Discurso no Senado Federal

REFLEXÕES SOBRE A IMPORTANCIA DA FERROVIA NORTE-SUL E DO PROJETO CALHA NORTE.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • REFLEXÕES SOBRE A IMPORTANCIA DA FERROVIA NORTE-SUL E DO PROJETO CALHA NORTE.
Aparteantes
Pedro Simon, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 22/05/1999 - Página 12561
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, PUBLICAÇÃO, JORNAL, GAZETA MERCANTIL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DOCUMENTO, SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS (SEBRAE), ASSUNTO, ANUNCIO, INVESTIMENTO, POLITICA DE TRANSPORTES, GOVERNO, FALTA, INCLUSÃO, ESTADO DO AMAZONAS (AM).
  • SOLICITAÇÃO, SECRETARIA GERAL DA MESA, INFORMAÇÃO, MINISTERIO DOS TRANSPORTES (MTR), SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS (SEBRAE), ESTADO DO AMAZONAS (AM), DISCURSO, ORADOR.
  • CRITICA, GOVERNO, AUSENCIA, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, PROJETO, FRONTEIRA, REGIÃO NORTE.
  • REGISTRO, UNIÃO, BANCADA, CONGRESSISTA, GESTÃO, INTEGRAÇÃO, REGIÃO NORTE, COMBATE, TRAFICO INTERNACIONAL, DEFESA, SOBERANIA.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a função principal de um Senador - e isto é constitucional - é defender o seu Estado. Enquanto a Câmara dos Deputados reflete o eleito pelo número de bancadas, ou seja, o número de Deputados Federais do meu Estado, o Amazonas, é de 8 Deputados, enquanto a Bancada de São Paulo é composta por 70. Já no Senado, esse desequilíbrio não acontece, pois cada Estado dispõe de exatamente 3 Senadores, para que a Federação tenha equilíbrio.  

E se isso é verdade, Sr. Presidente, nada mais justo, correto e imperioso que, vez por outra, eu possa ocupar esta tribuna para falar de um problema que pode ser regional, mas que diz de perto, induvidosamente, da forma pela qual o meu Estado é tratado pelo Governo Federal. E o curioso é que a União entenda que o Amazonas deva ser enteado e não filho legítimo.  

Este documento que está à minha frente, chegado às minhas mãos pela figura da Presidência e das diretorias auxiliares do Sebrae - que é, sem dúvida nenhuma, uma entidade séria, tão séria que já adquiriu o ISO 9002 -, confirma o que venho dizer.  

Passo a ler, para depois fazer comentários, o texto do expediente assinado pelo Diretor-Superintendente do Sebrae do Amazonas, Dr. José Carlos Reston , e pelos Diretores Operacionais nºs I e II, Drs. Avelino Pereira Cuvello e Aníbal Sérvulo da Rocha Normando.  

O texto a mim dirigido é o seguinte:  

Sr. Senador,  

Ao cumprimentá-lo, servimo-nos da presente para encaminhar-lhe, em anexo, cópia da publicação Gazeta Mercantil E-MAIL, especializada em notícias sobre empresas e negócios do setor de transportes, onde chamamos atenção para os itens 02 e 10, do mencionado material.  

Na oportunidade, o primeiro tópico aborda a construção da Ferrovia Norte-Sul, contemplando os Estados do Pará, Maranhão, Tocantins e Goiás; já no segundo aspecto, temos a notícia da construção de um ramal ferroviário de 120 km, no Estado de Pernambuco, ligando dois municípios produtores de gesso.  

Vou ler, Sr. Presidente, o Item 2, intitulado "Interligação ferroviária completará transporte":  

Belém, 30 de abril de 1999.  

A segunda fase do projeto de construção da Ferrovia Norte-Sul - que interliga as regiões Norte e Centro-Sul, integrando os modais de transporte existentes nestas áreas - deverá ser privatizada ainda neste semestre. De acordo com Valfredo Antunes, assessor especial do governo do Estado do Tocantins, os estudos econômicos e de viabilidade do sistema estão prontos e foram certificados por consultorias internacionais. ‘Só resta marcar a data’, diz.  

