Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM O NUMERO EXCESSIVO DE CONTRATAÇÕES DE ESTRANGEIROS PELAS EMPRESAS PRIVATIZADAS, FATO QUE AGRAVA O DESEMPREGO NO PAIS.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESEMPREGO.:
  • PREOCUPAÇÃO COM O NUMERO EXCESSIVO DE CONTRATAÇÕES DE ESTRANGEIROS PELAS EMPRESAS PRIVATIZADAS, FATO QUE AGRAVA O DESEMPREGO NO PAIS.
Aparteantes
Luiz Otavio, Marina Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 01/06/1999 - Página 13526
Assunto
Outros > DESEMPREGO.
Indexação
  • DENUNCIA, EXCESSO, CONTRATAÇÃO, ESTRANGEIRO, EMPRESA, OBJETO, PRIVATIZAÇÃO, CAPITAL ESTRANGEIRO, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, DESEMPREGO, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o grande tema do momento são as privatizações e a forma com estas ocorreram.  

Já tratamos aqui dos males causados pelas privatizações, mas quero trazer uma denúncia que considero extremamente grave. O capital internacional adquiriu grande parte de nossas empresas e está hoje importando para o Brasil seus técnicos, seus funcionários, para tomarem, na nossa Pátria, postos de trabalho do povo brasileiro.  

Já dissemos que as privatizações não serviram para absolutamente nada. Os recursos arrecadados ao longo dos últimos anos do Governo Fernando Henrique Cardoso não serviram sequer para diminuir a dívida pública brasileira. Muito pelo contrário, quando Sua Excelência assumiu o Governo, a dívida pública era de US$60 bilhões e, hoje, estamos chegando à casa dos US$500 bilhões. A dívida externa também ampliou no Governo Fernando Henrique. Nós ficamos, portanto, a nos questionar sobre o que foi feito com o dinheiro das privatizações.  

Sabe-se que os preços mínimos foram trabalhados de forma a não levarem à realidade, como no caso da Vale do Rio Doce, que foi vendida por 3 bilhões e 300 milhões de reais e tinha em caixa 1 bilhão de reais. Portanto, na verdade, a empresa foi vendida por 2 bilhões e 400 milhões, o que não significava sequer 10% do seu valor real.  

E assim foram inúmeros outros casos de privatização. Tornou-se público em todo o Brasil a interferência de integrantes do Governo – e agora, com as últimas gravações divulgadas, constatou-se a interferência pessoal do Presidente da República – para que determinada empresa ganhasse a concorrência.  

Ora, eu gostaria que estivessem presentes os defensores do Governo – é uma pena que o Senador Romero Jucá tenha saído tão rápido, mas ainda está aqui o Senador Luiz Otávio – tentassem justificar os fatos que relatarei. As empresas multinacionais, as empresas internacionais que compraram nossas empresas telefônicas, nossas siderúrgicas, nossas empresas mineradoras, nossas distribuidoras de energia elétrica nos vários Estados brasileiros, e que estão prestes a comprar nossas hidrelétricas, estão trazendo funcionários de seus países de origem. Vou mostrar dados anunciados pelo próprio Ministério do Trabalho e que foram causa, aliás, da demissão de três funcionários do Governo.  

No ano passado, somente no ano de 1998, entraram no Brasil 2.480 gerentes técnicos de empresas; 1.190 diretores de empresas; 820 engenheiros e arquitetos; 820 encanadores, soldadores e chapeadores de siderúrgicas; 460 oficiais de bordo - naturalmente para pilotar os navios da Vale do Rio Doce; demitem-se os brasileiros e admitem-se oficiais de bordo estrangeiros -, 360 economistas e contadores, entre outros.  

Nos últimos cinco anos, o aumento de visto para estrangeiros trabalharem no Brasil aumentou 321%; o número de vistos emitidos passou de 2.196 em 93 para 8.462 em 1998.  

