Discurso no Senado Federal

DEFESA DE UM PROGRAMA NACIONAL DE COMBATE AO EXCESSO DE BUROCRACIA, QUE AFETA DIVERSOS SETORES DA VIDA NACIONAL.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • DEFESA DE UM PROGRAMA NACIONAL DE COMBATE AO EXCESSO DE BUROCRACIA, QUE AFETA DIVERSOS SETORES DA VIDA NACIONAL.
Aparteantes
Lúdio Coelho.
Publicação
Publicação no DSF de 16/03/1999 - Página 5387
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, EXCESSO, BUROCRACIA, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, PREJUIZO, SETOR, SOCIEDADE, PAIS.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), EFEITO, BUROCRACIA, SETOR, INDUSTRIA, DEPOIMENTO, EMPRESARIO, RECLAMAÇÃO, PERDA, TEMPO, SERVIDOR, SOLUÇÃO, PROBLEMA, LEGISLAÇÃO, AUSENCIA, ESTABILIDADE.
  • DEFESA, PROGRAMA NACIONAL, COMBATE, EXCESSO, BUROCRACIA, VIABILIDADE, DESENVOLVIMENTO NACIONAL.

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL-TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o assunto que me traz hoje à tribuna gira em torno de um problema que afeta, sem distinção, todos os brasileiros. Trata-se do excesso de burocracia que ainda inferniza o dia-a-dia de todos os segmentos da sociedade brasileira. Não há cidadão neste País que não tenha enfrentado, uma vez sequer, a espera em uma fila para conseguir um documento, um carimbo, uma assinatura.  

Lembro-me de uma matéria publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo , um tempo atrás, sobre o impacto da burocracia no setor industrial brasileiro. Naquela ocasião, o Presidente do Sindicato das Micro e Pequenas Indústrias do Estado de São Paulo, Sr. Joseph Couri, contabilizava um dispêndio de 40% do total de horas trabalhadas nas empresas para tratar de questões burocráticas.  

Um exemplo da burocracia, segundo o Sr. Couri, estava representado na revista IOB - Informações Objetivas , que, no ano de 1996, havia publicado nada menos que 3.800 páginas com alterações na legislação tributária brasileira.  

Há alguns anos, a Trevisan Consultores fez uma pesquisa entre as empresas para as quais presta assessoria, a fim de saber quantos funcionários de cada uma delas trabalhava exclusivamente para atender às exigências burocráticas do Governo. Chegou a números preocupantes. Em algumas empresas, 13% dos funcionários se ocupavam exclusivamente de cuidar de procedimentos impostos pelos Governos Federal, Estadual e Municipal.  

O problema é considerado tão grave que já foi apontado em um relatório do Banco Mundial como um dos fatores que tornam os produtos brasileiros mais caros. Em certos segmentos da indústria, como na área de máquinas, os empresários chegam a perder quase 30% do tempo de trabalho para cuidar de questões impostas pela burocracia. Ora, Sr. Presidente, esse é um tempo roubado à produção. A conseqüência é visível para todos: a burocracia na indústria está encarecendo desnecessariamente os produtos nacionais e prejudicando, no contexto internacional, a competitividade comercial brasileira.  

Essa mesma matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo , a que estou fazendo referência, traz o depoimento do Sr. Álvares Romi, empresário de uma indústria de bens de capital, que reclama do tempo despendido e do número de funcionários envolvidos com questões burocráticas. Sua empresa chega a ter oito advogados, número inconcebível em qualquer lugar do mundo para uma indústria do porte da sua. Reproduzo parte de seu depoimento, para termos bem a idéia de onde se localiza um dos focos do cipoal da burocracia. Diz o senhor Romi:  

Nossa legislação é tão ampla e tão confusa que boa parte do nosso tempo é dedicado a questões que não têm a ver com a produção. A instabilidade das nossas leis dificulta a administração, pois, enquanto trabalhamos para entendê-las, elas estão em permanente mudança.  

O excesso de burocracia na área federal tem perpetuado algumas injustiças flagrantes. É o caso de milhares de brasileiros que esperam por até seis meses para tirar seus nomes do Cadastro de Inadimplentes do Setor Público – o tão temido Cadin. Quem faz essa denúncia é o jornal O Globo , de 4 de junho de 1998.  