Nesta segunda fase - e é para isto que chamo a atenção, Sr. Presidente - serão construídos 1,9 mil quilômetros da ferrovia, atravessando os Estados do Pará, Maranhão, Tocantins e Goiás. A obra vai unir a região Norte com mais de 5 mil quilômetros de trechos privados que servem às regiões Sudeste e Sul do Brasil.  

A construção da Norte-Sul foi iniciada em 1988 e somente foi construído e inaugurado o primeiro trecho, de 109 quilômetros, no Maranhão, restando, ainda, 117 quilômetros, que interligam Imperatriz a Estreito, também no Maranhão. A promessa do governo é que a conclusão será no fim deste ano. O valor do investimento é de R$50 milhões. Este trecho interliga-se por um ramal rodoviário até o porto de Xambioá (TO), na Hidrovia Araguaia-Tocantins. O governo federal também vai construir ainda este ano a ponte ferroviária sobre o rio Tocantins e o trecho até Colina do Tocantins, que vai se interligar, através de um ramal, com a Zona de Processamento de Exportação de Araguaína (TO).  

Sr. Presidente, esta é a notícia, publicada na Gazeta Mercantil , a que se refere o expediente do Sebrae.  

Antes de fazer os meus comentários, vou continuar lendo os parágrafos do expediente. Diz ele, depois de ter feito esta menção:  

Assim sendo, destas informações, denotamos, com muita tristeza, o esquecimento de nosso Estado em ações, promovidas pelo Governo Federal, desta natureza, as quais venham promover novas alternativas para a logística de transporte do Amazonas, facilitando o trâmite de mercadorias, para o fomento de atividades econômicas estaduais.  

Dentro desta perspectiva, o Sebrae/AM tem, há algum tempo, somado esforços, no sentido de sensibilizar o Ministério dos Transportes, para a efetivação de um estudo sobre as alternativas de logística de transporte, a nível regional, objetivando a preparação de infra-estrutura necessária para o acirramento do processo de promoção ao comércio internacional, por meio das exportações.  

Desta forma, tentamos, com este expediente, sensibilizá-lo, em prol de atitudes, a nível de bancada federal, que redundem no despertar, por parte da administração pública federal, da preocupação com o planejamento de mecanismos para o incremento do setor de transportes, pertinente à nossa Amazônia, no contexto das peculiaridades que nos são afetas, bem como na noção de veículos indutores do desenvolvimento regional.  

No aguardo de uma posição sobre a matéria, subscrevemo-nos mui cordialmente.  

E vêm as assinaturas.  

Sr. Presidente, desdobro este pronunciamento em alguns pontos.  

Em primeiro lugar, requeiro a V. Exª que, de posse deste expediente, determine à Secretaria-Geral da Mesa que faça chegar ao conhecimento do Ministério dos Transportes o que aqui se trava. Em segundo lugar, que também V. Exª determine que se dê conhecimento à Diretoria do Sebrae de que, do plenário do Senado, abordei a matéria. E, em seguida, Sr. Presidente, quero fazer aqui algumas considerações sobre a região.  

O Governo Federal começou a desprezar aquela área a partir do ano passado, quando consignou, no Orçamento, zero para o Projeto Calha Norte. A partir daí há um desencanto dos que defendem a região, pois percebem que, dificilmente, haverá sensibilidade dos que são responsáveis pelo comando dessa circunstância; verificam eles que, se não fosse a Zona Franca de Manaus, a nossa região seria, hoje, sem dúvida alguma, mutilada no seu meio ambiente, entregue à sanha daqueles que, sendo lindeiros, que, sendo de países vizinhos, já começaram a invadir o nosso território, através do narcotráfico, deixando-nos numa posição delicada, por falta, sobretudo, de reservas, que deveriam ter sido consignadas no Orçamento da Nação para que não houvesse o vazio que continua ali a existir.  

Não são poucos os colegas Senadores de vários Estados, e não apenas do Acre, Amazonas, Roraima e Rondônia, que têm procurado sensibilizar as autoridades, desta tribuna - e o que é mais interessante, Sr. Presidente, independentemente de qualquer conotação político-partidária -, em favor da nossa região.  

Temos tido, os que representamos a área, sobretudo a clarividência - e aqui não há nenhuma imodéstia ao dizer isso - de, quando se trata da defesa da Amazônia, despirmo-nos da roupagem partidária para vestir a farda brasileira. Por isso, não sou eu o único, mas quero, Sr. Presidente, fazer com que essas vozes se juntem, para que sensibilizemos as pessoas para o que está ocorrendo na região.  

