Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O DISCURSO DE DESPEDIDA DO DEPUTADO ALMINO AFFONSO, PRONUNCIADO NO FINAL DA LEGISLATURA PASSADA, EM QUE TECE CRITICAS A DESATENÇÃO DOS PARLAMENTARES AQUELES QUE OCUPAM A TRIBUNA E AO ABUSO DA PRERROGATIVA DO EXECUTIVO NA EDIÇÃO DE MEDIDAS PROVISORIAS.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MEDIDA PROVISORIA (MPV). LEGISLATIVO.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O DISCURSO DE DESPEDIDA DO DEPUTADO ALMINO AFFONSO, PRONUNCIADO NO FINAL DA LEGISLATURA PASSADA, EM QUE TECE CRITICAS A DESATENÇÃO DOS PARLAMENTARES AQUELES QUE OCUPAM A TRIBUNA E AO ABUSO DA PRERROGATIVA DO EXECUTIVO NA EDIÇÃO DE MEDIDAS PROVISORIAS.
Aparteantes
Lúcio Alcântara, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 05/05/1999 - Página 10044
Assunto
Outros > MEDIDA PROVISORIA (MPV). LEGISLATIVO.
Indexação
  • LEITURA, DISCURSO, DESPEDIDA, ALMINO AFFONSO, DEPUTADO FEDERAL, CONCLUSÃO, MANDATO PARLAMENTAR, CRITICA, FALTA, ATENÇÃO, DEPUTADOS, CONGRESSISTA, USO DA PALAVRA, TRIBUNA, ABUSO, PRERROGATIVA, EXECUTIVO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), DESRESPEITO, FUNÇÃO LEGISLATIVA, CONGRESSO NACIONAL.
  • COMENTARIO, CULPA, CONGRESSO NACIONAL, ACEITAÇÃO, USURPAÇÃO, EXECUTIVO, FUNÇÃO LEGISLATIVA.
  • AVALIAÇÃO, INEFICACIA, EMENDA CONSTITUCIONAL, APROVAÇÃO, SENADO, SOLUÇÃO, PROBLEMA, MEDIDA PROVISORIA (MPV).
  • SOLICITAÇÃO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, PRESIDENTE, SENADO, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, FUNCIONAMENTO, COMISSÃO MISTA, ANALISE, ADMISSIBILIDADE, REJEIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), IMPEDIMENTO, ABUSO, EXECUTIVO, RESTABELECIMENTO, PRESTIGIO, CONGRESSO NACIONAL.

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para reflexão de todos os membros desta Casa, não me furto de trazer ao conhecimento dos Srs. Senadores o discurso de despedida do Deputado Almino Affonso, pronunciado no final da Legislatura passada.  

Para quem não conhece, Almino Affonso foi, nos anos 50 e 60, um dos mais brilhantes parlamentares deste País, então representando o Estado do Amazonas. Mais recentemente, cassado, exilado, retornou, foi Vice-Governador do Estado de São Paulo e Deputado na Legislatura passada. Nesse discurso, ele extravasa toda sua melancolia e desencanto com o Parlamento de hoje.  

Sr. Presidente, reproduzo algumas de suas palavras:  

"Seja pela palavra oral ou escrita, a oratória pressupõe quem a ouça. Como pode o orador que anseia desempenhar-se com dignidade assumir a tribuna se o plenário desta Casa, a cada tarde, durante o Grande Expediente, reduz-se a um auditório de cadeiras vazias? O descaso com que a Câmara dos Deputados convive com essa realidade é espantoso: o orador, na mais absoluta solidão, falando às cadeiras vazias ou, quando muito, a dois ou três parlamentares que - por respeito, afeto ou desfastio - o escutam.  

O dramático nos dias de hoje é que a palavra também é asfixiada na Ordem do Dia. Justo quando os projetos de lei são discutidos, propiciando, em tese, o confronto das posições políticas, há uma desatenção universal. Instaura-se no plenário um burburinho que o orador, mesmo que desenvolva o melhor dos argumentos - e muitos o fazem -, mais uma vez está fadado a falar para si próprio. Ressalvem-se as exceções raríssimas.  

A palavra do orador, ilhado na tribuna, para a qual ninguém atenta, é de uma inutilidade absoluta. Estranho destino o de um Parlamento onde a palavra está morta! Não bastasse ao orador a incomunicação com seus próprios colegas, ainda vê, em derredor ao plenário, as galerias bloqueadas por paliçadas de vidro fumê, tornando o povo distante, abstrato, irreal.  

