Discurso no Senado Federal

CRISE DE CREDIBILIDADE DO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO EM VIRTUDE DOS FATOS OCORRIDOS NA PRIVATIZAÇÃO DA TELEBRAS. ENCAMINHANDO A MESA REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES AO MINISTRO DA FAZENDA SOBRE OS MONTANTES ARRECADADOS E A RESPECTIVA DESTINAÇÃO DO FUNDO DE ESTABILIZAÇÃO FISCAL, NOS ANOS DE 1998 E 1999.

Autor
Emília Fernandes (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINISTERIO DA FAZENDA (MF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • CRISE DE CREDIBILIDADE DO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO EM VIRTUDE DOS FATOS OCORRIDOS NA PRIVATIZAÇÃO DA TELEBRAS. ENCAMINHANDO A MESA REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES AO MINISTRO DA FAZENDA SOBRE OS MONTANTES ARRECADADOS E A RESPECTIVA DESTINAÇÃO DO FUNDO DE ESTABILIZAÇÃO FISCAL, NOS ANOS DE 1998 E 1999.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 01/06/1999 - Página 13518
Assunto
Outros > MINISTERIO DA FAZENDA (MF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, DESTINATARIO, PEDRO MALAN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, TOTAL, ARRECADAÇÃO, DESTINAÇÃO, FUNDO DE ESTABILIZAÇÃO FISCAL.
  • COMENTARIO, CRISE, PRESTIGIO, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, CORRUPÇÃO, DESVIO, DESTINAÇÃO, VERBA, FUNDO DE ESTABILIZAÇÃO FISCAL.

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos trazendo ao conhecimento do Plenário da Casa requerimento endereçado ao Ministro da Fazenda, que encaminharemos à Mesa. Antes de ler o conteúdo do nosso requerimento e o objetivo específico do nosso pedido de informações, quero associar-me à reflexão que este Plenário, nesta tarde e em outras, tem feito a respeito da situação que vive o nosso País, mais precisamente a respeito do desgaste tremendo do atual Governo, que está com a autoridade desgastada e a credibilidade abalada, o que é comprovado pelos dados estatísticos da consulta feita à sociedade brasileira, segundo a qual 50% dos consultados rejeitam e consideram péssima ou ruim a administração do atual Presidente da República.  

A todo momento, Parlamentares da base governista têm buscado, de diferentes formas - uns, de forma mais cordial, mais diplomática, outros, de forma mais agressiva - defender o atual Governo de todos os dados apresentados pelos meios de comunicação. Não há uma revista ou um jornal, que diariamente não escancare, no mínimo, algum assunto que precisa ser mais esclarecido pelo Presidente.  

Não estamos aqui condenando por antecipação. Entretanto, é nossa obrigação, e uma de nossas atribuições, fiscalizar o Poder Executivo. Por isso, principalmente, a partir de uma visão crítica como Oposição, não podemos nos silenciar.  

Tomamos conhecimento de que, na semana passada, houve neste plenário, um pronunciamento - diria - profundamente agressivo, contrariando até a natureza do Parlamentar que fez a defesa do Governo. A Oposição foi agredida violentamente, o que mostra o esgotamento da argumentação da defesa que o Governo precisa que seus aliados façam.  

Não é a Oposição que está envolvida, há algum tempo, em todas as formas de corrupção. Iniciamos pelas tentativas fraudulentas de garantir a reeleição neste País, quando, comprovadamente, Deputados venderam seus votos e, portanto, até perderam seus mandatos, abrindo mão deles, reconhecendo, por antecipação, a culpa e o crime. O País, contudo, não investigou de onde saiu o dinheiro para a transação. Se há um corrupto, se existe alguém que vende o voto, certamente há quem o tenha comprado – e, portanto, há um corruptor.  

Não é a Oposição que está atualmente envolvida em todas essas mazelas que os grampos telefônicos têm trazido à tona. Não que se aprove essa forma de buscar informações, mas, se elas existem, o Governo, pelo menos, tem explicações a dar ao povo brasileiro.  