Não é possível que a Nação se debruce apenas sobre o problema financeiro - a ajuda a bancos - e se esqueça de que se a região não for devidamente integrada, daqui a algum tempo passaremos a ser vítimas de organizações - cujo rótulo não quero aqui discriminar - que estão, pari passu , colocando lá os seus tentáculos.  

Vejam V. Exªs que ainda no outro dia...  

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT-AC) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - E já terei a honra de conceder os apartes aos eminentes Senadores Tião Maia e Pedro Simon. Ao Senador Tião Viana, perdão. Mais esta vez cometo o equívoco e me esqueço de que o Senador Tião Viana é um alto, um rico, um próspero homem de intelectualidade e não de bens materiais.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Seria bom se fosse dos dois, não é? Intelectual e material.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - V. Exª é mais do que uma reserva intelectual. V. Exª é um patrimônio.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - O bom seria se o Senador tivesse os dois dons, um e o outro. Não eu.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Pelo nosso desejo, gostaríamos que S. Exª tivesse ambos.  

Sr. Presidente, volto a dizer que todas as vezes que se fala nos grandes países que querem fazer convênios conosco para o combate ao narcotráfico, é como se estivessem buscando uma brecha para atentarem contra a nossa soberania. Já têm feito de tudo e agora, desta vez, conseguindo que não se registrem, na rubrica orçamentária, os valores necessários.  

Ouço V. Exª, Senador Tião Viana.  

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT-AC) - Senador Bernardo Cabral, gostaria de falar sobre a minha admiração pelo pronunciamento de V. Exª, que, de modo tenaz, observa a nossa região e, de modo francamente solidário, tenta suscitar um novo sentimento nacional em relação à Amazônia brasileira. É atípico que o Governo Federal demonstre, com atitudes como a tomada com o Calha Norte, como V. Exª muito bem diz, insensibilidade ou indefinição em sua visão estratégica, à altura da inteligência brasileira, em relação àquela região, quando o mundo inteiro a olha de modo especial, entendendo que ali talvez esteja o tabuleiro de xadrez da disputa e do domínio internacional no próximo milênio, porque diz respeito ao patrimônio genético, à biodiversidade e a toda uma estrutura mineral ainda preservada a disputar, à altura da personalidade internacional do nosso País.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - E aos nossos recursos hídricos.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT-AC) - Também aos nossos recursos hídricos, que já foram tão bem citados por V. Exª. Quando se fala do investimento em uma ferrovia que possa trazer desenvolvimento para a região, fico lembrando o sacrifício histórico e memorável que fizeram os construtores da Madeira-Mamoré em uma época tão admirável e difícil de viver na Amazônia, fico pensando por que é tão difícil o Governo Federal ter um senso de prioridade mais inteligente para a Região Amazônica. Veja que quase todos os pensadores do modelo de construção do Brasil são críticos do modelo rodoviário que se impôs, por ser mais caro, por ter sofrido forte influência do consumo de petróleo, que nos fez esquecer, ao mesmo tempo, da ferrovia como algo de longa duração, de baixo custo a longo prazo e de alta viabilização do fortalecimento das economias locais. Os países andinos, ao nosso lado, ali na Amazônia, são um potencial adormecido de mercado, de enriquecimento da Amazônia brasileira, que é o enriquecimento do próprio Brasil, e o Governo Federal não se define, não trata o assunto com a devida prioridade. Ao mesmo tempo, vejo o Nordeste, do Senador Geraldo Melo, em sofrimento, com dificuldades, uma área que, comparada à Amazônia brasileira, é muito mais restrita do ponto de vista geográfico. Mas existe a união da bancada nordestina, que grita, que esperneia e que, parece, alguma coisa tem conseguido ao longo de sua história, mesmo com a nossa solidariedade, dos amazônidas. E a nossa situação é muito especial: ou o Governo Federal estabelece o que é prioritário no final do milênio - ou ele toma uma decisão sobre o investimento humano definitivo, sobre o investimento socioeconômico e cultural para a Amazônia brasileira -, ou vamos pagar um preço que talvez vinte ou trinta gerações tenham dificuldade de recuperar, pelos erros de insensibilidade de hoje. Então, parabenizo-o e registro a minha admiração pelo pronunciamento de V. Exª.