Como ensina o latino Coelho, a oratória é uma arte literária e uma instituição essencial, o belo posto a soldo do bom. A Tribuna levantada como supremo principado no lugar do trono antigo, o orador exercendo a sua efêmera, porém gloriosa, ditadura com essa maravilha que os reis não podem alcançar: a de reger a multidão, o indômito corcel, com o delicado fio da palavra.  

A própria Oposição, porque não é ouvida, desobriga-se de argüir o Governo; e se acaso o faz, o Plenário desatento não levanta a luva e a Liderança da Maioria torna-se muda, esmaecendo o episódio. Como de fato a palavra perdeu o valor, a esmagadora maioria despreocupada aguarda a voz de comando de sua liderança e, mecanicamente, vota. Agravada pela adoção de procedimentos regimentais, que propiciam a matéria ser votada em regime de urgência urgentíssima, excluindo sua apreciação pelas Comissões Técnicas e sufocando o debate no plenário.  

O que me espanta é a concentração da iniciativa legislativa nas mãos do Poder Executivo, num crescendo que parece já agora incontrolável, reduzindo-se o Poder Legislativo a um órgão ratificador da vontade onipotente do Presidente da República.  

De 1995 até setembro de 1998, mais de 80% das proposições que se transformaram em leis tiveram como origem o Poder Executivo, sem incluir nesse percentual as medidas provisórias."  

Dou um exemplo: foram editadas até hoje 3.416 medidas provisórias, das quais 511 originais; 2.905, reedições.  

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - V. Exª me permite um aparte, Senador Jefferson Péres?  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - Senador Lúcio Alcântara, concedo-lhe o aparte, com muito prazer. O único problema é que eu ia falar após a Ordem do Dia, por 50 minutos. Vejo-me com uma enorme angústia de tempo para tentar resumir o meu pronunciamento em 20 minutos, embora contando com a habitual benevolência da Presidência.  

"O extremamente grave, porém, é a castração do Parlamento, a partir da instituição das medidas provisórias. A Comissão Mista, integrada por Senadores e Deputados, tem a prerrogativa de recusar de plano a medida provisória que não atenda aos requisitos de relevância e urgência. Rejeitada a sua admissibilidade, a proposição será arquivada, "baixando o Presidente do Congresso Nacional ato declarando insubsistente a medida provisória, feita a devida comunicação ao Presidente da República".  

Mais adiante, dizia S. Exª:  

"Nesse contexto, as medidas provisórias vão se convertendo em leis de fato. E, amanhã, quando o Congresso Nacional assumir a tarefa de votá-las, serão tantos os efeitos de sua vigência, que já não sobrará alternativa senão aprová-las.  

O Presidente da República, por esse procedimento tortuoso, esbulha o Congresso Nacional em sua principal função e transforma-se, cada vez mais, no "legislador unipessoal".  

Para ilustrar esse quadro desconcertante, relembro a Medida Provisória nº 542/94, por meio da qual se instituiu o real. Reeditada 12 vezes, o Congresso Nacional, ao votá-la em 1995, ainda que eventualmente quisesse, não tinha outra saída senão aprová-la.  

A função legislativa, como se vê, vai se transformando em um ato homologatório."  

O Congresso Nacional não consegue, há quatro anos, deliberar sobre o valor do salário mínimo. No período, o Governo tem legislado por meio de medida provisória. A Medida Provisória nº 1.744, publicada em fins de abril do ano passado, foi reeditada 12 vezes e agora pereceu de vez com a edição de uma nova medida provisória que quantifica o salário mínimo que deverá vigorar até abril do ano 2000.  

Continua o discurso do Deputado:  

"Até agora, jamais declararam inadmissível nenhuma medida provisória!  

A gravidade vai mais longe, chega a ser espantosa: com freqüência, a Comissão Mista sequer se reúne, e o Relator, emitindo o parecer que convém ao Poder Executivo, manda colher as assinaturas dos demais membros em seus respectivos gabinetes.  

A Medida Provisória nº 1.570-5, convertida na Lei nº 9.494, de 1997, entre outras aberrações jurídicas, "proíbe juízes e Tribunais brasileiros de conceder medida liminar contra atos do Governo relacionados com finanças públicas, mesmo que esses atos sejam claramente ilegais ou inconstitucionais".  

Volto a repetir: a Tribuna morreu.  