Senador Luiz Otávio, esses são dados do Governo. Os sindicalistas brasileiros afirmam que entraram no Brasil, só no ano passado, 30 mil estrangeiros para ocuparem postos de trabalho. São dados dos sindicalistas brasileiros. Não tenho certeza sobre eles. Eu tenho de mencionar os dados do Governo: só no ano passado, 8.462 técnicos foram trazidos para ocuparem cargos de chefia na empresas compradas pelo capital internacional.  

Ora, de onde vieram esses estrangeiros? O interessante, Senadora Marina Silva, é que eles vieram justamente dos países mais desenvolvidos do mundo: em primeiro lugar, dos Estados Unidos; em segundo lugar, do Reino Unido; em terceiro lugar, da França; e, em quarto lugar, do Japão.  

E de onde veio o capital que comprou as empresas? Justamente desses países mais desenvolvidos do Primeiro Mundo.  

A Srª Marina Silva (Bloco/PT-AC) - Permite-me V. Ex.ª um aparte, ilustre Senador Ademir Andrade?  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Concedo o aparte, com alegria, à Senadora Marina Silva.  

A Srª Marina Silva (Bloco/PT-AC) - Ainda bem que V. Ex.ª está citando dados oficiais do Governo, para que depois não seja acusado de estar praticando "a falta de generosidade da Oposição". Uma pesquisa recente feita oficialmente por órgãos do Governo dá conta de que, na Europa, há 10 anos, o índice de desemprego era de 30%. Dez anos depois, o índice caiu para apenas16%, o que é muito significativo. Ainda segundo a pesquisa, no início do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, o Brasil ocupava o 13º lugar no mundo em desemprego. Hoje, porém, ocupa o 4º lugar. Ano passado, eu e o então candidato ao Governo do Acre Jorge Viana fizemos uma série de contatos junto à Comunidade Européia e verificamos as linhas de apoio para projetos de desenvolvimento na Amazônia. Observamos que os programas para os países em desenvolvimento são feitos com recursos de cooperação internacional, mas todas e quaisquer consultorias realizáveis para esses projetos necessariamente tenham que dispor de mão-de-obra oriunda do país que está fazendo a cooperação internacional. É uma forma que eles encontram de debelar o desemprego. Por exemplo, uma hipótese que não vem ao caso: numa cooperação para um projeto de desenvolvimento no Estado de V. Exª, no Pará, a consultoria que seria realizada teria que ser feita por um técnico francês, se os recursos de cooperação internacional fossem oriundos da França. É uma forma que eles utilizam inteligentemente, vendo o interesse do povo do seu País, e assim procedem para ajudar a debelar o problema de desemprego. No caso brasileiro, estamos privatizando as empresas, estamos abrindo espaços para que operadores estrangeiros possam vir usufruir dos lucros e, ainda assim, estamos abrindo espaços também para que as ocupações sejam realizadas por pessoas de outros países, o que não é permitido nesses países desenvolvidos, de economia aberta, globalizados, como eles tanto argumentam. O Clóvis Rossi, em sua coluna, traz uma matéria muito interessante: "Os trouxas de plantão", não sei se V. Exª a leu, mas é interessantíssima a narrativa que ele faz com relação a essa questão da facilidade que essas pessoas estão tendo para entrar no país e ocupar os postos de emprego dos brasileiros, ou "ocupação", palavra mais elegante para alguns sociólogos, quando visitam a Europa. Diz que o filho dele que, quando chegou na Espanha, tentou, embora formado e competente, a todo custo um emprego, mas ele precisava de uma carta de permissão de trabalho e, sem ela, não poderia conseguir o emprego. Ele batalhou tanto quanto foi possível e não a conseguiu. Portanto, não teve o emprego. Essa atitude inteligente dos espanhóis tem como objetivo proteger os seus postos de emprego. No caso brasileiro, não é o que acontece, muito embora exista a falácia de que há preocupação em se gerarem novos empregos em face das novas oportunidades que começam a surgir. Todo o processo de desenvolvimento que está sendo feito, sob a égide das privatizações, não é para beneficiar o País, nem mesmo no que poderia, porque temos o know-how dos técnicos capacitados que já operavam nessas empresas. Diga-se de passagem: já operavam nessas empresas. Por que não podem ser aproveitados? Daqui a pouco, talvez até faxineiros importados tenhamos para resolver o problema de desemprego do mundo desenvolvido.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Agradeço o aparte de V. Exª.  