 

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Senador Tião Viana, o aparte a um discurso pode ser, tantas vezes, complicador para o orador: quando ele perde o fio da meada, quando não o consegue encadear. Mas, em outras, além de enriquecedor, ele traduz a solidariedade de quem interfere no discurso. E V. Exª registrou - e o fez bem -, junto comigo, a insensibilidade do Governo Federal com a riqueza que temos, com a nossa biodiversidade, a nossa riqueza hídrica, com o que a Amazônia tem ainda de desconhecido. E prova, com o seu aparte, a miopia exagerada do Governo - já que V. Exª é médico e eu me arvoro a falar em miopia -, sobretudo a miopia analítica do que vale a Amazônia para o mundo. Até me dá a idéia - se eu posso fazer uma grossa imagem, que talvez não esteja à altura dos que me ouvem no Senado - daquele cão meio adormecido, que tem um osso à sua frente e está satisfeito, mas que, se alguém mexe no seu osso, começa a rosnar.  

Parece que o Governo está apenas como que de barriga cheia, contemplando aquela região, e esperando que alguém venha nela mexer para, só aí, então, rosnar. E nós estamos aqui, desde logo, mostrando a eles que a omissão, que também é uma forma criminosa de desperdiçar o nosso território, poderá, amanhã, trazer conseqüências muito mais graves, quando aí já não dará para prevenir, quanto mais para remediar.  

