Discurso no Senado Federal

IMPORTANCIA DA INDUSTRIA DA RECICLAGEM NA PRESERVAÇÃO AMBIENTAL.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • IMPORTANCIA DA INDUSTRIA DA RECICLAGEM NA PRESERVAÇÃO AMBIENTAL.
Publicação
Publicação no DSF de 08/04/1999 - Página 7596
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • GRAVIDADE, PROBLEMA, LIXO, AUMENTO, PERDA, BRASIL, FALTA, RECICLAGEM, PREJUIZO, MEIO AMBIENTE.
  • ANALISE, SITUAÇÃO, RECICLAGEM, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ALUMINIO, VIDRO, PRODUTO, FABRICAÇÃO, EMPRESA DE MATERIAL PLASTICO, SUCATA, AÇO, COMPARAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, PRIMEIRO MUNDO, REGISTRO, EXPERIENCIA, ESTADO DO PARANA (PR), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • DEFESA, EDUCAÇÃO, POPULAÇÃO, ETICA, EMPRESARIO, GOVERNANTE, OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL.

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL-TO. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, durante milhares de anos, nossos primitivos e longínquos antepassados pré-históricos vagaram pelos continentes, preocupados única e exclusivamente com a sobrevivência e a reprodução.  

Nômades, deslocavam-se em pequenos grupos, ao sabor das mudanças climáticas e da maior ou menor escassez de alimentos. Eram caçadores e coletores, vivendo em relacionamento harmônico com a natureza.  

Ao surgirem os primeiros assentamentos humanos, nasceram também os problemas urbanos e, dentre eles, a preocupação com o destino a ser dado aos resíduos sólidos e líquidos, produzidos pelos indivíduos.  

O homem atual se diz civilizado, mas atira embalagens vazias pelas janelas dos automóveis e das residências. Evidencia o desperdício em todos os setores nos quais atua; da construção da própria casa à preparação e utilização dos alimentos. Clama contra a destruição da camada de ozônio, mas se sente no direito de destruir as matas ciliares, poluir as nascentes e produzir imensas queimadas.  

Ao aproximar-se a passagem do milênio, parece aumentar ainda mais a já tensa relação entre o homem e a natureza. Entretanto, vozes esparsas se fazem ouvir, alertando para a responsabilidade humana sobre o planeta que deixaremos como herança para as futuras gerações. Do consenso desses estudiosos surgiu um documento norteador — a Agenda 21 — apoiado oficialmente por mais de cem Chefes de Estado e de Governo em 1992.  

Com o objetivo claro de preparar a humanidade para o próximo século, a Agenda 21 nos alerta para um sério problema. A sociedade precisa desenvolver formas mais eficazes de eliminar um volume cada vez maior de resíduos. Os governos, as indústrias, as famílias e o público em geral devem envidar esforços conjuntos para reduzir a geração de rejeitos e de produtos descartados e o desperdício nas embalagens, estimulando tanto a reciclagem dos resíduos, quanto a introdução de novos produtos ambientalmente saudáveis.  

Sr. Presidente, nobres colegas, mais de seis anos decorridos da Eco-92, leio no jornal O Estado de S. Paulo que o Brasil perde, anualmente, cerca de R$4,6 bilhões por não aproveitar a totalidade do potencial de reciclagem do lixo domiciliar.  

Ponderam os especialistas que a necessidade de preservação ambiental ainda não faz parte da cultura brasileira, habituada à exuberância dos nossos recursos naturais.  

O estudante de classe média que, descuidadamente, rabisca dezenas de folhas em seus devaneios juvenis desconhece que a reciclagem de uma tonelada de papel resulta em uma economia de 50% de energia elétrica e de 10 mil litros de água, além de evitar o corte de 17 árvores.  

Os alegres grupos de bebedores de cerveja das sextas-feiras, estimulados pela publicidade televisada, ignoram que uma tonelada de alumínio reciclado economiza cinco toneladas de bauxita, gastando somente 5% da energia necessária para produzir a mesma quantidade de alumínio primário. Ao brindarem, erguendo as latinhas, desconhecem que 70% das mesmas já são recicladas, e que podem ser reaproveitadas infinitamente, sem que as características básicas se alterem.  

A leveza e a resistência fazem do alumínio o segundo metal mais utilizado neste final de século. A produção, porém, é economicamente custosa e agressiva ao meio ambiente, tanto que o alumínio é chamado pelos técnicos de "energia solidificada".  

Sr. Presidente, acabou de falar aqui o eminente Senador Sebastião Rocha sobre a possível privatização da Eletronorte. A Hidrelétrica de Tucuruí foi construída muito mais para servir às multinacionais do alumínio do que para servir às populações daquela região do sul do Pará, que até há pouco tempo não dispunham de energia elétrica.  

Atualmente, um veículo médio contém mais de 65 kg desse metal, o que deve dobrar até o final desta década. Sabe-se, porém, que o aumento da produção trará danos ambientais incompatíveis com as atuais tentativas de conservação de energia, além de riscos de mudanças climáticas. Por essas razões, os especialistas prevêem que a maior parte da lataria dos carros do século XXI será de alumínio reciclado.  