À falta de quem ouvisse a minha palavra no plenário povoado de cadeiras vazias, preferi reduzi-las a texto.  

Os Anais da Câmara dos Deputados hão de recolhê-la. De algo servirá a palavra que deixo? Entregue ao vento, talvez minha palavra se perdesse caindo entre espinheiros. Guardada nos Anais, quem sabe sobrevive? Talvez nem tarde tanto, ela ressurja com força de advertência: que alguém, por lê-la, lhe dê o chão que lhe falta. E, como a semente, nasça, cresça, espigue, amadureça e seja, por fim, colhida!"  

Trago esta palavras do Deputado Almino Affonso, editadas neste opúsculo, para que a semente dele floresça.  

Quero fazer um chamamento aos Senadores. O Senador Antonio Carlos Magalhães não está aqui, mas S. Exª há de me ouvir, há de saber que pronunciei estas palavras.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - E nós também.  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - S. Exª há de saber disso, Senador.  

O Congresso tem três funções. Senador Pedro Simon, como V. Exª, todos sabem disso. Esta Casa é um fórum de debates, e, quanto a isso, nada o Presidente desta Casa pode fazer. É que escasseiam os grandes oradores, e já não há interesses pelo discurso. A Casa, como fórum de debate, está se exaurindo, e o Presidente da Casa nada poderá fazer quanto a isso. Mas esta Casa tem também uma segunda função, que é a fiscalizadora, e o Presidente da Casa, secundado pelo Senador Jader Barbalho, revigoraram essa função ao criarem as duas Comissões Parlamentares de Inquérito ora em funcionamento. Mas há a terceira função, aliás a mais importante, Sr. Presidente, que é a função legiferante. Esta, o Congresso não está exercendo. Foi usurpada pelo Executivo, e estamos aceitando isso desde a promulgação da Constituição - já lá se vão dez anos -, e, quanto a isso, o Presidente desta Casa pode fazer muito.  

Este Senado até que já deu um passo adiante, ao regulamentar a edição de medidas provisórias. Encontra-se na Câmara, até hoje...  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Não sei se a que aprovamos é melhor do que a que está agora. Não votei a favor.  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - É verdade, Senador Pedro Simon. V. Exª tem razão. A medida provisória, por aquela proposta de emenda à Constituição, vai vigorar por 60 dias, prazo este prorrogável por mais 60 dias. Ora, vai vigorar durante 120 dias, ou seja, quatro meses, ao final dos quais teremos que homologá-la, Senador, porque os efeitos jurídicos decorrentes serão tão graves, que não teremos outra saída.  

Mais uma vez, esta Casa continuará emasculada. Mas, Senador Pedro Simon, podemos fazer alguma coisa mesmo sem isso. Como diz o Deputado Almino Affonso, por que não fazermos funcionar as Comissões Mistas, que analisam a admissibilidade da medida provisória?  

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - V. Exª me permite um aparte?  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - Concedo o aparte a V. Exª. Senador Pedro Simon, em seguida, eu o ouvirei com muito prazer.  

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - V. Exª tocou nesse assunto da medida provisória, que tem sido realmente um instrumento que, utilizado pelo Poder Executivo...  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - Abusivamente.  

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - ...que, utilizado abusivamente pelo Poder Executivo, retira muito da competência do Congresso. Ninguém pode ignorar que o Estado moderno precisa de instrumentos que permitam, em certos momentos, deliberar com rapidez. Imagine se o Governo encaminhasse o Plano Real para tramitar no Congresso! Seria impossível, visto que se trata de mudança de moeda e de uma série de coisas. Isso ninguém nega. O que nos causa espécie é o abuso, a repetição, o uso desse instrumento à exaustão. Entre outros, os Senadores Pedro Simon, Bernardo Cabral e Roberto Freire e eu fomos... E isso vinha no pressuposto do regime parlamentarista. Essa culpa não tenho, porque nunca militei entre os que pretendiam implantar no Brasil o regime parlamentarista na Constituição de 1988. Mas o sistema de trabalho de subcomissões, vindo de baixo para cima, terminou criando uma situação extremamente difícil, porque esse instrumento não se coaduna. Era melhor o decreto-lei do Getúlio, do Governo Militar.

 

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - É verdade, tinha decurso de prazo.  

