Discurso no Senado Federal

REFLEXOS DA CRISE ECONOMICA BRASILEIRA SOBRE O MERCOSUL.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).:
  • REFLEXOS DA CRISE ECONOMICA BRASILEIRA SOBRE O MERCOSUL.
Publicação
Publicação no DSF de 01/05/1999 - Página 9803
Assunto
Outros > MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
Indexação
  • ANALISE, EFEITO, ECONOMIA, PAIS ESTRANGEIRO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), REFERENCIA, CRISE, DESVALORIZAÇÃO, MOEDA, BRASIL.
  • COMENTARIO, ELEIÇÃO, COMISSÃO DIRETORA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), MISSÃO, INCENTIVO, INTEGRAÇÃO, ECONOMIA, CULTURA, LEGISLAÇÃO, ESTADOS MEMBROS.
  • COMENTARIO, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, SENADO, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI, CAMARA DOS DEPUTADOS, ASSUNTO, CRIAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, ENSINO, LINGUA ESPANHOLA, OBJETIVO, INTEGRAÇÃO SOCIAL.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um dos efeitos graves da crise econômica que vivemos é a turbulência e a tensão que ela injetou no Mercosul, um projeto ambicioso de importância estratégica para o Brasil e seus vizinhos, que vinha dando muito certo, além de acenar com possibilidades futuras. Mas a crise afetou o Brasil e, por conseguinte, os demais integrantes do Bloco. No início desta semana, o Congresso Nacional empossou a nova Comissão Parlamentar do Mercosul, da qual faço parte desde 1995. Tivemos a honra de contar com as presenças dos Srs. Embaixadores da Argentina, do Paraguai e do Uruguai.  

Apesar da crise, o Mercosul continua sendo assediado por outros blocos e até mesmo por países que apostam nos acordos bilaterais. Para se ter uma idéia desse sucesso, basta ver que o comércio entre esses quatro países saltou, nos últimos oito anos, de US$4 bilhões anuais para US$20 bilhões! As trocas comerciais dentro do Mercosul, além de terem tido um grande incremento, passaram gradualmente a abranger uma gama imensa de mercadorias. Vende-se e compra-se de tudo: aço, produtos agrícolas, alimentos, autopeças e automóveis. O Bloco produz 20% dos grãos do mundo, graças aos efeitos positivos da estabilidade econômica, responsável pela prosperidade do Mercosul.  

Com o colapso do real e com suas cotações em dólar situadas no extremo oposto, nossos parceiros de Mercosul vêem-se diante de espinhosas dificuldades. Além disso, a falta de tempo para uma adaptação à nova situação que se criou repentinamente, introduz um nervosismo perigoso no Mercosul, ameaçando uma instituição que custou tanto esforço e criatividade para ser construída.  

Por essa razão, apelei ontem - quando da eleição da nova Comissão Diretora do Mercosul - aos nossos diplomatas e aos representantes dos países vizinhos que olhassem o Mercosul com outros olhos. "Não podemos competir entre nós" - dizia eu naquele momento. Precisamos atuar juntos, unindo as forças desta região para conseguirmos o pleno desenvolvimento de todos. Temos o protecionismo norte-americano e europeu a ser combatido, mas, isoladamente, não alcançaremos êxito nenhum. Vejo o Brasil como principal sofredor e sacrificado por sua crise. Mas as soluções encontradas aqui terão de levar em conta a situação econômica de cada um de seus parceiros, para que se possa preservar as conquistas multilaterais obtidas nesta década. É preciso que haja uma forte unidade em benefício do fortalecimento do Mercosul, e o Brasil, com o grande porte de sua economia e de seu mercado, sem dúvida, por naturalidade, é o carro-chefe deste Bloco.  

Os problemas de nossos vizinhos são bem reais. Há previsões de que as exportações da Argentina, que totalizaram US$19,2 bilhões em 1998, sofrerão, este ano, uma queda em torno de 30%. O Paraguai já registra, neste início de ano, uma queda de 31% em suas exportações. No Uruguai, que exporta peixe para o Brasil, 20% da frota pesqueira encontra-se paralisada hoje. Em Córdoba, pólo automotivo argentino, dos 30 mil trabalhadores nas fábricas da Renault, da Fiat, da Chrysler e da General Motors, 6.400 foram licenciados e os remanescentes tiveram seus salários reduzidos à metade.  

Como se isso não bastasse, muitos ainda duvidam que o Brasil possa evitar a catástrofe econômica e temem ser arrastados por ela. Há, portanto, um clima de desconfiança que acaba gerando instabilidade na região e que muito nos preocupa. Não são estes os exemplos que gostaria de apresentar, mas é esta a realidade que precisa ser modificada.  

Outro aspecto importante é que a integração não deve, de forma alguma, restringir-se, na minha opinião, aos meandros econômicos. Devemos atuar - e este será o papel da nova Comissão Parlamentar - de forma a unificarmos, sem prejuízo das peculiaridades internas de cada país, as legislações em todos os campos. A juventude brasileira anseia pela completa integração cultural, enquanto que a nossa classe trabalhadora considera positiva a compatibilidade das leis trabalhistas. É esse caminho que devemos percorrer.  