Deve-se notar, Senadora Marina Silva, que, de acordo com os mesmos dados que temos, essa quantidade enorme de estrangeiros que vêm para trabalhar nas empresas privatizadas, dirige-se para os Estados mais ricos de nosso País. Assim, agravam mais o desemprego principalmente em São Paulo - nossa maior capital -, onde esse problema é mais relevante.  

Com relação a essa facilidade de o Brasil estar permitindo a entrada de estrangeiros, devemos observar a contrapartida. V. Exª falou na Espanha, mas a Europa inteira é toda assim. Lembremo-nos dos nossos dentistas e o trabalho que tiveram para se estabelecerem em Portugal, país irmão que possui a nossa mesma língua. Agora, imaginemos os Estados Unidos... Quem consegue um visto no Brasil para trabalhar por lá? Ninguém. Vistos falsos e clandestinos são vendidos na região do Triângulo Mineiro a uns 4 mil dólares, o que daria a possibilidade de o cidadão poder se deslocar para entrar e trabalhar, ilegalmente, nos Estados Unidos; não legalmente... O Brasil está permitindo, tranqüilamente, sem nenhuma restrição, a entrada de trabalhadores estrangeiros. Eles não estão apenas ocupando vagas que não existiam. Como os donos das empresas do Estado - portanto, o povo - passaram agora para a mão do capital privado internacional, estes querem, na direção dessas empresas, pessoas da sua absoluta confiança. Desta forma, demitem o dirigente brasileiro, demitem o trabalhador, o engenheiro e o técnico brasileiros e trazem um técnico estrangeiro e da sua confiança para ocupar o cargo daqueles.  

É uma situação extremamente complicada e difícil para o Governo justificar perante a sociedade. Esse é mais um dos males que traz a privatização a nosso País.  

O Sr. Luiz Otávio (PPB-PA) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Ouço o nobre Senador Luiz Otávio.  

O Sr. Luiz Otávio (PPB-PA) - Senador Ademir Andrade, V. Exª aborda um tema muito preocupante. V. Exª fala sobre o desemprego. Essa é uma preocupação de todos, independente dos Partidos ou de sermos ou não oposição, até porque dependemos da estabilidade econômica, procurada pelo Governo com êxito para, só assim, gerarmos emprego e renda. V. Exª se refere à contratação de mão-de-obra para a Marinha Mercante, pelo que entendi. É preciso que fique bem claro que, ao falar em tripulação, entendi como de tripulação de Marinha Mercante, haja vista ter a Marinha de Guerra sua própria tripulação. Existe legislação própria no que se refere a esse assunto, que proíbe a contratação de mão-de-obra estrangeira para trabalhar na cabotagem e na navegação fluvial do Brasil. Porém, fica aqui uma observação que V. Exª faz. Se não for incluído no programa de privatização - não tenho conhecimento a respeito, não sei se V. Exª tem -, nós, do Congresso Nacional, podemos criar legislação própria. Aqui estamos para defender os interesses do povo brasileiro, para realmente inibirmos, pelo menos cercearmos, dificultarmos, criarmos obstáculos para a contratação de mão-de-obra estrangeira no que se refere a telecomunicações e a outras atividades que foram privatizadas. No nosso Estado, esse exemplo das empresas de distribuição de energia elétrica não cabe porque a empresa vencedora da licitação que privatizou a companhia de eletrificação é empresa nacional com um

know-how em São Paulo, apenas adotou a mão-de-obra existente no próprio Estado e desenvolveu a terceirização com uma empresa espanhola, a Guascor, que mantém toda mão-de-obra do nosso Estado, com uma melhoria da qualidade de serviços acima de qualquer expectativa. Quanto a isso, a população toda tem visto a melhoria também no sistema de telecomunicações, como a telefonia celular, e agora estamos a um passo de conseguirmos também a grande melhoria na expansão da rede telefônica do nosso País. Era isso que tinha a acrescentar a V. Exª.  

