Discurso no Senado Federal

CONTRARIO AS JUSFICATIVAS PARA A MANUTENÇÃO DA ABERTURA DE MERCADO BRASILEIRO AOS PRODUTOS IMPORTADOS.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • CONTRARIO AS JUSFICATIVAS PARA A MANUTENÇÃO DA ABERTURA DE MERCADO BRASILEIRO AOS PRODUTOS IMPORTADOS.
Publicação
Publicação no DSF de 09/04/1999 - Página 7712
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, ABERTURA, MERCADO INTERNO, PRODUTO IMPORTADO, PREJUIZO, INDUSTRIA NACIONAL, AUMENTO, DESEMPREGO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, RECONSIDERAÇÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, INCENTIVO, INDUSTRIA NACIONAL, VIABILIDADE, CONCORRENCIA, MERCADORIA ESTRANGEIRA.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desde o início desta década, a economia brasileira vem experimentando rápida e acentuada liberalização comercial. O alegado esgotamento do modelo de substituição de importações foi e continua a ser a justificação para a abertura de nosso mercado aos produtos importados. Segundo essa visão econômica, a entrada de artigos importados, com sua maior taxa de incorporação de teconologia, e o fim do protecionismo estimulariam, pela competição, o aumento da produtividade das indústrias nacionais e a melhoria da qualidade de nossos produtos. Nossas indústrias, conforme essa ótica, estariam viciadas na proteção pela verdadeira reserva de mercado que as restrições às importações lhes forneciam.  

Não nego o fato de que algumas indústrias funcionavam e funcionam no País com um grau muito elevado de ineficiência, e que era necessário expor esses setores à competição. Penso também que se fazia necessário impor sobre eles uma desregulamentação, desde que progressiva, com estágios bem planejados, de modo a pôr fim aos privilégios comerciais quase monopolistas de alguns setores, mas sem desmantelá-los inteiramente. Tenho a convicção, porém, de que um erro foi cometido ao se exagerar na dosagem do remédio, tornando-o - como sói acontecer aos fármacos - em alguns casos veneno mortal.  

O problema é que essa posologia sinistra do remédio liberal não termina por matar somente as empresas atrasadas, identificadas como incapazes de se adaptar à competição com os produtos importados. Também empresas-modelo, como era a Metal Leve, por exemplo, outrora grande exportadora, cujas peças de alumínio de alta qualidade equipavam os motores dos automóveis fabricados na Alemanha, no Japão e nos Estados Unidos, foram deslocadas do mercado pela invasão de importados subsidiados em seus países de origem.  

Pior ainda é constatar que, como sempre, a corda arrebenta do lado mais fraco: o dos trabalhadores. Com a quebra das empresas, eles perdem seus empregos e se vêem sem possibilidades de recolocação, pois o desaparecimento dos postos de trabalho antes existentes é generalizado. Ainda mais grave é o fato de que esse desemprego não se dá somente entre os trabalhadores sem qualificação, mas, ao contrário, incide também sobre os mais treinados e especializados.  

São muito eloqüentes, nesse sentido, os números expostos em recente estudo sobre o desempenho industrial brasileiro elaborado pelo economista Márcio Pochmann, da Unicamp. Segundo esse trabalho, de 1985 a 1998, o total de empregos na indústria brasileira caiu de 4,2 milhões para 2,4 milhões - uma queda de 43%. No mesmo período, a produção industrial cresceu de apenas 2,7%, enquanto a importação de produtos industrializados crescia 75%.  

Vejam bem, Sr. Presidentes e nobres Colegas, como os fatos são alarmantes.  

A partir desses números, é possível deduzir-se que grande parte dos empregos perdidos se deveram à liberalização do comércio externo brasileiro - dizendo melhor, deveram-se ao escancaramento de nosso mercado às importações. Outra parcela da perda de postos de trabalho, portanto, deveu-se a mudanças organizacionais como a terceirização, reengenharia e a modernização tecnológica da indústria nacional.  

Nesse quadro, um dos setores mais sacrificados foi, sem sombra de dúvida, o da indústria têxtil. O crescimento das importações, de 1985 a 1998, foi de 1700%, enquanto o emprego caía cerca de 44%. No setor de material de transporte, no mesmo período, ou seja, de 1985 a 1998, o aumento das importações foi de 230% e a queda do emprego, de 32%; no setor metalúrgico, para dar outro exemplo dramático, as importações subiram 190% e o emprego caiu 33%.  