Não é a apenas a Oposição que diz, é o próprio Relator de uma das CPIs – como é o caso da CPI do Sistema Financeiro – que está chegando à conclusão de que houve omissão e conivência do Banco Central do Brasil. Este órgão tem ligação direta com a equipe econômica do País, que foi omissa, negligente, além de ter sido – e o Governo tem que dar uma resposta –, principalmente, favorecedora de uma meia dúzia de privilegiados do sistema financeiro, deixando em alto prejuízo os cofres públicos da nossa Nação.  

Não foi a Oposição que implementou o sistema de privatização, que, sem dúvida, atingiu setores estratégicos tais que países do mundo inteiro deles não abrem mão, como comunicações e petróleo. No mínimo, a atividade de privatização foi pouco clara ou, eu diria até, profundamente comprometida. Também não somos nós, as Oposições, que temos de dar essas respostas ao povo brasileiro, morrendo de fome, sem saúde e habitação, enfim sem condições mínimas de sobrevivência, com um salário indigno de R$136,00.  

Para onde foi o dinheiro das privatizações? Não somos nós que temos de dar também essa resposta; é o Governo. Portanto, respeito os integrantes da base governista, que vêm fazer a defesa do Governo, o que é lógico, é evidente, pois é assim que se processa a democracia que queremos preservar no País; todavia, por outro lado, não podemos nos silenciar. Temos questionamentos e esperamos que o Governo, ao contrário de tentar omitir e dificultar as investigações, seja o primeiro a buscar abrir espaços para que sua equipe econômica venha dar as devidas explicações.  

Nós, da Oposição, estamos até sendo acusados, como ocorreu na semana passada, de "patriotismo desenfreado". Pois quero registrar aqui que prefiro pecar por patriotismo desenfreado, por amor a nossa Nação, ao nosso povo, a nossa gente, que pecar, e pecar profundamente, pela submissão, pela conivência, que coloca este País de joelhos diante do FMI e do capital especulativo internacional, que desmonta nossa economia, que desmonta nossas empresas, que desmonta nossos produtores, jogando milhões de trabalhadores nas ruas. Prefiro pecar por isso, Srs. Senadores.  

O povo brasileiro deve fazer uma avaliação. Queremos que, neste momento, cada vez mais, o povo brasileiro reaja diante da indignação que tem demonstrado quando consultado. Que o faça de forma concreta e objetiva, saindo organizadamente às ruas deste País, clamando para que sejam esclarecidos os fatos e que voltem para o Brasil os bilhões de reais que saíram do País. Futuramente, a CPI do Sistema Financeiro comprovará neste plenário que, por meio de órgãos legais, mais de R$100 bilhões saíram do País pelas mãos de "laranjas", de privilegiados, em sua grande maioria favorecidos por ações ilícitas.  

Essas são as respostas que a Oposição e o povo brasileiro querem. A nossa obrigação é questionar, e as respostas não deverão vir de nós.  

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT-DF) - V. Exª me concede um aparte?  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Concedo o aparte ao Senador Lauro Campos.  

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT-DF) - Congratulo-me com V. Exª pelo brilhantismo de seu pronunciamento e quero, rapidamente, lembrar algo que aconteceu no último leilão de privatização, o que prova a ineficiência e a incapacidade do grande número de pessoas que ocupam cargos importantes nesse Governo. Tudo isso foi feito, toda essa confusão em que se envolveu inclusive o Presidente da República, quando manifestou a sua preferência pelo grupo do Banco Opportunity, sem que esse grupo pudesse sequer concorrer ao leilão. A equipe do BNDES organizadora do leilão não conhecia sequer os termos que regem o certame, porque esse grupo não poderia concorrer ao leilão, como, de fato, não concorreu; daí, o outro grupo, o do Consórcio Telemar, ao qual o Sr. Mendonça de Barros chamava de "rataiada" ou de "telegangue", ter vencido, vindo a ser, atualmente, o proprietário da Tele-Centro Norte. De modo que, então, tudo isso se fez em torno de nada; tudo isso se fez em torno de um erro, de um engano. Eis algo que nos espanta: como é que tanta gente, PhDs, com altos níveis de QI, não conseguiram perceber que estavam agindo como o exército de Brancaleone, para obter vitória alguma, já que aqueles concorrentes estavam impossibilitados, como, de fato, sequer participaram do dito leilão?  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Agradeço o aparte de V. Exª, que incorporo ao meu pronunciamento, enriquecendo-o com os dados que V. Exª apresenta.  