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - Por decurso de prazo. Esse é um aspecto. Sobre o segundo, V. Exª acabou de falar. O Senado aprovou. Votei de forma favorável em parte; fui voto vencido na questão de novas competências para o Presidente da República. A Câmara dos Deputados - li nos jornais de hoje - está anunciando que vai se debruçar sobre a matéria e deliberar. E é bom que o faça, porque estamos numa situação extremamente difícil. É verdade - não é a sua, não é a minha, não é a nossa opinião, mas sim a de todos - que o Congresso tem culpa, porque também nunca resolveu enfrentar isso.  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - Com certeza.  

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - E ficamos nos queixando, porque o Governo tem a sua maioria, imobiliza a apreciação das matérias, deixa o prazo fluir para que ela seja reeditada e assim por diante. Para concluir, quero dizer que se fala muito sobre credibilidade e sobre incerteza jurídica, mas penso que não há nada que possa criar mais incerteza jurídica do que uma medida provisória, por uma razão muito simples. O Governador Olívio Dutra, do glorioso Rio Grande do Sul, desistiu, nos termos em que estava posto o contrato, de denunciar o entendimento com a Ford. O Governador Itamar Franco tem também uma série de divergências, está adotando outras políticas e, agora, vai, com a Cemig, tentar comprar Furnas. E se o Lula tivesse sido eleito Presidente da República? Ele tinha a orientação dele, certamente não iria concordar com muitas medidas provisórias e não as reeditaria. Então, estava estabelecida uma situação extremamente difícil, porque todo o relacionamento econômico e outros assuntos do Governo teriam que mudar, porque a medida provisória, como o próprio nome diz, é provisória. Portanto, é bom que se reflita sobre isso pelos desdobramentos que podem levar a uma mudança de Governo. Pode acontecer que um novo governo não esteja de acordo - se não com todas, pelo menos com parte daquelas medidas - e, conseqüentemente, não as reedite: vamos ter, então, que fazer uma lei para disciplinar as relações anteriores, constituídas na vigência da medida provisória. Do ponto de vista jurídico, não há como se defender isso. Era o que queria dizer, concordando com o pronunciamento de V. Exª como um todo, não só com a parte relativa à medida provisória.  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - Obrigado.  

V. Exª tem razão: o Congresso é culpado. Ainda está em tempo, no entanto, não apenas de fazermos o mea culpa , mas de reagirmos, todos nós, independentemente de sermos da oposição ou do governo.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - Senador Pedro Simon, gostaria de ouvi-lo por muito tempo, mas como o meu tempo está se esgotando, eu lhe pediria brevidade.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Gostaria, em primeiro lugar, de dizer que V. Exª foi exageradamente (inaudível) quando disse esperar que seu depoimento fosse lido pelo Presidente...  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Por favor, fale ao microfone, Senador Pedro Simon, para que a Casa possa ouvir V. Exª.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - V. Exª disse esperar que o Presidente Antonio Carlos o escute e que o seu pronunciamento seja registrado nos Anais. Não concordo, pois nós já o estamos ouvindo e a Casa conta com um número considerável de parlamentares. Além disso, não há dúvida alguma acerca da importância e do significado do pronunciamento de V. Exª. Essa é a questão mais dramática e mais cruel que tem a enfrentar o Congresso Nacional. Na Constituição de 1988, cometeu-se um tremendo equívoco: com o parlamentarismo que era para ser aprovado, a medida provisória seria uma medida normal: uma vez publicada, ela vinha para o Congresso e, caso não fosse aprovada, caía o gabinete. Era esse o sentido da medida provisória. Lamentavelmente, ela foi mantida com o presidencialismo - na redação final deveriam ter tirado a medida provisória, já que não foi aprovado o parlamentarismo. Como isso não foi feito, estamos diante dessa situação que piora dia após dia. O Sarney começou a exagerar; o Collor, a mesma coisa; o Itamar, mais ainda, e agora estamos atingindo um recorde absoluto. O que me deixa assustado é que a emenda que vamos votar, aprovada pelo Senado - e acho que devo ter votado contra -, e que vai ser aprovada na Câmara, se aprovada da maneira como está, produzirá uma situação pior do que a que já enfrentamos. O mérito dela vai ser diminuir o número de medidas provisórias - para a opinião pública vai ser muito bom; vão dizer: "Eram 3000 medidas provisórias e baixou para 1500" -, porque em vez de serem 30 dias, passam a ser 60 dias para a reedição. Na verdade, vai continuar a mesma coisa, com o mesmo espírito e com a mesma fórmula de apresentação. Eu tenho a mesma opinião que o Senador que me antecedeu no aparte: eu prefiro o decreto-lei. Se tivesse que votar hoje... Parece mentira! Eu nunca imaginei que, depois de tanta luta para restabelecer a democracia, eu fosse dizer isto que vou dizer agora: entre decreto-lei e medida provisória, da maneira como ela vem sendo usada, eu prefiro o decreto-lei. Digo isso, porque era infinitamente menor o número de vezes em que se lançava mão do decreto-lei. Ele era aplicado, publicado e pronto, terminava. Hoje, passados os 30 dias, a medida provisória é renovada indefinidamente e, a cada renovação, o Presidente muda o que quer. Acontece muitas vezes de, entre a inicial, a primeira que foi publicada, e a vigente, só a ementa ser igual, porque todo o resto é mudado. O decreto-lei, pelo menos, era promulgado e pronto, não podia ser mudado. Lamentavelmente, essa é uma questão das mais trágicas que tem a enfrentar o nosso Congresso Nacional: está-se legislando por medida provisória. As grandes normas, as grandes decisões são tomadas via medida provisória. Nem sei se eu, se fosse Presidente da República, não faria a mesma coisa. Suponhamos a seguinte situação: às três e meia da tarde estamos eu, o Presidente e o Ministro da Fazenda conversando, quando surge, de repente, uma idéia interessante. O que se faz, então? Telefona-se para a Imprensa Nacional, pede-se que esperem antes de fechar a edição do Diário Oficial , redige-se a idéia e, no dia seguinte, ela está no jornal: é lei. É algo fantástico. Estamos, na verdade, atrapalhando esse processo legislativo fantástico, rapidíssimo, de que dispõe o Presidente da República!  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - Obrigado, Senador Pedro Simon. Concordo com a avaliação de V. Exª a respeito da emenda à Constituição que será aprovada, provavelmente, pela Câmara: não resolve o problema permitir que uma medida provisória vigore por 120 dias. Como eu disse há pouco, ela já terá gerado tais efeitos que não teremos outro caminho senão ratificá-la, aprová-la.  