Em razão das facilidades do processamento da sucata e também da iniciativa do setor privado, o índice de recuperação do alumínio é de 70%, desde o primeiro semestre de 1996; mais do dobro do que acontece com o vidro, que, embora seja 100% reciclável, alcança em média pouco mais que 30%.  

Uma vez que a reciclagem reduz custos de energia, pois a temperatura de fusão dos cacos é mais baixa que a da matéria-prima virgem, o setor pretende aumentar essa participação até chegar aos 60% de material reciclado.  

Outro segmento que vem procurando se organizar é o da reciclagem dos plásticos. Além dos obstáculos quanto à coleta, separação e classificação, o material é leve e ocupa muito espaço, o que leva ao encarecimento do transporte. Mesmo assim, o índice de reaproveitamento dessas embalagens, que desde 1995 superou os 20%, poderá crescer até 50%.  

Com a implantação do novo Código de Trânsito, a Associação Brasileira de Engenharia Automotiva calcula que, provavelmente, 90% dos veículos com mais de 15 anos de uso saiam de circulação. Como o total de carros nessas condições estima-se em quatro milhões, a vistoria tenderá a eliminar em torno de 3,6 milhões veículos, cuja reparação seria mais cara que o valor de mercado.  

Coloca-se, em conseqüência, uma séria questão: estará o Brasil preparado para processar tal volume de sucata?  

Atualmente, 35% das 200 mil toneladas de sucata de aço movimentadas por mês são recuperadas e utilizadas na fabricação de pregos, arames, vergalhões etc., mas o próprio Sindicato Nacional do Comércio Atacadista de Sucata Ferrosa e Não-Ferrosa admite que a ociosidade do setor ainda é de 50%.  

Sr. Presidente, nobres Senadoras e Senadores, vivemos em época na qual o fantasma da miséria ronda as classes menos favorecidas. Palavras como "crise" e "desemprego" passaram a estar presentes em todas as conversas, apresentando-se como os principais problemas a serem enfrentados pelos governos federal e estaduais. É em momentos como este que se devem valorizar as atividades capazes de absorver mão-de-obra menos qualificada, trazendo, ao mesmo tempo, retorno social e ecológico à população.  

Nos países desenvolvidos, a "indústria da reciclagem" vem se afirmando e rendendo lucros significativos. Um exemplo claro é a Alemanha, em que essas atividades vêm movimentando centenas de milhões de marcos, a partir da expansão da rede de coleta. Uma boa parte do material, que era jogada no lixo, é agora distribuída pelas caixas de seleção existentes nos domicílios alemães, destinada a jornais, vidros, latas vazias, etc. Em troca, as famílias alemãs são remuneradas pela quantidade de material reciclável produzido, e ocorre uma redução de 30% no volume de lixo recolhido nas casas.  

Fechando o ciclo, a indústria alemã se abastece nas centrais recicladoras, para a fabricação de pára-brisas, vidros isolantes, garrafas, etc. Na Áustria, as taxas de reciclagem ultrapassaram 65%, e, na Holanda, o total gira em torno dos 75%.  

Além disso, as indústrias européias estão sendo pressionadas a investir na redução da espessura das embalagens, sobretudo de bebidas, alimentos, remédios etc, o que ajudará a economizar matérias-primas e energia.  

Sr. Presidente, nobres Senadores, o Brasil urbano produz 90 mil toneladas de lixo por dia, que são espalhados em 12 mil pontos de despejo. Estimam os pesquisadores da EMBRAPA que 60% desses lixões sejam corpos de água, comprometendo-se assim a vida dos rios, o abastecimento, a saúde das populações e o futuro de lençóis freáticos.  

Todas as razões, portanto, apontam a reciclagem como o procedimento mais sensato e racional, quaisquer que sejam os aspectos analisados. Aqui no Brasil, porém, como em todo país ainda não desenvolvido, vários são os obstáculos: os orçamentos são restritos; os níveis educacionais e de conscientização da população são baixos — o que limita as possibilidades da coleta; a carência de indústrias de reciclagem reduz o aproveitamento do lixo; o envolvimento do Governo com o setor informal é bastante restrito; a municipalidade de maneira geral, talvez por falta de visão, não demonstra interesse e condições de explorar as opções mais baratas de reciclagem.  

Apesar dessas e de outras dificuldades, existem exemplos concretos da nova mentalidade que aos poucos se instala em nosso País.  

Curitiba, no Paraná, é considerada um dos melhores exemplos do processo de coleta e reciclagem do lixo urbano. Mais de 22% são reciclados, reduzindo de 20 a 30% o custo de ocupação de aterros sanitários e autofinanciando parte desse serviço. Aquela capital, juntamente com sete cidades de outros países, recebeu, no início da década, o prêmio máximo da ONU para meio ambiente, ao transformar 200 mil residências em mini-usinas de separação de lixo.  

