Discurso no Senado Federal

IMPORTANCIA DA APROVAÇÃO DA 'LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL', DE SUA AUTORIA, PARA A ORGANIZAÇÃO DAS CONTAS PUBLICAS.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO FISCAL.:
  • IMPORTANCIA DA APROVAÇÃO DA 'LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL', DE SUA AUTORIA, PARA A ORGANIZAÇÃO DAS CONTAS PUBLICAS.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Gilberto Mestrinho.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/1999 - Página 11217
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO FISCAL.
Indexação
  • DEFESA, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, TRAMITAÇÃO, SENADO, DISPOSIÇÃO, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL, FIXAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, COMPROVAÇÃO, APLICAÇÃO FINANCEIRA, EXCESSO, ARRECADAÇÃO, ANTERIORIDADE, EMPENHO, EXECUTIVO, CONTROLE, GASTOS PUBLICOS, PUNIÇÃO, RESPONSAVEL, DANOS, PATRIMONIO PUBLICO.
  • SUGESTÃO, RELATOR, MATERIA, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, APRESENTAÇÃO, SUBSTITUTIVO, UNIÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, EXECUTIVO, REFERENCIA, LEGISLAÇÃO, NATUREZA FISCAL.
  • COMENTARIO, PROJETO DE RESOLUÇÃO, AUTORIA, ORADOR, ACOMPANHAMENTO, LEGISLAÇÃO, NATUREZA FISCAL, OBJETIVO, DIFICULDADE, APROVAÇÃO, EMPRESTIMO, ESTADOS, AUSENCIA, CUMPRIMENTO, EXIGENCIA FISCAL.

O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a dívida pública, sem dúvida, é causa preponderante da crise brasileira, da crise econômica e social, de onde advêm o drama e a tragédia do desemprego, que se avulta a cada dia que passa.  

E é claro que, diante desse quadro de desorganização - e eu me permito insistir que o Brasil é ainda um país tremendamente desorganizado -, é relevante a missão do Congresso Nacional, nesse momento que reputamos de transição, quando o Legislativo readquire a plenitude das suas funções pela atuação mais presente dos seus Parlamentares.  

Há em tramitação no Senado projeto de minha autoria, com o apoio de toda a Bancada do PSDB e, na Câmara dos Deputados, de autoria do Governo, um projeto de lei de responsabilidade fiscal que considero da maior importância no que se refere à necessidade de organização do nosso País.  

Sabemos da irresponsabilidade que campeia pelos Governos estaduais e municipais - não todos evidentemente, mas por muitos - no que diz respeito ao irrefreável endividamento público. Há um apetite incrível de governantes, de administradores, que se endividam sem se preocupar com o pagamento. Não há preocupação alguma com a capacidade de honrar compromissos financeiros assumidos, até porque a impunidade prevalece já que nenhuma legislação vigente no País pune os responsáveis pelos danos praticados contra o patrimônio público. O mandato, evidentemente, é visto como um espaço de tempo para a realização de obras, para a inauguração de obras.  

Não há preocupação quanto ao que virá depois. Os empréstimos são tomados e rolados indefinidamente. A dívida pública explode e a crise assalta a preocupação de todos os brasileiros. De quando em vez, quando a mídia desperta para a realidade da crise econômica dos Estados, a preocupação é prevalente nas discussões do Congresso Nacional e do Executivo Federal. Passado aquele momento, há o esquecimento. E os Estados continuam desorganizados.  

Aqui ou ali se vê um programa de controle dos gastos públicos, mas não é a regra, é exceção. Raramente se vê um governante preocupado com reforma administrativa, com controle de gastos desnecessários, com a correta aplicação do dinheiro oriundo do imposto pago com sacrifício pela população, levando em conta a necessária relação custo-benefício desse investimento. E o que se verifica é a máquina inchada, com excesso de funcionários - que ganham pouco até por conseqüência do excesso -, superposição de ações, paralelismos, estruturas desnecessárias e ociosas, pagas com o dinheiro público. E a conseqüência é um péssimo serviço público oferecido à coletividade em setores fundamentais, como de segurança pública, educação e saúde.  

