Discurso no Senado Federal

SOLICITAÇÃO AS AUTORIDADES COMPETENTES, DE INFORMAÇÕES SOBRE AS PROVIDENCIAS QUE ESTÃO SENDO ADOTADAS RELATIVAMENTE AS DENUNCIAS DE ILEGALIDADES PERPETRADAS PELA CONSTRUTORA CR ALMEIDA, NA AQUISIÇÃO DE EXTENSA AREA DE TERRA NO ESTADO DO PARA.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FUNDIARIA.:
  • SOLICITAÇÃO AS AUTORIDADES COMPETENTES, DE INFORMAÇÕES SOBRE AS PROVIDENCIAS QUE ESTÃO SENDO ADOTADAS RELATIVAMENTE AS DENUNCIAS DE ILEGALIDADES PERPETRADAS PELA CONSTRUTORA CR ALMEIDA, NA AQUISIÇÃO DE EXTENSA AREA DE TERRA NO ESTADO DO PARA.
Publicação
Publicação no DSF de 28/04/1999 - Página 9067
Assunto
Outros > POLITICA FUNDIARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, PERIODICO, ISTOE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, IRREGULARIDADE, EMPRESA, LANÇAMENTO, TITULO, BANCO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), PREJUIZO, INVESTIMENTO, EXTERIOR.
  • COMENTARIO, IRREGULARIDADE, EMPRESA, PROJETO, ECOLOGIA, PREJUIZO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), REFERENCIA, TERRAS.
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, SOLICITAÇÃO, RAUL JUNGMANN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), ESCLARECIMENTOS, ANDAMENTO, PROCESSO JUDICIAL.
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, RENAN CALHEIROS, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), INFORMAÇÃO, PROCEDIMENTO, POLICIA FEDERAL, APURAÇÃO, AQUISIÇÃO, TERRAS, EMPRESA.
  • APRESENTAÇÃO, OFICIO, NELSON BORGES, PRESIDENTE, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), SOLICITAÇÃO, INFORMAÇÃO, PROBLEMA.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fatos da maior gravidade envolvendo empresas do grupo C.R. Almeida e suas atividades na Amazônia vêm sendo denunciados pela imprensa e pelas autoridades dos Estados e Municípios em que elas atuam. Em setembro do ano passado, por exemplo, reportagem dos jornalistas Adriana Chiarini e Mino Pedrosa, publicada na revista ISTOÉ, já relatava a maracutaia armada pelos empresários Ricardo Saad Filho, Henrique Almeida e Cecílio do Rego Almeida. Tratava-se de uma fraude contra investidores estrangeiros, na forma de lançamentos de títulos do Banco do Estado do Amapá – Banap, tudo lastreado em documentos que continham assinaturas supostamente falsificadas do então Diretor de Política Monetária do Banco Central, Francisco Lopes. Hoje, diante de todos os fatos, precisamos constatar se realmente eram falsificadas.  

A conseqüência imediata da tramóia foi a decretação da liquidação do Banap, que se encontrava, de fato, em dificuldades, mas não passava, naquele caso, de mera vítima. Saad Filho foi preso; os irmãos Almeida, porém, seguiram livres para armar outros golpes, desta feita no Pará. Várias denúncias sobre o assunto já foram feitas, inclusive por revistas de grande circulação nacional, como a Veja. 

Os problemas com a empresa Rondon Projetos Ecológicos, do grupo C.R. Almeida, começaram há quatro anos. Imaginem, Srªs e Srs. Senadores, que, nos dias de hoje, uma empresa compra quatro milhões e setecentos mil hectares de terra – que foram adquiridos por essa companhia – por meio de documentos fraudados no Cartório de Altamira, sendo que a história cartorial dessas terras demonstra que elas nunca pertenceram às pessoas que as venderam à C.R. Almeida.  

Essas terras englobariam terrenos pertencentes ao INCRA (dois milhões de hectares), ao Exército (duzentos e sessenta e oito mil hectares), à Funai (cento e noventa e nove mil hectares), ao Estado do Pará (quatro milhões de hectares) e até às áreas urbanas de localidades como Novo Progresso e Castelo dos Sonhos.  