Para alguns especialistas, a coleta seletiva em casa e nas empresas é duas vezes mais eficaz que a das usinas. Em Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, por exemplo, o lixo coletado é distribuído, em pequenos lotes, a famílias que separam e comercializam o material reciclável. Algumas chegam a faturar US$1.100 por mês.  

Em São Paulo, a coleta seletiva começou em 1990. Em um ano já atingia 16 mil domicílios em diferentes bairros, chegando a 70% a participação dos moradores.  

Um programa que não sofreu interrupção e hoje alcança quase 90% do Município foi o de Porto Alegre. Lá ocorreu a absorção do setor informal, os catadores de rua.  

No Rio de Janeiro, os próprios catadores se organizaram em cooperativas e montaram centros de coleta e triagem de materiais recicláveis. A prefeitura cedeu locais e apoiou a capacitação dos catadores.  

Em maio de 1993, o Rio de Janeiro criou o Projeto Escola, que, em três anos, cadastrou mais de 2.700 escolas no eixo Rio/São Paulo e, em 1995, alcançou Belo Horizonte. O objetivo desse projeto é a troca de latas de alumínio por material escolar ou por equipamentos, como os computadores. Hoje em dia, além de educandários, instituições e empresas como hospitais, paróquias, restaurantes e associações de moradores, o Corpo de Bombeiro e até as Forças Armadas participam desse projeto. Mais de três mil e quinhentos equipamentos já foram entregues a unidades do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.

 

Para outros especialistas, no entanto, a construção de usinas de compostagem do lixo é fundamental. Por esse sistema, o material orgânico é transformado em fertilizantes. Em 1989, apenas 0,6% dos 4.425 municípios brasileiros possuíam usinas de reciclagem; eram quinze usinas, das quais sete em São Paulo. Em 1991, quatro das sete usinas paulistanas já estavam desativadas. O principal motivo é a insuficiência dos recursos financeiros para a manutenção dos sistemas.  

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, contrariamente às décadas de desperdício, o mundo deve entrar, gradualmente, em uma fase de racionalidade de consumo. Em conseqüência, as nações lançarão mão da reciclagem de rejeitos e de reutilização das embalagens, de forma a prolongar a vida das reservas naturais e evitar a degradação do meio ambiente.  

Os ecologistas há muito chegaram ao consenso de que a solução para o nosso Planeta está no desenvolvimento auto-sustentável. Sob essa ótica, não haverá bens descartáveis no futuro, pois o esbanjamento está se tornando condenável também no aspecto comercial.  

Já se disse que o Brasil tem a cultura do desperdício: baixo nível de educação e de tecnologia; mão-de-obra insuficientemente treinada; técnicas inadequadas ou obsoletas; controle e gerenciamento, público e privado, deficientes.  

Nos países mais desenvolvidos, é clara a consciência de que os graves problemas da humanidade, no século XXI, serão a insuficiência de água e o excesso de lixo.  

Convém alertar que a questão do lixo toma dimensões dramáticas quando se considera que cascas de banana ou de laranja levam dois anos para se desfazerem; papel recoberto de plástico, de um a cinco anos; pontas de cigarro, de dez a vinte anos; tecidos de nylon e sacos plásticos, de trinta a quarenta anos.  

O SR. PRESIDENTE (Maguito Vilela) - Sr. Senador, lamento informar-lhe que o horário regimental da sessão já se encerrou.  

Prorrogarei a sessão por mais três minutos para que V. Exª possa concluir seu pronunciamento.  

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL-TO) - Serei atento aos três minutos que V. Exª me concede.  

Couros e latas de estanho levam até cinqüenta anos para se desfazerem; latas de alumínio, de oitenta a cem anos; garrafas de vidro, um milhão de anos para sua biodegradação. As garrafas plásticas, segundo os técnicos, podem durar eternamente.  

Alertam os especialistas que a produção diária de lixo por pessoa é, em média, de 1 quilograma. No Brasil, estima-se que trezentos e oitenta gramas desse lixo individual são atirados nas ruas, muitas vezes pelas janelas dos veículos e das residências.  

Para alterarmos essa realidade de país subdesenvolvido, necessitamos, prioritariamente, reciclar as mentalidades, estimular e fortalecer o exercício da cidadania. Precisamos levar o nosso povo a conhecer e a lutar pelos seus direitos, a partir da consciência e do cumprimento dos seus deveres.  

Sr. Presidente, ambiente sadio é, indiscutivelmente, um direito do ser humano. Devemos, portanto, permanecer atentos ao custos do desenvolvimento. É nossa responsabilidade, nobres Colegas, impedir que se persiga o progresso a qualquer preço; não ao preço das nossas praias e florestas, não ao preço da saúde dos brasileiros mais carentes, não ao preço dos nossos recursos naturais e do meio ambiente, porque, Srªs. e Srs. Senadores, o Brasil precisa crescer, sim, mas sem comprometer os direitos das futuras gerações.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/04/1999 - Página 7596