Discurso no Senado Federal

JUSTIFICATIVA A PROJETO DE RESOLUÇÃO QUE ENVIARA A MESA, QUE DISPÕE SOBRE A CONVOCAÇÃO DE PLEBISCITO PARA A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA HIDRELETRICA DO VALE DO SÃO FRANCISCO.

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO. POLITICA SOCIAL.:
  • JUSTIFICATIVA A PROJETO DE RESOLUÇÃO QUE ENVIARA A MESA, QUE DISPÕE SOBRE A CONVOCAÇÃO DE PLEBISCITO PARA A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA HIDRELETRICA DO VALE DO SÃO FRANCISCO.
Publicação
Publicação no DSF de 10/04/1999 - Página 7754
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DEBATE, COMISSÃO, SENADO, ASSUNTO, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, ENERGIA ELETRICA.
  • CRITICA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), AUTORIDADE, GOVERNO FEDERAL, FALTA, INFORMAÇÃO, IMPORTANCIA, RECURSOS HIDRICOS, COMPANHIA HIDROELETRICA DO SÃO FRANCISCO (CHESF), PROGRAMA, IRRIGAÇÃO.
  • DENUNCIA, SUJEIÇÃO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), PRIVATIZAÇÃO, PATRIMONIO PUBLICO, ESPECIFICAÇÃO, COMPANHIA HIDROELETRICA DO SÃO FRANCISCO (CHESF).
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO, AUTORIA, ORADOR, JOSE EDUARDO DUTRA, SENADOR, CONVOCAÇÃO, PLEBISCITO, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA HIDROELETRICA DO SÃO FRANCISCO (CHESF), CONSULTA, POPULAÇÃO, REGIÃO.
  • DENUNCIA, INEFICACIA, POLITICA SOCIAL, GOVERNO, OMISSÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROGRAMA COMUNIDADE SOLIDARIA, CONTINUAÇÃO, DESRESPEITO, DIREITOS, CRIANÇA, SUGESTÃO, ATUAÇÃO, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS).

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT-AL. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta semana, a Senadora Emilia Fernandes, o Senador Romero Jucá e os membros das Comissões de Fiscalização e de Infra-estrutura promoveram um excelente debate nesta Casa sobre o projeto de desestatização das empresas hidrelétricas.  

Trata-se de um assunto sério, a que outros parlamentares já fizeram referência ao discutir a relevância dos recursos naturais, especialmente da água, e que não poderia ser debatido em cinco minutos. Mas, para o meu estarrecimento - não sei se esse sentimento é compartilhado pelos outros Senadores -, tanto o Ministro das Minas Energia como os outros representantes do Governo Federal não tinham absolutamente nenhum argumento que pudesse convencer qualquer pessoa de bom senso, independentemente de identidade partidária, sobre a necessidade da privatização.  

Todos sabemos que a grande disputa do próximo século será pela água, único combustível necessário para garantir a geração de energia por parte de uma empresa, como é o caso da Chesf. Todos sabemos também que a natureza de uma empresa privada é ter lucro; assim, qualquer pessoa de bom senso deve imaginar que, se a água é o combustível necessário para que a empresa tenha lucro, é evidente a importância do controle dessa água, como no caso de um possível projeto de transposição do rio São Francisco. Mas eles não sabiam dizer qual era o nível da vazão - o que para nós, nordestinos, é uma aberração -, nem sabiam informar sobre projetos de irrigação e projetos de abastecimento de água. É uma grande irresponsabilidade o que está sendo feito.  

Infelizmente, entendemos que o Governo Federal se ajoelha diante dos ditames e do receituário do Fundo Monetário Internacional, como no contrato assinado que define a necessidade de privatização porque o Fundo Monetário Internacional quer e porque nós precisamos de algumas migalhas, mesmo que às custas do entreguismo do nosso patrimônio público, para pagar a tal da dívida externa ou os juros da dívida interna. E é isso que vai acabar acontecendo, como o Ministro deixou muito claro ao não negar que o processo de privatização realmente acontecerá.  

Em função disso, nós estamos apresentando - o Senador José Eduardo Dutra e eu - um projeto de decreto legislativo que dispõe sobre a convocação de plebiscito sobre a desestatização. Claro que a convocação do plebiscito é feita em função do que dispõem a Constituição e toda a legislação pertinente, no sentido de que as populações dos Estados que diretamente se relacionam com a Chesf ou com a Eletronorte possam se posicionar. Se o Governo Federal diz que quer mas não fornece nenhum argumento a fim de que uma pessoa de bom senso possa entender essa questão da privatização, nada mais justo, nada mais legítimo do que estabelecer o processo de plebiscito, onde as posições divergentes poderão ser explicitadas, e a opinião pública ser devidamente esclarecida sobre a questão. O que não se pode admitir é que, por ter sido assinado um acordo com o Fundo Monetário Internacional, as populações deixem de ser consultadas sobre o processo de privatização da Chesf, e, no nosso entendimento, de privatização das águas do rio São Francisco.  