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA) - Agradeço o aparte de V. Exª . Esclareço que a razão do meu discurso é alertar o Senado, porque todos nós temos o dever de acompanhar esse acontecimento e de buscar alterar a nossa legislação para proceder como os Estados Unidos, a França, a Espanha e todos os países europeus. Nesses países, o cidadão estrangeiro não é livre para chegar e, legalmente, assumir uma condição de trabalho. Nos Estados Unidos, o nosso povo é considerado verdadeiro bandido, sendo até deportado quando é preso por ter entrado ilegalmente no país, sendo maltratado, desconsiderado, desrespeitado como ser humano. Essa é a nossa realidade. O que temos de fazer é buscar alternativas para impedir que isso aconteça.  

Digamos que 10% dos engenheiros brasileiros estejam desempregados; como o Brasil vai permitir que venha um engenheiro de fora para ocupar os postos dos engenheiros brasileiros? Se temos 25% de arquitetos desempregados, por que vamos permitir que outros venham aqui trabalhar? Então, temos de estabelecer melhor isso.  

É para isso que estou vindo à tribuna, trazendo esses fatos e chamando a atenção para eles. Pessoalmente, estou interessado na questão, e toda a minha assessoria está estudando formas de modificação da legislação que estabeleçam novas normas para não permitir que o lugar do trabalhador brasileiro seja ocupado por um estrangeiro.  

O ideal seria que o mundo todo fosse absolutamente aberto, que pudéssemos ir de um lugar para outro e trabalhar aqui e lá. Isso seria o ideal, mas não é possível, porque os chamados países desenvolvidos, que defendem o neoliberalismo, têm as suas proteções, tanto no que se refere à importação de produtos que eles já possuem no seu mercado interno quanto na proteção do direito do seu próprio trabalhador. É isso que o Brasil tem que fazer.  

Com esse objetivo, fazemos este pronunciamento e em breve apresentaremos propostas para impedir que trabalhadores brasileiros percam sua vaga, percam seu trabalho, principalmente considerando esta fase extremamente difícil, a mais difícil de toda a história de nosso País. Nunca tivemos um nível de desemprego tão alarmante quanto o que temos hoje, em função de uma economia praticamente estagnada. Há uma previsão de decréscimo do Produto Interno Bruto brasileiro de 4% em 1999, o que significa desempregar mais 4 milhões de trabalhadores na nossa Pátria. Ao mesmo tempo, estamos abrindo as portas para trabalhadores de outros Países.  

Sr. Presidente, considere-se ainda a grande diferença de tratamento entre o trabalhador brasileiro e o trabalhador europeu ou o americano. Na Europa, todo trabalhador tem a proteção do Estado, tem o seguro desemprego. Se está desempregado, tem o Estado para mantê-lo e também sua família. E não é só o trabalhador da iniciativa privada, mas também o funcionário público, o funcionário de empresa estatal, todos, sem exceção, têm um ganho, mesmo quando não há oportunidade de trabalho. No nosso País, lamentavelmente, o seguro desemprego serve apenas a uma pequena parcela da população, pois há uma série de requisitos legais que precisam ser modificados. Além disso, o seguro é muito menor do que o salário médio do funcionário e não existe para o servidor do setor público, seja municipal, federal ou estadual. Isso também precisa ser modificado.  

De forma que trago essa denúncia ao Plenário do Senado esperando que também outros Senadores desta Casa trabalhem e se preocupem com essa questão, modificando nossa legislação para que se evite esse tipo de acontecimento ruim no Brasil.  

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/06/1999 - Página 13526