E continuamos nossos questionamentos.  

Quem são aqueles que têm que dar respostas ao povo brasileiro senão aqueles que governam, que estabelecem os seus programas, que fazem todo um alardeamento em relação ao combate à violência, ao atendimento à saúde, ao atendimento à educação, quando, na prática, o que vemos são problemas sociais que se acentuam, o desemprego que aumenta e as pessoas realmente chegando ao estágio máximo de, eu diria, contrariedade com o que está aí.  

Então, realmente, temos que pedir respostas – e é isso o que estamos fazendo –, porque sabemos o que precisa ainda ser feito e esclarecido. Instituições financeiras foram socorridas, alegando-se uma suposta crise sistêmica, que não aconteceria, como foi demonstrado, inclusive, pelos próprios envolvidos na manobra de elaboração de documentos, com datas anteriores, para comprovar um socorro cujo motivo ainda não compreendemos, porque ainda estamos investigando.  

Sr. Presidente, tudo isso nos faz realmente crer que este Governo passa por uma crise que nos leva, no mínimo, a chamar a atenção da sociedade brasileira, já que estamos presenciando investidas de toda ordem contra o povo, no que se refere à Previdência, no que se refere aos aposentados. Já agora, logo, estarão chegando a esta Casa novas medidas que atingirão pensionistas, aposentados, ou seja, as pessoas que ganham o mínimo, que não têm certamente os milhões, frutos de lavagem, para mandar para fora do País, nem bancos para salvar.  

Assim, Sr. Presidente, dentro dessa linha de raciocínio, surpreendi-me ontem quando lia, na imprensa nacional, mais especificamente no jornal Folha de S.Paulo , uma matéria cujo título é: "Dinheiro do FEF vai para miudezas". Ali estão feitas afirmações cujo registro penso ser importante, porque, inclusive, não somos nós que as fazemos, mas a reportagem de um jornal sério, em que acreditamos e ao qual respeitamos, entre tantos outros que existem no País. Diz a matéria que: "Prorrogado em duas ocasiões, com o objetivo de custear prioritariamente ações nas áreas da saúde, educação, previdência e de programas de interesse econômico e social, o FEF (Fundo de Estabilização Fiscal) vem tendo parte de seus recursos utilizados na compra de caixas de presentes, assinatura de jornais e até na manutenção de aparelhos de ar condicionado do Palácio do Planalto. Batizado inicialmente de FSE (Fundo Social de Emergência), o FEF é originário da desvinculação de 20% da arrecadação de impostos e contribuições federal."  

Mudaram o nome Fundo Social de Emergência - porque era escancarado, não se destinava ao social - para Fundo de Estabilização Fiscal, em que não havia um compromisso direto com as questões que nominei.  

Quer dizer, o Governo Federal toma para si 20% de todos os impostos e contribuições federais e fica liberado das obrigações impostas pela Constituição, garantindo flexibilidade de gastos.  

O Congresso Nacional tem parte na culpa, com o nosso voto contrário, porque autorizou o Governo a pegar 20% de todos os impostos e contribuições federais, que a nossa classe empresarial e o nosso trabalhador pagam, para fazer o que bem entender.

 

E continua a matéria:  

"No ano passado, o FEF destinou cerca de R$30 bilhões para o caixa da União. Para este ano, a expectativa é que a arrecadação deverá chegar a R$23 bilhões.  

Com a prerrogativa da livre utilização desses recursos, o governo empregou em 99, segundo levantamento feito no Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira), R$60.067,70 do fundo na confecção e instalação de painéis para a divisão de ambientes – feitos em aglomerado (serragem imprensada) e revestidos com tecido especial nas cores azul e grafite – e de painéis acústicos, que impedem a passagem do som, no Ministério das Relações Exteriores."  

Eu diria que é algo bem planejado.  