O mais grave, Srªs e Srs. Senadores, é que a análise cartográfica feita pelo Instituto de Terras do Pará - Iterpa - alerta que a área efetivamente delimitada no registro de imóveis, na verdade, tem um milhão de hectares a mais do que formalmente as dimensões registram, totalizando, portanto, 5,7 milhões de hectares.  

O esdrúxulo é que a C. R. Almeida não pagou aos vendedores, Srs. Eliezer, Heleno Moura, Umbelino e Emiliano de Oliveira. Este último já foi prefeito de Altamira e vendeu a terra que supostamente tinha adquirido, em 1993, de herdeiros da família Acioly e Silva, que, por sua vez, fraudaram o registro no Cartório de Altamira.  

As leis do País estão sendo desrespeitadas na medida em que se observa que como as terras pertencem, em grande parte, à União (Funai, Exército e INCRA), é competência do Congresso Nacional (art. 49, inc. XVII da CF/88) aprovar previamente a alienação ou concessão de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares. Além do mais, em vista do depoimento prestado à revista Veja pelo Sr. Ronaldo Barata, Presidente do Iterpa, há notícia de que três funcionários do empreiteiro e do próprio Cecílio compareceram previamente à sede do Iterpa para averiguarem a situação jurídica das terras e foram informados de que as terras não pertenciam aos então vendedores e sim ao Estado, mas, mesmo assim, fora efetuada "compra e venda das terras". Temos de forma clara a figura de um dos mais escancarados estelionatos da história, porque nessa operação o empreiteiro obteve uma "vantagem ilícita" (as terras) em prejuízo alheio (União e do Estado do Pará) e tinha plena ciência de que estava participando de uma fraude, pois atuou em detrimento do patrimônio público.  

Fazendo valer o seu direito de posse ilegal das terras, a Rondon vem deslocando habitantes tradicionais da área, expulsando seringueiros, castanheiros, populações ribeirinhas, além de madeireiros e garimpeiros, muitos dos quais com lavras autorizadas pelo DNPM. Também há denúncias de pressões exercidas pelas empresas contra comerciantes itinerantes – os chamados regatões –, para que deixem de fornecer suas mercadorias aos moradores da área, o que obrigaria estes a deixarem os locais onde vivem há décadas.  

Há denúncias também de que esse cidadão contratou índios, que já estavam afastados das suas tribos, e deu-lhes armas para fazer a guarda dessas suas pretensas terras.  

Outras denúncias estão relacionadas com o desrespeito aos direitos trabalhistas de seus empregados. Nenhum dos atuais 80 empregados teria carteira assinada e trabalham em regime ilegal de carga horária, com características de trabalho escravo, e portam ilegalmente armas fornecidas por esse cidadão. Em reportagem na revista Veja, de 8 de novembro último, foi publicada denúncia da dívida de Cecílio Rego Almeida com o INSS, da ordem de R$85.000.000,00. Ele chegou a tentar dar uma fazenda no Mato Grosso em troca da quitação da dívida, mas não conseguiu provar a propriedade das terras.  

Impressionante e nefasto, Srs. Senadores, é o fato de que o vereador Eduardo Modesto fez acusações gravíssimas à C.R.Almeida sobre formação de quadrilha, ocultação de cadáver, trabalho escravo, mediante carta ao Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso, que, por sua vez, a redirecionou ao Ministro da Justiça, Sr. Renan Calheiros, o qual enviou dez policiais federais à região.  

A reportagem da revista Veja aduz que, muito embora sejam graves as acusações, até agora, porém – imaginem V. Exªs –, por falta de recursos, por falta de dinheiro, os policiais federais não foram até a área investigar as denúncias.  

Sr. Presidente, por tudo isso, julgo ser necessária a ação da Polícia Federal, em conjunto com os órgãos fundiários, para investigar a procedência das acusações e para apurar os fatos. Não se pode permitir que uma empresa continue agindo à revelia da Lei.  

Por meio do Requerimento nº 408/96, de 07 de maio de 1996, solicitei que fossem enviadas ao Sr. Ministro Extraordinário da Política Fundiária informações a respeito da legalidade da aquisição, pelo Sr. Cecílio do Rego Almeida, de 4,7 milhões de hectares de terras situadas no Estado do Pará.  