A lei de responsabilidade fiscal é fundamental para frearmos essa irresponsabilidade. Tenho plena convicção de que, sem uma reorganização do Estado em todos os níveis, não nos será possível superar a crise. A palavra mágica é reorganização. Por tal entendo normas rígidas a serem seguidas pelos entes que constituem a Federação, de modo a proporcionar uma administração responsável, que vá desde o controle dos gastos públicos, passando pelo ajuste fiscal em todos os níveis, até a reestruturação do Estado, que envolva a racionalização da administração, com cortes nas estruturas superpostas, redução do custo de manutenção da máquina, principalmente com redução de gastos com funcionários, entre os quais os inativos, que hoje se constituem em oneroso peso na estrutura do Estado brasileiro.  

É claro que uma reorganização nesses níveis só terá resultado efetivo com uma honesta condução da administração, sem o que baldados serão os esforços no sentido de superar a crise que envolve a todos nós.  

Dentro dessa perspectiva, avulta como importante o controle dos gastos públicos, por meio de instrumentos que inibam, de uma vez por todas, a sanha de gastos injustificáveis e o irrefreável desejo de se contrair novas dívidas.  

A Lei de Responsabilidade Fiscal que tramita nesta Casa, Sr. Presidente, prevê que os créditos suplementares abertos por excesso de arrecadação deverão ser comprovados financeiramente antes de serem empenhados pelo Poder Executivo.  

Em alguns Estados, governantes, desejosos de gastar mais do que podem, elaboram Orçamentos fictícios, prevendo receita que jamais se realizará, para oferecer possibilidade de abertura de créditos especiais com a garantia dessa receita que, verdadeiramente, não se realiza. Dessa forma, operações de crédito são realizadas e os empréstimos, posteriormente, não são pagos, já que a receita para pagá-los, na realidade, não existe, o que existiu foi uma ficção orçamentária prevendo uma receita impossível de ser alcançada pelos cofres públicos.  

Para exemplificar, em determinado Estado a receita de 1998 alcançou a casa dos R$3 bilhões e estabeleceu-se como previsão de receita para o ano de 1999 o valor de R$9 bilhões. Como todos sabemos, a inflação vigente no País não alcança esse patamar e, de outra forma, não há mecanismo algum capaz de fazer com que esse milagre da multiplicação da receita se opere. Na verdade, o que se constata é a esperteza do governante, desejoso de realizar operações de crédito para investir em obras de infra-estrutura, quem sabe, ou em ações de administração pública que nem sempre correspondem à realidade social, mas de qualquer forma, provocando o aumento da dívida, criando, sem dúvida, um caos econômico no País.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB-SC) - V. Exª me concede um aparte, Senador Álvaro Dias?  

O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB-PR) - Com prazer, Sr. Senador Casildo Maldaner.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB-SC) - Senador Álvaro Dias, V. Exª aborda um tema que considero fundamental para que o País encontre o seu equilíbrio de uma vez por todas, principalmente nesse campo do Orçamento. Há poucos dias, o Senador Paulo Hartung analisava a proposta de controle fiscal que tramita no Congresso Nacional. No Brasil, temos a cultura de, após o lançamento da pedra fundamental de uma obra, não levarmos em consideração se quem virá a assumi-la dar-lhe-á seqüência ou não. A Lei de Responsabilidade Fiscal que tramita no Congresso Nacional é de suma importância. Fui secretário de uma comissão, Senador Álvaro Dias, que se instituiu nesta Casa, de autoria do Senador Carlos Wilson, para analisar cerca de mil e duzentas obras federais inacabadas no Brasil. Se incluírmos as estaduais e municipais, teremos uma infinidade. Por quê? Porque não há um enquadramento, não há uma responsabilização em relação a isso. Acredito que, de uma vez por todas, devemos mudar também a cultura desde os bancos escolares para que toda obra, em âmbito federal, estadual, ou municipal, tenha começo, meio e fim, com uma programação orçamentária real, palpável, não como a desse Estado, citado há pouco por V. Exª. É claro que, nesse caso, quer-se aumentar as condições de endividamento para se buscarem recursos, numa situação fictícia. Precisamos fazer com que essa proposta da Lei de Responsabilidade Fiscal tramite, a fim de que coloquemos ordem na Casa e nas três esferas de poder. V. Exª comunga com isso pela experiência que tem, não só no Legislativo - já foi Senador e volta a esta Casa -, mas por ter sido Governador do grande Estado do Paraná. Cumprimento V. Exª porque o assunto interessa não só aos Três Poderes, mas à Nação.  

