidente a influência das crises da Rússia e da crise asiática. Sem dúvida, estamos diante de uma globalização irreversível, porém muito cruel. Não tenho dúvidas quanto a isso, mas entendo que já era o momento de estarmos marchando rumo ao interior, aproveitando as nossas potencialidades.  

O Brasil não pode parar; não há como este País parar. Estamos, inclusive, provando que somos às vezes maiores que as crises. Quantas vezes isso não aconteceu no Brasil? Não vejo, portanto, razão para a desesperança. Ao contrário, penso que devemos levar a esperança e atentar para essas realidades.  

Assim, ocupo esta tribuna hoje, Sr. Presidente, porque não poderia deixar passar essa oportunidade. As duas obras são, talvez, as maiores que se construíram neste País, inauguradas neste mês. Há quanto tempo sabemos do Gasoduto da Bolívia e até agora não sabemos o que vai acontecer. Acontecerá apenas em São Paulo, no Paraná, em Santa Catarina, no Rio Grande? Onde acontecerá, se não tivermos bem definido e claro diante da sociedade o que pretendemos com isso, quais os planos e programas para o aproveitamento dessa energia? O mesmo pode ser indagado com relação à Usina de Porto Primavera.  

Então, ocupo esta tribuna hoje para dizer que temos de discutir aqui essas questões - e esta Casa tem de fazê-lo, porque é a Casa da Federação, e os problemas que afligem este País dizem respeito ao Senado da República. Como muita gente já discutiu política monetária, a grave crise econômica, é preciso que eu, ao enaltecer essas duas grandes obras, inauguradas neste mês pelo Presidente da República, com quase nenhuma referência nos órgãos de comunicação, também faça o meu apelo. Justifico, assim, a confiança que o povo me depositou para ser um dos seus representantes no Senado da República e defender os interesses da minha gente.  

Mato Grosso do Sul está perguntando onde está e o que será feito com o Gasoduto da Bolívia. Está pedindo, exigindo, que se façam as obras de compensação urgentemente pela perda de duzentos mil hectares do seu território para a construção do Porto Primavera.  

É isso que justifica a minha presença hoje nesta tribuna, Sr. Presidente.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT-AL) - V. Exª me concede um aparte, Senador Ramez Tebet?  

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Ouço V. Exª com muito prazer.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT-AL) - Nobre Senador, em primeiro lugar, eu quero dizer que é nossa obrigação permanecer aqui até o final dos debates e participar de todas as discussões na Casa, porque é para isso que o povo brasileiro nos elegeu; por mais que o Senado não tenha cumprido com as suas prerrogativas constitucionais, ao menos estar aqui, participando dos debates, é nossa obrigação. V. Exª ocupa a tribuna com um tema relevante, e eu tenho que saudá-lo. V. Exª, pelo menos, tem algo a falar sobre o Mato Grosso do Sul, as suas obras importantes. Não posso dizer o mesmo de Alagoas, porque a única coisa que temos em nosso Estado e que retrata o Governo Federal é a proteção da estrutura de corrupção da elite amiga do Presidente e a fome e a miséria da gigantesca maioria da população. O tema que V. Exª aborda é importante para todos nós brasileiros. O que é profundamente desencantador é que nas mesmas matérias em que se fala da inauguração da Usina de Porto Primavera fala-se também do processo de privatização. Isso é muito grave porque, diante deste dado relevante que V. Exª apresenta, de que há três milhões de propriedades agrícolas sem iluminação, todos nós que conhecemos as periferias, tanto das grandes cidades como das pequenas cidades do interior, temos a mais absoluta clareza de que a grande maioria da população brasileira não pode se submeter à lógica do setor privado. Temos que entender que a lógica do FMI e do setor privado não é de instituição filantrópica – pode ser, às vezes, até "pilantrópica" –, e sim de natureza financeira, portanto, visa lucro. Se visa lucro, não atende aos anseios da maioria da população. Então minha grande preocupação em relação ao tema que V. Exª traz neste fim de tarde é garantir a infra-estrutura necessária ao desenvolvimento econômico do nosso País, especialmente de regiões tão pouco privilegiadas no cenário nacional. Nobre Senador Ramez Tebet, V. Exª faz um alerta gravíssimo no sentido de que seu Estado não sabe ainda, efetivamente, o que será feito dessas obras. O processo de privatização dessa usina já se iniciou, e outras hidrelétricas serão privatizadas. Vai-se privatizar até o rio São Francisco. Daqui a pouco, vai-se tentar privatizar as torneiras de São Pedro. Esse processo de privatização está ocorrendo em áreas que considero essenciais - água e energia. Qualquer pessoa de bom senso, que sabe como funciona uma tarifa, sabe que as pequenas propriedades agrícolas, a periferia das cidades, as populações com menor poder aquisitivo só conseguem ter acesso à energia ou ao abastecimento de água em função do subsídio cruzado. Como é que vamos esperar desenvolvimento econômico se não pensarmos em obras de infra-estrutura, especialmente nestas duas áreas que são essenciais, abastecimento de água e fornecimento de energia, conforme falou V. Exª? Compartilho da sua indignação, nobre Senador. É importante estarmos neste debate, o que também deve ser feito com relação à política monetária e ao FMI, porque, quando chega ao Brasil uma missão do Fundo Monetário Internacional, temos a sensação de que não temos um Presidente eleito pelos brasileiros, mas um americano a nos conduzir, tendo em vista as ações tomadas. Angustia-me o fato de que tanto se tira do povo brasileiro para se construírem essas estruturas que, apesar de serem faraônicas, são importantíssimas para o desenvolvimento da Nação, mas não temos condições de vê-las voltadas em prol da Nação brasileira. Muito obrigada.  

O SR. PRESIDENTE (Leomar Quintanilha) - Nobre Senador, a Presidência informa a V. Exª que o prazo regimental da sessão expirará às 18 horas e 35 minutos e por isso vai prorrogar a sessão por mais 10 minutos para que V. Exª conclua o seu pronunciamento e o nobre Senador Eduardo Siqueira Campos também faça o seu registro nesta Casa.  

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Sr. Presidente, encerrarei, não sem antes agradecer à nobre Senadora Heloísa Helena, digna representante do Estado de Alagoas, do qual não ignoro as dificuldades. Houve um instante de extrema grandeza do Congresso Nacional. Foi o momento em que conseguimos, para as nossas regiões, três instrumentos constitucionais de fundamental importância, infelizmente, atuando de forma muito precária e num contexto econômico-financeiro de juros elevadíssimos. De sorte que os Fundos do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste, que constam da Constituição de 1988, foram produto da união das bancadas dessas regiões. Três regiões que precisam de políticas de desenvolvimento regionais, a fim de que possamos saber o que queremos para ter uma Pátria melhor, em defesa da cidadania, da melhor qualidade de vida do nosso povo.  

Sr. Presidente, deixo este registro porque entendo que o Brasil tem de falar sobre tudo, tem de falar administrativamente. É o que falta a este País. Precisamos crescer, não podemos parar. Essas obras são tão grandiosas que é impossível que não sejam colocadas a serviço da cidadania, a serviço dos mais necessitados e do desenvolvimento integrado de nossas regiões.  

Agradeço o aparte de V. Exª, nobre Senadora, e a tolerância do nosso Presidente, que prorrogou a sessão para que eu pudesse concluir o meu pronunciamento e o Senador Eduardo Siqueira Campos pudesse nos brindar com o seu talento.  

 

¿


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/02/1999 - Página 3567