Segundo consta da matéria do jornal, 90% dos clientes de advogados e contadores ouvidos pela reportagem caem na teia do Cadin injustamente. Se acontece de o contribuinte errar o preenchimento da guia por um número; ou se pagar um centavo a menos; ou se, ainda, pagar antecipadamente um imposto que venceria em dia posterior, a Receita recebe o pagamento, mas continua pendente o débito do contribuinte. E se inicia, então, um interminável périplo para consertar um pequeno erro ou esclarecer um pagamento feito, o que costuma se estender por cinco ou seis meses.  

Para não terem de esperar por longo tempo a liberação do nome de sua empresa do Cadin e evitarem prejuízos maiores, muitos empresários tomam um atalho rápido, porém dispendioso, e decidem pagar o imposto pela segunda vez. Ora, Sr. Presidente, é claríssimo e fora de questão que cabe ao inadimplente regularizar sua situação com o Fisco; o que é inaceitável e inconcebível é a burocracia da Administração Púbica dificultar e tornar tardo tal procedimento.  

O Sr. Lúdio Coelho (PSDB-MS) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Carlos Patrocínio?  

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL-TO) - Pois não, nobre Senador Lúdio Coelho.  

O Sr. Lúdio Coelho (PSDB-MS) - O discurso de V. Exª é absolutamente oportuno. É verdade que a burocracia traz um prejuízo enorme às nações em estágio de desenvolvimento como o nosso. Vou dar um exemplo: como minha Carteira de Identidade está um pouco usada - como eu mesmo -, solicitei à minha secretária que se informasse a respeito da troca do documento. Para minha surpresa, eu necessitaria apresentar minha certidão de casamento original, tirada há mais de 50 anos. Comentei com minha mulher que eu ficarei com aquela carteira velha mesmo, que agüentará mais um pouco, mesmo porque não devo usá-la por muito tempo mais. Apenas para trocar a Carteira de Identidade, me exigiram isso.. É fantástica a inutilidade da burocracia brasileira. Faz muito bem V. Exª em alertar a Nação sobre o tema.  

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL-TO) - Agradeço o aparte muito oportuno do eminente Senador Lúdio Coelho, que cita um exemplo clássico. Inclusive devo dizer-lhe que o mesmo acontece comigo, Senador Lúdio Coelho; também já enfrentei esse problema. A minha carteira de identidade se esfacelou pelo uso constante, posto que já se vão mais de 35 anos desde que sua expedição – era eu ainda menor de idade, sendo a única Carteira de Identidade que tive. Dessa forma, como encontrei todos os obstáculos para tirar uma segunda via da carteira, estou usando a minha carteira do Senado Federal.  

Existem ainda outros pormenores, eminente Senador: por esses dias, registrou-se em minha conta telefônica uma cobrança indevida, rotulando um telefone residencial como comercial. Tentei dirimir essa dúvida, mas verifiquei que é muito melhor pagar. Como é preciso delegar essa tarefa a outros, é melhor pagar a conta, mesmo porque não temos como ficar reclamando.  

Ainda ontem, assisti a uma reportagem no Fantástico sobre aquelas pessoas que reclamam porque ainda não receberam seus telefones e outros utensílios domésticos comprados há mais de cinco ou seis anos. Normalmente, os postos de atendimento ao cliente pedem para que estes esperem um minuto para serem atendidos. O fato é que o cliente espera cinco ou dez minutos e a resposta é sempre negativa.  

Eminente Senador Lúdio Coelho, acredito que devemos despender algum esforço para diminuir essa burocracia que emperra, muitas vezes, a atividade econômica do nosso País e passa a ser um dos fatores do custo Brasil, conforme pretendo demonstrar nas linhas que se seguem.  

Retomo a leitura do meu pronunciamento, Sr. Presidente.  

Não é sem razão que adjetivos como pesado, lento e ineficiente sejam aplicados costumeiramente ao Estado brasileiro. Muitas dessas pechas, podemos estar certos, deve-se ao excesso de burocracia e de regulamentação que tomaram de assalto os serviços públicos.  