Em função disso, estamos apresentando um projeto de decreto legislativo para que todas as comunidades e todos os Estados que trabalham diretamente com a Chesf possam ser consultados por meio de um plebiscito.  

O que nós, nordestinos, não vamos aceitar é que, simplesmente, em função de acordo assinado pelo Governo Federal com o Fundo Monetário Internacional, sejamos obrigados a aceitar o processo de privatização da Chesf.  

Não gostaria, também, Sr. Presidente, de deixar de fazer um brevíssimo comentário sobre uma cena que vi, ontem, no Jornal Nacional . Sei que todas as pessoas que assistiram àquela cena certamente sentiram-se profundamente machucadas como cidadãs, especialmente nós, mães e pais deste Brasil. Já disse várias vezes nesta Casa que nós, nordestinos, ou sobreviventes, ou miseráveis, não aceitamos que as pessoas simplesmente fiquem emocionadas frente à televisão. Só isso não serve. Não serve simplesmente a emoção frente à televisão, porque, a cada dia, são casos e mais casos que ocupam espaço na televisão brasileira mostrando cenas extremamente dolorosas, como essa de uma criança que tinha perdido os dois braços trabalhando no quintal da sua casa, com o seu pai, numa olaria. O mais doloroso de se ver não foi apenas o rosto e o jeito da criança, mas o seu próprio pai, que, ao mesmo tempo em que era o algoz, aparecia como uma figura inocente, um pobre miserável, que dizia assim: "a gente está fazendo isso porque não tem outra forma de ganhar dinheiro".  

E o que é que a lei vai fazer? A lei vai processar o pai da menina, que, certamente, irá para a cadeia. Depois que o pai da menina for para a cadeia, talvez essa mesma menina e as outras crianças daquela casa apareçam novamente no Jornal Nacional como vítimas da prostituição infantil ou de outra forma de violência.  

O Presidente da República e a antropóloga Primeira-Dama, que fala em solidariedade por meio do Comunidade Solidária, que fala do Estatuto da Criança e do Adolescente, não fazem nada. Creio que está na hora de o Presidente da República rasgar o Estatuto da Criança e do Adolescente, porque se esse Estatuto é a maior declaração de amor que se deu às crianças do nosso País, infelizmente não é seguido, é rasgado todos os dias pelo Presidente da República.  

Sr. Presidente, sei que V. Exª tem sensibilidade por esse assunto, inclusive, como Presidente da Comissão de Assuntos Sociais, já o demonstrou. Por isso, estou apresentando um requerimento para que, ou por meio da Subcomissão Permanente da Criança, ou da Comissão de Assuntos Sociais, possamos fazer alguma coisa.  

Há tempos, uma Comissão Mista visitou vários lugares onde havia trabalho infantil. Tudo isso mexeu com os nossos corações, com as nossas emoções. Creio que agora temos que revisitar esses lugares, que foram fotografados e que apareceram em todos os meios de comunicação. Muitas dessas crianças que foram visitadas continuam sendo exploradas, quer seja nos canaviais, nas empresas privadas ou pelas suas próprias famílias. Creio que devemos visitá-las novamente.  

Sinceramente, cada dia penso mais em processar o Presidente da República por crime de responsabilidade e pelo seu cotidiano, que rasga a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente.  

Não tenho mais nenhuma calma. Sei o que passei na minha infância, sei da alegria que tenho por ver meus filhos irem à escola, o que só tive a oportunidade de fazer muito depois; sei das angústias que minha mãe passou para não me colocar na rua vendendo o corpo por um prato de comida.  

Mas aquelas cenas de ontem ...E o mais grave é que aqui não se fala nada do Presidente da República. Estabeleceu-se a culpa para o pai. Ele é culpado, é verdade. Não podemos aceitar que os pais façam isso, mas o pobre miserável, com a maior inocência, permitiu que filmassem tudo e disse: "é porque não tem como a gente ganhar dinheiro; é preciso fazer isso".  

Sinceramente, onde está esse Presidente da República, esse Comunidade Solidária, o projeto de renda mínima que o Presidente da República disse que iria implementar e estabelecer um percentual para os municípios, o que inviabiliza qualquer Município de se credenciar a esse projeto?  

Fica aqui o meu protesto. Sei que conto com a solidariedade da nossa Líder, Senadora Marina, do Senador Romero Jucá e do Senador Eduardo Siqueira Campos, que têm falado sobre o assunto; e sei que conto não apenas com a solidariedade, mas com o apoio do Presidente da Comissão. Portanto, sugiro que revisitemos esses lugares para ver o que efetivamente foi feito.  

Cenas na televisão, mostrando as tragédias familiares e pessoais que acontecem, todos conhecemos ou já vivenciamos. Mas o que é que esse maldito Presidente da República vai fazer? E o que é que nós, Senadores, que temos a obrigação de fiscalizar esse Governo Federal, vamos fazer? Isso temos que exigir, porque, sinceramente, chorar diante da televisão não resolve.  

Obrigada pela benevolência, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/04/1999 - Página 7754