De modo que permita-me V. Exª que incorpore o seu aparte ao meu discurso, para dizer que, ao enriquecê-lo, começo a ter uma fortuna maior, porque vou ouvir o Senador Pedro Simon.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Nobre Senador, quero dizer, em primeiro lugar, que tenho uma admiração muito grande por V. Exª.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Obrigado a V. Exª.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Entre tantos outros aspectos positivos, há em V. Exª quase que, eu diria, mais do que angústia, uma predisposição permanente e constante para debater as questões da Amazônia. Pelo seu prestígio e pela sua credibilidade, além de ser um representante da Amazônia, V. Exª é um nome nacional.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Muito obrigado.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - E na sua boca, as manifestações que V. Exª apresenta sobre a Amazônia adquirem um tom especial. Se eu tiver chance, pretendo ir à tribuna abordar uma questão diferente, mas para mostrar apenas como são questões tão fundamentais. Acho, meu prezado Senador, que devíamos fazer uma benção, neste plenário, um estudo, uma tecnologia, porque ouvimos e o que ouvimos não significa nada. Nós, Parlamentares, sentamo-nos aqui e parece que estamos numa academia, num seminário, num simpósio, em que V. Exª fala e eu acho bonito, acho muito interessante; mas V. Exª desce da tribuna, eu vou para o meu gabinete, e morreu o assunto. Morreu aqui no Senado - vamos ser sinceros -, e, principalmente, morreu no Executivo. E, há de concordar V. Exª, também morreu na imprensa, porque a imprensa do Rio, de São Paulo, do Sudeste não tem preocupação em citar em manchete o que V. Exª está falando - não vende jornal, não diz de perto aos anunciantes daqueles jornais. O discurso de V. Exª, apesar do brilho, apesar da credibilidade, apesar de ser V. Exª um dos Senadores mais importantes desta Casa, não nos atinge, não atinge o Executivo - V. Exª terminou de dizer que o que foi aplicado lá foi zero -, não atinge a imprensa e não atinge ninguém. Às vezes, fico me perguntando se não está certo o fato de esta Casa estar vazia na sexta. Já diminuímos a sessão de quinta-feira, que era para ser à tarde e é pela manhã; segunda-feira também ela é deliberativa. Talvez subir à tribuna seja perda de tempo. Mas, na verdade, na verdade, o discurso de V. Exª é de uma importância fundamental. Tive ocasião de visitar, no Governo Sarney, com o então Chefe da Casa Militar, o Projeto Calha Norte.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - General Bayma Denys.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Exatamente. S. Exª é um dos autores do Projeto. Permaneci lá por seis dias. Fiquei emocionado e impressionado. Conheci um hospital militar, que é de toda a região, que é uma benção para a região. Em primeiro lugar, impressionou-me a qualidade, o serviço e o atendimento. E vi um quartel que, na verdade, é a grande fórmula de ocupação da região. Não é um quartel fechado, mas um quartel aberto, do qual a sociedade participa, no qual a escola recebe alunos, e onde há orientação educacional, orientação agrícola. Fiquei abismado pelo alto aspecto positivo! Eu não tenho nenhuma dúvida de que projetos dessa natureza são a grande chance de conhecermos a Amazônia e de nos compenetrarmos do seu significado. Eu sou do Rio Grande do Sul. Lá, houve uma época em que, por motivos diferentes - V. Exªs estão aqui chamando a atenção -, por um atavismo antigo, ridículo, na verdade, havia preocupação com uma guerra entre o Brasil e a Argentina. Não pelas questões locais, porque as fronteiras nossas, que são enormes, sempre foram tranqüilas, normais, a não ser no futebol. Na verdade, de cima para baixo, lá da América do Norte para baixo, criou-se o ambiente de que era inevitável o conflito entre o Brasil e a Argentina. Então, o que aconteceu? Durante um século, metade do Exército brasileiro estava na fronteira do Brasil com a Argentina. Temos cidades, como Alegrete, que têm quatro quartéis do Exército; Santiago tem quatro quartéis do Exército. De certa forma, sob um certo ângulo, isso foi altamente positivo, porque houve integração, desenvolveu-se a região, cresceu. Passou a ser negativo depois, quando proibiram aquela região de ter fábricas, de crescer, de ter indústrias, de ter energia, porque, na fronteira com a Argentina, isso era impossível. Agora, eu imagino o que ocorreria se, de repente, como foi feito ali, uma questão muito mais profunda - e aqui podemos inseri-la -, se fizesse isso na Região Norte; se se colocasse, sob esse sentido, como uma fórmula de discussão, de debate, de tomada de conhecimento da terra; se se criasse e se transformasse em realidade, se se multiplicasse o Projeto Calha Norte; se houvesse ali, de região em região, uma dessas instituições com quartel, com hospital, com casas à sua volta, criando e fazendo nascer uma cidade. Porque ali, em torno nasce uma cidade, há desenvolvimento, progresso, se cresce e avança - e é a grande maneira de ocupar a Amazônia, é a grande maneira de se fazer de forma considerável, positiva, é a grande maneira de evitar o tráfico da droga, que, de certa forma, vindo dos países vizinhos, está passando por ali. É a grande maneira. Estamos vivendo uma época dramática. Vivemos uma época em que não temos mais o mundo dividido em três nem em dois. Os americanos são os donos do mundo. Eles estão aí. Não há OTAN, nem ONU. Eles decidem o que vão fazer. Aí está o que está acontecendo, dramaticamente, na Iugoslávia, com o protesto do mundo inteiro. Está aí. O que eles resolvem fazer, eles fazem, e praticamente com a simpatia mundial, porque a defesa do meio ambiente e a poluição, hoje, são questões que o mundo está absorvendo. De repente, trama-se uma campanha, faz-se um movimento dizendo que o Brasil é incompetente para cuidar da Amazônia, que a Amazônia é o pulmão do mundo, que ela é importante demais para que nós, que somos uns fracassados, olhemos. E aí vêm os americanos, com as forças da ONU, fazer alguma coisa nesse sentido. Quando estive na terra de V. Exª, em Manaus, naquela oportunidade, o Comandante da região - e eu gostaria que V. EXª me dissesse o nome dele -, um general espetacular, um carioca, mas espetacular, apaixonado pela questão, fez um debate mostrando a importância de, ali, haver uma escola de formação de pessoas para andarem no meio da selva.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Centro de Instrução de Guerra na Selva - CIGS -, que teve como comandante o Coronel Nilton Lampert, que hoje é meu assessor técnico.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Não, refiro-me ao General-Comandante.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Do Centro de Instrução?  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Sim. Quem fez a palestra foi o General-Comandante. Aliás, diga-se de passagem, brilhante nacionalista, de alta competência. S. Exª nos mostrou a importância do trabalho feito, mas também nos mostrou que os americanos estavam querendo criar, do outro lado, na Guiana, coisa semelhante.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Trata-se do General Santa Cruz.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - General Santa Cruz. Exatamente. Os americanos estavam querendo criar, do lado de lá, na Guiana, a mesma coisa. Por que os americanos têm que criar, do lado da Guiana, um centro de penetração, de conhecimento da Amazônia? O que eles têm a ver com isso? Penso que essa questão levantada por V. Exª é séria demais. Considero que é a questão mais importante do início do próximo milênio para o Brasil.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Sem dúvida nenhuma.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Recebemos o Brasil desse tamanho. O mínimo que temos que fazer é deixar para os nossos filhos um Brasil do tamanho do que recebemos. Estão brincando com coisa muito séria! V. Exª já subiu várias, várias, várias vezes a essa tribuna, mas, lamentavelmente, não ouço resposta do Executivo. Um dos melhores projetos que vi é o Projeto Calha Norte, do General Rubens Bayma Denys. Lamentavelmente, em primeiro lugar, quiseram dizer que era um projeto militar. É militar, não há dúvida nenhuma, mas é um projeto de integração. Se há algo militar para o que bato palmas mil vezes e que apóio, para que construam quantos quartéis quiserem, com o objetivo de criar uma civilização, de forjar uma cidade, é esse projeto. No entanto, ele foi decaindo, decaindo e, hoje, o que se vê são os americanos preocupadíssimos, porque a nova rota do tráfico vem da América, passa pela Amazônia e segue para os Estados Unidos. Eles só estão preocupados com a entrada da droga; não estão preocupados com quem compra e com quem atiça o seu consumo. Eles estão preocupados com o caminho que a droga percorre. Meus cumprimentos por mais um brilhante trabalho de V. Exª.  