A Comissão de Educação do Senado vota, na próxima quarta-feira, o projeto de lei da Câmara que institui a obrigatoriedade do ensino da língua espanhola nas escolas de ensino médio. É mais um passo rumo à completa integração do Bloco. Deveremos ratificar em breve os protocolos de integração educacional, títulos universitários, integração cultural, cooperação jurisdicional em matéria civil, trabalhista e administrativa, assistência jurídica, acordo multilateral sobre previdência social e a declaração sociolaboral. Recentemente, aprovamos o nome do Embaixador Sebastião do Rego Barros, um dos mais destacados quadros da diplomacia brasileira, para chefiar nossa missão em Buenos Aires, numa demonstração do alto grau de importância conferido pelo nosso Governo ao país vizinho.  

Sr. Presidente e nobres Colegas, ao Brasil interessa preservar a grande conquista que representa o Mercosul e até mesmo sacrificar-se para isso. Os países-membros do Bloco não podem abandonar o barco ao primeiro sinal de perigo. O entendimento e a cooperação devem prevalecer sobre o desespero, nesta quadra de dificuldades. Devemos trabalhar para que as instituições multilaterais cheguem ao final da crise funcionando plenamente, com o Mercosul em posição de dar suporte a um novo ciclo de prosperidade, numa postura de solidariedade que tão bons frutos já renderam na longa caminhada percorrida desde 1985.  

Sr. Presidente e nobres Colegas, anteontem se constituiu a nova Comissão Diretora do Mercosul para o próximo biênio, na presença dos Embaixadores do Paraguai, da Argentina e do Uruguai. Num momento, como eu disse, não propício, não favorável, em função da própria desvalorização do real, em que esses países sentem-se prejudicados, no momento em que estamos a enfrentar todas essas características, penso que o bom senso deve prevalecer. Eu disse, na presença dos Embaixadores - ainda anteontem, quando da eleição da nova Comissão do Mercosul -, que não podemos de forma alguma competir entre nós.  

A razão da criação da Comissão do Mercosul, da unidade dos países do Cone Sul, não é a competição interna. Não é essa a razão principal, em absoluto. O fundamental é a integração, o espírito de irmandade, para que possamos nos dar as mãos e formar esse Bloco, para juntos termos mais forças, para podermos conversar, em melhores condições e com mais naturalidade, com outros blocos. Não devemos ficar divididos. Em bloco, já é difícil; o que dirá divididos! Não é fácil conversar isoladamente com o bloco do Norte, com o bloco europeu ou mesmo com o Oriente, apesar dos problemas.  

Por que a Comunidade Européia resolveu formar o seu bloco? Sem dúvida alguma, porque estava sentindo que, com o tempo, os Estados Unidos, isoladamente, não tinham mais como manter a sua tradição no mundo. Aí resolveram formar a Unidade Européia. Essa é a grande razão de o berço da humanidade, o berço do mundo, manter suas relações e ser respeitado. Apesar das tradições, deve-se atualizar isso. Essa é a evolução dos tempos.  

Sem dúvida alguma, para nós, no extremo sul da América Latina, a razão fundamental é esta: devemos ter condições, por meio do Bloco, de conversar pelo menos com um pouco mais de igualdade com todos esses blocos. Essa é a sua grande razão de ser; não se trata de competição entre nós. Com a ajuda do intercâmbio de mercadorias, daquilo que produzimos, poderemos ser, juntos, um pouco mais respeitados pelo mundo, poderemos competir em melhores condições.  

Vinte por cento dos grãos produzidos no mundo têm origem aqui. Precisamos conversar, inclusive com o Mercado Comum Europeu, para alcançar um entendimento. Lá existe o protecionismo - isso é natural - em vários setores, mas eles também têm interesse em nosso mercado consumidor, que é grande. Precisamos conversar no sentido de que haja reciprocidade e para que isso aconteça, é preciso haver a unidade dos blocos.  

A unidade é o grande objetivo a ser atingido no futuro, não só pelos quatro países, mas por todos os países do Pacto Andino. Temos que nos tornar uma irmandade cada vez maior. Nós estamos atravessando um momento difícil no campo das trocas comerciais, mas devemos nos esforçar para fazer com que circulem com maior liberdade as mercadorias entre os quatro países do Mercosul, seus associados, o Chile e a Bolívia, e outros países que começam a participar mais diretamente desse processo.  

Também no campo cultural, Sr. Presidente, precisamos cada vez mais buscar essa unidade e esse entendimento. Isso é fundamental. Paralelamente à integração cultural, também devemos procurar a integração de legislações. É para isso que existe a comissão: para aperfeiçoar a legislação, buscar adaptações no campo do Judiciário, no campo trabalhista, enfim, em todos os setores. Precisamos examinar as legislações e adaptá-las, mas sempre preservando aquilo que é mais reservado, mais íntimo de cada país - suas cláusulas pétreas, eu diria.  

Devemos avançar no sentido de facilitar o intercâmbio, desburocratizando certas funções, certas legislações. Essa questão é fundamental. Nesse sentido, acredito que a comissão parlamentar há pouco instalada tem um grande objetivo a alcançar: facilitar a aproximação e a integração, estimulando todos os setores, seja no campo econômico, cultural ou profissional. Deve-se trabalhar no sentido da reciprocidade, para que as legislações possam avançar no sentido do bem comum. Esse é um importante papel – eu o disse na presença dos respectivos embaixadores – e, por isso, trouxe a esta Casa, nesta manhã, essas considerações.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/05/1999 - Página 9803