O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB-PR) - Muito obrigado, Senador Casildo Maldaner. O nosso objetivo, na tribuna, é sugerir ao Relator da matéria na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, ou na de Assuntos Econômicos, que, aproveitando-se do projeto do Governo que tramita na Câmara dos Deputados, apresente um substitutivo reunindo o que de melhor existir nas duas propostas: na proposta que encaminhamos a esta Casa, em nome do PSDB, e na do Poder Executivo Federal, que se encontra na Câmara dos Deputados.  

A sugestão que faço tem por objetivo agilizar a tramitação dessa matéria na agenda positiva do Congresso Nacional, pois, repito, não chegaremos à organização da economia nacional sem organizarmos as estruturas públicas, estabelecendo um controle rígido dos gastos públicos, porque quem sempre paga essa conta, e sem poder fazê-lo, é a população trabalhadora do País.  

O art. 43, que propomos como Lei de Responsabilidade Fiscal, diz respeito à ficção dos orçamentos. Se esse excesso de arrecadação não for devidamente comprovado financeiramente antes de ser empenhado pelo Poder Executivo, implicará crime de responsabilidade por parte do responsável pela gestão da Fazenda Pública. E, ao final de cada trimestre, o Governo deverá publicar no Diário Oficial a diferença, por unidade orçamentária, entre as quotas financeiras programadas e o que for efetivamente executado, descontando, obrigatoriamente, o excesso de gastos, se ocorrer, das quotas do trimestre seguinte. Fica também estabelecido, pela lei, o limite de 20% de cada programa de trabalho para o Poder Executivo remanejar no Orçamento a partir de decreto, porque há - e o nobre Presidente Geraldo Melo, que já foi Governador, conhece bem o assunto - uma verdadeira mágica da parte de alguns governantes no que diz respeito ao remanejamento do Orçamento.  

Registrado déficit no balanço orçamentário e após a remessa do relatório das contas do Governo pelo Tribunal de Contas para o respectivo Poder Legislativo, fica bloqueado no Orçamento corrente o valor correspondente ao supracitado déficit até que o respectivo Poder Executivo proceda a ajuste das suas contas. Em caso de o Poder Executivo não efetuar o ajuste necessário, conforme o disposto neste artigo, ou seja, "o Poder Executivo deverá remeter ao Poder Legislativo as medidas de ajuste fiscal adotadas e somente após análise da eficácia dessas poderá ser o Orçamento desbloqueado", o Poder Legislativo iniciará, obrigatoriamente, o processo para afastamento do Chefe do Poder Executivo.  

Creio que somente adotando-se punições desse porte frearemos a irresponsabilidade dessa gastança exagerada de alguns administradores no Brasil.

 

Caso o Tribunal de Contas registre déficit orçamentário por três exercícios consecutivos, a aprovação do Orçamento para o exercício seguinte fica condicionada à aprovação pelo Poder Legislativo de medidas de restrição ao endividamento público e redução de gastos correntes.  

A proposta orçamentária remetida para o Poder Legislativo, correspondente ao exercício seguinte à constatação de déficit pelo Tribunal de Contas, não poderá exceder, em termos reais, o Orçamento do período anterior.  

Enfim, o que se propõe mediante esse projeto de lei é a punição dos responsáveis pelo endividamento exacerbado dos entes públicos no Brasil - punição rigorosa, que vai desde multas elevadas até a perda do mandato.  

No que diz respeito ao Senado, é bom que a autocrítica também seja feita neste momento, já que a aprovação de empréstimos a Estados e Municípios tem sido conseqüência não de uma análise técnica apurada, mas de uma avaliação de natureza política. Mais do que isso: não bastasse o Senado da República decidir, em muitos casos, politicamente, o próprio Ministério da Fazenda, desta forma, tem se comportado.  

