Discurso no Senado Federal

APOIO A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E A RUPTURA ESTRUTURAL QUE ELA REPRESENTA NA GESTÃO FISCAL.

Autor
Paulo Hartung (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Paulo César Hartung Gomes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO FISCAL.:
  • APOIO A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E A RUPTURA ESTRUTURAL QUE ELA REPRESENTA NA GESTÃO FISCAL.
Publicação
Publicação no DSF de 30/04/1999 - Página 9270
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO FISCAL.
Indexação
  • APOIO, PROJETO DE LEI, ORIGEM, EXECUTIVO, REGULAMENTAÇÃO, FINANÇAS PUBLICAS, DEFINIÇÃO, RESPONSABILIDADE, GOVERNANTE, NATUREZA FISCAL, DEFESA, AGILIZAÇÃO, TRAMITAÇÃO, DIVIDA PUBLICA.
  • IMPORTANCIA, RESPONSABILIDADE, REGIME FISCAL, GARANTIA, ESTABILIDADE, ECONOMIA, ALTERAÇÃO, DIVIDA PUBLICA.
  • NECESSIDADE, INCLUSÃO, NORMAS, PREVENÇÃO, CONFLITO, NATUREZA FISCAL, ESTADOS, ESPECIFICAÇÃO, IRREGULARIDADE, CONCESSÃO, INCENTIVO FISCAL.
  • NECESSIDADE, INCLUSÃO, NORMAS, FISCALIZAÇÃO, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, ATUAÇÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN).

O SR. PAULO HARTUNG (PSDB-ES) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na Assembléia Nacional Constituinte, que há pouco mais de dez anos elaborou a atual Constituição, o relator da Comissão Temática encarregada de tratar do sistema tributário, dos orçamentos e do sistema financeiro, o atual Ministro da Saúde, José Serra, sugeriu - como uma das principais e mais inovadoras medidas para a organização e o equilíbrio permanente das contas governamentais - a elaboração de um Código de Finanças Públicas. A expressão "código" foi suprimida no texto final, mas foi mantida, no artigo 163, a atribuição à lei complementar para dispor sobre as finanças públicas em geral; o endividamento governamental, especialmente mobiliário e prestação de garantia; e sobre a fiscalização financeira e as funções dos bancos estatais.  

Recentemente, o Presidente Fernando Henrique Cardoso enviou ao Congresso Nacional um projeto para regular tal disposição da Constituição. A proposta vem sendo chamada de Lei de Responsabilidade Fiscal. Trata-se de uma iniciativa extremamente louvável, para a qual se espera uma apreciação legislativa atenciosa e célere , uma vez que, em sua estrutura básica, atende plenamente o espírito constituinte em relação às normas gerais para finanças e dívida pública.  

Com essa proposição, o Governo espera dar eficácia e coerência a um conjunto de medidas - muitas já previstas na própria Constituição - que contribuem decisivamente para uma melhor organização do gasto público e que dependem de uma legislação complementar, ou para entrarem em vigor, ou para serem melhor interpretadas e aplicadas, de modo a produzir plenos efeitos.  

Na verdade, o que ocorre é que nunca se deu a devida importância a tais matérias. Nem a mídia, nem os economistas, nem o próprio Executivo. Muito menos o Congresso. Em grande parte, porque preferiu-se enfrentar o desafio do déficit com sucessivos planos econômicos, pacotes tributários e, mais recentemente, programas de corte de gastos, que, quando alcançaram os resultados pretendidos, não o fizeram de forma sustentada. A Lei de Responsabilidade Fiscal significa o abandono da prática de tentar "tapar buracos" e a implementação de um novo regime, fundamentado em lei nacional, e que, portanto, só pode ser alterado por quorum qualificado e com metas fiscais conjunturais cravadas em leis.  

Mais que discursos ou cartas de intenção, a austeridade fiscal deverá ser uma prática obrigatória, sob pena de se descumprir uma lei e não uma promessa. Não estamos falando de uma missão impossível . Mesmo porque, o País já está coroado de experiências concretas, bem-sucedidas, de reequilíbrio das contas. Basta ver o caso de São Paulo. Na década de 80, o Governo Montoro conseguiu garantir o equilíbrio das finanças públicas e agora, depois de duas complicadas administrações, o Governador Mário Covas está repetindo a empreitada.  

Esses são exemplos eloqüentes de que há saída para o inferno fiscal - embora o preço seja alto sobretudo para os contribuintes - e, especialmente, de que a austeridade é uma obra que se constrói na gestão do dia-a-dia das contas públicas, com políticas e práticas firmes e consistentes. Até porque, se alicerçada apenas em discursos e acenos para o mercado, mais dia, menos dia, a casa cai.  