Depois de um ano e muita insistência, em junho de 1997, o Ministro Raul Jungmann nos encaminhou cópia da certidão de registro dos imóveis no Cartório de Registro de Imóveis da comarca de Altamira - PA, além de informações obtidas junto ao Instituto de Terras do Pará - Iterpa e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA.  

O Instituto de Terras do Pará apresentou pedido inicial de ação de nulidade e cancelamento de matrícula, transcrições e averbações no registro de imóveis, proposta perante o Juízo da Comarca de Altamira, em que esclarece a situação de fato e de direito das áreas objeto de apropriação indevida por parte da empresa Indústria, Comércio, Exportação e Navegação do Xingu Ltda. - INCENSIL, que estaria fazendo o papel de "laranja" ou "testa-de-ferro" do Sr. Cecílio do Rego Almeida. O Iterpa também informou que as áreas anexadas abrangem uma superfície de quase 6 milhões de hectares. Já o INCRA informou que ingressou na lide e, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, requereu o encaminhamento do feito à Justiça Federal.  

Considerando que até a presente data, passados três anos, a situação se mantém inalterada, estou hoje apresentando um requerimento, mais uma vez, ao Sr. Ministro da Política Fundiária, Raul Jungmann, para que nos esclareça sobre o andamento da questão, pedindo que nos informe as providências que vêm sendo tomadas em relação ao caso.  

Neste requerimento, solicito também informações sobre o pagamento do ITR. Vejam bem a ilegalidade da posse dessa terra: o cidadão afirma e registra em cartório que tem uma área de 4,7 milhões de hectares no Estado do Pará. Não há registro no INCRA; ele não paga o ITR. Portanto, a sua dívida hoje com a Receita Federal é da ordem de R$200 milhões, apenas de Imposto Territorial Rural.  

Ademais, nesta oportunidade, apresento outro requerimento, endereçado ao Sr. Ministro da Justiça, a fim de que S. Exª preste as devidas informações sobre quais os procedimentos que foram adotados pela Polícia Federal para a apuração dessa aquisição de terras pela C.R. Almeida e sobre as denúncias de assassinatos, ocultação de cadáveres, trabalho escravo, formação de quadrilha, feitas pelo Vereador Eduardo Modesto, de Altamira, além de esclarecer a veracidade ou não da reportagem da Revista Veja de que o atraso das indenizações se deve à falta de verba para a viagem dos policiais federais à região.  

Também estou enviando ofício ao Sr. Nelson Borges, Presidente do INCRA, solicitando informações a respeito deste problema, que considero da maior gravidade, pois trata-se de um golpe em que uma empresa tenta açambarcar uma área do tamanho da Holanda e da Bélgica juntas.  

Peço à Mesa que inclua a cópia destes três requerimentos como parte integrante deste pronunciamento.  

Apresento, Sr. Presidente, em primeiro lugar, o ofício dirigido ao Dr. Nelson Borges Gonçalves com todas as explicações e pedido de resposta e dois requerimentos oficiais que entrego a esta Casa - requerimentos de informação. Como já disse, um, dirigido ao Ministro Jungmann, para saber em que pé está o processo, porque a primeira resposta enviada por S. Exª, depois de um ano de recebido o primeiro pedido de informação, não disse absolutamente nada. Quero saber em que situação estão as providências tomadas pelo Ministério no sentido de que a questão venha para a Justiça Federal, conforme solicitado pelo INCRA. E, finalmente, o requerimento de informação ao Ministro da Justiça para saber que providências S. Exª tomou em função das denúncias apresentadas e se é verdade ou não que os policiais federais nunca foram ao local porque o Ministério da Justiça não teve recursos para pagar a passagem e as diárias dos policiais federais que deveriam investigar a denúncia.

 