Resumo dessa opereta trágica para os trabalhadores brasileiros: 1,2 milhão de empregos foram perdidos. Ou, antes, para empregar as próprias palavras de Pochmann, foram exportados para os países cujos artigos passamos a comprar. Esta é a verdade: tiramos empregos daqui, do Brasil, e colocamos lá fora, ou seja, oferecemos empregos para os países dos quais importamos essas mercadorias, conforme os dados técnicos e estatísticos levantados e que temos em mãos. Muitas vezes, artigos até de péssima qualidade, no caso de importação - como se diz vulgarmente: bugigangas da China -, que praticamente liquidaram nossa indústria de brinquedos, embora muitíssimos inferiores sob quaisquer critérios. Por isso, Sr. Presidente, nobres Colegas, em muitas cidades pelas quais temos percorrido, temos visto verdadeiros camelódromos em que de cada dez produtos à venda nove são importados, o que tem prejudicado enormemente a indústria nacional.  

Eis um exemplo que contraria a tese de que a liberação do comércio melhoraria a qualidade dos produtos em nosso mercado.  

A questão, nobres Colegas, está em serem nossos formuladores de políticas comerciais excessivamente apegados à pregação liberal das potências capitalistas. Na verdade, mais realistas que o rei, abrimos nosso mercado sem sequer sugerir contrapartidas, quanto mais exigi-las, como seria o adequado. Enquanto isso, as grandes potências comerciais seguem mantendo barreiras alfandegárias de diversos tipos a quaisquer produtos brasileiros que apresentem vantagens competitivas substanciais.  

Esse é o caso, por exemplo, das dificuldades enfrentadas por nosso suco de laranja nos Estados Unidos, onde é onerado por pesada tarifa de importação e limitado por uma cota draconiana, tudo para não varrer do mapa os citricultores da Flórida e da Califórnia, como provavelmente ocorreria se a concorrência fosse mesmo livre. Da China também nos chegam toneladas de alho, vendido abaixo dos preços de cultivo a preços internacionais, o que evidencia o pesado subsídio de que é objeto em seu país, o que faz com que os cultivadores catarinenses de alho, como é o caso de meu Estado, sofram uma concorrência absolutamente injusta e totalmente descabida.  

Pode-se chamar isso de política comercial? A sustentação do real sobrevalorizado por tão longo tempo, agora está muito claro, foi certamente mais um dos equívocos já cometidos por nossas autoridades econômicas. Ela ajudou a liberação comercial a enterrar a indústria brasileira. Este é um fato que ficou evidenciado, aliás até reconhecido pelo próprio Governo hoje.  

Neste momento, em que caminhamos para a realidade cambial, faz-se necessário reconsiderar nossa política comercial e repensar particularmente essa abertura desbragada que só trouxe prejuízos aos empresários e desemprego aos trabalhadores. Os produtores brasileiros não podem, neste momento, perder a oportunidade de recuperar algumas posições nos mercados interno e externo.  

Quero, por isso, pedir aos formuladores de nossa política comercial mais senso prático e menos zelo ideológico liberal; mais combatividade e agressividade.  

Essas, Sr. Presidente, nobres Colegas, são algumas considerações que trago em relação a essa política comercial que vivemos nos últimos anos. Espero que agora, quando há condições de pelo menos tentarmos recuperar um pouco os prejuízos, possamos, com mais agressividade, tentar enfrentar esse modelo que estamos a viver.  

O próprio Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, há pouco, esteve no meu Estado, Santa Catarina, numa palestra à Associação Comercial e Industrial conjunta com a Federação das Indústrias do meu Estado, onde informou que está disposto a recrutar cerca de 90 assessores ou profissionais para ajudar nessa área, sendo mais combativo.  

Disse à S. Exª, à época, que procurasse o Ministério deixar um pouco, como falei no meu pronunciamento, a ideologia liberal de lado a fim de que esses profissionais sejam mais agressivos no campo da competição, fazendo com que os produtos brasileiros a serem colocados no mercado externo sejam aqueles de primeira grandeza, não numa troca por aquilo que eles lá tenham de sobra e que para nós seriam coisas para concorrer com os nossos produtos, muitas vezes de terceira ou quarta grandeza.  

Creio que temos que valorizar aquilo que é nosso, de primeira grandeza. Quando houver necessidade de importação de equipamentos para melhorar o nosso parque industrial, que se avalie com cuidado. Deve-se evitar as importações liberais desenfreadas, em que países mais fortes, num mercado muitas vezes monopolista, fazem com que percamos a produção numa concorrência desleal. Com isso, fecham-se empresas no Brasil, aumentando ainda mais o desemprego.  

Creio que essa agressividade justa e merecida em defesa dos irmãos brasileiros e em defesa de uma política nacional é necessária.  

Eram essas as considerações que tinha a trazer no dia da hoje, Sr. Presidente e nobres Colegas.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/04/1999 - Página 7712