A propósito, quero relatar um pequeno fato, aproveitado por Abram Szajman, presidente da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, como mote para escrever interessante artigo no jornal Folha de São Paulo , de 29 de janeiro de 1998. Trata-se de um episódio singelo, porém intrigante. Imaginam os senhores quanto poderá pesar, em quilos, um jornal ou um tablóide? Pois bem, a volumosa edição do Diário Oficial da União do dia 19 de dezembro de 1997 foi posta na balança e o fiel cravou exatos 5 quilos e 270 gramas. Todo esse peso trazia apenas atos administrativos dos Poderes Executivo e Judiciário, sem anúncios. O Diário Oficial desse dia ganhou posição no livros dos recordes, o Guinnes, como o jornal tablóide com maior número de páginas de todos os tempos do mundo: duas mil cento e vinte, ao todo.  

Para Abram Szajman, esse não é um recorde honroso. É, sim, "um triste marco emblemático da anacrônica concepção de que governar é usar a famosa caneta para assinar decretos e portarias, para nomear e demitir". Para esse empresário, temos de nos livrar da cultura do amanuense, "que exige selos, carimbos, atestados, declarações, certidões, cópias em segunda, terceira ou mais vias de tudo e que infesta a administração pública, em todas as esferas, desde os tempos de D. João VI."  

O ex-ministro da desburocratização, o saudoso Hélio Beltrão, costumava comparar a burocracia à figura mitológica da Hidra de Lerna, serpente de sete cabeças que tinha a capacidade de fazer renascer suas cabeças tão logo eram cortadas. Ele foi um batalhador incansável, em toda a sua vida pública, no combate à burocracia. O programa de desburocratização que comandou durante o Governo Figueiredo, de 1979 a 1985, arejou o Brasil com idéias inovadoras que beneficiam até hoje o cotidiano de milhares de brasileiros. Permito-me mencionar apenas duas delas espalhadas pelo Brasil inteiro: o Estatuto da Microempresa e o Juizado de Pequenas Causas.  

Fez muito mais o ex-Ministro Beltrão para dinamizar a pesada máquina governamental e para aliviar a vida do cidadão do excesso de exigências e controles burocráticos. Mas a burocracia cresce, neste País, como erva daninha em solo fértil, e assistimos, nesses 14 anos que nos separam dos últimos atos do ex-ministro, a um desastroso retrocesso. Muitos atestados, certidões e procedimentos eliminados pelo Programa Nacional de Desburocratização foram ressuscitados ao longo desse tempo, como o atestado de bons antecedentes, as certidões negativas de impostos, o reconhecimento de firma e a autenticação de documentos em repartições públicas federais.  

Em vista do que venho expondo no decorrer deste pronunciamento, Sr. Presidente, manifesto minha convicção de que o Brasil precisa urgentemente de um programa de combate aos excessos de burocracia. Se na década de oitenta, mesmo sob as restrições do regime militar, tiveram êxito os programas de desburocratização, mais razão teríamos hoje para acreditar no sucesso de um conjunto de ações contra a burocracia.

 

Temos de considerar que os governos democráticos pouco fizeram para dar continuidade ao que se havia conseguido no Governo Figueiredo. E temos de entender que a desburocratização é um processo e, como tal, não se faz de uma só vez. Não é uma operação instantânea, com data e hora para acabar. O processo é incessante e contínuo.  

Creio, Sr. Presidente, estar defendendo uma aspiração que não é só minha. É uma aspiração de todos os brasileiros, compartilhada por todos os cidadãos deste País, desde o mais humilde trabalhador até o empresário mais poderoso.  

A burocracia é uma doença que contamina todos os setores da vida nacional. Não podemos nos esquecer de que o cipoal burocrático é parte importante do que se convencionou chamar de custo Brasil. Numa época de abertura econômica e globalização dos mercados, nação alguma pode desprezar a onerosidade que o sistema de custos indiretos imprime ao preço final dos seus produtos. Competidores estrangeiros, livres de fatores extramercado, como o peso advindo do excesso de burocracia, terão muito mais chance de tornar seus produtos competitivos diante dos nacionais. Não é isso que queremos para o Brasil, com certeza!  

Finalizo este pronunciamento, na esperança de que as instâncias de Governo brasileiras se sensibilizem para a necessidade de empreendermos já um programa nacional de desburocratização, que retire do caminho de nosso desenvolvimento um dos entraves mais daninhos e perniciosos.  

Era o que tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/03/1999 - Página 5387