No entanto, creio estar nas nossas mãos modificar esse estado de coisas, Senador Pedro Simon, independentemente de qualquer emenda à Constituição ou projeto de lei. Basta apenas passarmos a examinar com seriedade a admissibilidade das medidas provisórias, porque a grande maioria delas não é urgente, muitas não são relevantes, e o pior: há muitas que não são nem urgentes nem relevantes. Esse abuso, Senador Pedro Simon, repete-se há dez anos.  

V. Exª me pede que faça um apelo aos senadores. Desde que cheguei a esta Casa, ouço apelos desta tribuna. Não sou o primeiro, nem serei o último e, no entanto nada se faz.  

Portanto, estou apelando ao Presidente desta Casa, realisticamente, sabendo que ele tem um enorme peso político e que, justiça seja feita, já fez muito para restaurar o prestígio do Parlamento. Se o Senador Antonio Carlos Magalhães quiser fazer com que as comissões mistas funcionem mesmo, elas funcionarão.  

Senador Pedro Simon, nenhuma medida provisória foi, até hoje, rejeitada. No dia em que o Senado e a Câmara, por meio de uma comissão mista, rejeitarem, por inadmissível, por não ser urgente ou relevante, uma medida provisória, se fizerem isso uma única vez, vai cessar o abuso por parte do Executivo e este Congresso terá restabelecido o seu prestígio e se engrandecido. Espero que o Senador Antonio Carlos Magalhães faça isso.  

Peço que as notas taquigráficas do meu discurso me sejam remetidas ainda hoje. Vou entregá-las ao Senador Antonio Carlos em mão, porque se ele fizer isso, terá feito história neste País, Senador Pedro Simon.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Olhe, Senador, nem na época em que os generais mandavam ouvi um discurso com tanta força, com tanta confiança num cidadão como o de V. Exª, ao demonstrar tanta confiança no Senador Antonio Carlos Magalhães. O Senador Antonio Carlos está vivendo um momento realmente fantástico na história deste País. Em parte, até concordo com V. Exª: pelo menos até agora, o que S. Exª quer, S. Exª está fazendo.  

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT-AM) - Faço um apelo a V. Exª: se V. Exª tem o mesmo peso do Senador Antonio Carlos, faça isso! Faça com que as comissões mistas funcionem.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Agora V. Exª está brincando!  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/05/1999 - Página 10044