O Sr. Romero Jucá (PSDB-RR) - V. Exª me permite um aparte?  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Concedo, com satisfação, o aparte ao Senador Romero Jucá.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB-RR) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, registro a importância do tema levantado pelo Senador Ademir Andrade. A ocupação de terras, a grilagem de terras, os conflitos em grandes áreas não se estendem apenas ao Estado do Pará. É uma realidade praticamente de toda a Amazônia e também de parte do Centro-Oeste. Portanto, entendo que esta é uma ótima oportunidade para o Ministro Raul Jungmann, do Ministério Extraordinário da Política Fundiária, e o INCRA providenciarem um cadastramento de terras, a fim de que haja um banco de terras, levantando-se o potencial fundiário deste País, porque é inadmissível acontecerem fatos como os narrados há pouco pelo Senador Ademir Andrade. Sem dúvida nenhuma, é de fundamental importância que tenhamos condições de averiguar efetivamente a propriedade das terras no Brasil, verificando o que está sendo grilado da União, que tipo de ocupação pode-se fazer nessas terras, exatamente para que, de um lado, se promova a reforma agrária e, de outro, se evite a malversação de recursos públicos da forma como vem ocorrendo. O Senador retrata aqui uma grave questão; de sorte que quero juntar-me à sua voz no sentido de apelar ao Ministro Raul Jungmann e ao INCRA, a fim de que efetivamente tomem providências para que, talvez, o caso específico da C. R. Almeida se torne emblemático, sinalizando para os outros, que assim agem no nosso País, que, de fato, chegou o momento de dar um basta a esses abusos e a essas ocupações ilegais. Parabenizo o Senador Ademir Andrade por abordar uma questão tão relevante para a região e para o País.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PT-PA) - Agradeço a manifestação de V. Ex.ª, Senador Romero Jucá. Ainda hoje, estiveram em meu gabinete trabalhadores de Paraopebas, muito insatisfeitos por estarem recebendo apenas cinco alqueires de terra, ou seja, menos de 25 hectares.  

Já ficou provado que, num dos primeiros assentamentos, o de Palmares, 96 famílias foram retiradas porque a área não era suficiente para atender às suas necessidades, sendo essas famílias deslocadas para outro loteamento, onde receberam oito alqueires, quase 40 hectares de terra. Agora, causa-me admiração o Governo do Senhor Fernando Henrique Cardoso, notadamente em uma situação como a atual, permitir que um empresário como esse se diga o maior latifundiário do Planeta, apresentando documentos, apropriando-se de uma vasta área e cometendo barbaridades na nossa terra, em uma propriedade de 4,7 milhões de hectares - e isso é o que ele diz nos documentos que apresenta. Na verdade, o Iterpa, por outro lado, afirma que essa área que esse cidadão está cercando, inclusive, com índios armados, chega a 6 milhões de hectares.  

Então, Sr. Presidente, não é possível que, na situação de disputa, de conflito, de morte e de violência como ocorre no Brasil, permita-se que um cidadão se aproprie ilegalmente de seis milhões de hectares de terra no Estado do Pará.  

Em outra época, denunciei aqui, nesta Casa, que a Companhia Vale do Rio Doce também grilou terras no Estado do Pará. A Companhia Vale do Rio Doce ganhou oficialmente, por este Senado da República, 410 mil hectares para a implantação do Projeto Carajás. De outra parte, por meio de convênios com o Ibama, conseguiu o direito de administrar três reservas florestais, cuja área, de 300 mil hectares, está separada daquela primeira de 410 mil hectares. Pois bem; a Companhia Vale do Rio Doce grilou todas as áreas existentes entre uma e outra. Oficialmente, ela teria 410 mil mais os 300 mil hectares das reservas florestais, que não são de sua propriedade mas que ela administra por convênio com o Ibama. Ela grilou as áreas intermediárias e hoje ocupa, no Estado do Pará, 1.160 mil hectares de terra. E atualmente não é nem uma empresa privada; é uma empresa de capital internacional. E, para quem não sabe, os 19 trabalhadores que morreram em Eldorado dos Carajás, iniciaram a sua luta, mas foram expulsos das terras que ocupavam pela Vale do Rio Doce. Dois anos depois de longa espera, eles encontraram a morte em Eldorado dos Carajás.  

Espero que, desta vez, o Ministro Raul Jungmann seja mais firme nesse processo. Uma vez fiz um pedido de informação e S. Exª levou mais de um ano para responder e não disse absolutamente nada; apenas mandou as cópias dos documentos de registro de cartório de Altamira, sem referência alguma sobre se era ou não legal, se era ou não justo, enfim, não havia nenhum comentário.  

Estou entrando com requerimento de informações pedindo mais detalhes sobre essa questão, porque não posso admitir que o maior grileiro e latifundiário do planeta se instale no meu Estado, o Pará.  

Era essa a manifestação que queria fazer, Sr. Presidente.  

 

c A


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/04/1999 - Página 9067