Recentemente, técnicos do Tesouro da União indicaram falta de capacidade, falta de liquidez para determinado Estado obter novos empréstimos. No entanto, uma ação de natureza política de determinado partido político implicou uma carta do Ministro da Fazenda ao Senado recomendando a aprovação daquele pedido de empréstimo. Ou seja, o próprio Ministro da Fazenda desautorizou a sua equipe técnica, que se preocupou em realizar uma avaliação de natureza técnica para oferecer parecer a esta Casa do Congresso Nacional.  

O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB-AM) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB-PR) - Ouço V. Exª com muito prazer.  

O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB-AM) - Senador Álvaro Dias, V. Exª aborda um assunto que preocupa a todos. Todavia, o que fala V. Exª é um pouco diferente do que efetivamente acontece no País. A dívida pública não é de exclusiva responsabilidade dos Estados e Municípios. O maior devedor é a União, e isso vem de há muito tempo. O princípio orçamentário de que a lei teria que ser elaborada antes do vencimento do ano para valer no ano seguinte, às vezes não é cumprido. Houve alguns anos em que o Orçamento foi aprovado em abril e maio do ano a que se referia, e a União ficou usando duodécimos, baseado no Orçamento do ano anterior. Então, Estados e Municípios não podem ser culpados do déficit público, porque eles são o reflexo da situação nacional. O déficit público no Brasil é uma conseqüência maior do endividamento da União. A União, com a necessidade constante de cobrir o seu próprio déficit, transfere-os para os Estados, que não têm o mesmo poder que a União tem de emitir, de fazer operações de crédito, de empréstimo. É muito reduzido o poder dos Estados. Daí, as irresponsabilidade nos Estados e nos Municípios. É preciso fazer uma lei que abranja a todos.  

O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB-PR) - Essa lei atende a todos, inclusive à União.  

O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB-AM) - E que tenhamos cuidado para que a receita da União não seja, metade dela, consumida com o pagamento dos juros da dívida interna. Esse é o grande problema do País. Enquanto não reduzirmos os juros da dívida interna, não encontraremos saída para o déficit público nem para a situação difícil que os Estados atravessam.  

O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB-PR) - Agradeço ao nobre Senador o aparte, que, inclusive, me proporciona a oportunidade de dizer que não estamos excluindo a responsabilidade da União. O nosso projeto prevê as mesmas punições para o Presidente da República, Governadores e Prefeitos.  

Na verdade, a desorganização é responsabilidade maior da União. Durante todo esse período de atividade pública, presenciei apenas um momento em que a União se preocupou em conter o excesso de gastos possibilitado pelo endividamento público interno e externo. Foi quando o Ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, Ministro do Presidente José Sarney, em determinado momento, por decreto do Executivo, impediu que novos empréstimos fossem concedidos a Estados e Municípios. Foi exatamente no período em que tive a honra de governar o Paraná, e vi projetos de interesse do meu Estado abortados em função desta ação do Governo Federal. Foi o único momento, em todo esse período de vida pública, em que presenciei uma atuação presente do Governo Federal com o objetivo de conter o processo de endividamento dos Estados e Municípios.  

Para concluir, Sr. Presidente, há um projeto nosso, um projeto de resolução - acompanha essa da responsabilidade fiscal - que diz respeito ao Senado Federal.  

Os projetos de resolução relativos a endividamento de quaisquer dos entes da Federação que estabeleçam excepcionalidades na legislação vigente quanto a limites, prazos, cumprimento de metas e documentação exigida, somente serão aprovados, em Plenário por maioria qualificada correspondente a quatro quintos dos Senadores.  

Portanto, o objetivo dessa proposta é dificultar a aprovação de empréstimos a Estados que, de forma completa, não respondem às exigências técnicas para a obtenção de novos empréstimos.  

São considerações que me levam a defender essa lei de responsabilidade fiscal e defender uma reorganização do Estado brasileiro com normas que inibam a ação dos governantes que, preocupados apenas com seus mandatos, se esquecem de que eles passam, mas os entes estatais ficam, e com eles os problemas econômicos e financeiros que criam.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/1999 - Página 11217