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL- AM) - Senador Pedro Simon, V. Exª tocou num ponto que vou aproveitar para dar o fecho ao meu discurso - sei que daqui a pouco o Presidente deverá me advertir, pois o meu tempo está concluído. V. Exª registra que o Projeto Calha Norte foi rotulado de militar. Aí é que está; este é o ponto. O estigma sofrido pelo Projeto Calha Norte deriva dessa premissa. Ninguém se lembra que Rondon era um militar e que fez a nossa integração porque era um homem que conhecia o interior. Ele foi um pioneiro!

 

É preciso estar lá, estar exatamente na nossa fronteira para conhecer, sentir, saber, analisar, calcular o que é o Projeto Calha Norte. O deserto é tão grande ali que se não tivermos aptidão para essa luta que vem por aí - e V. Exª já citou, com propriedade, a hegemonia que acontece naquela área -, não sei o que vai ocorrer. Mas o que noto é que altas personalidade mundiais já começam a fazer declarações muito significativas. Ora é o vice-presidente da república de um país estrangeiro que declara que a Amazônia é patrimônio do mundo, não pode pertencer só ao Brasil. Mais recentemente, o chefe do estado-maior das forças armadas de um país declarou que, se for necessário, vão invadir a Amazônia com tropas militares. E há insensibilidade neste País por parte de quem deveria tê-la e exercitá-la, o que me deixa realmente boquiaberto, a exemplo de V. Exª!  

Quero agradecer o aparte de V. Exª com uma espécie de imagem que faço agora. Realmente, V. Exª é do Rio Grande do Sul, da outra fronteira. Sou natural do Amazonas. Os rios, no Amazonas, desde as suas cabeceiras, vão cavando o seu próprio leito. E, no começo, são rios pequenos, mas, à medida que vão recebendo como empréstimo as águas que a eles se juntam, tornam-se rios caudalosos. Veja, Sr. Presidente: comecei como um rio pequeno. Ao receber as águas emprestadas dos dois apartes, o rio ficou caudaloso, porque incorporou a este pálido pronunciamento a responsabilidade de quem sente: um do Acre - portanto, do Extremo Norte -, e o outro, do Extremo Sul.  

E todos ficamos certos de uma coisa - e voltaremos à tribuna para demonstrar isso: de que a Amazônia vale mais do que um governo efêmero pode pensar, porque é duradoura. Mas a Amazônia só será duradoura se nós, brasileiros, com as nossas mãos, tentarmos resguardá-la para os nossos herdeiros, já que a recebemos como um patrimônio.  

Sr. Presidente Geraldo Melo, obrigado a V. Exª por ter permitido que eu ultrapassasse o tempo regimental. É que V. Exª também é um defensor da Amazônia.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/05/1999 - Página 12561