"Também vieram do fundo R$7.912 gastos com a assinatura de jornais para o gabinete do Ministro do Exército, Gleuber Vieira, e R$2.250 para o pagamento de serviços de bufê prestados por solicitação do cerimonial do Ministério das Relações Exteriores.  

De acordo com o Siafi, o FEF foi o responsável pelo pagamento de R$4.860 para a aquisição de "caixas especiais" para presentes, e de R$10.002 pela confecção de objetos de prata e pedras brasileiras a serem oferecidas pelo Ministério das Relações Exteriores a autoridades estrangeiras.  

Outros R$6.119,75 do fundo foram gastos na confecção, instalação e remoção de um toldo na residência do m Luiz Felipe Lampreia (Relações Exteriores) por ocasião de um almoço oferecido pela embaixatriz Lenir Lampreia a mulheres de senadores norte-americanos.  

Ainda fazem parte da lista de serviços custeados pelo FEF, entre outros, gastos com hospedagem, aquisição de arranjos florais e locação de instalações no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro para a realização de um evento."  

Essa não é a primeira vez que vêm ao conhecimento público tais desvios ou, no mínimo, o emprego irresponsável de recursos que pertencem ao povo brasileiro, que deveriam ser muito bem utilizados. Deveriam pensar muito bem antes de empregá-los.  

Em 1995, por exemplo, sabemos que foi revelado que o uso da verba do FEF era para toda ordem: compra de doces, passagens, tecidos, toalhas, até material de higiene.  

O Governo fez toda essa transação, tirou o "s" para dizer que não era social, afirmou que a prioridade seria para a educação e para a saúde, para enganar a grande maioria do Congresso Nacional, e hoje estamos vendo o resultado. Então, perguntamos se não é uma falta de respeito com o povo brasileiro, com milhões de pessoas que estão enfrentando filas para ingressar em frentes de trabalho e ganhar menos de um salário mínimo, ou um salário mínimo, para sobreviver; crianças escrevendo cartas, pedindo socorro em nome dos seus pais, como presenciamos ontem nos meios de comunicação, porque estão sofrendo precocemente, talvez com seqüelas psicológicas profundas, porque estão vendo a mãe e o pai sofrendo dentro de casa, sem condições nem de dar um prato de comida, de dar o material para a escola. Este Governo brinca com o povo brasileiro, brinca com a sensibilidade das pessoas e se diz tão honesto. Desonestidade é isto também: é ser conivente, é ser omisso, e, principalmente, acobertar situações dessa natureza.  

Por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago aqui esta denúncia. Precisamos, de forma oficial, receber os dados referentes ao Fundo de Estabilização Fiscal, tanto no ano de 1998 como no ano de 1999, até esta data.  

Com fundamento no disposto no art. 50 da Constituição Federal e no inciso I do art. 215 do Regimento Interno do Senado Federal, requeiro a V. Exª que sejam solicitadas informações ao Sr. Ministro da Fazenda, Pedro Malan, referentes aos montantes arrecadados por meio do Fundo de Estabilização Fiscal, durante os anos de 1998 e 1999 até a presente data, bem como as respectivas destinações, com discriminação de onde foram empregados os respectivos recursos.  

Queremos alertar aqui que, na mesma matéria, foi publicado um depoimento do advogado Waldir Luiz Braga, Presidente da Associação Brasileira dos Consultores Tributários, no qual diz que pode não ser ilegal, mas, no mínimo, é imoral, é uma falta de respeito com o povo brasileiro, e que o Tesouro se recusou a fornecer os números relativos às perdas dos municípios. Espero que para nós, para o Congresso Nacional, essa recusa não exista.  

Segundo levantamentos feitos pelos partidos de oposição, há uma perda, em 1998, que chega a mais de R$550 milhões, dinheiro que era dos Municípios e que veio diretamente para a União, com o qual ela está fazendo o que bem entende.  

Esse é o pedido que encaminho à Mesa, por meio de um requerimento, para que esta Casa e a sociedade brasileira tenham algum esclarecimento sobre esse ponto, já que em outros continua a nebulosidade.  

Obrigada, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/06/1999 - Página 13518