Não tenho dúvidas de que um regime fiscal responsável garantirá a estabilidade de preços - conquista recente da sociedade brasileira - abrirá caminho para a tão sonhada mudança de perfil da dívida pública nacional e para a redução das taxas de juros de forma sustentada. E a conjugação desses fatores certamente provocará mudanças na lógica de funcionamento do nosso sistema financeiro, o que, indiscutivelmente, traduzir-se-á em mais empregos e melhores oportunidades para a população.  

O Congresso, por certo, aprofundará o debate público e poderá aperfeiçoar a proposta de Lei de Responsabilidade Fiscal. Na minha opinião, faltou tratar de pelo menos dois pontos muito importantes para uma mudança estrutural do regime fiscal, em que pese terem forte correlação com outras matérias - os sistemas tributário e financeiro.  

Em primeiro lugar, destaco a ausência de normas mais diretas, objetivas e eficazes contra a chamada guerra fiscal. Numa conjuntura onde encontramos Estados e Municípios falidos ou pré-falidos e diante de uma reforma estrutural que pretende dar maior austeridade e responsabilidade às administrações e aos administradores, é imprescindível aproveitar a oportunidade para combater frontalmente a concessão arbitrária e irregular de incentivos.  

É absolutamente inaceitável e deveria ser punido, inclusive com ação civil e penal contra os responsáveis, que um Estado ou Município ofereça incentivos à custa de outro Estado ou Município. Ou seja, que se conceda a um contribuinte redução do imposto que é subtraído da arrecadação de outro sem que este seja consultado ou consinta.  

E em segundo, o fato de terem sido deixadas de lado as questões relativas à interface das finanças públicas e privadas (como as operações estatais cambiais, a emissão direta de títulos pelo Banco Central, a fiscalização de todo o sistema financeiro e atuação dos bancos estatais). O Executivo - preocupado, talvez, com a extensão e complexidade da proposta - acabou ignorando esses itens. Mas, pessoalmente, acho que, quando se discute e aprova um Código, mais importante que o tamanho de um texto, é sua qualidade, é sua capacidade de tratar de forma coesa e harmônica as mais diferentes facetas de uma mesma matéria.  

Especificamente sobre as matérias omissas, é importante ressaltar que os constituintes não incluíram a fiscalização das instituições e dos mercados financeiros no capítulo que trata do Sistema Financeiro e sim no que diz respeito às Finanças Públicas, e no mesmo artigo que trata da responsabilidade fiscal. Eles foram extremamente felizes em relação à tendência moderna mundial que reserva ao banco central - independente ou não - o papel de guardião da moeda e, no máximo, supervisor do sistema bancário.  

Nosso sistema financeiro desenvolveu-se a ponto de demandar uma fiscalização que não se limite a bancos ou a bolsa de valores tradicional. Os recentes episódios realçam o vazio institucional - da supervisão à fiscalização - em que está mergulhada a parte que mais cresce de nosso sistema: o mercado de futuros.  

A questão da fiscalização financeira deve ser encarada de maneira eficaz, abrangente e em separado da regulamentação do banco central. Se já temos uma proposta muito avançada para a responsabilidade fiscal, falta agora tratar da responsabilidade financeira, em sua expressão mais ampla, que não se limite apenas à moeda ou ao câmbio, ou a matérias exclusivamente pertinentes ao Banco Central e à lei que o regulará.  

Quero registrar o meu apoio enfático à Lei de Responsabilidade Fiscal e à ruptura estrutural que ela representa na gestão fiscal. Era premente reunir e dar um tratamento consistente e disciplinador às mais diferentes matérias fiscais - do orçamento e sua execução, passando pelos gastos com pessoal e pela seguridade, até a dívida pública.  

Faço ainda questão de esclarecer que as ressalvas que apresento em nada contrariam os objetivos e as normas do projeto. Minha intenção é contribuir para o seu aprimoramento. Espero sinceramente que o Congresso aprove o mais breve possível tal proposta e aprofunde a austeridade que enseja. É óbvio que uma lei, por si só, por mais importante que seja, não tem a capacidade de erradicar todas as distorções existentes. Não tenho essa ilusão.  

Também não acho que esse projeto de lei tramitará no Congresso sem obstáculos e reações. Mas faço aqui minha defesa e profissão de fé de que o projeto seja aprovado e que a boa saúde das contas públicas no País passe do âmbito das cartas de macrointenções para o da árdua e eficaz gestão do dia-a-dia em todas as áreas do serviço público.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/04/1999 - Página 9270